PROCESSO - TC-2938/2005 INTERESSADO - SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO DE ALEGRE ASSUNTO - CONSULTA
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1 PROCESSO - TC-2938/2005 INTERESSADO - SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO DE ALEGRE ASSUNTO - CONSULTA REPASSE DE RECURSOS FINANCEIROS POR AUTARQUIA MUNICIPAL À PREFEITURA PARA EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE SUA PRÓPRIA ATRIBUIÇÃO - SITUAÇÃO QUE DESNATURA A FINALIDADE DA AUTARQUIA - IMPOSSIBILIDADE. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Processo TC-2938/2005, em que o Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Alegre, Sr. Paulo de Tarso Ávila de Oliveira, formula consulta a este Tribunal, nos seguintes termos: É legalmente permitido a uma Autarquia Municipal, responsável pelos serviços de água e esgoto, que possui independência financeira, repassar recursos financeiros à Prefeitura Municipal durante o exercício ou ao final dele, direcionados à cobertura de serviços e aquisição de materiais para obras de drenagem pluvial e outros serviços de saneamento que sejam executados pela Prefeitura? Considerando que é da competência deste Tribunal decidir sobre consulta que lhe seja formulada na forma estabelecida pelo Regimento Interno, conforme artigo 1º, inciso XVII, da Lei Complementar nº 32/93.
2 Fls. 02 RESOLVEM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão realizada no dia vinte e sete de setembro de dois mil e cinco, por unanimidade, acolhendo o voto do Relator, Conselheiro Dailson Laranja, preliminarmente, conhecer da consulta, para, no mérito, respondê-la nos termos da Instrução Técnica nº 278/2005 da 8ª Controladoria Técnica, firmada pela Inspetora, Srª Soraide Ruy Bragatto, e do Parecer nº 3441/05 da douta Procuradoria de Justiça de Contas, da lavra do Procurador-Chefe, Dr. Ananias Ribeiro de Oliveira, abaixo transcritos: INSTRUÇÃO TÉCNICA Nº 278/2005 DA 8ª CONTROLADORIA TÉCNICA: Tratam os autos de consulta formulada a esta Egrégia Corte de Contas pelo Ilmo. Sr. Paulo de Tarso Ávila de Oliveira, na qualidade de Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto do Município de Alegre, na qual textualmente indaga: É legalmente permitido a uma Autarquia Municipal, responsável pelos serviços de água e esgoto, que possui independência financeira, repassar recursos financeiros à Prefeitura Municipal durante o exercício ou ao final dele, direcionados à cobertura de serviços e aquisição de materiais para obras de drenagem pluvial e outros serviços de saneamento que sejam executados pela Prefeitura? Ultrapassada a fase do artigo 97, caput, da Resolução TC 182/2002 (Regimento Interno), vieram-nos os autos a fim de nos pronunciarmos quanto ao mérito da proposição. É o relatório DO MÉRITO O Estado tem como função primordial o oferecimento de utilidades aos administrados, não se justificando sua atuação senão para atender ao interesse público. Assim, entende-se que todas as vezes que o Estado atua, o faz porque à coletividade deve atender. O Estado pode desenvolver por si mesmo as atividades administrativas que tem constitucionalmente a seu encargo, ou pode prestá-las através de outros sujeitos. O conceito de serviço público conforme o saudoso doutrinador, HELY LOPES MEIRELLES: "Serviço Público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado." (HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, Ed. Malheiros, 1997, 22ª
3 Fls. 03 Ed., pg. 297) Nesse sentido, prendendo-se aos critérios relativos à atividade pública, ensina o Professor JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO: "..., conceituamos serviço público como toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob o regime de direito público, com vistas a satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade." (JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Ed. Lumen Juris, 3ª ed., 1999, pg. 217) Sendo o Estado titular dos serviços públicos, deve prestá-los da melhor forma possível. Assim, pode, em casos específicos, transferir a tarefa da execução aos particulares através de concessão, permissão e autorização ou criar outras pessoas, entidades, descentralizando suas atividades conferindo às mesmas ora personalidade de direito público ora de direito privado conforme o caso. Portanto, os serviços públicos podem ser executados direta ou indiretamente. Leciona o Professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO que: "Diz-se que a atividade é descentralizada quando é exercida,..., por pessoas distintas do Estado. {...} Na descentralização o Estado atua indiretamente, pois o faz através de outras pessoas, seres juridicamente distintos dele, ainda quando sejam criaturas suas e por isso mesmo se constituam,...em parcelas personalizadas da totalidade do aparelho administrativo estatal." (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, Curso de Direto Administrativo, São Paulo, Ed. Malheiros, 17ª ed., 2004, p. 139) Visualizado o conceito de descentralização da prestação dos serviços públicos, há que se destacar os modelos de descentralização adotados pelo nosso ordenamento jurídico pátrio para auxiliar o Estado a desenvolver suas atividades, são eles: as autarquias, as empresas públicas as sociedades de economia mista e as fundações. Versaremos somente em relação à Autarquia, entidade esta, que se subsume ao caso em tela. A origem do vocábulo autarquia é grega, significando qualidade do que se basta a si mesmo, autonomia, entidade autônoma. A existência da autarquia reside na necessidade da pessoa política criar uma entidade autônoma (com capacidade de administrar-se com relativa independência e não de maneira absoluta, visto que há a fiscalização do ente criador) para a realização de atividade tipicamente pública, sendo uma das formas de materialização da descentralização administrativa. Sua criação depende de lei específica, conforme art. 37, XIX da Constituição da República. As autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei específica, com
4 Fls. 04 personalidade jurídica de direito público interno, para a consecução de atividades típicas do poder público, que requeiram, para uma melhor execução, gestão financeira e administrativa descentralizada além de serem dotadas de patrimônio próprio. Tendo personalidade jurídica, as autarquias são sujeitos de direito, são aptas a contrair direitos e obrigações, ou seja, são de titulares de direitos e obrigações próprios, distintos dos pertencentes ao ente político (União, Estado, Município ou Distrito Federal) que as institui. As autarquias desempenham atividades tipicamente públicas. O ente político "abre mão" do desempenho de determinado serviço, criando entidades com personalidade jurídica (autarquias) apenas com o objetivo de realizar tal serviço. Outra característica destas entidades é capacidade específica, significando que as autarquias só podem desempenhar as atividades para as quais foram instituídas, ficando, por conseguinte, impedidas de exercer quaisquer outras atividades. O atributo da capacidade específica é o denominado comumente de princípio da especialidade ou especialização. Em que pese a possibilidade do próprio ente Municipal executar diretamente o serviço e a existência de recursos da entidade serem revertidos ao âmbito Municipal, os serviços de saneamento, no caso em tela, não são administrados diretamente pela Prefeitura, uma vez que, há na Municipalidade a Autarquia Municipal SAAE - Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Alegre, criada especificamente para atuar em serviços de saneamento. Devolver tal atribuição, que foi imposta por lei, ao ente criador retiraria a razão de existência da própria Autarquia, afastaria a sua própria finalidade. As autarquias sendo pessoas jurídicas, gozam de liberdade administrativa nos limites da lei criadora, não há subordinação a nenhum órgão, mas controle efetuado pelo ente que as instituiu visando assegurar os objetivos fixados em seu ato de criação, sem prejuízo do controle efetuado pelo Tribunal de Contas. Ademais, se a Municipalidade lançou mão da descentralização para realizar um serviço de melhor qualidade, com a especialização do serviço a ser prestado em favor da coletividade, não poderia a mesma avocar este serviço tendo uma entidade criada por ela para fazê-lo, a não ser que, o próprio ente criador extinguisse a entidade, através de lei (pelo princípio do paralelismo das formas) e retomasse a realização do serviço, que ao nosso ver, seria uma atitude despropositada. O mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, ao discorrer sobre a Autarquia relata que:...seus recursos, não importa se oriundos de
5 Fls. 05 trepasse estatal ou hauridos como produto da atividade que lhes seja afeta, configuram recursos e patrimônios próprios, de tal sorte que desfrutam de autonomia financeira, tanto como administrativa; ou seja, suas gestões administrativas e financeira necessariamente são de suas próprias alçadas - logo, descentralizadas. (grifo nosso). (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, Curso de Direto Administrativo, São Paulo, Ed. Malheiros, 17ª ed., 2004, p. 147). Deste modo, considerando o ordenamento pátrio aplicável ao presente caso e a fundamentação exposta, opinamos para, no mérito, responder que a Autarquia ao repassar recursos para que a Prefeitura execute serviços que são de sua própria atribuição desnaturaria a sua própria finalidade. Respeitosamente, esse é o nosso entendimento. PARECER Nº 3441/05 DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA DE CONTAS: Cuidam os presentes autos de Consulta formulada pelo Senhor PAULO DE TARSO ÁVILA DE OLIVEIRA, na qualidade de Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto do Município de Alegre. Apresenta o Consulente a seguinte indagação: É legalmente permitido a uma Autarquia Municipal, responsável pelos serviços de água e esgoto, que possui independência financeira, repassar recursos financeiros à Prefeitura Municipal durante o exercício ou ao final dele, direcionados à cobertura de serviços e aquisição de materiais para obras de drenagem pluvial e outros serviços de saneamento que sejam executados pela Prefeitura? Vieram os autos para apreciação desta Procuradoria de Contas, na forma regimental. Deve ser respondida a consulta. Trata-se de autarquia municipal, cuja principal característica é a capacidade específica, ou seja, que só pode desempenhar atividades para as quais foram instituídas, ficando impedidas de exercer quaisquer outras atividades. Assim, no caso em análise, os serviços de saneamento não são administrados diretamente pela Prefeitura, uma vez que há na Municipalidade uma Autarquia Municipal, o SAAE, criada especificamente para atuar em serviços de saneamento. Devolver ao Município tal atribuição, imposta por lei, retiraria a razão de existência da própria autarquia, afastando, assim, a sua finalidade. Desenvolvendo este raciocínio, a análise técnica, assim se manifestou: Ademais, se a Municipalidade lançou mão da descentralização para realizar um serviço de melhor qualidade, com a especialização do serviço a ser prestado em favor da coletividade, não poderia a mesma avocar este serviço tendo uma entidade criada por ela para fazê-lo, a não ser que, o próprio ente criador extinguisse a entidade, através de lei (pelo princípio do paralelismo das formas) e retomasse a
6 Fls. 06 realização do serviço, que ao nosso ver, seria uma atitude despropositada. Desta forma, concluímos pela impossibilidade do repasse de recursos pela Autarquia ao Município, tendo em vista que os serviços a serem executados são de sua própria atribuição, desnaturando assim a sua finalidade. Pelo exposto, adota esta Procuradoria de Contas o entendimento do corpo técnico, com as observações contidas neste Parecer, opinando no sentido de que esta Corte responda, de forma objetiva, aos questionamentos do Consulente. Presentes à sessão plenária da apreciação os Srs. Conselheiros Valci José Ferreira de Souza, Presidente, Dailson Laranja, Relator, Mário Alves Moreira, Enivaldo Euzébio dos Anjos, Marcos Miranda Madureira e Elcy de Souza. Presente, ainda, o Dr. Ananias Ribeiro de Oliveira, Procurador-Chefe do Ministério Público junto a este Tribunal. Sala das Sessões, 27 de setembro de CONSELHEIRO VALCI JOSÉ FERREIRA DE SOUZA Presidente CONSELHEIRO DAILSON LARANJA Relator CONSELHEIRO MÁRIO ALVES MOREIRA CONSELHEIRO ENIVALDO EUZÉBIO DOS ANJOS
7 Fls. 07 CONSELHEIRO MARCOS MIRANDA MADUREIRA CONSELHEIRO ELCY DE SOUZA DR. ANANIAS RIBEIRO DE OLIVEIRA Procurador-Chefe Lido na sessão do dia: FÁTIMA FERRARI CORTELETTI Secretária Geral das Sessões zwd/shbs
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