PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Araras, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado AILTON LEONARDO GUIDOTTI. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E NEWTON NEVES. São Paulo, 24 de novembro de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: Araras Apelante: Ministério Público Apelado: Ailton Leonardo Guidotti Advogado: Roberto Benetti Filho VOTO Nº Apelação. Sentença desclassificatória. Porte de droga para consumo próprio. Réu detido em posse de 46,80 gramas de maconha (24 porções). Notícia anônima. Acusado que confessou a posse, alegando tratar-se de usuário. Duas condenações anteriores, transitadas em julgadas, pelo crime constante do artigo 28, da Lei /06. Pedido de procedência total da ação criminal. Impossibilidade. Ausência de provas quanto à traficância. Réu que, em depoimentos convergentes e harmônicos, ab initio, asseverou ser usuário de maconha. Pequena quantidade de entorpecente apreendido. De rigor, a manutenção da desclassificação para o delito constante do artigo 28, da Lei de Drogas. Pena de prestação de serviços à comunidade. Acusado preso provisoriamente, onerado mais severamente do que o próprio preceito secundário da norma transgressora. Negado provimento ao recurso ministerial, declarando-se, de ofício, extinta a punibilidade, pelo cumprimento da pena. O MM. Juiz a quo, Dr. Marcelo Vieira, da Apelação nº

3 Vara Criminal da Comarca de Araras, em sentença datada de 29/04/2015 (fl. 112), julgou parcialmente procedente a acusação, a fim de desclassificar a conduta do réu, condenando-o como incurso no artigo 28, da Lei /06, à pena de prestação de serviços à comunidade, pelo prazo de três meses, na forma do artigo 28, 5º, da Lei /06, seis horas por semana. Insurge-se o órgão acusatório em face da r. sentença, requerendo a condenação do recorrido nos termos da denúncia. Contrariado o recurso, a defesa bateu-se pelo acerto do decisum; a Procuradoria Geral de Justiça opinou, em seu parecer, pelo provimento do apelo ministerial. É o relatório. Segundo consta da exordial acusatória, na data de 26 de junho de 2014, por volta de 19h10, o denunciado trazia consigo, para fins de tráfico, a quantia de 46,80 gramas de maconha, distribuídas em 24 porções. Os policiais João e Valter, inquiridos na fase instrutória processual, relataram estar em patrulhamento de rotina quando receberam uma notícia anônima acerca de um indivíduo magro, trajando calça jeans e moletom marrom, com deficiência física na orelha direita, havia acabado de receber entorpecente de terceira pessoa, ocupante de uma motocicleta. Dirigindo-se ao endereço indicado, localizaram o réu e, em revista pessoal, as porções de maconha foram encontradas em seu poder. O local é conhecido como ponto de tráfico. Interrogado, o recorrido confirmou a Apelação nº

4 posse da droga, alegando se tratar para o seu próprio consumo. Disse ter adquirido as porções de maconha pelo valor de R$ 120,00. É ajudante de pedreiro e informou já ter sido condenado pelo crime constante do artigo 28, da Lei /06, em duas oportunidades. Não obstante a irresignação ministerial, agiu com acerto o juízo a quo ao desclassificar a conduta do acusado, porquanto inexistentes provas suficientes quanto à autoria do crime de tráfico. A quantidade de maconha apreendida tampouco serve para evidenciar eventual intenção de mercancia, o que, ao contrário, fortalece, ainda mais, a versão apresentada pelo recorrido, o qual se manifestou, de maneira uníssona e convergente, em ambos os momentos que foi ouvido. As circunstâncias da prisão, outrossim, não sugerem outro desfecho condenatório, a não ser o porte de droga para consumo próprio. Por fim, o histórico de antecedentes do acusado demonstra se tratar de réu usuário de entorpecente, tendo sido condenado, por duas vezes, pelo delito constante do artigo 28, da Lei /06. Dessa forma, sobejando dúvidas no tocante ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes, melhor solução é a desclassificação para o crime constante do artigo 28, da Lei Própria, este plenamente comprovado durante a instrução processual. Não agiu com presteza, contudo, o Apelação nº

5 magistrado sentenciante ao fixar pena, porquanto, além de incompetente para tanto, a extinção da punibilidade deveria ter sido declarada, visto ter o acusado cumprido pena mais severa, preso provisoriamente, daquela prevista no preceito secundário da norma transgressora, sendo imperiosa a aplicação da detração imprópria, assim como vimos entendendo, a saber: Detração e pena de multa: aplica-se, por analogia, no desconto da pena de multa o tempo de prisão provisória. Assim, quem foi preso preventivamente para, ao final, ser condenado apenas à pena pecuniária não terá nada a cumprir. 1 O réu foi preso em flagrante na data de 26 de junho de 2014, tendo sido a prisão convertida em preventiva e, posteriormente, na data de 13 de março de 2015, beneficiado com o alvará de soltura. Destarte, em consonância com a coerência do sistema, justo se faz, de ofício, o reconhecimento da extinção da punibilidade, em favor do recorrido, o qual já cumpriu pena mais severa daquela prevista no preceito secundário da norma transgressora, em autêntica detração imprópria. Ante o exposto, pelo meu voto, nego 1 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, RJ: Forense. Apelação nº

6 provimento ao recurso ministerial, declarando-se, de ofício, extinta a punibilidade de AILTON LEONARDO GUIDOTTI, pelo cumprimento da pena. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Apelação nº