Módulo 3 Crescimento com regulação - contínuos

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Transcrição:

MC Gomes Crescimeno em conínuos 1 Módulo 3 Crescimeno com regulação - conínuos A maemáica do crescimeno desconrolado é assusadora. Uma única célula da bacéria E. coli pode, em circunsâncias ideais, dividir-se de 2 em 2 minuos. A coisa pode parecer inofensiva enquano não se pensa nela a sério. O faco é que a bacéria muliplica-se geoméricamene: uma ranforma-se em duas, duas em quaro, quaro em oio e assim por diane. Desa forma, pode-se mosrar que num só dia uma célula de E. coli poderia originar uma super-colónia de massa e amanho idênico a odo o planea. M. Crichon. 1969. The Andromeda Srain. Dell, Y, Y, US. Alguém viu o filme "A Ameaça de Andrómeda"? Quanas células de E. coli haveria enão ao fim do dia? O número de indivíduos da grande maioria das populações esá sujeio a consideráveis fluuações. Exisem populações que fluuam frequenemene, ouras que permanecem esáveis por longos periodos de empo enre duas fluuações, populações que fluuam com padrões regulares e ouras que o fazem sem que se consiga deecar qualquer regularidade. As causas são muio variadas e na maior pare dos casos mal conhecidas. Por vezes é possivel idenificar um facor paricular como sendo a principal causa das fluuações, seja ese de naureza abióica (e.g. accção da emperaura sobre a axa de moralidade), bióica e exrínseca à população (e.g. fluuações em ouras populações que ineracuam com a primeira) ou bióica e inrínseca à própria população, como se verá nese capíulo. A aparene irregularidade das fluuações de muias populações pode sugerir a inexisência dese úlimo facor. Com efeio, a subida ou descida do efecivo populacional aparena por vezes ocorrer de forma aleaória ou, pelo menos, se exisem mecanismos regulaórios, eses parecem esar oalmene fora do conrole da própria população. Conudo, é pouco provável que assim seja. Se uma população fôr compleamene desiuída de mecanismos de regulação da sua própria densidade, nada impede que os seus "alos e baixos" se dirijam predominanemene numa única direcção, mais arde ou mais cedo levando a população à exinção ou ao esgoameno dos recursos do habia. A grande maioria das populações reais não faz iso, pelo menos se o seu habia não fôr severamene perurbado. Pelo conrário, não obsane evidenes fluuações de geração para geração, as populações endem a maner um nível de abundância caracerísico, de al forma que nos habiuamos a dizer que a espécie A é "muio abundane" e que a espécie B "é rara". É mesmo frequene, que após perurbações relaivamene rápidas que desloquem as populações do seu nível habiual de abundância, algum empo depois esas endam a reornar ao nível em que esavam anes da perurbação. 1

MC Gomes Crescimeno em conínuos 2 É provável porano que odas as populações possuam mecanismos próprios de regulação da sua densidade populacional. É possível que eses mecanismos acuem apenas fora de uma cera gama de valores da densidade populacional. Denro dessa gama as fluuações da população serão principalmene deerminadas por facores exrínsecos, porém, logo que o efecivo da população diminui perigosamene ou aumena para níveis incomporáveis, fazem-se senir os efeios correcores dos mecanismos de regulação. enhuma população pode porano crescer ou decrescer indefinidamene com axa consane, seguindo as leis do crescimeno exponencial. Se a população cresce (λ>1), mais arde ou mais cedo limiações de espaco e/ou de alimeno obrigam ao despolear de processos de auo-regulação. A eoria clássica da Dinâmica Populacional ensina que a densidade das populações naurais ende, aumenando ou diminuindo, para uma densidade equilibrada máxima () (nos exos ingleses, é em geral designada por "carrying capaciy") em que os recursos espaciais e energéicos do meio equilibram exacamene a população nessa densidade. Se, num dado insane, a densidade fôr menor que, a população cresce uilizando o excesso de recursos disponíveis; se fôr maior, a população diminui, porque os recursos do meio são insuficienes para a maner. Esa endência, inrínseca à população, de regular a sua própria densidade em função dos recursos do meio, chama-se auo-regulação. Os recursos do meio, em função dos quais se regula a densidade populacional, podem ser bióicos ou físicos. A variação de uns ou de ouros podem fazer deslocar a densidade. Assim, as populações de uma comunidade bióica endem a ajusar ou regular as suas densidades em função umas das ouras. Por exemplo, o aumeno da densidade de uma dada população pode causar a diminuição da densidade de oura população de uma espécie diferene com a qual compee na uilização de recursos limiados do meio, e, indirecamene, o aumeno da densidade de uma erceira de que a segunda é predador, e por aí adiane ao longo da eia rófica. Esas causas de variação da densidade são inrínsecas à comunidade bióica, já que dependem das densidades das populações que a consiuem. As populações endem ambém a regular as suas densidades em resposa a variações (aleaórias, sazonais, cíclicas ou seculares) do meio físico. Esas causas de variação, exrínsecas à comunidade, não dependem em geral das densidades populacionais. ese módulo esudam-se as possíveis consequências dos mecanismos de auo-regulação numa população de reproduores sazonais com gerações separadas. A perguna cenral que aqui se procura responder é uma das mais simples possíveis em Dinâmica Populacional: que ipo de comporameno pode exibir uma população num ambiene com recursos limiados? A íulo ilusraivo, pense-se por exemplo num microorganismo limiado pelo espaço de uma caixa de Peri e pela axa de renovação do seu meio de culura. Esa limiação de recursos exclui desde logo a possibilidade de crescimeno ilimiado e impõe a enrada em acção dos mecanismos de auo-regulação. Por muio simples que sejam eses mecanismos, a sua represenação nos modelos maemáicos de crescimeno da população ransforma eses modelos em equações não-lineares. Como se mosrará, o comporameno dinâmico deses modelos é surpreendenemene complexo, mesmo quando as equações não-lineares às diferenças são de aparência muio simples. 4. Reproduores Conínuos. 2

MC Gomes Crescimeno em conínuos 3 Em algumas espécies em que a reprodução é, em grande medida, independene da sucessão das esações do ano, como por exemplo a nossa própria espécie e, especialmene, a de espécies manidas em condições ambienais consanes dos bioérios e culuras laboraoriais, não exisem épocas de reprodução bem definidas, e os nascimenos e mores ocorrem durane odo o ano. Consequenemene as gerações não se sucedem separadas umas das ouras e não se formam classes de idade separadas nauralmene por desconinuidades no empo. Enquano as populações de reproduores sazonais são adequadamene represenadas por equações às diferenças, os modelos maemáicos apropriados para esudar a variação da grandeza das populações de reproduores conínuos são equações diferenciais. 4.1 Inrodução à represenação do crescimeno conínuo: O crescimeno exponencial. Os modelos clássicos do crescimeno conínuo podem derivar-se da equação de recorrência das populações de reproduores sazonais: +1 + B - D [4.1] as populações de reproduores conínuos os nascimenos e as mores ocorrem odo o ano. uma população suficienemene grande pode enão admiir-se que ocorrem coninuamene. Suponha-se que a densidade da população é avaliada enre dois insanes de empo muio pero um do ouro, e +. Sendo o inervalo enre eses dois insanes. A axa de crescimeno no inervalo é enão + ou seja, - ( B - D ) [4.2] + - B - D [4.3] Ocorrendo os nascimenos e mores conínuamene, a medição do crescimeno da população será ano mais precisa quano menor fôr o inervalo. o limie, ende para zero e a equação [4.3] pode ser aproximada pela seguine equação diferencial ordinária: d d B - D [4.4] que represena a axa insanânea de crescimeno da população quando a sua grandeza é, i.e. no insane. Subsiua-se agora os números de nascimenos e de mores por quanidades que sejam proporcionais à grandeza populacional, usando para isso as axas de nascimeno (b ) e de moralidade (d ) já enconradas na Secção 3.1. oe-se, conudo, que enquano nos reproduores sazonais com gerações separadas a axa de 3

MC Gomes Crescimeno em conínuos 4 moralidade era dada pelo número de mores (D ) a dividir pelo número de nascimenos (B ) (uma vez que B era o número de indivíduos no inicio de cada inervalo de empo discreo), nos reproduores conínuos faz senido ober a axa de moralidade dividindo D pelo número de indivíduos em cada insane ( ). Assim, b B / é a axa de naalidade por indivíduo e, d D / é a axa de moralidade por indivíduo A equação diferencial que represena o crescimeno conínuo é enão 1 d d ( b - d ) [4.5] A equação [4.5] é por vezes conhecida por Lei de Malhus, e a diferença (b - d ) represena-se em geral por r (érre minúsculo, para se disinguir do R dos reproduores sazonais - mas ver adiane, a propósio da equação [4.7], uma explicação mais complea do significado de r). A equação foi uilizada por Malhus, no seu raado "An essay on he Principle of Populaion" (1798), para esudar o crescimeno da população humana. Ese rabalho de Malhus foi o primeiro raameno eórico rigoroso de Dinâmica Populacional, endo na época causado sensação na comunidade cienífica. Com base em [4.5], Malhus defendeu que, na ausência de grandes desasres naurais, a população humana cresceria exponencialmene, enquano os seus recursos cresceriam apenas ariméicamene. A população esgoaria os recursos do planea, esando a nossa espécie condenada à more pela fome. EXERCÍCIO. Jusificar o raciocínio de Malhus, usando [4.5]. (Sugesão: qual é a solução analíica da equação?). Apresenar argumenos pró e conra o raciocínio de Malhus. Convém desde já fazer noar que r não pode permanecer consane por longos periodos de empo. Para verificar esa afirmação, procure-se a solução analíica de [4.5] (o velho livro de cálculo coninua-nos a perseguir). O primeiro passo para resolver [4.5] consise em separar variáveis: d r d e o segundo passo em inegrar ambos os lados da equação [4.6] 1 Esa equação pode deduzir-se ambem da seguine forma: o insane, quando a população é, a probabilidade de qualquer indivíduo dar origem a 1 nascimeno no inervalo infiniésimal d é b d, e a probabilidade de que qualquer indivíduo morra no mesmo inervalo d é d d; o incremeno infiniésimal d por indivíduo da população (no insane ), d /, é porano igual à diferença dessas duas probabilidades: d / (b - d ) d 4

MC Gomes Crescimeno em conínuos 5 d r donde, ln - ln d r iso é, e r sendo a grandeza da população na origem da conagem do empo e a sua grandeza decorrido o empo. Se r > (i.e. b > d ) a população cresce exponencialmene para grandezas incomporáveis com os recursos do meio; se r < (i.e. b < d ) a população diminui exponencialmene e exingue-se. EXERCÍCIO. O que sucede no caso improvável em que b d? Traçar o gráfico de [4.6] num sisema de eixos coordenados em que as abcissas são o empo () e as ordenadas o logarimo da densidade populacional. 4.2 A equação logísica de Verhuls-Pearl Quarena anos após o ensaio de Malhus, Verhuls (1838) apresenou pela primeira vez a equação logísica no seu rabalho "oice sur la loi que la populaion suie dans son accroissemen", a segunda grande conribuição para o desenvolvimeno da Dinâmica Populacional. Para que a população não cresça exageradamene nem se exinga, a axa de naalidade e/ou a axa de moralidade devem poder variar em função da própria densidade populacional. Se a densidade subir acima de níveis susenáveis pelo meio ambiene, deve ocorrer uma reroacção negaiva que incida sobre a axa de naalidade, diminuindo-a, e/ou sobre a axa de moralidade, aumenando-a. Em ermos biológicos, iso resula de que quano maior fôr a densidade populacional, maior é a inerferência dos indivíduos uns com os ouros: por exemplo reduzindo o espaço disponível, comeendo acos de canibalismo, ou esgoando nurienes limiados. Inversamene, quando a população esá em níveis abaixo da capacidade de susenação do meio, a axa de naalidade deve aumenar e/ou a axa de moralidade deve diminuir. A forma analíica mais simples de exprimir esas ideias é admiir que b e d são funções lineares, respecivamene decrescene e crescene de : b b - p [4.7] d d + q 5

MC Gomes Crescimeno em conínuos 6 em que b e d são as axas de naalidade e de moralidade que se observam quando a densidade populacional fôr ão baixa que os indivíduos não inerfiram nocivamene uns com os ouros (eóricamene quando ). Os parâmeros b e d são porano, respecivamene, a axa de naalidade máxima e a axa de moralidade mínima, específicas da espécie para cada conjuno de circunsâncias ambienais. A sua diferença (b - d ) simboliza-se por r, a axa inrínseca de crescimeno populacional ou parâmero malhusiano. É evidene que na naureza r deve ser sempre posiivo, ou a população exingue-se. Os simbolos p e q represenam os declives das recas [4.7] e medem a rapidez com que naalidade e moralidade, respecivamene, diminuem e aumenam à medida que a densidade populacional cresce. Subsiuindo [4.7] em [4.5], obem-se a equação diferencial d d ( b - d ) - (p + q) 2 [4.8] EXERCÍCIO. Demonsrar [4.8]. A equação [4.8] é designada por equação logísica de Verhuls-Pearl. o enano, a sua forma clássica, aquela que mais frequenemene se vê nos livros de ecologia, não é aquela, mas sim uma oura em que a axa insanânea de crescimeno (d / d) é expressa em função da capacidade de susenação do meio,. Para al, escreva-se [4.8] subsiuindo (b - d ) por r e colocando em evidência d d [ r - (p + q) ] [4.9] o que mosra que a derivada de em ordem ao empo (i.e. a variação insanânea da densidade) se anula quando e quando r / (p + q). Ese segundo pono corresponde a uma siuação em que a axa insanânea de crescimeno da população é nula e, porano, a população permanece inalerada à medida que o empo passa: é, por definição, um pono de equilíbrio, nese caso um equilíbrio não-rivial. Represene-se ese pono de equilíbrio por, ( r / (p + q)). Subsiuindo agora (p + q) por r/ em [4.9], obem-se d d r - r 2 [4.1] ou d d r - [4.11] EXERCÍCIO. Demonsrar as duas formas da logísica [4.1] e [4.11]. 6

MC Gomes Crescimeno em conínuos 7 Escria na forma [4.11], a equação logísica em os seus dois principais componenes em evidência: O componene (r ) que represena o crescimeno da população quando os recursos do meio são muio abundanes em relação à densidade populacional (ver eq. [4.5]), iso é, quando é muio pequeno em relação a, e o componene ( - ) / que represena o efeio regulador de reroacção negaiva. À medida que cresce para, o componene regulador oma valores sucessivamene mais pequenos, aé que se anula (quando ). essa alura a população pára de crescer (d /d ). Quando é maior do que, o ermo regulador é negaivo e porano o crescimeno é ambem negaivo (d /d < ), a população decresce aé aingir. EXERCÍCIO. Geoméricamene, a forma diferencial da equação logísica (eq. [4.11]) é uma parábola (Fig. 4.1A). Demonsrar que, segundo o modelo logísico, o crescimeno mais rápido ocorre quando /2. FALTA FIG A. SLIDE 17; B. SLIDE 19 Figura 4.1. A. Relação enre a axa de crescimeno insanâneo d /d e a densidade populacional segundo o modelo logísico dos reproduores conínuos (eq. [4.11]). B. Crescimeno logísico para diferenes valores de r, usando a forma inegral do modelo logísico (eq. [4.13]). O valor de é 1. oe-se a forma do crescimeno quando se enconra abaixo e acima de. Exisem muias ouras formas de deduzir a equação logisica dos reproduores conínuos. A íulo exemplificaivo, ver Roughgarden (1979) (Cap. 16). As expressões [4.1] e [4.11] represenam a equação logísica na sua forma diferencial. Para calcular as dimensões da população,, em qualquer insane, é necessário enconrar a solução da forma diferencial. A solução de [4.11] enconra-se inegrando a equação (ver AEXO abaixo). O resulado é: [4.13] - r + ( - ) e Aribuindo valores aos parâmeros e r, podem-se deerminar os sucessivos valores de, à medida que aumena, por meio da equação [4.13]. A Figura 4.1B apresena o resulado dese ipo de exercícios, quer quando a população se inicia com valores acima do equilíbrio ( > ) quer quando se inicia abaixo do equilíbrio ( < ). ese úlimo caso, a curva de crescimeno em forma sigmóide: de início exponencial, mas depois inflecindo para uma assínoa em. 7

MC Gomes Crescimeno em conínuos 8 oe-se duas coisas imporanes nese modelo de crescimeno conínuo. Em primeiro lugar, é um pono de equilíbrio esável, mais, é um pono globalmene esável. Em segundo lugar, a população ende a aproximar-se de monoónicamene, sem oscilações, qualquer que seja a grandeza inicial da população e qualquer que seja r (noe-se na Fig. 4.1 que r apenas influencia a rapidez com que a população ende para ). é uma assínoa de. Cabe enão pergunar porque é que o crescimeno das populações de reproduores conínuos é diferene do das populações que se reproduzem sazonalmene, em que a população pode descrever oscilações ao aproximar-se do seu pono de equilíbrio esável, er equilíbrios cíclicos, ou aé comporameno caóico. É possível dar uma resposa inuiiva a esa perguna. os reproduores sazonais, a variação da grandeza populacional decorre enre o início e o fim de um inervalo de empo finio, mais ou menos longo, definido pelas épocas de reprodução. Essa variação pode ser muio grande, podendo a população ulrapassar largamene o seu valor de equilíbrio esável anes que enha oporunidade de se auo-regular. os reproduores conínuos, o inervalo de variação da população é um inervalo infiniésimal, dada a naureza conínua da reprodução. A variação da grandeza populacional ambem é infiniésimal, a população auoregula-se insanâneamene, e, por isso, nunca é aingido no modelo conínuo, muio menos ulrapassado como no modelo discreo. Por ouras palavras, podem-se formar oscilações no modelo discreo porque nese a regulação se efecua com araso: a resposa a desvios do pono de equilíbrio é feia após um inervalo de empo finio. o modelo conínuo nunca se formam oscilações porque nese a resposa a desvios do equilíbrio é insanânea. Evidenemene, em populações reais de reproduores conínuos verificam-se oscilações da densidade populacional. Embora a razão para esas oscilações possa ser procurada em variações das condições ambienais (que deerminam variações em e/ou em r) é possível conceber modelos de reproduores conínuos mais aperfeiçoados que a equação logísica [4.11] e que permiem explicar esse comporameno. O número de criicas que se podem fazer à equação logísica é grande. Aperfeiçoamenos da equação, por forma a orná-la biológicamene mais aceiavel, êm sido sugeridos por vários auores, mas conduzem quase sempre a maior complicação maemáica. as duas Secções abaixo revejo duas desas enaivas de correção de defeios imporanes da equação logísica. 4.3 Um modelo conínuo que leva em cona a densidade críica de rarefação (O efeio de Allee). A equação logísica, quer no caso dos reproduores conínuos (eq. [4.11]), quer no caso dos reproduores sazonais, pressupõe que a população cresce sempre, ainda que enha densidade muio baixa. De faco, essas são as circunsâncias em que o modelo pressupõe mesmo um crescimeno mais rápido, do ipo exponencial (ou do ipo geomérico, no caso dos reproduores sazonais). 8

MC Gomes Crescimeno em conínuos 9 EXERCÍCIO. Cobrir os parágrafos que se seguem com um papel. Reflecir sobre ese pressuposo criicá-lo. e Se bem que à priori iso pareça aceiável, uma vez que abundam os recursos para os poucos indivíduos presenes, uma reflexão mais cuidadosa sobre o assuno leva-nos a quesionar a legiimidade dese pressuposo. Pelo menos para ceras populações, é admissível que haja uma densidade mínima abaixo da qual a probabilidade de enconros efecivos enre indivíduos (ou células reproduoras) dos dois sexos seja ão baixa que a população não consegue repôr a sua densidade no mesmo valor. Pense-se, por exemplo, em populações aquáicas, com reprodução exerna, cuja densidade populacional seja muio baixa. Dispersos numa área demasiado grande, indivíduos (ou células) masculinos e femininos, enconram-se demasiado raramene para que sejam deixados para a geração seguine um número médio mínimo de dois descendenes por casal. Acima dessa densidade, a probabilidade de enconros efecivos é suficiene para fazer a população crescer. A densidade mínima que corresponde a uma axa de incremeno (r) que permie a população manerse exacamene com a mesma densidade (i.e. r ), designa-se por densidade mínima críica (simboliza-se por E), ou densidade críica de rarefação 2. É, evidenemene, muio inferior a. Enre E e, exise uma gama de densidades inermédias em que r >. a densidade mínima críica, a população é incapaz de crescer (r, ou R 1 no caso dos sazonais), mas ambém não em necessáriamene que se exinguir: permanece em equilíbrio aé que agenes perurbadores a desloquem de E. Se a população crescer ligeiramene acima de E, a probabilidade de enconros efecivos enre indivíduos dos dois sexos aumena e, imediaamene, r >. A população começa enão a crescer aé. Se a população descer a uma densidade ligeiramene inferior a E, a probabilidade de enconros diminui o suficiene para que r <, e a população ende irreversivelmene para a exinção. As consequências da exisência de uma densidade mínima críica para o crescimeno da população designa-se por efeio de Allee (foi descrio pela primeira vez por Allee em 1931). EXERCÍCIO Que ipo de equilíbrio é E? Wilson and Bosser (1971) noaram que a inexisência de uma densidade críica de rarefação, E, no modelo logísico clássico, é um defeio que pode ser corrigido se, na equação [4.11], se inroduzir um ermo que faça com que a variação da densidade populacional seja negaiva logo que seja inferior a E: 2 o caso dos reproduores sazonais, raa-se da densidade mínima correspondene a uma axa de incremeno (R) exacamene igual a 1, quando a população repõe exacamene a sua densidade na geração seguine. 9

MC Gomes Crescimeno em conínuos 1 d d r - - E [4.14] iso é, d d r - ( - E ) [4.15] A forma inegral de [4.15] (equivalene a [4.13]) é: ( - E ) ( - E ) E + - r [4.16] ( - E )+( - ) e e permie calcular a densidade populacional no insane. EXERCÍCIO. Que formas geoméricas, correspondenes às da Fig. 4.1, erão as equações [4.15] e [4.16]? AEXO AO MÓDULO 4 DEDUÇÃO DA SOLUÇÃO DA EQ. LOGISTICA Para enconrar a solução inegral da equação [4.11] começa-se por separar variáveis, inegrando-se em seguida ambos os lados da equação: d d r (1- ) d (1- ) r d 1 1 1 ( + ) d 1- r d Primiivando, ln - ln (1- ) r +C 1

MC Gomes Crescimeno em conínuos 11 Quando, e porano a consane de inegração C oma os valores presenes no lado esquerdo da equação, subsiuindo por : ln (1- donde, ln - ln (1- ) ) r + ln - C ln - ln (1- ) muliplicando udo por -1 e usando a regra da diferença enre logarimos, 1-1 - ln - r + ln irando logarimos (levanando ambos os lados da equação à base dos logarimos neperianos) é possivel chegar à expressão (1- (1- ) ) e - r muliplicando ambos os lados por : - ( - ) ( - ) e r A parir desa expressão pode-se expliciar em função de e pode-se expliciar em função de : - r [4.27] +( - ) e 1 r ( - ) ln [4.28] ( - ) Lieraura Ciada Roughgarden J. 1979. Theory of Populaion Geneics and Evoluionary Ecology: An Inroducion. MacMillan Pub., Y. Wilson EO, and WH Bosser. 1971. A Primer of Populaion Biology. Sinauer 11