PN 1056.03-51; Ap.: TC Valongo, 3º J. (1272/01); Ap.es2: Ap.a3: Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Introdução (a) propuser am a presente acção contra pedindo: despejo imediato do rés do chão do prédio urbano sito na Rua da Costa, n.º447, da freguesia de ermesinde, con celho de valongo, inscrito na matriz sob o artigo 2433º e a entrega do mesmo aos AA, livre e devoluto de pessoas e bens; pagamento, a estes últimos, da quantia de PTE: 420.000$00 referente às rendas vencidas até à presente data, corr espo ndentes a metade do mês de Fevereiro, acrescida dos meses de Março a Dezembro de 2001 no montante de PTE: 40.000$00 cada, bem como o pagamento das rendas que, no mesmo montante mensal, se vencerem durante a pendência da acção até final. (b) Alegaram, em síntese: 1 Vistos: Des (...); Des. (...). 2 Adv.: Dr. 3 Adv.: Dr.ª 1
foi celebrado um contrato escrito de arrend amento com a ré, fixada a renda actual em PTE: 40.000$00; a ré deixou de pagar as rendas em Fevereiro de 2001, motivo pelo qual pretendem resolver o contrato celebrado. (c) A R. comprovou nos autos o depósito na CGD da quantia total de 1.356,41, correspondente às rendas de Março a Dezembro de 2001 e Janeiro e Fevereiro de 2002, acrescida a indemnização moratória de 50%; (d) Contestou admitindo ter deixado de pagar a renda em Março de 2001, mas alegando que as rendas contratualmente fixadas são no valor mensal de PTE: 15.000$00 e não de PTE: 40.000$00; negou ainda que tenham existido no locado quaisquer obras justificativas de aumento da renda, nos termos alegados na P.I. (e) Os AA. na resposta, alegaram que o depósito efectuado não fez cessar o direito à resolução do contrato de arrendamento, uma vez que o valor das rendas não corresponde ao montante depositado; (f ) Da sentença recorrida: (1) A única factualidade que com segur ança resulta dos autos é que a renda contratualmente fixada no ano de 1987 era de PTE: 3.000$00 mensais; (2) Tendo em conta que o acordo celebrado entre as partes se encontra reduzido a escrito em formal documento particular, assinado pelos litigantes, qualquer aumento superior ao decorrente da aplicação anual do coeficiente, fixado através de portaria, teria que revestir idêntica forma, art. 394/1 CC; (3) Se é certo que o p agamento constitui excepção cu ja prova impendia sobre a R, aos AA impunha-se provar a existência da cláusula contratual ou do acordo bi-vinculante em que assentava a correspectiva obrigação de pagamento, prova que não fizeram para além do valor estipulado no próprio contrato de arrendamento; 2
(4) No entanto, uma vez que a R admite em sede de contestação qu e o seu valor correspondia a PTE: 15.000$00/ 74,82 no ano de 2001, confissão que produz efeitos probatórios (art. 352 CC), o tribunal terá que considerar tal valor como correspondendo ao da renda mensal, ex traindo as legais consequências; (5) Assim, em atenção ao disposto no art. 1048 CC, ao depósito efectuado nos autos e à circunstância de não terem os AA cumprido o ónus de prova que sobre eles impendia quanto ao valor da renda mensal alegado na P.I., impõe-se declarar cessado o direito à resolução do contrato que aqui se pretendia exercer, improcedendo a acção proposta, por se concluir ser tempestivo e liberatório o depósito efectuado pela R e, consequentemente, ferido de caducidade o direito dos AA. II. Matéria assente: a) Por acordo escrito celebrado no dia 2 de Janeiro de 1987, o A. marido cedeu à R., mediante o pagamento de uma contrapartida mensal de três mil escudos, o gozo temporário para habitação do rés-do-chão do seu prédio urbano sito na Rua da Costa, n.º447, freguesia de Ermesinde, concelho de Valongo, inscrito na matriz sob o artigo 2433º; b) A R. não pagou as rendas referentes aos meses de Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2001, as quais se venceram respectivamente em 1 de Março, 1 de Junho, 1 de Julho, 1 de Agosto, 1 de Setembro, 1 de Outubro, 1 de Novembro e 1 de Dezembro daquele ano; c) A R. depositou, em 4 d e Fevereiro de 2002, na CGD e à ordem deste processo, a quantia global de mil trezentos e cinquenta e seis euros e quarenta e um cêntimos, correspondente às rendas relativas aos meses de Março a Dezembro de 2001, acrescidas de 50% do respectivo valor; d) A contrapartida pela cedência mencionada era de vinte e sete mil escudos em Fevereiro de 2000, trinta mil escudos em Maio de 2000, trinta e cinco mil escudos em Junho de 2000 e quarenta mil escudos em Setembro de 2000; 3
e) Os AA não realizaram no rés-do-chão em causa quaisquer obras, à excepção da colocação de portas e janelas em alumínio há cerca de 3 anos; f) Não existem obras ao nível das canalizações e rede de esgotos; g) R. vive no arrendando há mais de 30 anos; h) E não dispõe de outro sítio para habitar; i) Encontra-se cega há cerca de 2 anos. III. Cls/Alegações: (1) A recor rida não p agou as rendas referentes aos meses de 04/12.01; (2) Depositou, depois, em 02.02.04, na CGD, e à ordem do juiz da causa, a quantia global de 1 350,41, correspondente às rendas relativas aos mesmos meses, com o acréscimo de 50%; (3) Contudo, a contrapartida pela cedência... era d e Pte.: 27 000$00 em 02.00, Pte.: 30 000$00 em 05.00, Pte.: 35 000$00 em 06.00 e Pte.: 40 000$00 em 09.00; (4) Entretanto, a recorrida pagou anteriormente aos recorrentes, durante o ano 2000, e já em 2001, a título de rendas, valores superiores aos que depositou em 02.02, pelos quais estes últimos emitiram os competentes recibos; (5) Ora a emissão de recibos pelo senhorio e a aceitação destes por parte da inquilina corresponde, em abstracto, a um qualquer acordo entre ambos celebrado; (6) Assim, a recorrida não depositou a totalidade das rendas devidas, antes procedeu a um depósito arbitrário de um montante que nunca pagou anteriormente, e para o qual nunca foi notificada antes para pagar; (7) O tribunal reco rrido não usou portanto um critério prudente na sentença; (8) E existe uma nítida contradição entre os factos dados como assentes de início e os resultantes das respostas aos quesitos; (9) Por outro lado os fundamentos estão em op osição com a decisão; (10) Deste modo, merece censura a sentença recorrida, porquanto é nula, art. 668/1 CPC; 4
(11) Deve ser revo gada e substituída por outra que condene a R. no pedido. IV. Contra-alegações: (1) A acção de despejo intentada pelos Ap.es assentou num fundamento cuja prova não lograram; (2) Com efeito, apenas resultou dos debates o valor da renda estipulado no contrato de arrendamento, Pte.: 3 000$00; (3) Ora, encontrando-se o mencionado contrato de arrendamento reduzido a escrito, qualquer aumento superior ao decorrente da aplicação anual do coeficiente fixado por portaria, teria de revestir idêntica forma, art. 394/1 CC; (4) Então, impunha-se aos Ap.es provar a ex istência de cláusula contratual ou de acordo vinculante em que assentasse obrigação de pagamento de uma renda diferente: não a fizeram! (5) Mais... não lograram os AA. provar a realização de obras de conservação extraordinária ou de beneficiação no arrendado em causa; (6) Resultou antes provado que n ão realizaram quaisquer obras, nomeadamente ao nível da canalização e da rede de esgotos; (7) Entretanto os montantes da rend a que invocam não resultam da aplicação dos coeficientes de actualização legais; (8) E acresce que os recibos constantes dos autos não provam por si só os montantes exigível à Ap.a como contrapartida da concessão do gozo do locado; (9) E a Ap.a, que sempre confiou nos senhorios, [nada verificou neles], por jamais ter duvidado da correcção dos montantes inscritos nos mesmos; (10) Aliás nem de tal circunstância se poderia aperceber: encontra-se cega há cerca de dois anos; (11) Resultou provado por fim que a renda devida durante o ano 2001 era de Pte.: 15 000$00, ou seja, 74,82 [e foi este o valor de referência tomado pela sentença]; 5
(12) Certo é que a Ap.a vive há mais de 30 anos no arrend ado em qu estão, cumprindo com todas as obrigações de inquilina; (13) Agem pois os Ap.es abusivamente, pretendendo exigir da Ap.a montantes de renda que jamais receberam na mesma; (14) Por todo o exposto, e face ao art. 1048 CC, ou seja, ao depósito efectuado nos autos pela Ap.a, é de concluir pela cessação do direito de resolução do contrato, o qual os Ap.es pretendiam exercer por via desta acção de despejo: improcede; (15) Porém o comportamento dos Ap.es é susceptível de integrar o crime de especulação pp. art. 14 DL 321D/90, 15.10; (16) Em suma: os fundamentos da decisão não estão em oposição com a matéria dada como assente, e não se verifica pois a nulidade do art. 668/1 C PC; (17) Deve a sentença de 1ª instância ser inteiramente mantida. V. Recurso: pronto para julgamento. IV. Sequência: (a) Invocado pelos senhorios o contrato de ar rendamento antigo, fica a renda sujeita apenas às actualizações de lei, e o aumento só se tornaria operativo acaso a inquilina tivesse sido notificada formalmente. Ora, os recorrentes nem sequer alegaram as notificações para aumento de renda ao abrigo d a lei. Portanto, há-de concluir-se sem dúvida que a renda defendida pelos Ap.es para a procedência do pedido se funda num quantitativo ilegal: ainda tivesse ficado provado o montante crítico, não havia fundamento para o despejo, porque não correspondia ao valor da renda que deveria, e foi tido em consideração na sentença recorrida. 6
E há de facto motivo para participação ao Ministério Público por prática do crime pp. art. 14 DL 321B/90, 15.10, deixadas à jurisdição criminal as questões do dolo, complexas neste caso. (b) Apenas mais uma nota para rebater o argumento dos recibos como prova da alteração do montante da renda. Cada alteração corresponderia, antes, a um novo contrato, desde logo porque o livre aumento de renda era proibido e, como dissemos, não foi esta a arquitectura do pedido desenh ada pelos recorrentes. De qualquer modo, é de notar que a tradicional prova do consenso através do simples recibo da renda beneficiava apenas os inquilinos, sistema destinado justamente a evitar que os senhorios se prevalecessem d a nulidade do contrato por não ter sido reduzido a escrito. Havendo escrito, como é o caso dos autos, a problemática está naturalmente arredada: não seria o senhorio a poder invocar o contrato com fundamento no mero recibo... e, aliás, nem sequer o fez, insiste-se, exibindo a fórmula assinada. (c) Não revestem valimento, por conseguinte, as conclusões da apelação: a sentença de 1ª instância fica mantida tal e qual. V. Custas: pelos Ap.es, sucumb entes. 7