Economia Brasileira: Câmbio, Balança de Pagamentos e a Política Fiscal Affonso Celso Pastore 1
índice (basket / US$) Entramos em um ciclo de valorização do dólar. A experiência dos dois ciclos anteriores indica que ele será longo e intenso. A razão está na diferença entre os crescimentos de Estados Unidos e outros industrializados, como Europa e Japão. Europa e Japão ainda dependem de fortes estímulos monetários (não convencionais e taxa de juros básica), enquanto o vigor do crescimento dos Estados Unidos está levando à retirada de estímulos monetários. Capitais deverão continuar fluindo do resto do mundo para os Estados Unidos, sustentando o longo e intenso processo de valorização do dólar. 13 Dólar - Cesta de Moedas trade weighted 11 1 9 1975 19 1985 199 1995 2 25 21 215 2
índice (1 = 212-213) O dólar se valoriza com relação a todas as moedas. Mas o movimento das moedas não é homogêneo algumas se depreciam mais do que outras, como é o caso do real. A diferença entre as moedas vem de causas internas a cada país. 17 16 15 14 13 Real Euro Yen Peso Mexicano Peso Chileno Lira Turca 11 1 9 I II III IV I II III IV I II III IV I II 212 213 214 215 3
4 BRASIL
US$ bilhões R$ bilhões US$ bilhões O Brasil está sendo pego no início do ciclo de valorização do dólar com um déficit nas contas correntes muito grande 4,2% do PIB em relação aos ingressos de capitais. Para financiar tal déficit o país ficou muito dependente de capitais de portfólio. A absorção cresceu muito acima do PIB, e o real sobrevalorizou-se. 4 2 Transações Correntes 55 5 PIB (preços de 2) Absorção Doméstica (preços de 2) -2-4 -6 45 - -1 - Mensal Anualizada (s. dessazonalizada) Acumulado em 12 meses 4 35 3-14 19 1985 199 1995 2 25 21 215 16 Balanço de Pagamentos Saldo Balanço de Pagamentos Conta Financeira + Capital Déficit em Transações Correntes 25 séries dessazonalizadas AC Pastore 96 98 2 4 6 8 1 12 14 4-4 acumulado 12 meses 1998 2 22 24 26 28 21 212 214 5
US$ bilhões US$ bilhões No passado os investimentos estrangeiros diretos financiavam com sobras o déficit nas contas correntes. Atualmente eles atingem U$ 6 bilhões, contra mais de US$ 9 bilhões do déficit nas contas correntes. Mas o Brasil está entrando em uma recessão, e se valerem as regularidades da história, assistiremos a alguma queda nos ingressos de investimentos diretos. A recessão, a crise na Petrobrás e a queda dos preços de commodities (particularmente minério) não favorecem o ingresso em portfólio de renda variável. Ficamos, assim, dependentes dos ingressos de portfólio de renda fixa. Composição IED 5 Investimentos Líquidos em Carteira 7 6 Participação no Capital Empréstimos Intercompanhia 4 3 Ações Títulos de Renda Fixa 5 2 4 3 1 2 1-1 acumulado em 12 meses 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14-2 acumulado em 12 meses 1998 2 22 24 26 28 21 212 214 6
% ao ano Índice (2=1) Há várias forças explicando a depreciação do câmbio real de equilíbrio. Primeiro, como uma força é a da valorização do dólar, e como o real tem que se depreciar com relação à cesta de moedas, conclui-se que terá que se depreciar em relação ao dólar mais do que as demais moedas. Segundo, não temos mais ganhos de relações de troca. Os preços internacionais de commodities vêm em trajetória de queda (desaceleração da China + valorização do dólar), reduzindo os preços em dólares das exportações brasileiras e levando a quedas nas relações de troca. Terceiro, há uma forte desaceleração no crescimento das exportações mundiais. 4 2 3 2 1 24 2 Preços das exportações CRB -1 16-2 -3 Exportações Mundiais (valores) Exportações Mundiais (quantum) PIB Mundial -4 19 1985 199 1995 2 25 21 9 92 94 96 98 2 4 6 8 1 12 14 7
b.p. R$/US$ Mas o câmbio é um preço esquizofrênico : é ao mesmo tempo um preço relativo (o câmbio real) e um asset price (o câmbio nominal). Grande parte dos movimentos recentes do real são movimentos típicos de asset price, seguindo muito de perto o comportamento das cotações do CDS brasileiro. Por trás dessa relação está a equação de paridade não coberta de taxa de juros, na qual entra explicitamente uma medida dos prêmios de risco (no caso as cotações do CDS). O que explica as flutuações do CDS? 4 3.5 36 32 2 24 2 CDS 1 Anos - Brasil (E) Taxa de Câmbio (D) 3.25 3. 2.75 2.5 2.25 2. 16 1.75 8 I II III IV I II III IV I II III IV I II III IV I 211 212 213 214 215 1.5
CDS CDS A cotação do CDS funciona como um indicador do rating do país. Empiricamente os movimentos do CDS precedem as notas das agências de rating, e acumulam-se desvios. O diagrama de dispersão à esquerda compara as cotações do CDS aos ratings (da S&P) em março de 214, e no diagrama da direita a comparação é feita em março de 215. Em 214 o Brasil estava sobre a reta de regressão, indicando que a cotação do CDS dava uma avaliação semelhante à da S&P. Já em março de 215 o Brasil está acima da reta de regressão o que significa que o rating correspondente à atual cotação do CDS é menor. Agências de rating não reagem instantaneamente ao CDS, e por isso a curto prazo não há uma indicação de perda do grau de investimento. Mas se a execução da política fiscal e o apoio político ao governo não levarem a uma queda nas cotações do CDS, teremos uma elevação do risco de rebaixamento. 35 Croácia Março/214 5 Rússia Março/215 3 4 25 2 15 Rússia Turquia África do Sul Indonésia Brasil Colômbia 3 2 Croácia Turquia Brasil Colômbia 1 5 Itália Espanha Irlanda México Polônia Chile B BB- BB+ BBB A- A+ AA RATING 1 Hungria Itália Espanha Chile Polônia Irlanda B BB- BB+ BBB A- A+ AA RATING 9
Isso nos remete ao ajuste fiscal. O exercício feito na tabela abaixo indica que se tudo der certo e todas as medidas forem aprovadas (com as projeções de receita do ministério) o governo poderá entregar o superávit primário próximo da meta. Mas é preciso apoio político. R$ bilhões % PIB Ato Início Ajustes Concluídos 44.8.82 PIS-COFINS e CIDE-Combustíveis 12.2.22 Decreto fev/15 Fim do Auxílio à CDE 7.8.14 - - Aumento IOF-Crédito Pessoa Física 7.4.13 Decreto jan/15 Alíquotas Cheias de IPI 4.5.8 Decreto jan/15 Reajuste Tabela IRPF 3.9.7 MP abr/15 Limitação Mensal 1/18 das Despesas Discricionárias 3.8.7 Decreto jan/15 Restabelecimento PIS-COFINS sobre Receitas Financeiras 2.7.5 Decreto ago/15 Nova Tributação Bebidas Frias 1.5.3 Lei mai/15 Restabelecimento PIS-COFINS sobre Importados.7.1 MP jun/15 IPI sobre Cosméticos.4.1 Decreto jun/15 Ajustes Pendentes 25.2.46 Reforma Pensão por Morte, Abono e Seguro-Desemprego 18..33 MP 664/665 - Revisão Desoneração da Folha 5.4.1 Proj. Lei - Revisão Reintegra 1.8.3 Proj. Lei - 1
jun.9 set.92 mai.93 abr.94 jun.95 mai.97 mai.98 fev.99 out. dez.1 out.2 dez.3 jul.5 mar.6 ago.6 out.6 ago.7 mai.9 mai.1 set.1 nov.1 ago.12 out.13 jul.14 set.14 out.14 em %...e com a popularidade em baixa torna-se mais difícil a obtenção do apoio político. O problema se agrava devido à queda de poder do PT dentro do Congresso. Na nossa avaliação as chances de sucesso de Dilma se elevam no caso de um acordo com o PMDB, com o qual ela teria que dividir o poder, readquirindo melhor condição de governabilidade. Mas este é um movimento contra o PT, o que dificulta a sua execução. Obviamente a operação Lava Jato dificulta ainda mais uma solução. 9 Aprovação Presidencial Fonte: Datafolha 7 6 Ótimo/Bom Regular Ruim/Péssimo 5 4 3 2 1 Collor Itamar FHC Lula Dilma 11
Superávit Primário PIB Potencial e Risco Fiscal Uma forma simples de se avaliar a trajetória da dívida é calcular a diferença entre a taxa de juros real e o crescimento do PIB. Essa diferença, grosso modo, representa o resultado fiscal necessário para estabilizar a dívida. Dessa maneira, para uma dada taxa real de juros, há uma série de pontos que caracterizam o equilíbrio da dívida bruta (linha no gráfico abaixo). Assumimos aqui uma taxa de juros real de 6%. Sem reformas estruturais, o crescimento potencial do PIB (hoje em 1%) não tem razões para crescer. Portanto, mesmo com um primário de 2% do PIB a trajetória da dívida bruta seria de alta (ponto vermelho no gráfico). 4 3 Juro real 5% Juro real 6% 2 1 12 1 2 3 4 Nesse exercício simples é possível concluir que uma trajetória sustentável para a dívida exige: a) reformas que aumentem a capacidade do país crescer no longo prazo; ou b) um resultado fiscal mais austero. PIB
índice índice índice Não há nenhum índice de confiança calculado pela FGV (e todos eles têm alto poder de previsão) que indique qualquer reversão. São os casos da indústria, do consumidor, da construção e dos serviços. 13 Índice de Confiança da Indústria (FGV) 15 14 13 Índice de Confiança do Consumidor (ICC) 11 1 11 9 Total Atual Futura 1 9 Total Situação Atual Expectativas séries dessazonalizadas 7 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15 16 Índice de Confiança da Construção (ICST) séries dessazonalizadas 7 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15 16 Índice de Confiança de Serviços (ICS) 14 14 1 1 Total Situação Atual Expectativa Total Situação Atual Expectativa 13 6 21 211 212 213 214 215 6 28 29 21 211 212 213 214 215
% FBCF R$ / litro Além da recessão e do risco de racionamento, que derrubam os investimentos em capital fixo, temos que computar os efeitos econômicos da crise na Petrobrás. O CAPEX da Petrobrás é alto em relação à formação bruta de capital fixo, e a depreciação cambial já comeu o potencial ganho de receita que aquela empresa teria em função da queda dos preços internacionais do petróleo. Como não tem balanço auditado e perdeu o seu grau de investimento, terá dificuldades em voltar ao mercado, e em grande parte devido a isto vem atrasando pagamentos. Introduz uma condição extremamente desfavorável nos setores de bens de capital e da construção civil. 2. 1.8 Preço da Gasolina 14 12 CAPEX Petrobras 1.6 1.4 1 1.2 8 1. 6.8.6 Golfo Doméstimo ex-imposto 4.4 3 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15 2 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 11 12 14
mil vagas mil vagas No mercado de trabalho estamos assistindo ao início do crescimento da taxa de desemprego. As recontratações líquidas no CAGED se iniciaram na indústria; atingiram em seguida o setor da construção; e agora chegaram ao setor produtor de serviços. 3 CAGED - Brasil 16 2 1 4-1 -2 Saldo Saldo - MM3 Dados Dessazonalizados 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14-4 - - dados dessazonalizados Agropecuária Comércio e Serviços Construção Civil Governo Indústria 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15