Cinco cenários para o Brasil, Cláudio Porto, Elimar Nascimento e Sérgio C. Buarque. Rio de Janeiro, Nórdica, 2001.
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- David Avelar de Sá
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1 R ESENHA B IBLIOGRÁFICA Cinco cenários para o Brasil, Cláudio Poro, Elimar Nascimeno e Sérgio C. Buarque. Rio de Janeiro, Nórdica, Maria Celina D Araujo* Enre o desejável e o possível: cenários de mudança no Brasil Nas úlimas décadas, examinar e propor cenários em-se ornado roina enre dirigenes empresariais e governamenais. As aividades de consuloria prosperaram na medida em que as incerezas aumenavam em meio à crise do Esado, em suas faceas gerencial e fiscal, e em meio aos desafios de uma economia crescenemene globalizada. Pode-se dizer que o Brasil ganhou experise nesse campo, como bem aesa o livro Cinco cenários para o Brasil, , de Cláudio Poro, Elimar Nascimeno e Sérgio C. Buarque. Os rês auores são consulores e vêm de carreiras acadêmicas bemsucedidas, ligadas à economia e à sociologia, o que dá a esse rabalho uma ampliude incomum enre seus congêneres. O livro, com prefácio de Luís Nassif, em um objeivo de curo prazo, vislumbrando cinco cenários para o riênio , e uma proposa de médio prazo, apresenando possibilidades para as próximas duas décadas. E, logo no início, ensina algumas lições sobre as vanagens de rabalhar na perspeciva ali enfocada, ressalando que um conjuno de cenários, explícia e adequadamene uilizado, reduz os conflios de percepção a respeio do fuuro e melhora a qualidade das decisões esraégicas, ornando-as mais conroláveis ou avaliáveis (p. 24). Comecemos pelo capíulo iniulado Meodologia, que esclarece as especificidades do méodo de cenários. Desacam-se aqui dois erros nos procedimenos de previsão comumene adoados por cienisas sociais e similares. O * Douora em ciência políica, pesquisadora do Cpdoc/FGV e professora da UFF. RAP Rio de Janeiro 36(1):145-8, Jan./Fev. 2002
2 146 Maria Celina D Araujo primeiro é o de enar enxergar o fuuro sem levar em cona mudanças iminenes e correnes, visíveis no empo presene, o que leva a uma simples exrapolação condenada ao fracasso, por não enxergar as mudanças em curso. Nessa perspeciva, o fuuro pouco em de diferene do presene e do passado. O segundo equívoco comum, quase anípoda do primeiro, é aribuir grande peso a evenos conjunurais recenes ou em curso (principalmene crises e escândalos), pois eles podem muio bem esgoar sua capacidade de influência sem alerar subsanivamene a roa dos aores, dos processos e da sociedade. A conseqüência disso é que o méodo de cenários dá aenção especial às chamadas incerezas críicas faores, variáveis e processos que esão claramene passando por mudanças cujos desfechos são insabidos, mas capazes de alerar os resulados. Oura caracerísica meodológica noável da consrução de cenários é o peso dado aos ineresses diferenciados dos aores, às possibilidades de anagonismos ou alianças enre eles, e ao somaório de apoio social que as diferenes alernaivas podem receber. Assim, cenários que parecem alamene prováveis ao se considerarem processos e esruuras podem, na verdade, conar com pouco ou nenhum apoio social, o que é em si um faor que apona para a sua improbabilidade. No curo prazo as possibilidades do Brasil são expressas pelos auores em cinco cenários. Numa primeira perspeciva, denominada O vôo da Fênix: coninuidade, emos o cenário de crescimeno econômico, coninuidade políica, com inflação reduzida, superação da crise energéica e um início de reversão do quadro de exclusão social. Nese caso, o Brasil ressurge das graves crises cambial e energéica, segue uma rajeória bem-sucedida e despona como uma das nações poencialmene mais relevanes do mundo globalizado (p. 68). A possibilidade seguine, Nas asas do Tuiuiú: ajuses de roa, maném a anerior, com a diferença de que aqui eríamos uma mudança no bloco de poder, de forma a incorporar políicas sociais mais densas. Nese caso, sinais de um ciclo viruoso de crescimeno econômico razem a perspeciva de um país não só viável e promissor, mas ambém decidido a aproveiar as oporunidades exernas e suas poencialidades inernas para corrigir as imensas desigualdades sociais que marcaram seus 500 anos de hisória (p. 82). No cenário 3, Seguindo a arribação: mudança de rumo, o Brasil muda seu perfil políico e busca maior responsabilidade social, mas as condições inernacionais são desfavoráveis, compromeendo o crescimeno econômico. Do pono de visa inerno o país se depararia, de início, com problemas energéicos e insabilidade políica. Mas, ao fim do riênio, eria recuperado a confiança de invesidores exernos e inernos e pare para um novo rumo no erreno social, sem perder a cauela e a prudência na esfera econômica. O Brasil se mosra uma nação decidida a reduzir, no menor empo possível, suas imensas desigualdades sociais (p. 95).
3 Cinco Cenários para o Brasil, O cenário 4, Do jeio do caramujo: resisência, prevê um quadro de dificuldades inernas e exernas, de crise energéica e de crescimeno, propiciando a viória nas urnas de um bloco de oposição reformisa e nacionalisa que daria prioridade ao combae à pobreza e à exclusão social. Mas nese caso ambém, ao fim de rês anos, a comunidade inernacional volaria a acrediar que seria possível ao Brasil crescer e, ao mesmo empo, combaer a pobreza resisindo ao liberalismo e à globalização (p. 108). O crescimeno econômico e o conrole sobre a inflação aqui esariam mais compromeidos, mas não mais do que no cenário seguine e úlimo, A síndrome da vaca louca: crise. Esa seria uma possibilidade excepcional em que as siuações exerna e inerna seriam políica e economicamene desfavoráveis e a inflação enraria em franca elevação. Cenário pouco provável, mas não impossível. O país esaria sem rumo claro e, aparenemene, sem capacidade políica para enconrar novas saídas que levem ao crescimeno econômico susenável e à redução dos enormes déficis e injusiças sociais presenes na cena nacional (p. 122). Ese é o pior dos cenários e que no médio prazo nos levaria a uma siuação de esagnação e pobreza. O melhor cenário é o primeiro, em ermos de menores axas de desemprego, melhor inserção inernacional, desenvolvimeno inegrado, inflação baixa e políicas consisenes, embora embrionárias, de combae à exclusão. Nese senido, os auores acabam corroborando a ese de que mudanças abrupas podem gerar mais emores do que soluções. Adoam uma posura ponderada que se conrapõe aos mudancismos quer da esquerda, quer da direia, embora não seja preocupação do livro copilar proposas exisenes, criicá-las ou endossá-las. Os auores apresenam uma sinopse de odos esses cenários (p ) para, a seguir, expor sua visão de longo prazo. Nese caso, a ariculação com os cinco cenários aneriores é evidene. Para as próximas duas décadas as possibilidades vislumbradas são: coninuidade modernização com exclusão social; ajuse e mudança desenvolvimeno inegrado; resisência organizada crescimeno endógeno; crise esagnação e pobreza. Em odos os casos é imporane a menção que os auores fazem a quesões ainda consideradas emergenes por vários analisas, mas que, na verdade, vêm-se consiuindo em caracerísicas marcanes de nossos empos. Por exemplo, inegração regional, novos direios sociais, em especial os do consumidor, a novidade do Minisério Público como espaço de novas demandas sociais por jusiça, a Lei de Responsabilidade Fiscal, o erceiro seor,
4 148 Maria Celina D Araujo a reforma do Esado e a reconfiguração da esquerda. Ou seja, omam-se as mudanças na sociedade e nas insiuições jurídicas, sociais e econômicas como indicadores de mudanças que precisam ser operadas ou já o foram no plano políico. No decorrer de odo o exo noa-se, com saisfação, a ênfase na quesão social e uma posição explícia de que al problema não seria hoje apenas monopólio das preocupações da esquerda. Ese seria um desafio a ser seriamene encarado por qualquer governo, independenemene da sua orienação políica. A orienação ideológica poderia mudar a ênfase, mas não a iniciaiva. A exclusão social é aqui apresenada como um obsáculo ao crescimeno inegrado, e não mais como um resulado consciene e provisório de um crescimeno acelerado, como se pensou durane os governos miliares. Mesmo sem ciá-las, os auores esão corroborando posições pioneiras nesse campo, como as do economisa Amarya Sen, para quem o desenvolvimeno econômico só faz senido se for insrumeno para produzir liberdade e jusiça social, ou seja, se iver no homem o seu meio e o seu fim. Percebe-se ambém uma convicção de que uma saída nacionalisa e populisa, ao velho esilo laino-americano, se aparece como saída salvacionisa e milagrosa para alguns políicos isolados, não eria mais condições de aender à complexidade econômica do Brasil, sua feição inernacional e sua densidade democráica. Ao fim da leiura emos a agradável convicção de que o país em várias possibilidades para amenizar seus problemas sociais e econômicos e que, mesmo com condições inernacionais adversas e de fao o Brasil em sido aingido por crises imprevisas, especialmene as financeiras, em capial humano e esoque de alernaivas que lhe permiirão eviar o pior cenário. Mesmo porque o pior dos cenários joga com hipóeses que hoje parecem remoas. De oda forma, exisem. Fique claro que quem rabalha com ese ipo de perspeciva não adoa expliciamene as suas preferências nem faz desses cenários uma cesa básica de proposas que permia aos aores responsáveis pelos desinos do país opar por uma ou por oura. Não se raa disso, mas sim da composição de uma série de probabilidades que acabam conformando possíveis quadros com os quais os governanes e os omadores de decisões poderiam se defronar. São possibilidades que ajudam a formar opinião e sinalizam para ouros debaes e caminhos. O que é imporane regisrar, conudo, é que, mesmo levando em cona udo isso, parece que a aual posição do país nos campos políico e econômico permie anever vários cenários que não são caasróficos, nem fazem a alegria das cassandras. Pelo conrário, oscilando enre os exremos da coninuidade e a crise complea, haveria um amplo campo para combinar melhorias em algumas áreas com esagnação ou piora em ouras, mas, como saldo final, haveria uma fore endência a configurações que per-
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