DINÂMICA DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO NO RIO GRANDE DO SUL
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- Mikaela Belo
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1 DINÂMICA DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO NO RIO GRANDE DO SUL Resumo - O papel fudametal desempehado pelas atividades ecoômicas ão-agrícolas o desevolvimeto rural brasileiro tem sido evideciado por vários estudos. O presete trabalho tem como objetivo aalisar a hipótese de que uma parte importate das atividades ão-agrícolas presetes o meio rural da maioria dos muicípios do Rio Grade do Sul foi origiada pela demada de bes e serviços da própria população destes muicípios. Uma aálise da formação dos muicípios ao logo da história do Rio Grade do Sul idicou que a desidade demográfica, assim como o ível e a distribuição da reda dos agricultores são variáveis importates para explicar o seu desevolvimeto. A partir destas costatações elaborou-se um modelo matemático aalítico que permitisse explicitar as relações destas variáveis (população rural, ível e distribuição da reda) com a demada de bes e serviços locais. Os resultados obtidos o trabalho, especialmete as implicações formais dos modelos formulados, idicam que a mauteção da população o campo, a ampliação da reda dos agricultores e a promoção de uma melhor distribuição desta reda, podem ser elemetos importates de uma política de estímulo a atividades ãoagrícolas o meio rural, o que, o etato, ão exclui a ecessidade de medidas específicas de apoio à criação de atividades ão-agrícolas como, por exemplo, crédito, assistêcia técica e capacitação de recursos humaos. 97 Beedito Silva Neto Telmo Rudi Fratz 2 Professor Doutor do Departameto de Estudos Agrários UNIJUÍ. bseto@uijui.tche.br. 2 Professor Doutor do Departameto de Estudos da Admiistração UNIJUÍ. lfratz@uijui.tche.br.
2 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 Palavras-chave: desevolvimeto rural, modelo ecoômico, ecoomia rural. Itrodução O papel fudametal desempehado pelas atividades ecoômicas ão-agrícolas o desevolvimeto rural brasileiro tem sido evideciado por vários estudos, o que se costitui em um dos avaços mais importates os campos da ecoomia e da sociologia rural os últimos aos. O presete trabalho, de caráter exploratório, tem como objetivo aalisar a hipótese de que uma parte prepoderate das atividades ão-agrícolas presetes o meio rural da maioria dos muicípios do Rio Grade do Sul foi origiada pela demada de bes e serviços da própria população destes muicípios. Especificamete, é aalisada a possibilidade de que os efeitos ecoômicos iduzidos (MICHAÏLOF & BRIDIER, 987) pela reda agropecuária, a forma de geração de uma demada de bes e serviços passíveis de serem produzidos localmete, poder ser um elemeto importate para o desevolvimeto de atividades ão-agrícolas o meio rural. Portato, a dimiuição da reda dos agricultores e da ocupação da mão-de-obra a agricultura podem ser cosideradas obstáculos e ão estímulos à criação de atividades ão-agrícolas, como sustetam algus autores (por exemplo DEL GROSSI & GRAZIANO, 2000 e LAURENTI, 2000). Este trabalho está dividido em duas partes. Na primeira parte procurou-se aalisar sucitamete algumas características do desevolvimeto rural do Rio Grade do Sul e, a partir disto, idetificar as pricipais variáveis resposáveis por este processo. Na seguda parte foi desevolvido um modelo que permitisse aalisar formalmete as possíveis relações etre as variáveis idetificadas a primeira parte e a demada de bes e serviços locais. - O desevolvimeto rural do Rio Grade do Sul WANDERLEY (200), estudado as relações etre urbaização e ruralidade o Estado de Perambuco cocluiu que a grade 98
3 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz maioria dos muicípios deste Estado é rural, situado etre e o úmero míimo de habitates para que o que covecioalmete se deomia de perímetro urbao dos muicípios possa ser cosiderado como uma cidade. Esta mesma autora cita vários outros estudiosos que adotam critérios semelhates para aalisar a ruralidade dos muicípios brasileiros, especialmete os localizados o Nordeste. Etretato, é o estudo de VEIGA et alii (200) que foi ecotrada a aálise mais exaustiva das repercussões ecoômicas da ruralidade de boa parte dos muicípios brasileiros. Este autor aalisou os critérios atualmete adotados as estatísticas oficiais para defiir a população urbaa dos muicípios brasileiros meos populosos, comparado-os com os critérios vigetes em outros países e cocluiu que os critérios oficiais para a defiição de populações urbaas o Brasil mascaram o fato de que o chamado êxodo rural a verdade correspode, em boa parte, ao crescimeto da população de muicípios por ele classificados como rurais, o qual é um idicativo de um importate desevolvimeto rural verificado o Brasil as últimas décadas. Segudo este autor, o que se covecioou chamar de perímetro urbao de muicípios que possuem meos de habitates ão pode ser cosiderado, rigorosamete, como uma cidade, a medida em que a sua população matém profudos vículos com o meio rural. No caso do Rio Grade do Sul, icluido-se a população rural a população residete o perímetro urbao dos muicípios de meos de habitates, coforme proposto pelos autores citados acima (VEIGA et alii, 200; WANDERLEY, 200), observa-se que esta população apreseta um pequeo crescimeto as décadas de 80 e 90, coforme pode-se costatar a Figura (ode a população rural do Estado adicioada à população residete o perímetro urbao os muicípios de meos de habitates é deomiada de população rural corrigida ). Nesta mesma Figura pode-se observar que a população rural medida segudo os critérios oficiais (deomiada a figura de população rural oficial ) apresetou este período uma queda sigificativa, seguido a tedêcia dos aos
4 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 Figura - População rural do Rio Grade do Sul 940 a ,000,000 3,500,000 3,000,000 2,500,000 2,000,000,500,000,000, , ao População rural oficial Fote dos dados: JARDIM (200). População rural corrigida Esta difereça de comportameto pode ser explicada pelo crescimeto da população, total e residete o perímetro urbao, dos muicípios de meos de habitates, observado a partir de.950, coforme mostrado a Figura 2. Assim, pode-se afirmar que a população rural do Rio Grade do Sul tem se cocetrado de maeira crescete em pequeos muicípios, cujas sedes, embora ão possam ser cosideradas cidades, possuem uma certa diversidade de atividades ecoômicas. A costatação desta cocetração é aida reforçada pelo fato de o crescimeto da população do cojuto dos muicípios rurais (isto é, com meos de habitates) os aos 80 e 90 (coforme mostrado a Figura 2) ter sido acompahado por um vigoroso processo de criação de ovos muicípios, coforme podese costatar pelo aumeto do úmero de muicípios o Rio Grade do Sul mostrado a Figura 3. Além disto, pela aálise de dados populacioais apresetados por JARDIM (200) costatou-se que ehum muicípio do Rio Grade do Sul criado a partir de 98 possuía mais do que habitates em seu primeiro receseameto. Ou seja, os muicípios criados as últimas décadas o Rio Grade do 00
5 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz / DINÂMICA DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO 4,000,000 3,500,000 3,000,000 2,500,000 2,000,000,500,000,000, ,000 Fote dos dados: Jardim (200). Figura - População rural do Rio Grade do Sul 940 a População rural oficial ao População rural corrigida 600 Figura 3 - Número de muicípios o Rio Grade do Sul a ao Fote dos dados: Jardim (200). Sul poderiam todos ser classificados como muicípios rurais o mometo do seu primeiro receseameto. 0
6 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 Na verdade, a grade maioria dos ovos muicípios cosegue sua emacipação com uma população próxima à do limite legal exigido. Portato, a criação de ovos muicípios provavelmete está ligada a uma progressiva diversificação das atividades ecoômicas o meio rural, a medida em que esta está relacioada à formação de úcleos habitacioais, o que acaba resultado a implatação de uma ifra-estrutura admiistrativa que cofere a estes úcleos e ao seu etoro um status de muicípio. Baseado o exposto acima, as próximas seções procurar-seá evideciar os pricipais fatores resposáveis pelo desevolvimeto rural do Estado através da aálise do cotexto ecoômico regioal relacioado aos desmembrametos muicipais o Rio Grade do Sul... O processo de desmembrameto muicipal o Rio Grade do Sul Os primeiros muicípios do Rio Grade do Sul surgiram com o desevolvimeto das charqueadas. Estas cosolidaram as estâcias e provocaram um aumeto da reda do setor pastoril permitido uma diâmica urbaa iicialmete reduzida a algumas poucas cidades detre as quais se destacam Rio Grade, Alegrete, Cachoeira, Pelotas e Bagé, com uma ítida predomiâcia dos muicípios a metade sul do Estado. A expasão da idústria do charque só ão foi cotíua até 860 em virtude da Revolução Farroupilha que a prejudicou temporariamete etre 835 e 845. A sua diâmica ecoômica permitiu, o etato, o surgimeto de ovos muicípios de tal maeira que já em 846, logo após o fial da Revolução, o Estado cotava com dezeove uidades político-admiistrativas cocetradas, em sua maioria, a metade sul. Etre 84 e 860, durate o período do auge do desevolvimeto das charqueadas, foram criados mais sete muicípios detre os quais apeas o de São Leopoldo, criado em 846, deveu-se à ecoomia dos coloos alemães. Mas a apropriação cocetrada da terra e, coseqüetemete, da reda, determiou uma fraca diamicidade ecoômica aos cetros urbaos que surgem dadas as 02
7 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz características cocetradoras do sistema agrário baseado a pecuária extesiva o qual se alicerçam. No fial do século XIX, o charque estava perdedo rapidamete a posição de pricipal produto de exportação do Rio Grade do Sul, pois passava a cocorrer com a ascesão de outros produtos agrícolas, pricipalmete aqueles oriudos da Região Norte Coloial do Estado (ROCHA, 998: 50). Apesar da itrodução de frigoríficos o iício do século XX, a região sul uca mais coseguiu apresetar um ritmo de crescimeto que lhe permitisse fazer face à diâmica ecoômica das regiões do orte, de predomíio da produção agrícola baseada o trabalho familiar. Assim, a região de predomíio da pecuária, surgiram apeas seis muicípios ovos ao logo de toda a primeira metade do século XX. A partir de 873, com a criação do muicípio de Moteegro, iiciam-se, letamete, as emacipações a região das Colôias Velhas, chegado-se ao limiar do século XX com 4 muicípios esta região. A partir de etão, além de serem criados ovos muicípios as Colôias Velhas, iicia-se também o processo as Colôias Novas de tal forma que, em 944, já existiam as regiões de agricultura familiar, trita e cico muicípios. Mas é a partir da seguda metade do século XX que as emacipações as regiões coloiais passam por um extraordiário icremeto com a criação de 40 ovos muicípios etre 954 e 965, mais do que dobrado o úmero total existete o Estado em 954, que era de 02 muicípios. Neste período de 20 aos ão é criado ehum ovo muicípio as regiões de agropecuária tradicioal. Esse processo é a expressão da diâmica ecoômica e sóciopolítica da coloização das áreas de mato do Estado. Na medida em que a ocupação das matas avaçava pelo iterior do Estado ela era acompahada, gradativa e rapidamete, pelo surgimeto de povoados e a posterior criação de ovos muicípios. Assim, segudo LA SALVIA & MARODIN (976: 4), a atividade produtiva dos agricultores familiares forçava a criação de muitos úcleos populacioais ode os coloos faziam o itercâmbio comercial de seus produtos agrícolas em coseqüêcia de sua diamicidade populacioal e ecoômica, dado origem a uma maior divisão do trabalho pela multiplicação de serviços sociais e culturais e 03
8 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 pela crescete ecessidade de atividades comerciais, de maufatura, de trasporte, etc. Todas estas atividades eram remueradas a partir do valor agregado gerado pelos agricultores em seus diversificados sistemas de produção. Os sistemas de produção predomiates etre os coloos de origem alemã eram os baseados a produção de milho e suío, visado a produção de baha, tato para o mercado itero quato para a exportação (ROCHE, 959; PEBAYLE, 974). Etre os italiaos teve papel importate, além da suiocultura, a produção de uva que permitiu o desevolvimeto de uma pujate idústria viícola a região (PEBAYLE, 974). No etato, segudo PESAVENTO (983: 75), a itermediação comercial prejudicava o agricultor, por isolá-lo dos estímulos do mercado a medida em que o comerciate assumia uma fução oligopólica/ oligopssôica, cotrolado a veda dos artigos ão-coloiais e a compra dos produtos da região. Desta forma reduzia-se o desevolvimeto do pleo potecial da agricultura familiar. Estas dificuldades foram, em parte superadas pelo movimeto cooperativista a partir dos aos 9 e 92 (PESAVENTO, 983). A diâmica de expasão da agricultura coloial deu-se em dois mometos distitos. O processo de desmembrameto muicipal foi iflueciado por estes mometos. O primeiro mometo refere-se ao povoameto das chamadas Colôias Velhas que ocorreu a partir de 824. Nesta fase o surgimeto de muicípios dava-se pela multiplicação de colôias que iam tomado corpo admiistrativo e dado origem aos muicípios cujos distritos se trasformavam, a seguir, em ovos muicípios. O ritmo de evolução muicipal dava-se assim de uma forma bastate acelerada, porque os muicípios apresetavam uma desidade demográfica rural muito alta (superior a 50 hab./km 2 ) e possuíam um grade úmero de distritos (LA SALVIA & MARODIN, 976: 4). O segudo mometo correspode ao da ocupação, pelos coloos, das chamadas Colôias Novas. Isso ocorreu muito mais tarde, a partir de 890, com a criação da Colôia Ijhuy em área pertecete ao muicípio de Cruz Alta o qual já existia desde 834. O processo de surgimeto e multiplicação de muicípios as Colôias Novas foi semelhate ao das Colôias Velhas. 04
9 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz Até 954 os muicípios de uma maeira geral apresetavam expressiva área territorial e eram subdivididos em muitos distritos. A partir de etão desecadeou-se de modo efetivo o processo de muicipalização com criação de iúmeros muicípios (LA SALVIA & MARODIN, 976: 4) com uma extraordiária aceleração de desmembrametos. Assim, etre 954 e 965, o úmero de muicípios o Rio Grade do Sul passa de 02 para cerca de 242, sedo a grade maioria as regiões das Colôias (Velhas e Novas), sedo que ehum muicípio foi criado essa época as regiões de pecuária extesiva do sul do Estado (regiões da Campaha e Serra do Sudeste). Etre 966 e 980, justamete o período em que a agricultura do Rio Grade do Sul passou por profudas trasformações tecológicas, as quais provocaram uma grade dimiuição do emprego a agricultura, apeas um muicípio foi criado (JARDIM, 200). Mas a partir de 98, o processo se itesifica ovamete com a criação, os aos 80, de 96 muicípios. Nos aos 90 o processo de desmembrameto muicipal se itesifica aida mais, com a criação de 53 ovos muicípios resultado os 497 muicípios atualmete existetes o Estado (JARDIM, 200), cuja distribuição espacial idica uma ítida cocetração as regiões de agricultura familiar (Colôias Velhas e Novas), coforme pode ser costatado a Figura 4. Em suma, a velocidade dos desmembrametos muicipais ao logo do século XX foi sempre muito maior as regiões de coloização, as quais apresetam predomiâcia da agricultura familiar, do que as regiões de campo em decorrêcia de sua maior diamicidade ecoômica. Esta se deve às características de uma agricultura capaz de gerar a riqueza ecessária à efetivação de uma diâmica ecoômica mais abragete e diversificada. O grau de divisão territorial para efeitos admiistrativos parece ter chegado ao seu limite apesar de aida haver demadas por criação de ovos muicípios em tramitação a Assembléia Legislativa do Estado. Estas demadas cotiuam sedo maiores as regiões de agricultura familiar, o que expressa a capacidade destas de seguir origiado úcleos populacioais geradores de bes e serviços. 05
10 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3.2. As variáveis explicativas do desevolvimeto rural do Rio Grade do Sul A partir do exposto acima se levata a hipótese da existêcia de três variáveis explicativas das diferetes diâmicas de desevolvimeto rural observadas ao logo da história do Rio Grade do Sul. A primeira é a população rural presete as suas regiões, a qual difere segudo a desidade demográfica. A seguda variável é o ível de reda das populações regioais e a terceira é a distribuição da reda o seio dessas populações. Estas variáveis podem codicioar o desevolvimeto rural de uma região através da sua ifluêcia sobre a demada de bes e serviços locais como se procurará aalisar formalmete o modelo descrito a próxima seção. Figura 4 Divisão muicipal atual e regiões do Rio Grade do Sul Legeda Colôias Velhas; 2 Colôias Novas; 3 Plaalto; 4 Depressão Cetral; 5 Serra do Sudeste; 6 Campaha; 7 Campos de Cima da Serra; 8 Litoral Fotes: divisão regioal adaptada a partie de PEABAYLE (974), divisão muicipal obtida em JARDIM (200) 06
11 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz 2. Um modelo de demada de bes e serviços locais Na tetativa de explicar os fatores resposáveis pelo desevolvimeto rural de uma região foi elaborado um modelo de demada de bes e serviços locais. Tal modelo está baseado em uma geeralização para produtos de cosumo correte da Lei de Egels (MOUNIER, 992), ou seja, cosiderou-se que os bes e serviços de cosumo correte têm uma demada que se comporta de forma semelhate à dos alimetos em relação ao aumeto da reda dos cosumidores. Assim, ates de discutir a estrutura formal deste modelo, é importate explicitar os pressupostos adotados para a sua elaboração, os quais são: a) as comuidades rurais podem proporcioar uma dispoibilidade limitada de bes e serviços, os quais cocetram-se em atividades que exigem meos capital e tecologia (predomiâcia de atividades comerciais e de serviços em geral); b) os bes e serviços passíveis de serem produzidos as comuidades rurais são de cosumo correte, isto é, são produtos de baixo valor por uidade (o que exclui bes duráveis e de luxo ), os quais são prioritariamete cosumidos em relação a bes duráveis, a bes e serviços de luxo, ou em relação à poupaça ou ao ivestimeto; c) os cosumidores gastam apeas uma parte da sua reda com bes e serviços corretes, reservado a outra parte para bes e serviços de maior valor por uidade ou para costituir fudos de poupaça ou ivestimeto; d) os bes e serviços locais são cosumidos pelas pessoas residetes a própria região; e) a medida em os agricultores se costituem a maioria da população rural, estes são os pricipais resposáveis pela sustetação da demada de bes e serviços locais. A partir destas costatações, elaboramos um modelo matemático simples para aprofudarmos a aálise das relações etre a população rural (e, portato, a desidade demográfica), o ível e a 07
12 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 distribuição da reda desta população, e a demada de bes e serviços locais. Procurado respeitar os pressupostos b e c descritos acima, adotamos uma fução hiperbólica para descrever a relação etre, por um lado, a demada média por bes e serviços locais e, por outro lado, a reda média e a sua distribuição. A demada média é etão multiplicada pela população para podermos obter a demada total. Assim, temos, d = m D = dp K r () (2) ode d = demada média de bes e serviços locais por pessoa; m = demada máxima de bes e serviços locais por pessoa; K = escalar positivo (o sigificado ecoômico de K é discutido a próxima seção); r = reda média por pessoa; D = demada total de bes e serviços locais; P = população rural. Observado-se a equação () pode-se perceber que a demada por pessoa de bes e serviços locais aproxima-se assitoticamete de um ível máximo, represetado por m, a medida em que a reda aumeta. Esta aproximação é mais rápida quato meor é o valor de K, o qual desempeha um importate papel a relação etre a reda e a demada de bes e serviços locais. Portato, para a compreesão do modelo proposto, é importate que se proceda a uma discussão das possíveis iterpretações do sigificado ecoômico que se pode atribuir à variável K. 2.. Iterpretação ecoômica da variável K A variável K idica a propesão ao cosumo de bes e serviços corretes da população aalisada. Assim, valores mais elevados 08
13 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz de K sigificam que uma dada população teria uma meor propesão ao cosumo destes produtos (e, portato, uma maior propesão a poupar, a ivestir ou a cosumir bes duráveis e bes e serviços de luxo) em relação à uma população cujo comportameto é descrito por uma equação com valores de K mais baixos. Para cada idivíduo isoladamete, o valor de K, em parte, é determiado pelas suas características culturais e psicológicas, sedo também iflueciado pelo risco (ou icerteza) em relação aos resultados das suas atividades ecoômicas. Por exemplo, um idivíduo em dificuldades fiaceiras, portato com tedêcia a uma maior aversão ao risco, em uma codição ode a dispersão dos resultados possíveis da sua atividade ecoômica é elevada, tederia a ter uma preferêcia mais acetuada pela liquidez (BOUSSARD, 987), o que pode afetar sua propesão ao cosumo e, portato, o valor de K da equação que descreve sua demada de bes e serviços de cosumo correte em relação a sua reda. Mas para uma população cosiderada como um todo, o valor da variável K também pode ser iterpretado como uma expressão da ifluêcia da distribuição da reda sobre a demada por bes e serviços locais (e, portato, sobre o desevolvimeto rural). Isto porque o valor da variável K difere se cosiderarmos o seu cálculo os agricultores idividualmete ou a população como um todo, coforme demostração a seguir. Cosiderado o segudo membro da equação (), para idivíduos teríamos, m r m i K = i= i= K r i i (3) m = demada máxima de bes e serviços por pessoa em média; m i = demada máxima de bes e serviços de cada idivíduo i; K i = K de cada idivíduo; r = reda média da população; 09
14 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 r i = reda de cada idivíduo i; = úmero de idivíduos da população. Cosiderado m i o mesmo para todos os idivíduos, ou seja, m i = m, i= m i = m (4) substituido (4) em (3) temos m K r m = i= K r i i (5) ou seja, Ki K r m m i i = = r (6) cosiderado K i igual para todos os idivíduos, e efetuado algumas trasformações para isolar K, temos, K = Kir i= ri (7) dado que a média harmôica (H) é defiida como (HOFFMANN, 998), 0
15 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz dado que a média harmôica (H) é defiida como (HOFFMANN, 998), H = r i i= (8) o seu iverso é H = i= r i (9) substituido (9) em (7), temos K = K i r H (0) ou seja, a variável K para o cojuto da população correspode à variável K i (ou seja, K de cada idivíduo) multiplicada pela razão etre a média aritmética e a média harmôica da reda da população. Como a média harmôica é tato meor que a média aritmética quato maior a dispersão dos valores que a compõe (HOFFMANN, 998), K será tato maior em relação à K i quato maior a dispersão dos valores da reda da população. Assim, a variável K está diretamete relacioada com o perfil de distribuição da reda da população a qual determia que quato maior a dispersão dos valores da reda da população, meor será a demada de bes e serviços para um mesmo ível de reda médio. Para ilustrar a capacidade do modelo proposto em captar a ifluêcia da distribuição da reda sobre a demada de bes e serviços foram realizadas algumas simulações utilizado-se parâmetros obtidos a partir de etrevistas efetuadas juto a agricultores de Ijuí. Tais
16 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 simulações são apresetadas a Figura 5 que mostra a ifluêcia da reda sobre a demada de bes e serviços locais, cosiderado-se dois perfis de distribuição de reda. Um destes perfis correspode a uma distribuição igualitária (isto é, toda a população recebe o mesmo valor de reda/pessoa) cosiderado-se que uma pessoa com uma reda muito elevada demadaria R$ 2.040,00 por ao de bes e serviços locais (ou seja, m = 2.040) e uma pessoa com reda de R$.000/ao demadaria R$ 700/ao de bes e serviços locais, o que resulta, utilizado a equação (), em um valor de K de O outro perfil de distribuição de reda cosiderado a simulação parte do mesmo valor de m, porém com uma dispersão Figura 5 - Relação etre a reda e a demada por pessoa de bes e serviços locais Reda por pessoa (R$/pessoa) demada com distribuição igualitária da reda (K = ) demada com distribuição desigual da reda (K = ) Fote: simulação da pesquisa da reda que traduz uma proporção de dois trabalhadores recebedo um salário de R$ 2.340/trabalhador/ao para cada trabalhador recebedo R$ 0.320/ao, o que resulta uma média aritmética de R$ 5.000/trabalhador/ao e uma média harmôica de R$ 3.52,58/ trabalhador/ao. Combiado os valores da média aritmética, a média harmôica e o valor de K i ( K obtido ateriormete, correspodete 2
17 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz ao de uma distribuição igualitária), através da equação (0) obtemos o valor de K, de cerca de , que caracteriza o segudo perfil de distribuição de reda utilizado a simulação. Pode-se observar a Figura 5 que uma distribuição desigual da reda dimiui a demada de bes e serviços locais pelos agricultores. Por exemplo, para uma reda média de R$ 2.000/pessoa, quado esta é distribuída de forma desigual, ela geraria uma demada de bes e serviços locais de cerca de R$.000/pessoa, equato que a sua distribuição igualitária provocaria uma demada de bes e serviços de quase R$.400/pessoa. Assim, uma melhor distribuição de reda elevaria, este caso, a demada de bes e serviços locais de 50% para 70% da reda. Outro aspecto a ser salietado a partir da observação da Figura 5 é que quato meor a reda média, maior será o efeito da distribuição da reda sobre a demada de bes e serviços locais. Por exemplo, equato que para o ível médio de reda de R$ 2.000/pessoa discutido acima uma distribuição da reda levou a um aumeto de R$ 400/pessoa a demada de bes e serviços locais, para o ível de reda de R$ 8.000/pessoa, as mesmas medidas de distribuição de reda levariam a um aumeto da demada de bes e serviços locais de cerca de apeas R$ 00/pessoa. Assim, embora estas simulações teham um caráter apeas ilustrativo, a medida em que os dados obtidos foram isuficietes para uma validação estatística do modelo, elas idicam que em regiões pobres a distribuição da reda pode ser um fator mais importate para o desevolvimeto rural, através do seu efeito sobre a demada de bes e serviços locais, do que em regiões de reda rural per capita elevada. Coclusões Os resultados obtidos este trabalho idicam que a mauteção da população o campo, a ampliação da reda dos agricultores e a promoção de uma melhor distribuição desta reda podem ser elemetos importates de uma política de estímulo a atividades ão-agrícolas o meio rural. Evidetemete, isto ão exclui a ecessidade de medidas específicas de apoio à criação de atividades ão-agrícolas como, por exemplo, crédito, assistêcia técica e capacitação de recursos 3
18 REVISTA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL. VOL. 4 Nº 3 humaos. Etretato, a promoção de uma diâmica da agricultura favorável à mauteção da população e da reda dos agricultores como, por exemplo, o estímulo, com eqüidade, de sistemas de produção com maiores resultados ecoômicos por uidade de superfície e com maior utilização de mão-de-obra, pode ser crucial para assegurar que medidas específicas destiadas à criação de atividades ão-agrícolas ão sejam eutralizadas por um cotexto ecoômico local adverso. Os dados obtidos este trabalho idicam que a dimiuição da demada de mão-de-obra os trabalhos agrícolas ão foi um fator importate para o desevolvimeto rural do Rio Grade do Sul. Ao cotrário, a aálise da história do Estado efetuada este trabalho idica que mesmo os períodos em que ão houve mudaças que poderiam levar a uma ecoomia de mão-de-obra a agricultura observou-se que a liberação de mão-de-obra do campo devida ao crescimeto vegetativo da população foi suficiete para a criação de atividades ão-agrícolas as regiões mais atigas de agricultura familiar do Estado, além de prover mão-de-obra para a coloização de ovas terras. Efim, é importate ressaltar que os resultados obtidos este trabalho são apeas prelimiares, devedo ser cofirmados por pesquisas mais precisas para que as coclusões por eles suscitadas possam ser cosideradas em políticas de desevolvimeto. Etretato, tais resultados idicam que um cohecimeto adequado das iterrelações etre as atividades ecoômicas agrícolas e ão-agrícolas pode ser de crucial importâcia para o estabelecimeto de políticas eficazes de desevolvimeto rural, especialmete para os muicípios com meos de habitates, cuja maioria apreseta características predomiatemete agrícolas. Referêcias Bibliográficas DEL GROSSI, M. E. & GRAZIANO DA SILVA, J. Ocupações e Redas Rurais o Brasil. I: ORNAs. Ocupações rurais ão-agrícolas: oficia de atualização temática. Lodria, Iapar, BOUSSARD, J.-M. Ecoomie de l agriculture. Paris, Ecoomica (Coleção Écoomie Agricole & Agro-alimetaire),
19 Beedito Silva Neto & Telmo Rudi Fratz JARDIM, M. de L. T. Um século de população o Rio Grade do Sul. Porto Alegre, Fudação de Ecoomia e Estatística Siegfried Emauel Heuser, 200 (CD-ROM). LAURENTI, A. C. Terceirização dos trabalhos agrários e o ovo rural. I: ORNAs. Ocupações rurais ão-agrícolas: oficia de atualização temática. Lodria, Iapar, HOFFMANN, R., Estatística para Ecoomistas. São Paulo, Editora Pioeira (Biblioteca Pioeira de Ciêcias Sociais. Ecoomia), 998. LA SALVIA, F. & MARODIN, E. F. Evolução muicipal: uma aálise geográfica. Boletim Geográfico do Rio Grade do Sul.Porto Alegre, ao 2,. 9, jaeiro a dezembro de 976. MOUNIER, A. Les théories écoomiques de la croissace agricole. Paris, INRA-Ecoomica, 992. MICHAÏLOF, S. & BRODIER, M. Guide Pratique d Aalyse de Projets. Èvaluatio et Choix des Projets d Ivestissemets. Paris, Ed. Ecoomica, 987. PEBAYLE, R. Eléveurs et Agriculteurs du Rio Grade do Sul (Brésil). Istitut des Hautes Etudes de l Amérique Latie. Paris, 974 (Tese de Doutorado, documeto ão publicado). PESAVENTO, S. J. RS: agropecuária coloial & idustrialização. Porto Alegre, Mercado Aberto, 983. ROCHA, J. M. & BECKER, D.F. As raízes do declíio ecoômico da metade sul do Rio Grade do Sul. I Estudo & Debate, UNIVATES, ao 5, o., Lageado, FATES, 998. ROCHE, J. La Coloisatio allemade et le Rio Grade do Sul. Istitut des Hautes Etudes de l Amérique Latie. Paris, 959 (Tese de Doutorado, documeto ão publicado). VEIGA, J. E. da, et alii, O Brasil, J. E. da,. O Brasil Rural precisa de uma Estratégia de Desevolvimeto. Brasília, Covêio FIPE-IICA (MDA-CNDRS/NEAD), 200 (dispoível a Iteret o edereço: acessado em 28 de março de 2002). WANDERLEY, Urbaização e Ruralidade: Relações etre a Pequea Cidade e o Mudo Rural e Estudo Prelimiar sobre os Pequeos Muicípios em Perambuco. Brasilia, NEAD/MAD, 200 (dispoível a Iteret o edereço: acessado em 28 de março de 2002). 5
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