Capítulo 6: Por que isso continua acontecendo comigo? Conceitualizações explanatórias transversais
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- Samuel Zagalo Gorjão
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1 Capítulo 6: Por que isso continua acontecendo comigo? Conceitualizações explanatórias transversais Andréa Bogatti Guimarães Tomazela Elaine C. S. Gazignato Eloísa Gil Rossa Kennedy Q. Martins Lígia Cardoso Silveira Rosa Solange Aparecida La Salvia Caropreso
2 Por que isso continua acontecendo? Nível descritivo de conceitualização para um nível explanatório. Explanatório: os fatores desencadeantes e os fatores mantenedores. Transversais: examinar várias situações similares. Intervenções: redução do sofrimento ou expandir os pontos fortes (resiliência).
3 Conceitualização de caso transversal: Um processo de quatro passos. Passo 1: Reunir exemplos Passo 2: Mapear os modelos apropriados, identificar fatores desencadeantes e de manutenção. Passo 3: Escolher e implementar intervenções. Passo 4: Avaliar e revisar o modelo; considerar a sua aplicabilidade a outras dificuldades atuais.
4 Passo 1: Reunir exemplos Caso S.(49 anos) Transtorno Depressivo Maior com Sintomas Ansiosos Grave. Evento 1 Evento 2 Evento 3 Situação Pensando em buscar um emprego Pensamentos automáticos Os outros vão pensar que sou um coitadinho ou que dei 171 no INSS. Emoções Vergonha Comportamentos Não busca Situação Fumando Pensamentos automáticos Eu estava trabalhando e ganhando bem. Emoções Tristeza Comportamentos Vai para o quarto Situação Um parente diz: Quem se aposenta tem que arrumar uma atividade e o paciente ouve a conversa. Pensamentos automáticos Eu não estou fazendo nenhuma atividade. Emoções Angústia e vergonha Comportamentos Continua conversando com outra pessoa.
5 Passo 2 Adequar os exemplos de humor a um modelo apropriado dos fatores desencadeantes e de manutenção. terapeuta considera se as experiências do paciente combinam com modelos e teorias relevantes da TCC. No domingo, dia das mães, quis ir ao mercado com minha esposa. Foi horrível. Fiquei com dor, irritado e muito deprimido.
6 Antecedentes Comportamento Consequência No mercado não pude pegar o que queria da lista que fiz Fiquei parado por um tempo, como um burro empacado Eu me senti com raiva Fui o culpado pelo acidente. Cometi um erro Digo que sou um peso para todos. Choro e fico o tempo todo na cama Triste Sem paciência Brigo com minha esposa. Cometi 50% do acidente. Penso que é possível errar um pouco. Me sinto aliviado por não ser o culpado 100%. Fui no mercado novamente, não empurrei o carrinho, mas fiquei na fila por 2 coisas é horrível. Não sou tão inútil porque eu posso andar e fico na fila de idosos. Me sinto mais alegre. Afinal peguei o que eu quis. Não precisei de ajuda.
7 Terapeuta: colocamos aqui alguns exemplos de quando o seu humor piora. O que você acha? Paciente- acho que tenho altos e baixos. Terapeuta- mas o que você acha disso? Paciente- isso é bom, pois vejo agora que não estou triste o tempo todo. Terapeuta- então, se não é triste o tempo todo, o que você acha que desencadeia o seu humor deprimido? Paciente- vendo isso, fica claro que fico mal apenas quando penso que não posso ser independente como antes. Terapeuta- isso mesmo. Pensar em seu acidente é um desencadeante importante que faz com que seu humor decaia. Como você se sente olhando para isso agora? Paciente- ainda penso que se não tivesse fosse o culpado pelo acidente, não estaria assim. Terapeuta- pode parecer que sim quando você pensa que é o culpado, mas vamos ver o significado da palavra acidente?... Paciente- bem, pensando desta forma, eu não desejei o acidente. Portanto parece claro que não devo pensar que fui o culpado. Terapeuta- muito bem. O que você acha de anotarmos isto como uma resposta à pergunta sobre o que desencadeia o seu humor deprimido. O que você poderia escrever para resumir isso? Paciente- quando penso que errei e sou culpado, me deprimo, sou um peso, mas se pensar que não desejei o ocorrido posso me sentir melhor. Afinal vou deixá-los fazer um pouco por mim.
8 Passo 2: Identificar os fatores desencadeantes e de manutenção Considerar se as experiências do cliente combinam com modelos e teorias da TCC. Identificar padrões, desencadeantes comuns e fatores de manutenção.
9 Antecedentes Comportamento Consequências Na cidade com Clare e as crianças, esperando para pagar. De repente pensei na reunião de 2ªfeira e em como eu não estava preparado para ela. Cometi um erro no trabalho, no relatório financeiro mensal. Em casa, pensando no meu relatório atrasado. Tentei trabalhar no relatório à noite. Pensei em todo o trabalho que eu não tinha feito e no quanto eu sou um inútil. Fui para casa e para a cama. Parei de trabalhar, procurei por outros erros, não terminei o relatório em tempo. Perdido em meus pensamentos, ignorei Clare. Não terminei por falta de concentração Eu me senti muito mal. Me senti triste e choroso. Triste. Fui para casa mais cedo. Discuti com Clare. Me senti mal e deprimido. Mais uma vez cancelei uma saída com John. Exemplos de situações angustiantes para Mark (modelo ABC)
10 Desencadeantes Os humores podem ser desencadeados internamente (como uma reação a determinados pensamentos, reações físicas ou comportamentos) ou externamente por tipos particulares de eventos ou situações. Identificar desencadeantes comuns nas situações.
11 T: Você observa algum padrão? O que você acha que desencadeia o seu humor deprimido? P: Quando penso no erros no trabalho, isso desencadeia o meu humor deprimido.
12 A terapeuta observa que o humor deprimido é comumente desencadeado pela percepção de erros cometidos. Iniciando a avaliação, a terapeuta tem em mente que Mark é muito cuidadoso. Embora isto seja um ponto forte, este ponto forte pode ser superdesenvolvido em Mark e levá-lo a uma maior vulnerabilidade para se sentir deprimido quanto comete erros. Neste caso, sua terapeuta espera que ele tenha um ou mais pressupostos subjacentes sobre cometer erros. Ela decide que este é um bom momento para ajudá-lo a identificar seu(s) pressuposto(s) subjacente(s) sobre cometer erros.
13 T: Se eu cometer erros, então... P:... Perder tudo. T: O que significaria para você caso perdesse essas coisas? O que isso diria de você como pessoa? P: Eu seria um inútil, uma perda de tempo. T: Se eu cometer um erro, então isso significa que eu sou um inútil, uma perda de tempo, e isto está conectado a sentir-se deprimido.
14 Pressupostos subjacentes. Crenças Centrais: Eu sou um inútil. Eu sou uma perda de tempo. Após identificar o erros como desencadeantes, a terapeuta poderá aproveitar para introduzi-lo na teoria e na pesquisa sobre a depressão que sugere que os temas de realizações e de falhas no trabalho são desencadeantes comuns do humor deprimido de muitas pessoas.
15 A experiência individual do paciente é destacada por meio da identificação dos significados pessoais que os erros têm para ele. Questionar sobre experiências mais positivas revelam outras dimensões dos significados específicos dos desencadeantes. As experiências positivas são importantes para se conceitualizar a resiliência.
16 Antecedentes Comportamento Consequência Pensamentos sobre erros no trabalho. Lidar com as minhas tarefas mais como eu imagino que Peter faz: levar os créditos pelas coisas boas que acontecem e admitir os erros sem ficar tão tomado por eles e adiar o meu trabalho por medo de cometer outro erro. Experiência de controle da situação. Sentir-se bem. Não me sentir atrapalhado. O mesmo evento pode conduzir a reações diferentes, dependendo de como o eveto é avaliado e interpretado.
17 Fatores de manutenção Fatores de reforço: tudo o que aumenta uma resposta particular. Pode ser reforço positivo ou negativo. Por vezes o método que a pessoa escolhe para lidar com o problema pode acabar por mantê-lo. Isto acontece porque as pessoas geralmente preferem abordagens que são imediatamente reforçadoras; aquelas que levam a recompensas imediatas ou a reduções imediatas do sofrimento.
18 P:...no momento, o melhor a fazer era ficar afastado da situação. Eu só queria estar em casa e não pensar nisso. Aquilo me ajudou um pouco na hora. T: então, na hora, isso o ajuda a evitar os seus problemas. Pensando nisso agora, o quanto você acha que isso lhe ajudou a longo prazo? P: no final das contas foi pior, porque a pressão só aumentou. * Identificar se este é um padrão comum.
19 Pressuposto subjacente Se eu cometer um erro, isso significa que eu sou um inútil Penso nos erros no trabalho Triste Evito o trabalho O trabalho se acumula
20 Os terapeutas podem ajudar os clientes a construírem análises funcionais das experiências resilientes de lidar com as situações em paralelo com as análises dos desencadeantes e dos ciclos de manutenção. Fazer isso coloca em foco para o cliente os seus padrões adaptativos e sugere a possibilidade de resultados alternativos.
21 Passo 3: Escolher intervenções com base na conceitualização explanatória Insight Compreensão das dificuldades para escolha das intervenções apropriadas
22 Análise funcional das contingências: teoria da análise do comportamento FATORES DESENCADEANTES FATORES DE MANUTENÇÃO QUAIS SÃO OS REFORÇADORES? Aumenta a probabilidade de um determinado comportamento voltar a ocorrer. R+ R- ESQUIVA FUGA
23 Passo 4: Analisar e revisar a conceitualização do humor deprimido J.A.A.J (38 a) Queixa principal Desejo de superar os sintomas de humor deprimido após rompimento de relacionamento amoroso
24 Minha relação amorosa SITUAÇÕES Minha escolha profissional Relação familiar Eu estou sendo preconceituoso em não aceitar seus valores A Má me valoriza como professor e sozinho temo não ter essa força profissional Indecisão Vivi intensamente a relação mesmo contrariado em muitos valores pessoais PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS Na filosofia eu nunca fui o cara que se destacava SENTIMENTOS Frustração COMPORTAMENTO Aumento o nível de exigência comigo mesmo quanto a leitura, estudo, capacidade intelectual Meu pai é classista e em casa dizem que eu não gosto de quem me questiona Raiva Não me relaciono muito bem com alguns de meus irmãos e discuto com meus pais
25 Pressupostos subjacentes Se eu não aceito o diferente, mesmo contrariado em meus valores, sou preconceituoso. Mulheres não classistas me notam, me valorizam como profissional Eu sou um simples professor de filosofia, pobre, desvalorizado e inutil para os alunos Eu me daria melhor com minha família, mas são classistas e me questionam
26 Se eu não aceito o diferente, mesmo contrariado em meus valores, sou preconceituoso. Mulheres não classistas me notam, me valorizam como profissional J. SÓ PAQUERA MULHERES EM BARES DE PERIFERIA COM VALORES OPOSTOS AO SEU J. ESQUIVA-SE DE PONTOS DE ENCONTROS FREQUENTADOS POR PESSOAS MAIS INTELECTUALIZADAS
27 Análise custo benefício Construção de alternativas* Técnica da semântica Treino de habilidades sociais*
28 Resiliência Sou filósofo e posso usar meu conhecimento técnico para minha vida pessoal Eu consegui passar em concurso público então fui capaz Posso treinar auto confiança em minha atuação profissional não atribuindo essa função a minha companheira.
29 CONCEITUALIZAÇÃO EXPLANATORIA DAS PREOCUPAÇOES OBSESSIVAS Quatro Passos
30 Quando as dificuldades apresentadas pelo paciente priorizam grupos de preocupações obsessivas podemos explorar a possibilidade de Transtorno Obsessivo Compulsivo. O TOC caracteriza - se por pensamentos, frases, palavras, cenas ou impulsos que invadem a consciência, involuntários ou impróprios, persistentes ou recorrentes as obsessões, geralmente acompanhados de aflição ou medo e de tentativas de ignorar, suprimir ou neutralizá-los pela realização de atos repetitivos e estereotipados as compulsões ou os rituais. Pelo tempo que tomam, pelo desconforto que provocam ou pelo que levam o paciente a executar ou a evitar, comprometem as rotinas diárias, o desempenho do profissional e as relações interpessoais (DSM-IV, 1994).
31 TOC - TRANSTORNO OBSESSIVO COMPULSIVO
32 1º Passo Reunir exemplos de preocupações obsessivas. Esfregar o corpo na hora do banho repetidas vezes; Passar o fio dental diversas vezes nos dentes; Urinar forçosamente (sem vontade) antes de dormir.
33 Na cabeça da terapeuta Será que essas preocupações são pensamentos intrusivos??? Esses pensamentos parecem típicos de TOC....
34 Modelo Pensamento Intrusivo Minha pele ainda esta suja! Pensamento automático Não sei fazer nada direito mesmo e fico perdendo tempo de sono.
35 Modelo Pensamento Intrusivo - Seu corpo ainda esta sujo Imagem - Corpo sujo direito Emoção - Ansiedade Pensamento - Não sei fazer nada Comportamento - Esfrega o corpo novamente. OBS: Cria um ritual que se mantem reforçado pela própria ansiedade.
36 2º Passo Identificar os fatores desencadeantes e de manutenção das preocupações obsessivas. Chegada a hora de se preparar para dormir repete o ritual: - banho, escovar os dentes, urinar. Sua mãe fica repetindo a hora e mandando ela se apressar para dormir. Paciente fica irritada e a ansiedade se instala.
37 O caldeirão vai se completando Preocupações obsessivas, ansiedade, imagens, pressão materna, necessidade de dormir, sentimento de incapacidade e muita responsabilidade.
38 Na cabeça da terapeuta A ansiedade causada pela pressão da mãe, pelo horário que se esgota, pela crença de que não consegue fazer as coisas direito e pelos pensamentos intrusivos me remetem ao modelo de TOC que é baseado em evidencias. Quanto mais ela demora pra ir se deitar mais aumenta sua ansiedade que se mantem como num ritual mental e comportamental.
39 O modelo cognitivo propõe que interpretações distorcidas são as responsáveis pelo fato de determinados pensamentos intrusivos assumirem um significado especial para o indivíduo, ativando pensamentos automáticos de natureza negativa ou catastrófica e emoções desagradáveis: medo, desconforto, ansiedade e depressão. Em consequência dessas interpretações distorcidas, tais pensamentos assumem um significado especial, o que faz com que aumentem de frequência, compelindo o indivíduo a adotar estratégias para neutralizá-los: aumentar a vigilância, realizar atos voluntários (rituais, evitações, reasseguramentos) para afastá-los ou para evitar os desfechos catastróficos imaginados. O sucesso momentâneo de tais estratégias acaba perpetuando o transtorno (Salkovskis, 1985, 1989, 1999; Salkovskis, Forrester, Richards, 1998; Rachman, 1987).
40 POR QUE ISSO CONTINUA ACONTECENDO COMIGO? Para responder a esta pergunta, precisamos mudar de um nível descritivo de conceitualização de caso para um nível explanatório. (CONCEITUALIZAÇÕES EXPLANATÓRIAS TRANSVERSAIS) Explanar o real significado de explanar é explicar, tornar claro, inteligível.
41 POR QUE CONCEITUALIZAÇÕES TRANSVERSAIS? Porque terapeuta e paciente, juntos, irão examinar inúmeras situações em que as dificuldades presentes são ativadas para identificarem os desencadeantes comuns e os fatores de manutenção.
42 QUATRO ESTÁGIOS 1) Reunir exemplos. 2) Identificar os fatores desencadeantes e de manutenção à luz de modelos existentes baseados em evidências. 3) Escolher e implementar intervenções 4) Avaliar e revisar o modelo.
43 Estes quatro passos são repetidos para outras dificuldades presentes. Terapeuta e paciente consideram se as dificuldades presentes estão ligadas entre si por fatores desencadeantes e de manutenção em comum.
44 Pressuposto subjacente Se eu cometer um erro, Isso significa que sou um inútil Pensamentos automáticos Ruminação Eu sou um fracasso Triste Evito o trabalho, as crianças e Clare Eu sempre cometo erros Eu sou um inútil. Eu sou uma perda de tempo. Eu não faço nada
45 Pensamento Intrusivo: O fogão pode estar ligado. Verificação: Volto e verifico o fogão. Ansioso Imagem: Explosão; depois a casa incendeia. Pensamento: Foi minha culpa. Esquiva: Peço à Clare para verificar. Evito ser o último a sair de casa. Pensamento: Se a casa explodir e incendiar, a culpa não vai ser minha.
46 DIFICULDADES VINCULADAS Sempre que possível, as conceitualizações devem destacar os pontos em comum entre as dificuldades atuais. Cada uma delas tinha desencadeantes que estavam centrados em temas relativos a erros ou a risco de resultados negativos. Esses desencadeantes traziam à tona temas de fracasso e de responsabilidade que aumentavam o seu humor deprimido e a ansiedade. O paciente tentou lidar com o seu humor angustiado, tanto a depressão quanto a ansiedade, por meio da esquiva, da verificação e da ruminação.
47 CONCEITUALIZAÇÃO UNIFICADA DO HUMOR DEPRIMIDO, DO TOC E DAS PREOCUPAÇÕES Desencadeantes Pensamentos perturbadores Pensar nos erros e nas responsabilidades ou notar sangue Crenças Centrais Eu sou um fracasso. Eu sou responsável. Pressupostos subjacentes Seu eu quiser ser visto como competente, preciso fazer tudo bem. Eu estou vigilante, portanto consigo evitar que aconteçam coisas ruins. Ciclos de manutenção Verificar Humor Evitar e ruminar Deprimido e ansioso
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