VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL/CONSUMIDOR APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: BANCO DO BRASIL S/A APELANTE: CLAUDIO FELIPE CUSTODIO LESSA APELADO: OS MESMOS RELATOR: DES. ANA MARIA PEREIRA DE OLIVEIRA Relação de consumo. Fraude na contratação de serviços bancários. Documentos assinados por Lavrador relativos à abertura de conta corrente e empréstimo na modalidade PRONAF, aos quais nunca teve acesso. Sentença que julgou parcialmente procedente o pedido, condenado o primeiro Réu (BANCO DO BRASIL S/A) a cancelar o saldo devedor existente em nome do Autor e ainda a operação de crédito denominada PRONAF, além do pagamento de indenização, a título de dano moral, no valor de R$10.000,00. Apelação do Autor e da instituição financeira. Relação de consumo. Consumidor por equiparação. Responsabilidade objetiva. Instituição financeira que não cuidou de se certificar, cuidadosamente, da veracidade das informações prestadas quando da celebração dos contratos, principalmente por ser o contratante pessoa humilde e de parcos conhecimentos, assumindo o risco de causar danos a terceiros, o que lhe impõe o dever de indenizar. Cancelamento do débito e da operação de crédito corretamente determinados. Dano moral configurado. Quantum da indenização arbitrado com a observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Honorários advocatícios de sucumbência arbitrados nos termos do artigo 20, 3º do CPC. Desprovimento de ambas as apelações. VISTOS, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível, em que são Apelantes, BANCO DO BRASIL S/A e CLAUDIO FELIPE CUSTODIO LESSA, e Apelados, OS MESMOS. ACORDAM, por unanimidade de votos, os Desembargadores que compõem a Vigésima Sexta Câmara Cível/ Consumidor do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em negar provimento a ambas as apelações, nos termos do voto do Relator.
2 Trata-se de ação de rito ordinário, com pedido de tutela antecipada, proposta por CLAUDIO FELIPE CUSTODIO LESSA em face de BANCO DO BRASIL S/A e ERNESTO ZANIRATE NELES, alegando, em resumo: que é lavrador e trabalhava fazendo serviços temporários para o segundo Réu (ERNESTO); que há vários anos o segundo Réu pediu cópia de seus documentos para fazer um seguro agrícola e o induziu a assinar um contrato que supostamente era para requerer tal benefício; que foi levado à agência bancária do primeiro Réu (BANCO DO BRASIL) e que a documentação já estava pronta para ser assinada, sem que qualquer funcionário lhe esclarecesse o motivo da assinatura daqueles documentos; que, em novembro/2012, foi surpreendido com a informação de que não poderia pegar um empréstimo junto ao primeiro Réu (BANCO DO BRASIL), vez que havia uma dívida no valor de R$9.000,00 e que seu nome estava inscrito no rol de inadimplentes; que nunca teve lavoura de café ou qualquer outro produto com o segundo Réu; que nunca teve acesso a nenhum cartão para movimentação bancária e que não tinha conhecimento que possuía cheque especial, conta poupança e empréstimo eletrônico em seu nome. Ao final, requereu que o Réu se abstenha que incluir seu nome nos cadastros restritivos de crédito, a declaração de inexistência do débito e da relação jurídica entre as partes e indenização por dano moral em valor não inferior a 60 salários mínimos. A sentença, às fls. 196/202, foi prolatada com o seguinte dispositivo: Face ao exposto, determino a exclusão do 2 requerido (ERNESTO ZANIRATE NELES) do polo passivo, conforme requerido às fls. 195, JULGANDO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para Condenar o BANCO DO BRASIL S/A, inicialmente, a cancelar o saldo devedor existente em nome do autor e ainda a operação de crédito denominada PRONAF, tudo no prazo de quinze dias, a contar do trânsito em julgado, o que deverá comprovar nos autos, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais). CONDENO ainda o BANCO DO BRASIL S/A a indenizar o Autor pelo dano moral que lhe causou, conforme acima apontado, com a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que será corrigida na forma da Lei e acrescida dos juros legais, a contar desta data, o que, faço com base no artigo 5º, incisos V e X da Constituição Federal, c/c o artigo 927 do Código Civil, e, artigos 6ºe 14 do Código de Defesa do Consumidor, extinguindo o processo na forma do artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil.
3 Condeno o Réu ao pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da condenação. Houve apelação do primeiro Réu (fls. 204/213), alegando, em resumo: que, até prova em contrário, reitera a relação contratual existente entre as partes, pois esta foi firmada após o cumprimento de todas as exigências legais e documentais; que, na remota possibilidade de existência de fraude, também foi vítima do golpe; que não praticou ato ilícito; que não ficou caracterizado o dano moral, e que o quantum da condenação e os honorários advocatícios são excessivos. A parte autora interpôs apelação de fls. 231/239 pretendendo a majoração do dano moral para o equivalente a 40 salários mínimos, bem como o percentual dos honorários sucumbenciais. fls. 217/226. Foram apresentadas contrarrazões, apenas pelo Autor, às É o relatório. Insurgem-se ambas as partes contra a sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para cancelar o saldo devedor existente em nome do Autor e, ainda, a operação de crédito denominada PRONAF, além de condenar o primeiro Réu (BANCO DO BRASIL S/A) ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de dano moral. A vítima da relação de consumo, que dela não tenha participado, mas seja atingida em seu patrimônio pelos danos causados pela falha na prestação do serviço, se equipara ao consumidor, nos termos do artigo 17 da Lei 8.078/90, pelo que incumbe ao fornecedor o dever de indenizar, salvo se demonstrada a inexistência do defeito ou fato exclusivo do consumidor ou de terceiro (artigo 14, 3º da Lei 8078/90). No caso destes autos, o Autor teve seu nome indevidamente incluído em cadastro de inadimplentes, por débito que desconhece, pois alega que não manteve nenhuma relação jurídica com o Réu. O Réu, por sua vez, sustenta que a abertura da conta corrente foi realizada de forma regular, seguindo todas as formalidades exigidas, o que afastaria sua responsabilidade e que, se houve fato de terceiro, também foi vítima de golpe.
4 Entretanto, a instituição financeira demandada não comprovou em favor de quem os valores creditados na suposta conta corrente foram sacados ou transferidos, tampouco que fez a entrega do cartão para movimentação da conta diretamente ao Autor, e de que forma foi selecionada a senha de acesso. Na verdade, não cuidou o Réu de se certificar, cuidadosamente, da veracidade das informações prestadas quando da celebração do contrato, vez que disponibilizou os documentos necessários para a sua formalização fora da agência bancária, não identificando de forma correta e segura o contratante, principalmente por se tratar de um lavrador, pessoa humilde e com poucos conhecimentos. Assim, não pode o Autor suportar os prejuízos decorrentes da relação que se travou entre o Réu e o terceiro fraudador, pois, em se tratando de responsabilidade objetiva, não se cogita da existência de culpa. Ressalte-se que a inclusão indevida do nome do consumidor em cadastros restritivos de crédito prejudica a prática dos atos da vida civil e provoca aborrecimento que supera os do cotidiano, configurando dano moral, gerando obrigação de indenizar, independentemente de prova atinente a prejuízo material, pois se trata de dano in re ipsa. A indenização por dano moral deve ser fixada com moderação para que seu valor não seja tão elevado a ponto de ensejar enriquecimento sem causa para a vítima do dano, nem tão reduzido que não se revista de caráter preventivo e pedagógico para o seu causador. O valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), arbitrado na sentença, deve ser mantido, pois observou critérios da razoabilidade e proporcionalidade, sendo compatível com a repercussão dos fatos em discussão e com aqueles que têm sido fixados em casos análogos. Com efeito, existem inúmeros outros processos oriundos da Comarca de Porciúncula com a mesma causa de pedir, nos quais igualmente foi reconhecida a fraude na contratação de empréstimos por ex-parceiros rurais dos autores e arbitrada indenização por dano moral. A propósito:
5 0002323-21.2012.8.19.0044 - APELACAO DES. SEBASTIAO BOLELLI - Julgamento: 05/02/2014 - VIGESIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR APELAÇÃO CÍVEL. Direito Do Consumidor. Abertura de conta e Empréstimo na modalidade PRONAF. Fraude. Banco que faltou com seu dever de cautela. Risco do empreendimento. Responsabilidade objetiva. Pequeno lavrador que teve seu nome incluído em cadastros de inadimplentes indevidamente. Banco que não demonstrou ter o autor recebido o cartão e senha de acesso. Dano moral fixado em R$10.000,00. Manutenção da sentença. NEGO SEGUIMENTO AOS RECURSOS, COM FULCRO NO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. 0004574-46.2011.8.19.0044 - APELACAO DES. TEREZA C. S. BITTENCOURT SAMPAIO - Julgamento: 04/02/2014 - VIGESIMA SETIMA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE PARCERIA AGRÍCOLA. FRAUDE EM NEGOCIAÇÃO. LAVRADOR QUE ASSINA DOCUMENTOS RELATIVOS A EMPRÉSTIMOS NA MODALIDADE PRONAF ACHANDO TRATAR-SE DE CONTRATO DE PARCERIA AGRÍCOLA. - Precedentes deste Tribunal que são pacíficos no sentido da existência de violação ao direito do consumidor. Banco réu que assumiu o risco do negócio ao aceitar documento sem antes se certificar sobre sua regular procedência. - Inscrição do nome do demandante em cadastros restritivos de crédito que se revela abusiva e dá direito ao ressarcimento ora pleiteado. - Valor da compensação por danos morais que se revela adequado, estando, ainda, em consonância com outros julgados proferidos por esta Corte sobre o mesmo tema. NEGATIVA DE SEGUIMENTO DO RECURSO, NA FORMA DO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. 0004371-84.2011.8.19.0044 - APELACAO DES. MAURO MARTINS - Julgamento: 11/09/2013 - VIGESIMA QUINTA CAMARA CIVEL CONSUMIDOR APELAÇÕES CÍVEIS. RECURSO DO AUTOR QUE NÃO SE CONHECE. NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO RECURSO DO RÉU. 1. Recurso do autor que não se conhece, eis que interposto antes do julgamento dos embargos de declaração, sem posterior ratificação. Intempestividade. Precedentes do STJ. 2. Recurso do réu conhecido, pois devidamente ratificado. 3. Contrato de parceria agrícola. Fraude na contratação. Lavrador que assina documentos relativos à abertura de conta corrente e empréstimo na modalidade PRONAF, em relação aos quais nunca teve acesso. 4. Sentença que julga procedentes os pedidos, determinando o cancelamento dos contratos, bem como dos débitos existentes em nome do demandante; a baixa do aponte; e compensação por danos morais, no importe de R$ 10.000,00. 5. Defeito na prestação do serviço do banco, que não observou seu dever de cuidado e segurança na contratação. Preposta do réu que afirma que os valores do empréstimo eram transferidos
6 para a conta do parceiro rural do demandante. Prova testemunhal que corrobora a narrativa do autor. 6. Sentença correta. 7. Dano moral inconteste, ante a negativação indevida. Valor adequado e proporcional. Súmula 89 do TJ/RJ. Manutenção da decisão vergastada. 8. Recurso do autor que não se conhece. Negativa de seguimento ao recurso do réu, nos termos do art. 557, caput, do CPC Por fim, com relação aos honorários advocatícios de sucumbência, foram os mesmos fixados em valor que se adequou aos critérios previstos no artigo 20, 3º do Código de Processo Civil, não comportando a majoração pretendida pelo Autor. apelações. Diante do exposto, nega-se provimento a ambas as Rio de Janeiro, 06 de novembro de 2014. DES. ANA MARIA PEREIRA DE OLIVEIRA Relatora