PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº , da Comarca de Limeira, em que é paciente JOÃO RAUL DO PRADO OLIVEIRA e Impetrante CARLOS ROBERTO ROCHA. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Denegaram a ordem. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), OSNI PEREIRA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 14 de abril de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Habeas Corpus nº Comarca: Limeira Impetrante: CARLOS ROBERTO ROCHA Paciente: João Raul do Prado Oliveira VOTO Nº 9216 Habeas Corpus. Tráfico de entorpecentes. Pleito objetivando o reconhecimento da nulidade das provas produzidas. Impossibilidade. Delito permanente que dispensa prévio mandado. Ordem denegada Trata-se de Habeas Corpus, impetrado por advogado, em favor de JOÃO RAUL DO PRADO OLIVEIRA, contra ato do MM. Juiz de Direito, Dr. Rogério Danna Chaib, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Limeira, sob a alegação de que o paciente estaria sofrendo constrangimento ilegal, consistente na ausência de justa causa para ação penal, em razão da ilicitude das provas produzidas. Sustenta o impetrante a ilegalidade das provas produzidas pelos policiais, pois obtidas mediante violação da garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. Em razão de tais provas, o paciente foi denunciado como incurso no art. Habeas Corpus nº

3 33, caput, e 1º, I, ambos da Lei /06. Dessa forma, pleiteou o trancamento da ação penal. Inexistindo pedido liminar, foram solicitadas informações à autoridade impetrada (fls. 14/15). Por intermédio de ofício datado de 14 de agosto de 2014, a autoridade impetrada prestou as informações de estilo (fls. 117/118). Em seu parecer, a Procuradoria Geral de Justiça opinou pela prejudicialidade do writ (fls. 28/32). É o relatório. Devidamente processado, o presente writ não comporta concessão. Conforme consta dos autos, o paciente foi preso em flagrante no dia 13 de março de 2014, pela suposta prática do crime de tráfico, acusado de trazer consigo, para fins de comércio, 1 kg de cocaína, sob a forma de crack, e 173g de cocaína, sem autorização e em desacordo com determinação legal regulamentar. Consta, ainda, que, nas mesmas circunstâncias de tempo e espaço, o paciente tinha em depósito, 5 litros de éter, 4 litros de acetona e cerca de 5,280g de ácido bórico, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Segundo narra a denúncia, o paciente envolveu-se em um acidente de trânsito com sua motocicleta, contudo, evadiu-se do local para sua residência, a fim de que não fosse reconhecido. Sabedores desse fato, policiais e Habeas Corpus nº

4 guardas civis municipais que atenderam a ocorrência de trânsito dirigiram-se à casa do paciente. Em razão do nervosismo apresentado por José Raul do Prado, os agentes públicos passaram a realizar diligências pelo imóvel, encontrando, no quarto do paciente, as 125 porções de cocaína e o tijolo de crack, além de embalagens plásticas para o armazenamento de drogas. Em seguida, no forro do telhado, foram encontrados os 5 litros de éter, 4 litros de acetona e 5.280g de ácido bórico. Finda a instrução criminal, em sentença datada de 16/09/2014, houve por bem a autoridade impetrada condenar o paciente como incurso no art. 33, caput, e 1º, inciso I, ambos da Lei /06, combinados com o art. 70, do Código Penal, à pena de 6 anos de reclusão, em regime inicial fechado, mais o pagamento de 600 dias-multa, no patamar mínimo legal, vedando-lhe o recurso em liberdade. Inicialmente, quanto ao pleito de reconhecimento de nulidade pela ausência de mandado de busca e apreensão, não assiste razão ao apelante, posto que o estado de flagrância, de per si, dispensa a necessidade do mandado. A Carta Magna é expressa ao prever no inciso XI do art. 5º, a possibilidade não só de apreensão, mas de invasão até mesmo do domicílio, em caso de flagrante delito. Sendo o tráfico delito permanente, cuja consumação perdura ao longo do tempo, o estado de flagrância persiste durante toda a manutenção dos entorpecentes sem autorização legal, dispensando a necessidade de mandado de Habeas Corpus nº

5 busca e apreensão, pela polícia. Tal entendimento é pacífico em nossos Tribunais, consoante ilustram recentes acórdãos proferidos pelo STJ: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINAR. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. É dispensável o mandado de busca e apreensão nos casos de flagrância de delito cuja execução protrai-se no tempo, como na espécie, sendo, pois, lícito à autoridade policial ingressar no interior do domicílio, a qualquer hora do dia, para fazer cessar a prática criminosa. (AgRg no AREsp /SP, 5ª Turma, rel. Marco Aurélio Bellizze, 21/08/2014, v.u.) HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE ANTE A SUPOSTA EXISTÊNCIA DE PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS. AUSÊNCIA DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. Em se tratando de receptação qualificada, Habeas Corpus nº

6 crime de natureza permanente, não se mostra necessário mandado judicial para a apreensão de objetos do delito no estabelecimento comercial, ante a comprovada situação de flagrância. Precedentes. (HC nº /SC, 6ª Turma, rel. Sebastião Reis Júnior, , v.u.) posicionando: Na mesma esteira, assim vimos nos Desnecessidade mandado em caso de flagrante: é indiscutível que a ocorrência de um delito no interior do domicílio autoriza sua invasão, a qualquer hora do dia ou noite, mesmo sem o mandado, o que, aliás, não teria mesmo sentido exigir fosse expedido. Assim, a polícia pode ingressar em casa alheia para intervir num flagrante delito, prendendo o agente e buscando salvar, quando for o caso, a vítima. Em caso de delito permanente (aqueles cuja consumação se prolonga no tempo), como é o caso do tráfico de entorpecentes, na modalidade ter em depósito ou trazer consigo, pode o policial penetrar no Habeas Corpus nº

7 domicílio efetuando a prisão cabível 1. Dessa feita, resta rechaçado o pleito de nulidade decorrente da ausência do competente mandado de busca e apreensão, porquanto a flagrância dispensa essa formalidade. Ante o exposto, pelo meu voto, denego a presente ordem impetrada em favor do paciente JOÃO RAUL DO PRADO OLIVEIRA. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator 1 NUCCI, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Comentado, Forense, 13ª Ed., nota 31, art Habeas Corpus nº