Massas Mediastínicas na Criança (Coração e vasos excluídos)
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- Isadora Rios Leão
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1 Acta Radiológica Portuguesa, Vol.XIX, nº 76, pág , Out.-Dez., 2007 Massas Mediastínicas na Criança (Coração e vasos excluídos) Ana Nunes Serviço de Radiologia - Hospital de Dona Estefânia, Lisboa Introdução Na criança as massas torácicas localizam-se mais frequentemente no mediastino. São raras, mas constituem um grupo heterogéneo de patologia: malformativa, infecciosa e neoplásica. A ausência habitual de sintomatologia explica a razão pela qual a sua detecção é com frequência um achado acidental na radiografia do tórax. As manifestações clínicas, quando presentes, são muitas vezes inespecíficas, podendo ocasionalmente resultarem do efeito compressivo das vias aéreas ou das estruturas vasculares. Na investigação diagnóstica, a radiografia do tórax é o primeiro exame a efectuar. A ecografia, pode definir as características da lesão e revelar a presença ou não de vascularização, quando associada ao doppler. A tomografia computorizada e a ressonância magnética são as técnicas que melhor avaliam a extensão da massa e a sua relação com as estruturas vizinhas. O compartimento do mediastino onde se localiza a lesão, as suas características e o grupo etário, são dados importantes a considerar na formulação das hipóteses diagnósticas. Técnicas de imagem Nas últimas décadas o desenvolvimento tecnológico, veio permitir uma avaliação imagiológica mais detalhada e precisa das lesões do mediastino. A radiografia simples do tórax em planos ortogonais continua a ser o exame de primeira linha. A ecografia com papel limitado na avaliação das massas mediastínicas, tem interesse no grupo pediátrico, principalmente na criança com idade inferior a 2 anos, pois permite o esclarecimento rápido de imagens equívocas, encontradas no exame radiológico, diferencia o timo normal (Fig. 1) de uma massa, caracteriza a lesão quanto à natureza sólida, líquida ou vascular, e pode ser útil na orientação de biópsias. A tomografia computorizada (TC) com administração endovenosa de contraste iodado permite com maior precisão, localizar a lesão, avaliar os seus componentes e definir a sua relação com as estruturas adjacentes. Pode ainda ter interesse, na monitorização da resposta ao tratamento e na orientação de biópsias. A ressonância magnética (RM) tem particular indicação na avaliação das massas do mediastino posterior, no estudo de lesões vasculares e na suspeita de envolvimento cardíaco ou invasão vascular. Está especialmente indicada na impossibilidade de administração de contraste iodado endovenoso no estudo por TC. Anatomia do Mediastino Fig. 1 Aspecto ecográfico do timo Classicamente o mediastino é dividido em 3 compartimentos: anterior, médio e posterior, com base na radiografia do tórax em perfil. Localizar a lesão num compartimento do mediastino permite estreitar o diagnóstico diferencial, mas esta definição não é fácil quando as massas atingem grandes dimensões. Mediastino anterior É a localização mais comum das massas mediastínicas na criança e a maioria origina-se no timo ou no tecido linfóide. Timo Na radiografia do tórax a massa do mediastino anterior mais comum é o timo (Fig. 2). Este órgão é proeminente nas crianças até aos 3 anos de idade, podendo estender-se desde a região cervical até ao diafragma. O timo normal pode variar consideravelmente quanto à localização, extensão, dimensão e morfologia. ARP!97
2 Localização das massas mediastínicas na criança Linfoma Pode abranger todos os compartimentos do mediastino mas é o mediastino anterior habitualmente o mais envolvido, devido à infiltração do timo e das cadeias ganglionares. O linfoma não-hodgkin surge sobretudo nas crianças com idade inferior a 10 anos, enquanto que a doença de Hodgkin afecta mais os adolescentes e adultos jovens. A TC com contraste endovenoso revela um timo com volume aumentado, contornos lobulados, irregulares e densidade heterogénea, com áreas hipodensas/necróticas (Fig. 3). Informa da extensão da massa e do efeito compressivo que esta pode exercer nas estruturas vizinhas, nomeadamente na via aérea. Define a presença de adenopatias e demonstra, quando presente, o envolvimento do parênquima pulmonar, pleura e parede torácica. A bold estão referenciadas as lesões mais frequentes, de cada compartimento. Fig. 3 Linfoma não Hodgkin Fig. 2 Timo normal. A configuração da glândula é diferente consoante o grupo etário. Tem uma forma quadrangular com bordos convexos nas crianças mais novas e após os 5 anos adopta morfologia triangular com bordos rectificados ou côncavos. O processo de involução inicia-se após a puberdade. Um aspecto particular desta glândula é a capacidade de alterar a sua dimensão em resposta a situações de stress agudo. Hiperplasia do timo Na criança ocorre habitualmente em associação com terapêuticas realizadas, citostáticos e mais particularmente com os corticoides, thymic rebound. A doença de Graves, doença de Addison, aplasia ou hipoplasia das células vermelhas e acromegália, são situações que também podem cursar com hiperplasia do timo. Os tumores primários do timo (timolipoma, timoma) são muito raros na criança. A maioria dos tumores tímicos na idade pediátrica estão em relação com o linfoma ou leucemia. Tumores de células germinativas Incluem os teratomas benignos e as variantes malignas, como o seminoma, o carcinoma embrionário, o teratocarcinoma e o tumor yolk-sac. O teratoma benigno é o tumor de células germinativas mais frequente no grupo pediátrico. A maioria localiza-se no mediastino anterior (Fig. 4), no timo ou na sua proximidade. Os seus constituintes tecidulares derivam da endoderme, mesoderme e ectoderme. A TC define as características internas da massa, sendo a apresentação típica a de uma massa complexa com componente quístico e áreas sólidas, contendo gordura e calcificações irregulares (Fig.5). A RM com a capacidade multiplanar tem maior facilidade em avaliar a extensão e invasão do tumor aos tecidos e orgãos vizinhos, nas situações de malignidade. Mediastino médio A maioria das massas do mediastino médio estão relacionadas com; adenopatias ou malformações do intestino primitivo. Adenopatias A presença de gânglios é rara na criança até aos 10 anos de idade e quando identificados são consideradas 98! ARP
3 Fig. 6 Adenopatia com calcificação. Tuberculose Fig. 4 Teratoma Malformações quistícas congénitas As malformações quistícas congénitas resultam de uma anomalia de desenvolvimento embrionário do intestino primitivo, que dá origem à árvore traqueo-brônquica e ao esófago. O quisto broncogénico, o quisto entérico e o quisto neuroentérico, são as formas mais comuns. Os dois primeiros localizam-se mais frequentemente no mediastino médio e o último no mediastino posterior. O quisto broncogénico é normalmente detectado na região subcarinal ou paratraqueal direita (Fig.7). O quisto entérico também conhecido como quisto de duplicação do esófago localiza-se próximo ou na parede do esófago e habitualmente ao longo do seu 1/3 inferior. Na TC têm normalmente, uma forma arredonda ou ovalada, parede bem definida e densidade hídrica, ocasionalmente esta pode ser semelhante às partes moles, devido ao muco, à hemorragia ou infecção. Não captam o contraste endovenoso. Fig. 5 Teratoma patológicos. Nos adolescentes podem ser considerados normais os gânglios cujo maior eixo é inferior a 10mm. As adenopatias mediastínicas ou hilares na criança podem ser de natureza inflamatória/infecciosa, a maioria associada à doença granulomatosa (tuberculose, sarcoidose e histoplasmose) ou neoplásica, sendo o linfoma a causa mais frequente. As de origem metastática são mais raras e os tumores primitivos mais comuns; o neuroblastoma, o sarcoma de Ewing, o tumor de Wilms e o sarcoma osteogénico. As adenopatias na TC são bem individualizadas ou apresentam-se como aglomerados de densidade partes moles. Localizam-se preferencialmente na região paratraqueal direita, espaço subcarinal e hilos. A detecção de adenopatias calcificadas, na TC sem contraste endovenoso, sugere a presença de doença granulomatosa (Fig.6). O diagnóstico diferencial entre adenopatias inflamatórias e neoplásicas não é possível, apenas com base na TC. Fig. 7 Quisto broncogénico Mediastino posterior As massas do mediastino posterior são tipicamente de origem neural e diferenciam-se em tumores das células ganglionares simpáticas, tumores dos nervos periféricos e tumores das células paraganglionares. ARP!99
4 Tumores neurogénicos A grande percentagem deriva das células ganglionares simpáticas e pertencem ao complexo neuroblastoma - ganglioneuroma - ganglioneuroblastoma O neuroblastoma é a forma mais imatura e maligna. Geralmente surge antes dos 5 anos de idade. O ganglioneuroma é bem diferenciado e benigno, ocorre habitualmente após os 10 anos de idade. O ganglioneuroblastoma tem um grau de diferenciação intermédio entre o ganglioneuroma e o neuroblastoma e é a forma de aparecimento mais rara, com pico de incidência entre os 5 e 10 anos. Os tumores com origem nos nervos periféricos, neurofibromas e schwannomas ocorrem com menor frequência e são geralmente benignos. Raros antes dos 20 de idade, a maioria tem origem nos nervos intercostais ou simpáticos. O neurofibroma plexiforme surge muitas vezes em associação com a neurofibromatose. Os paragangliomas são raros na criança, menos de 2% são malignos. Os doentes apresentam com frequência sinais de excesso de catecolaminas. A TC demonstra as lesões, normalmente em localização paravertebral, com densidade de partes moles. As calcificações são frequentes nos neuroblastomas (Fig. 8). A RM dá uma melhor avaliação da extensão do tumor ao canal raquidiano e parede torácica, devido às suas capacidades; multiplanar e excelente detalhe dos tecidos moles, incluindo da medula óssea (Figs. 9 a 11). Fig. 10 Neuroblastoma Fig. 11 Neuroblastoma Fig. 8 Neuroblastoma Fig. 9 Neuroblastoma Conclusão Perante a suspeita clínica ou radiológica de massa mediastínica na criança, é importante definir, numa fase inicial, se os achados imagiológicos são normais ou patológicos. O estudo radiográfico do tórax constitui o exame inicial, podendo a ecografia ser mais esclarecedora, no grupo etário mais baixo, ao excluir variantes anatómicas do timo, tornando assim desnecessárias outras investigações. Uma vez confirmada a presença de massa mediastínica a TC com contraste endovenoso é a técnica de imagem habitualmente escolhida para melhor a localizar, caracterizar e determinar a sua extensão e complicações. 100! ARP
5 A RM é considerado o exame de eleição no estudo das massas do mediastino posterior com possível extensão ao canal raquidiano, nos tumores ou malformações vasculares, bem como nas situações em que o contraste iodado endovenoso não pode ser utilizado. A localização anatómica da massa mediastínica e o conhecimento das suas características imagiológicas, contribuem para um diagnóstico mais preciso permitindo orientar para a natureza benigna ou maligna da lesão. O linfoma, os tumores neurogénicos, o teratoma, as adenopatias, as malformações quistícas do intestino primitivo e a hiperplasia do timo constituem as massas mediastínicas mais comuns na criança. Face à complexidade das lesões e ao seu relacionamento com as estruturas mediastínicas, a orientação imagiológica é importante para a realização da biopsia, que assume frequentemente um papel decisivo no diagnóstico. É ainda relevante o papel que a imagiologia assume no seguimento de patologia conhecida permitindo avaliar a resposta à terapêutica instituída. Bibliografia 1. David, F. Merten - Diagnostic Imaging of Mediastinal Masses in Children. AJR, 1992, 4:158: Meza, M.; Benson, M.; Slovis, T. L. - Imaging of mediastinal masses in children. Radiol Clin North Am, 1993, 31(3): Siegel, M. J. - Pediatric Body CT Lippincott Williams & Wilkins Kim, O. H.; Kim, W. S.; Kim, M. J.; Jung, J. Y.; Suh, J. H. - US in the Diagnosis of Pediatric Chest Diseases. Radigraphics, 2000, 20: Lucaya, J.; Strife, J. L. - Medical Radiology Diagnostic Imaging. Pediatric Chest Imaging Springer Williams, H. J.; Alton, H. M. - Imaging of paediatric mediastinal abnormalities. Paed Resp Rev, 2003, 4: Kuhn, J. P.; Slovis, T. L.; Haller, J. O. Caffey s Pediatric Diagnostic Imaging Mosby Jaggers, J.; Balsara, K. - Mediastinal Masses in Children. Thorac and Cardiovasc Surg, 2004, 16: Stephanie, S. Kennebeck. - Tumors of the Mediastnum. Clin Ped Emerg Med, 2005, 6: Franco, A.; Mody, N.; Meza, M. - Imaging Evaluation of Pediatric Mediastinal Masses. Radiol Clin North Am, 2005, 43: Duwe, B. V.; Sterman, D. H.; Musani, A. I. - Tumores of the Mediastnum. Chest, 2005, 128: Avni, F.; Ziereisen, E.; Delpierre, I.; Louryan, S. - EMC, 2006, A Tansel, T.; Onursal, E.; Dayioglu, E.; Basaran, M.; Sungur, Z.; Çamci, E.; Yilmazbayhan, D.; Eker, R.; Ertugrul, T. - Chilhood mediastinal masses in infants and children. The Turkish Journal of Pediat, 2006, 48: Siegel, M. J.; Coley, B. D. Pediatric IImaging - Lippincott Williams & Wilkins Whitten, C. R.; Khan, S.; Munneke, G. F.; Grubnic, S. A - Diagnostic Approach to Mediastnal Abnormalities. Radiographics, 2007, 27: ARP!101
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