Aula 10. variáveis; a resultante fatoração única em Z[x]
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- Manoel Caminha Leão
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1 Aula 10 fatoração única em várias variáveis; a resultante (Anterior: Gauss. ) 10.1 fatoração única em Z[x] 1. Prop. Seja f Z[x], deg f > 0. Então existem m Z e polinômios irredutíveis p 1,..., p t Z[x] tais que f = mp 1 p t. O inteiro m é único e os polinômios são únicos a menos de ordem. Prova. A existência da fatoração é simples de entender: comece fazendo f = m f onde m = c(f) e f é primitivo. Se f for irredutível, fim. Se não, recomeçamos com dois fatores de grau menor e ganhamos por indução sobre o grau. A unicidade exige mais atenção. Suponhamos f = mp 1 p t = nq 1 q s, com m, n Z e tanto os p i s como os q j s irredutíveis em Z[x]. A irreducibilidade em Z[x] garante que cada um desses polinômios é primitivo. O produto também é primitivo. Logo, o cálculo do conteúdo mostra que m = n, um bom começo. Cancelamos, e examinamos a igualdade p 1 p t = q 1 q s em Z[x]. Agora lembramos que Z[x] Q[x], e (da aula anterior) que cada irredutível não constante em Z[x] permanece irredutível em Q[x]. Usando a fatoração única provada para Q[x], podemos concluir que t = s, e que, a menos de ordem, temos p i = c i q i com c i Q. A necessidade momontânea dessas constantes se deve ao fato de que
2 2 fatoração única nem p i nem q i precisa ser mônico. Mas um novo cálculo de conteúdo mostra que podemos supor de fato c i = 1 i = 1..t DIP s Dizemos que um domínio A é um domínio de ideais principais se todo ideal de A é da forma a para algum a A. Reflexo condicionado: Z é um dip; idem cada K[x], com K = corpo. 2. exercícios. 1. Z[x] não é dip, pois 2, x não é principal. 2. ( ) O ideal 4, 2x, x 2 Z[x] não pode ser gerado por menos de 3 elementos. Generalize! (Mas não desanime se achar difícil: é preciso ter uma idéia essencialmente nova, talvez um pouco fora do contexto deste curso) DFU s Dizemos que um domínio A é um domínio de fatoração única se todo elemento de A se escreve como produto p 1 p t onde cada p i é irredutível, de forma única a menos de ordem e de multiplicação por invertível. Praticamente as mesmas demonstrações que fizemos para Z e para K[x] mostram que vale o seguinte. 3. Teorema. Todo dip é um domínio de fatoração única. Prova. A existência da fatoração no caso de Z e K[x] beneficiou-se de uma informação que servia para mostrar que o processo de fatoração não pode prosseguir indefinidamente. No caso de K[x] controlamos o grau; no caso Z, olhamos para o valor absoluto. E no caso geral? Seja A um dip. Tome a A redutível. Temos assim a = a a, com a, a A, ambos não invertíveis. Se ambos forem irredutíveis, fim. Senão, escrevemos por exemplo a = a 1 a 2 e repetimos. Temos que garantir que isso não continua indefinidamente. Um modo elegante usa o seguinte 4. Teorema. Se A é um dip então toda coleção não vazia de ideais de A admite um membro maximal.
3 10.3 DFU s 3 Admitindo este ultimo teorema, voltemos à demonstração da existência da fatoração em A. Seja C = { a a A é redutível mas não é produto de irredutíveis}. Devemos mostrar que C é vazio! Se não o fosse, admitiria um membro maximal, digamos a. Temos assim a = a a, com a, a A, ambos não invertíveis. Se ambos fossem produtos de irredutíveis, não poderíamos ter a como membro de C. Um deles, digamos a, tem que ser redutível e não se expressar como produto de irredutíveis. Logo, a é membro de C. Temos a a. Esta inclusão é estrita. De fato, se tivéssemos a = aα para algum α A, seguiria a = a a = aαa. Cancelando, deduziríamos que a é invertível, contradição. Mas se a inclusão a a é estrita, contradiz-se a maximalidade de a. 5. Teorema. Se A é um dip, então A[x] é um domínio de fatoração única. Um caso particular importante é o seguinte. Considere A = K[x]. Escolhemos um novo símbolo, digamos y, e formamos o anel de polinômios A[y], que denotamos por K[x, y]. Cada elemento de K[x, y] se escreve na forma a 0 (x) + a 1 (x)y + + a d (x)y d, onde cada coeficiente a i (x) é um polinômio na variável x, com coeficientes em A. Outra maneira de escrever os elementos de K[x, y] é expandindo cada a i (x) = a im x m e coletando os monômios x m y n : α 00 + α 10 x + α 01 y + α 11 xy + + α ij x i y j +, α ij K. Podemos concluir o seguinte 6. Teorema. Se K é um corpo, então K[x, y] é um dfu. 7. Lema. Seja A um dfu. Então todo elemento irredutível é primo. Prova. Seja a A irredutível e sejam b, c A tais que a bc, i.e., vale bc = ad para algum d A. Por fatoração única, o elemento irredutível a deve figurar também no primeiro membro e assim, divide b ou c. O leitor é convidado a escrever a definição de MDC de uma lista de elementos a 1,..., a n A. Seja A um dfu e seja f = a n x n + + a 0 um polinômio com coeficientes a i A. O conteúdo de f é o MDC(a 1,..., a n ), denotado c(f). Dizemos que F é primitivo se c(f) = 1.
4 4 fatoração única 8. Prop. Sejam A um dfu e f, g A[x] polinômios. Então: (1) f, g primitivos = f g primitivo; (2) c(f g) = c(f)c(g) Prova. (1) Sejam f = a m x m + + a 0, g = b n x n + + b 0, c r = a i b r i (=coeficiente de x r em f g). Seja δ A irredutível. Visto que c(f) = c(g) = 1, existem índices 0 m 0 m, 0 n 0 n tais que δ a i para i < m 0, δ b i para i < n 0 e δ a m0 b n0. Assim, na expressão c m0 +n 0 = a m0 +n 0 b 0 + a m0 +n 0 1b a m0 b n0 + a m0 1b n0 +, todas as parcelas à exceção de uma (leitor: qual?) é divisível por δ. Logo, δ c m0 +n 0 e concluímos que c(fg) = 1. (2) Podemos escrever f = c(f)f, g = c(g)g, com f, g primitivos. Temos então f g = c(f)c(g)f g. Como f g é primitivo segue facilmente que todo divisor comum aos coeficientes de f g é divisor de c(f)c(g), donde se conclui (2). 9. Lema de Gauss. Seja A um dfu e seja K A seu corpo de frações. Seja f A[x] um polinômio primitivo não constante. (1) Se f é redutível em K[x], então também é em A[x]. (2) Se g A[x] e f g em K[x], então f g em A[x]. Prova. Sejam g, h K[x] não constantes tais que f = g h. Reduzindo os coeficientes a denominador comum, podemos escrever g = f 1 /d 1, h = f 2 /d 2, com f 1, f 2 A[x], d 1, d 2 A. Podemos supor que MDC(d 1, c(f 1 )) = MDC(d 2, c(f 2 )) = 1. Segue-se d 1 d 2 f = f 1 f 2 em A[x]. Tomando conteúdos, obtemos d 1 d 2 = c(f 1 )c(f 2 ). Logo d 1 c(f 2 ), d 2 c(f 1 ) em A[x] e concluímos uma relação f = (f 1 /d 2 ) (f 2 /d 1 ) válida em A[x]. A segunda afirmativa se demonstra de forma similar e deixamos a cargo do leitor mais variáveis Um pouco mais geralmente, dada uma lista de símbolos, x 1, x 2,..., x n (chamados de variáveis), podemos definir o anel de polinômios A[x 1, x 2,..., x n ]. Cada elemento f A[x 1, x 2,..., x n ] é, por definição, uma combinação linear de um número finito de monômios x i 1 1 x i x in n. Por vezes será conveniente estabelecer a notação de multi-índices,
5 10.4 mais variáveis 5 x i = x i 1 1 x i x in n, onde abreviamos i = (i 1,..., i n ), i k N. Assim, cada f A[x 1, x 2,..., x n ] se escreve, de maneira única, na forma f = i a i x i = a a x a x n + + a i1...i n x i 1 1 x i x in n + onde os coeficientes, a i A, são em número finito. O grau de um monômio se define como deg x i = i 1 + i i n. O grau de um polinômio é o máximo dos graus dos monômios que ocorrem efetivamente, i.e., com coeficiente não nulo. Por exemplo, deg(1 x x x 1 x 2 2x 5 3) = 8. A soma e o produto de polinômios em mais de uma variável se define de forma evidente. (Se tiver um acesso de compulsão formalizadora, note que A[x 1, x 2,..., x n ] = (A[x 1 ])[x 2,..., x n ] pode ser construído indutivamente.) 10. exercícios. 3. Mostre que, se A é um domínio, então vale deg(fg) = deg f + deg g para f, g A[x 1, x 2,..., x n ]. Falha para A = Z Mostre que A[x 1, x 2,..., x n ] é um domínio se A o for. Quando trabalhamos com um anel de polinômios com um número pequeno de variáveis, podemos também denotar por símbolos não necessariamente indexados, e.g., Q[x, y, z, t] significa o anel de polinômios a coeficientes racionais nas variáveis x, y, z, t. 11. Teorema. Se A é dfu então A[x 1, x 2,..., x n ] também é. Prova. Basta mostrar que A[x] é dfu quando A é, pois podemos acrescentar uma variável por vez e usar indução. A exemplo do que se passou no caso de Z[x], (veja p. 1)) a existência da fatoração é barata. Concentremo-nos na unicidade. Lembrando a demonstração do caso Z[x], percebe-se que o ponto fundamental é mostrar que se f A[x] é um polinômio irredutível não constante
6 6 fatoração única então f é primo. Sejam g i A[x], i = 1, 2, 3 tais que f g 3 = g 1 g 2. Como f é primitivo, temos c(g 3 ) = c(g 1 )c(g 2 ). Logo, dividindo os coeficientes de g 1 ou g 2 pelos fatores irredutíveis de c(g 3 ), podemos supor que g 1 e g 2 são primitivos. Como f permanece irredutível (e portanto primo) em K[x], segue-se que f divide, digamos, g 1. Logo, existe h K[x] tal que g 1 = h f. Procedendo como na demonstração do lema de Gauss, obtemos uma relação dg 1 = h f, onde h A[x] e d A não tem fator em comum com c(h ). Como g 1 e f são primitivos, podemos supor d = 1 e portanto f g 1 em A[x]. 12. exercícios. 5. Fatore x 3 y 3 em irredutíveis em Z[x]. E em C[x]? 6. Mostre que y x 2 é irredutível em K[x, y]; idem para y 3 x 2. (Sugestão: grau com respeito a y ou x.) 7. (Eisenstein) Seja A um dfu e seja p A irredutível. Seja f = a 0 + a 1 x + a d x d A[x]. Suponha que (1) p a d ; (2) p a 0, p a 1,..., p a d1 ; (3) p 2 a 0. Prove que f é irredutível em A[x]. Por exemplo, x 5 2x 3 + 6x 2 30 é irredutível em Z[x]. (Sugestão: numa hipotética fatoração f = gh, imite a demonstração do lema de Gauss e examine a divisibilidade por p para os coeficientes de g = b 0 + b 1 x +, h = c 0 + c 1 x + começando por a 0 = b 0 c 0.) 8. Mostre que x 5 yx 3 + (y 2 y 3 )x 2 y 6 + y é irredutível em K[x, y]. Próximo: a resultante.
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