Gravitação Newtoniana e o Sistema Planetário
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1 Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada Equações Diferenciais Ordinárias Gravitação Newtoniana e o Sistema Planetário Aluno: Felipe de Mattos Chafik Hindi Orientação: Guilherme T. Goedert Rio de Janeiro Abril
2 Sumário 1 Fundamentos Teóricos 2 2 Objetivos 4 3 Metodologia 4 4 Resultados e Discussão Propagação de Erros Oscilação Tridimensional Sistema Sol-Terra-Lua Conclusão 7 6 Anexo 1 - Figuras 9 7 Anexo 2 - Código em Octave Código Principal Definição da Função
3 1 Fundamentos Teóricos Antes de Newton, a gravitação era compreendida empiricamente. Cartas astronômicas permitiam fazer previsões sobre as órbitas dos astros e efeitos gravitacionais terrestres já eram bem entendidos pelo menos desde Galileu. No entanto, ainda não existia uma teoria universal da gravitação, que relacionasse esses fenômenos e os abstraísse matematicamente. O processo científico ainda se resumia a avaliações heurísticas e empíricas da realidade. Foi somente com a publicacção de um dos mais importantes livros de toda a ciência, e por extensão da humanidade, que esse paradigma epistemológico começou a mudar. O Principia Mathematica (1687) apresentou a primeira formulação de uma teoria universal da gravidade, que alicerçou os fundamentos da física moderna, e cuja influência incalculável se extende desde Kant [1] ao programa Apolo. O sucesso da gravitação newtoniana se refletiu num gigantesco aumento da capacidade preditiva da astronomia ao longo dos séculos que se seguiram, cujos feitos notáveis incluem desde a previsão das trajetórias de cometas com órbitas decadárias até a aplicação a programas espaciais modernos e contemporâneos. Foi apenas no século XIX que Einstein demonstrou que a teoria da gravitação newtoniana era apenas uma aproximação particular de uma teoria gravitacional ainda mais universal: a Relatividade. A dificuldade tanto analítica como computacional das Equações de Einstein e o sucesso da gravitação newtoniana para escalas relativamente pequenas de velocidade e massa garantem que esta permaneça relevante até o presente. De acordo com a gravitação de Newton, a passagem do tempo e as distâncias relativas entre astros são independentes do referencial, as interações gravitacionais satisfazem o prinçípio da superposicção linear e ocorrem instantaneamente. Com essas considerações, a interação gravitacional entre dois corpos pontuais é sempre atrativa, diretamente proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado de suas distâncias. Dependendo do sistema de unidades que se use, é necessário também multiplicar a força resultante por uma constante gravitacional para obter seu valor real nesse sistema. Assim, sejam dois corpos pontuais A e B com massas respectivas m A e m B, e G a constante gravitacional para o sistema de unidades considerado, então a força no corpo A devida ao corpo B é: F AB = G m Am B AB 2 ( ) AB AB (1) 2
4 Sendo AB = x B x A, e x A e x B as respectivas coordenadas de A e B. Também devido a Newton, sabemos que: F AB = d P A dt = m A d 2 x A dt 2 (2) A partir das equações acima, podemos concluir: d 2 x A dt 2 = Gm B ( x B x A ) x B x A 3 (3) Podemos facilmente estender essa conclusão para um sistema de número finito arbitrário de corpos pelo prinçípio da superposição. Denotando cada corpo por um índice distinto, temos que a equação de movimento de cada corpo i é dada por: d 2 x i dt 2 = G j i m j ( x j x i ) x j x i 3 (4) Esse sistema de equações pode ser interpretado como uma única equação diferencial ordinária de dimensão igual a 6 vezes o número total de corpos, em termos das posições e velocidades em cada coordenada referentes a cada corpo. Note que a fórmula não é bem definida sempre que para algum par i j, as suas posições coincidem, ou seja, x i = x j. Essa é uma dificuldade tanto teórica da formulação da gravidade, como computacional. A dificuldade teórica está em conciliar essa singularidade com a existência de corpos extensos, cujas partículas componentes estão a prinçípio a distâncias arbitrariamente próximas umas das outras. Ela também está na inexistência de velocidades infinitas na natureza, no entanto teoricamente presentes na colisão de dois corpos pela gravitação newtoniana. Essas dificuldades podem ser parcialmente explicadas pela presença de outras interações (eletromagnética e nuclear forte), e não constituem grande percalço para a maioria das aplicações. As dificuldades computacionais, no entanto, não são apenas um detalhe inócuo, e constituem um problema real quando corpos ficam muito próximos e as aproximações numéricas se tornam progressivamente mais grosseiras. Essa questão reforça a necessidade de se utilizar um método numérico de passo variável de alta precisão, e possivelmente até mesmo prevenções de erro mais robustas, como estabelecimento de uma segunda função além da gravitacional newtoni- 3
5 ana, para modelar choques, perdas de energia devidas a forças de maré 1, e mesmo correções relativísticas 2. 2 Objetivos Escrever um programa em Octave para simular interações segundo a teoria newtoniana de gravitação; Estudar diferentes trajetórias para diferentes distribuições pontuais de matéria (diferentes configurações astronômicas). 3 Metodologia Foi escrito um programa em Octave capaz de simular equações de movimento para a gravitação newtoniana numericamente, usando o método RKF45, ou seja, com passo variável. O passo tomado foi pelo menos quatro ordens de grandeza menor que o tempo total de simulação, para garantir um Erro Total pequeno. Decidiu-se utilizar este método por dois motivos. Em geral as órbitas estudadas descrevem trajetórias suaves, adequadas para métodos explícitos de um passo, como a família de métodos Runge-Kutta. Outro motivo é que apesar da suavidade em curta escala, as variações de velocidade em escalas de tempo maiores, suficientes para compreenderem a aproximação de dois objetos, por exemplo, podem ser bem drásticas, de várias ordens de grandeza. Um método de passo variável é ideal para esse tipo de modelagem. O programa foi utilizado para realização de três experimentações de interesse, com diferentes quantidades e configurações de objetos. Primeiramente, dois sistemas simétricos hipotéticos, de interesse teórico: um planar e outro tridimensional. Por último, foi simulado o sistema Sol-Terra-Lua, em uma aproximação planar. 1 Podem ser particularmente relevantes para planetas gasosos ou com núcleo elástico. 2 Correções relativísticas são necessárias para a descrição de órbitas nas proximidades de corpos muito massivos, como a órbita de Mercúrio. 4
6 4 Resultados e Discussão Todas os conjuntos de trajetórias gerados pela modelagem computacional da gravitação newtoniana são apresentados no Anexo 1, e são referenciados ao longo das discussões. Exceto pelo último caso, convencionou-se utilizar G = 1 ao longo de todas as simulações. 4.1 Propagação de Erros O primeiro sistema de interesse teórico é uma configuração simétrica planar de corpos pontuais. São cinco corpos inicialmente dispostos da seguinte forma: um par com massas iguais, dispostos de forma diametralmente oposta em relação à origem, com velocidades opostas; outro par nas mesmas condições; e por fim, um corpo originalmente parado, na origem. Como resultado, obtevese a figura 1, na qual são enfatizadas as posições iniciais das trajetórias. As condições iniciais e parâmetros do programa foram: Passo (dt),4 Tempo final (Tf) 16 Massas [ 3 ] 3 [ ] [ 2 ] [ 2 ] [ 6 ] Posições iniciais Velocidades iniciais [ 12 9 ] [ 12 9 ] [ 9 12 ] [ 9 12 ] [ ] Pela simetria da interação gravitacional e do sistema em si, espera-se que o resultado obtido pela integração numérica das órbitas seja também perfeitamente simétrico. Isso, no entanto, não acontece. Após algum tempo de simulação, o corpo central exibe uma trajetória não estacionária no plano, como se pode ver na figura 1. A explicação mais plausível para esse tipo de fenômeno é o acúmulo de erros do método RKF45 e da própria máquina. Isso mostra como é importante ter cautela com previsões feitas para tempos longos. 5
7 4.2 Oscilação Tridimensional O segundo sistema de interesse é um sistema oscilatório tridimensional hipotético, também com simetria radial. Ele é composto por três corpos com a mesma massa, inicialmente dispostos da seguinte forma: um par de corpos no eixo x com posições diametralmente opostas e velocidades também opostas, no eixo y; e um corpo na origem, com velocidade no eixo z. As condições iniciais e parâmetros do programa foram: Passo (dt),4 Tempo final (Tf) 16 Massas Posições iniciais Velocidades iniciais 1 As trajetórias obtidas estão ilustradas na figura 2. Nota-se que o corpo na origem nunca deixa o eixo z, e prescreve um movimento oscilatório contínuo. Os demais corpos oscilam em trajetórias não necessariamente periódicas, mas marginalmente estáveis em relação à origem. Conjectura-se que para uma escolha adequada de parâmetros e condições iniciais, todas as órbitas desse sistema de três corpos possam ser de fato periódicas. Esse é um resultado interessante, pois demonstra como trajetórias marginalmente estáveis, e possivelmente até mesmo periódicas, não planares são possíveis, embora implausíveis, em sistemas físicos reais Sistema Sol-Terra-Lua O sistema Sol-Terra-Lua é aqui tratado de maneira bastante simplificada. Como primeira simplificação, as trajetórias foram consideradas no mesmo plano. Isso se justifica porque o ângulo da lua com relação à eclíptica é de apenas 5 8, mas também porque essa órbita precessiona completamente em menos de 9 anos, ou seja, está na escala de tempo do sistema considerado. Qualquer simulação que leve em consideração o ângulo da eclíptcia lunar, mas não sua precessão, é igualmente realista em relação à simulação planar. [2] [3] Outra simplificação foi considerar distâncias e velocidades relativas médias. 6
8 Essa simplificação pode gerar grandes aberrações para sistemas planetários com alta excentricidade orbital, mas a excentricidade da órbita lunar é apenas.55 terrestre,.17. Como forma de simplificar o tratamento computacional, e evitar a propagação de erros de aproximação, foram utilizadas unidades físicas para as quais a massa lunar é 1 e a distância inicial da Terra à Lua também é 1. Nessas unidades, G =, 122 e as demais condições e parâmetros iniciais são: Passo (dt),4 Tempo final (Tf) 16 Const. Grav. (G),122 Sol Terra Lua Massas 27,7 1 [ ] 6 [ 81,23 ] [ 1 388, 8 388, 8 Posições iniciais 1 Velocidades iniciais [ ] [ 29, 14 ] [ 1 29, 14 ] ] Obteve-se os resultados apresentados nas figuras 3 e 4. A primeira apresenta uma trajetória terrestre aproximadamente circular, em torno de um ponto aparentemente estacionário, o Sol. Nessa primeira imagem, as trajetórias da Terra e da Lua se confundem, e ambas aparentam ter órbitas circulares em relação ao Sol. A figura 4 tem como objetivo justamente distinguir as trajetórias da Terra e da Lua com maior resolução. O comportamento oscilatório das trajetórias indica que, para essa simulação, de fato existe uma orbitação lunar em torno da Terra. Pelo acúmulo de aproximações, erros de modelagem e pelo limite de aproximação computacional, não se pode prever apenas a partir dessa modelagem qual será seu comportamento passado um tempo arbitrário. Todo sistema que se propõe a ser realista deve também ter ciência de suas limitações. No escopo presentemente desejado, entende-se que o resultado obtido foi satisfatório. 7
9 5 Conclusão Com a modelagem computacional apresentada no Anexo 2, foi possível simular corpos interagindo de acordo com a gravitação newtoniana. A simulação foi aplicada a três casos específicos, um simétrico planar com cinco corpos; um radialmente simétrico, mas não planar e uma simulação aproximada do sistema Sol-Terra-Lua. O primeiro caso revelou que a modelagem computacional pode gerar aberrações, como produzir resultados assimétricos a partir de sistemas inicialmente simétricos. Isso é um indicativo do cuidado que se deve tomar ao se fazer previsões baseadas nessas modelagens. O segundo caso sugere a possibilidade teórica da existência de trajetórias marginalmente estáveis, ou mesmo periódicas, mas não planares. Finalmente, o terceiro caso demonstra uma razoável aplicabilidade do programa à realidade. Com efeito, a simulação conseguiu reproduzir com sucesso o comportamento orbital da Lua em relação à Terra. Referências [1] Stanford Encyclopedia of Philosophy: Immanuel Kant Sítio eletrônico acessado em 6/217 [2] NASA: Moon Fact Sheet Sítio eletrônico acessado em 6/217 [3] Lua Sítio eletrônico acessado em 6/217 8
10 6 Anexo 1 - Figuras Figura 1: Comportamento assimétrico com condições iniciais simétricas 9
11 Figura 2: Oscilador tridimensional 1
12 Figura 3: Sistema Sol-Terra-Lua 11
13 Figura 4: Sistema Sol-Terra-Lua - detalhe da órbita lunar 12
14 7 Anexo 2 - Código em Octave 7.1 Código Principal clear; %Condiç~oes Iniciais: gravidade, massas, posiç~oes, velocidades. G=2; M=G.*[2; 2; 2]; X = [12 12 ; 6; ]; Y = [-3 3 ; ; 3-3 ]; %Define o referencial do observador no centro de massa. X=X.-(sum(M.*X,1)./sum(M)); Y=Y.-(sum(M.*Y,1)./sum(M)); %Precis~ao e tempo total de simulaç~ao; dt=.2; Tf=4; %Inicializaç~ao do vetor posiç~oes-velocidades; D = length(m); V = []; for i=1:d V = [V; X(i,:) ; Y(i,:) ]; end %Implementaç~ao do método RKF45; GRAUX GRAV2(M,V); [T,X] = ode45(graux, [:dt:tf], V); %Exibiç~ao dos gráficos. hold on; plot3(graf1(:,1),graf2(:,1),graf3(:,1), r- ); plot3(graf1(:,2),graf2(:,2),graf3(:,2), b- ); plot3(graf1(:,3),graf2(:,3),graf3(:,3), r- ); 13
15 7.2 Definição da Função function grav2 = GRAV2(M,V) %A saída da funç~ao é um vetor nas dimens~oes de V; grav2 = zeros(1,6*length(m)); %Definiç~ao da funç~ao de gravitaç~ao; %Índices definidos de forma a eliminar redund^ancias nas somas; for i=:(length(m)-1) for j=:(i-1) %Cálculo das aceleraç~oes; raux =(abs(v(6*i+1)-v(6*j+1))^2 + (V(6*i+2)-V(6*j+2))^2 + (V(6*i+3)-V(6*j+3))^2)^(-3/2); grav2(6*i+4)=grav2(6*i+4)-(v(6*i+1)-v(6*j+1))*m(j+1)*raux; grav2(6*i+5)=grav2(6*i+5)-(v(6*i+2)-v(6*j+2))*m(j+1)*raux; grav2(6*i+6)=grav2(6*i+6)-(v(6*i+3)-v(6*j+3))*m(j+1)*raux; grav2(6*j+4)=grav2(6*j+4)-(v(6*j+1)-v(6*i+1))*m(i+1)*raux; grav2(6*j+5)=grav2(6*j+5)-(v(6*j+2)-v(6*i+2))*m(i+1)*raux; grav2(6*j+6)=grav2(6*j+6)-(v(6*j+3)-v(6*i+3))*m(i+1)*raux; endfor %Cálculo das velocidades. grav2(6*i+1)=v(6*i+4); grav2(6*i+2)=v(6*i+5); grav2(6*i+3)=v(6*i+6); endfor endfunction 14
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