Ap.e:; Ap.o: Acordam do Tribunal da Relação de Évora

Transcrição

1 PN. 856/991; AP.: TC. Santarém. Ap.e:; Ap.o: Acordam do Tribunal da Relação de Évora 1. O Ap.o [A.] pediu o despejo da Ap.e [R.], por não ter satisfeito o pagamento de 57 rendas (Pte. 2050$00, mensais) entre Março, 1990, a Abril de 1998, de contrapartida pela habitação do prédio, sito que lhe deu de arrendamento, a partir de A Ap.e [R.] opôs: (a) Prescrição, vistos os arts. 310º a. e 323º/1.2 CC, das rendas de Março, 1990, a Maio, de 1993, tendo-se em conta a data da entrada da acção em juízo, ; (b) Caducidade do direito à resolução do direito à resolução do contrato de arrendamento, uma vez que o mesmo não foi exercido dentro de um ano a contar do conhecimento do facto-fundamento (daí que só as rendas desde Maio, 1997, possam ser pedidas); (c) O depósito, nos termos do art. 1041º CC, demonstrado nos autos, relativamente a estas últimas (que faz cessar, por sua vez, o mesmo direito); (d) Só serem devidas rendas no montante de Pte.: 2050$00 desde ; (e) Quantia que ainda assim considerou incomportável, já que não auferia então rendimentos que lhe permitissem, por si só, oferecer atempadamente o pagamento; 1 ML. (498/99) 1

2 (f) Tendo dado conhecimento desta circunstância à CM Santarém, entidade outorgante do contrato de arrendamento, e ao próprio A., a este por carta de Ap.o [A.] respondeu, alegando: (a) Em Fevereiro, 1995, através do of. 3363, notificou a R. para proceder ao pagamento das rendas em dívida (interrupção da prescrição); (b) Os depósitos efectuados não correspondem à soma da dívida acrescida da indemnização legal; (c) Na data do contrato de arrendamento, a renda técnica do locado era de Pte.: 14541$00; (d) Em , através do of. 319, o A. notificou a R. de que iria ser aplicada esta renda técnica; (e) Ao of. em questão, respondeu a R. com as razões de recusa que alegou na contestação; (f) E foi assim, que por aplicação da Port. 288/83, 17.03, foi fixada a renda social de Pte.: 2050$00, comunicada à R. por ofício 527, O saneador/sentença recorrido julgou procedente o pedido do Ap.o [A.]: (a) São reclamadas rendas vencidas no período compreendido entre Março, 1990, e Abril, 1998, mas a prescrição interrompeu-se em , data a partir da qual começou a correr novo prazo de 5 anos (art. 310ºa. CC); (b) Tratando-se de facto continuado e duradouro, o prazo da caducidade conta-se antes a partir da data em que tiver cessado; (c) O depósito das rendas c/ a indemnização (art. 1041º/1 CC) diz respeito apenas aos meses de Maio, 1997, a Setembro, 1998; (d) A R. não ressalvou, por isso, o pagamento das rendas vencidas de Março, 1990, a Maio, 1997, pelo que (art. 64º/1a. RAU) há fundamento para a resolução MM. (115/99) 2

3 do contrato, com o consequente despejo, e condenação nas rendas em dívida, das já vencidas e das vincendas, até entrega do local arrendado. 5. Conclui a Ap.e: (a) A simples comunicação à R., manifestando a intenção de exercer o direito, não é meio adequado para interromper o prazo de prescrição; (b) Por isso, e nos termos do art. 323º/1 CC, as rendas vencidas e não pagas, desde Março, 1990, a Maio, 1993, estão prescritas; (c) A falta de impugnação do documento junto na Resposta, onde apenas se contra-atacaram as excepções invocadas pela R., não consubstancia o reconhecimento, expresso ou tácito, da obrigação, tal como está previsto no art. 325º CC; (d) E não podem ser considerados admitidos factos não impugnados que estejam em contradição com o global da defesa (art. 490º/2 CPC); (e) As rendas vencidas há mais de um ano (data da propositura da acção), não fundamentam o direito de resolução do contrato de arrendamento, por ter operado a caducidade nos termos do art. 65º/1 RAU; (f) Para fazer cessar o direito à resolução do contrato de arrendamento (art. 1048º CC), é suficiente o depósito das rendas e da indemnização, relativas ao último ano, à data da propositura da acção e até à contestação; (g) Pelo que, tendo-o feito a R., cessou o direito do A. à resolução do contrato; (h) Entende-se que a decisão recorrida, ou as disposições legais constantes dos arts. 310ºb., 323º/1, 325º e 1048º CC, também dos arts. 490º/2 e 503º CPC, e ainda do art. 65º/1 RAU; (i) Deve ser revogada, para que a R. seja absolvida do pedido, julgadas procedentes as excepções de prescrição e caducidade. 6. Nas contra-alegações disse o Ap.e: 3

4 (a) A sentença recorrida fez correcta interpretação da lei; (b) Nos termos do disposto no art. 325º/1 CPC, a prescrição é interrompida pelo reconhecimento do direito, efectuado perante o respectivo titular, por aquele contra quem o direito pode ser exercido; (c) Assim, o reconhecimento da dívida pela recorrente, para efeitos de interrupção da prescrição, não carece ser expresso, bastando que seja tácito; (d) Por outro lado, dispõe o art. 65º/2 RAU: o prazo de um ano, quando se trate de facto continuado e duradouro, conta-se a partir da data em que o facto tiver cessado; (e) Mas a conduta da recorrente (falta de pagamento das rendas) manteve-se não intervalada por espaços temporais superiores a um ano; (f) Ora, e é a posição de Pais de Sousa, in Anotações ao RAU, a violação deve entender-se como continuada quando o processo de violação do contrato de arrendamento se mantiver em aberto, alimentado pela conduta persistente do locatário; (g) Afigura-se assim que só se verifica a caducidade do direito à resolução por parte do A. quando este o não faz valer no prazo de um ano contado desde a cessação da violação; (h) Por conseguinte, dado que existiu uma continuação da falta de pagamento das rendas, sem intervalos temporais superiores a um ano, é de concluir que não chegou a caducar o direito do A. a pedir a resolução do contrato de arrendamento com base nessa violação; (i) E é certo também que para fazes caducar o direito à resolução do contrato de arrendamento nos termos do art. 1048º CC, depósito liberatório deveria ter incluído todas as rendas e indemnizações que se venceram até ao momento da contestação; (j) Deve ser confirmado o despacho saneador recorrido. 7. O recurso está pronto para julgamento. 8. Deve dar-se por assente em face das posições das partes: 4

5 (a) O A. atribuiu, para habitação social, a partir de , à R. c/ o agregado familiar o prédio urbano sito no Bairro Suíço, Quinta do Mocho, Rua 1, 4, Santarém, exclusivamente para que nele se recolhessem, mantendo sede permanente da vida quotidiana, aí tomando refeições, dormindo, sendo procurados e deixando contactos; (b) Tendo aceite, a R. ficou a saber que retribuiria por isso, mensalmente, uma quantia em numerário fixada por lei, e que se não a satisfizesse, poderia ser sujeita a despejo; (c) A presente acção deu entrada em e a R. foi citada, através de carta registada com aviso de recepção, em ; (d) Em , pediu a concessão de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono; (e) A R. vive em economia comum com um sobrinho de 21 anos de idade ( ), estudante; (f) E apenas vencia, em 1998, uma pensão no montante mensal de Pte.: $ Apesar da regra de que o objecto do recurso é fixado pelas conclusões do recorrente, ainda assim não está vedado ao Tribunal da Relação encarar a resolução de problemas diferentes que se conexionem com matéria de que pode conhecer de ofício e que de algum modo as conclusões suscitem. No caso vertente pretende a Ap.e discutir certa matéria encadeada que através da alegação de prescrições (num caso), da caducidade (noutro), delimitaria um quantitativo de depósitos liberatórios, reputando darem-lhe o benefício de obstar ao despejo. Claro é que em última análise o raciocínio depende do apuramento certo do montante das rendas, que deveria ter satisfeito para com o Ap.o. Sob este ponto de vista as conclusões pressupõem a crise deste elemento central, que por isso mesmo reentra no objecto do recurso. E não se pode ter por assente, como se disse na sentença recorrida, que a R. [Ap.e] aceitou, pelo menos, o quantitativo da renda alegado pelo A. [Ap.o]. 5

6 Na verdade, no contexto normativo de que emerge a pretensão, a renda está subtraída à mera vontade das partes, o acerto decorrendo da lei, que minuciosamente estabelece o regime do cálculo2, e para colateralmente determinar subsídios de natureza social3 no quadro da concretização do direito à habitação previsto na CRP4, justamente como directiva ao legislador. Ora, não há ainda elementos probatórios no processo que habilitem a saber, no íter temporal do conflito, se a Ap.a deveria ter satisfeito estas ou aquelas rendas. É que tudo depende da variação do nível de rendimentos do agregado familiar5, circunstância de prova documental, que ainda poderia ser junta, acaso não se tivesse optado por prematura decisão final6. Por isso mesmo cabe acórdão no âmbito do disposto no art. 712º/1.a.4 CPC. 10. Atento o exposto, vista o art. de lei que acaba de ser citado, decidem anular oficiosamente a decisão proferida na 1ª instância, pela deficiência da matéria de facto anotada. 11. Sem custas, por não serem devidas. 2 Vd. art. 1º/ , Port. 288/83, Vd. art. 1º/5.17, Port. 288/83, Vd. art. 65º/1.2a.b.3 CRP, e art. 6º/1.2 DL 794/76, Vd. art. 1º/ (o valor mínimo da prestação pessoal de renda a cobrar será de Pte.: 400$00) , Port. 288/83, E nem se diga que a ausência de impulso processual administrativo, por parte da R., tenha outra sanção que as que vêm expressamente cominadas, mas com regimes nem sequer simétricos, na Port. 288/83, 17.03, para os casos de crescimento negativo ou positivo do rendimento global mensal do agregado familiar. Para a determinação inicial, os elementos terão de ser colhidos pela Administração e, na falta de elementos, os ajustes anuais têm por base a variação percentual dos rendimentos globais mensais tomada como idêntica à observada para o salário mínimo nacional. 6