HIDRODINÂMICA DE ESCOAMENTOS COM SUPERFÍCIE LIVRE E FRONTEIRAS RUGOSAS Teoria e aplicações

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Transcrição:

HIDRODINÂMICA DE ESCOAMENTOS COM SUPERFÍCIE LIVRE E FRONTEIRAS RUGOSAS Teora e aplcações Ru M. L. FERREIRA CEHIDRO Insttuto Superor Técnco Unversdade Técnca de Lsboa; Av. Rovsco Pas, 1 1049-001 Lsboa, ruf@cvl.st.utl.pt Ana M. C. RICARDO CEHIDRO Insttuto Superor Técnco Unversdade Técnca de Lsboa; Av. Rovsco Pas, 1 1049-001 Lsboa, ana.rcardo@st.utl.pt Lara S. M. FERREIRA Insttuto Superor Técnco Unversdade Técnca de Lsboa; Av. Rovsco Pas, 1 1049-001 Lsboa, lara.ferrera@st.utl.pt João G. A.B. LEAL CEHIDRO & Faculdade de Cêncas e Tecnologa Unversdade Nova de Lsboa, Qunta da Torre, 89-516 Caparca, leal@fct.unl.pt Máro J. FRANCA IMAR Centre for Marne and Envron. Res. & FCT Unversdade Nova de Lsboa; Qunta da Torre, 89-516 Caparca, mfranca@fct.unl.pt A prátca da engenhara fluval requer um conhecmento detalhado da hdrodnâmca de escoamentos com superfíce lvre e com fronteras rugosas que ocorrem, por exemplo, em de ros de montanha, ros aluvas com formas de fundo, canas artfcas protegdos com enrocamento ou vegetação, planíces de nundação com zonas urbanzadas ou exploradas agrcolamente. Para caracterzar o escoamento médo temporal e a resstênca ao escoamento não é sufcente conhecer o escoamento num conunto dscreto e reduzdo de locas uma vez que coexstem város tpos de rugosdade a dversas escalas (de grão, formas de fundo, vegetação) e exste forte heterogenedade espacal no escoamento devdo a curvas, edfcado, pontes ou estruturas hdráulcas. O obectvo prncpal deste trabalho é apresentar uma metodologa de caracterzação de escoamentos trdmensonas sobre fronteras rugosas baseada na aplcação do operador Méda Dupla espáco-temporal (MD). Na metodologa MD, as equações de conservação são expressas em quantdades médas no tempo e no espaço, sendo as últmas defndas numa anela espacal maor que as dmensões, em planta, das rregulardades da frontera. As equações de conservação MD permtem o tratamento teórco da resstênca ao escoamento e não necesstam da calbração das equações de resstênca devdo à nteracção entre o escoamento e os elementos sóldos no seu seo. Pretende-se anda mostrar aplcações prátcas, nomeadamente a caracterzação de escoamentos em ros de montanha suetos a transporte sóldo e a qualfcação da resstênca ao escoamento em zonas densamente povoadas por vegetação emersa. Palavras-chave : escoamentos com superfíce lvre, fronteras rugosas, métodos de méda dupla espacal e temporal. 1

1. INTRODUÇÃO A prátca da engenhara fluval requer um conhecmento detalhado da hdrodnâmca de escoamentos com superfíce lvre e com fronteras rugosas. Estes escoamentos ocorrem em ros de montanha, ros aluvas com formas de fundo, canas artfcas protegdos com enrocamento ou vegetação, planíces de nundação com zonas urbanzadas ou exploradas agrcolamente, entre mutos outros exemplos. Nestes espaços fluvas são comuns os trabalhos que compreendem o proecto de estruturas de establzação de margens, a regularzação de trechos para mtgação de cheas, a renaturalzação de trechos para promoção da bodversdade ou a protecção de estruturas fluvas ou váras. Nestes trabalhos de engenhara fluval subaz a necessdade de se caracterzar o escoamento médo temporal e a resstênca ao escoamento. Em canas com letos e margens rugosos ou com obstruções, não é sufcente conhecer o escoamento num conunto reduzdo de locas dscretos uma vez que coexstem város tpos de rugosdade: de grão (escala do grão), de formas de fundo (mcro-escala), e de vegetação (escala do grão a mcro-escala) e sobrepõese anda a rugosdade equvalente, devda à morfologa do canal ou à confguração do domíno de cálculo (meso-escala, e.g. curvas, meandros, zonas construídas). Neste caso, é necessáro conhecer a nteracção entre o escoamento e os elementos de rugosdade ou obstruções. A forma fundamental de descrever o escoamento consste na aplcação das equações de conservação da massa e das equações de Naver-Stokes (NS) com condções de frontera vscosas apropradas para o campo de velocdades. A solução das equações NS (DNS) não é exequível em problemas correntes de engenhara fluval. Se se fltrar as menores escalas temporas turbulentas e se se ncorporar equações adconas de fecho, que dêem conta do efeto dessas pequenas escalas sobre o escoamento médo temporal, obtêm-se as equações NS médas no tempo (Reynold Averaged Naver Stokes equatons, RANS na lteratura de língua nglesa). As soluções vrão nsensíves às pequenas flutuações temporas,.e. expressarão apenas o campo médo temporal de pressões e velocdades o que, em problemas correntes, é nformação sufcente. O ncremento de capacdade computaconal começa a possbltar a aplcação das equações RANS a problemas de mcro- e meso-escala. Todava, em problemas de meso-escala, o tempo de cálculo pode ser da ordem de grandeza de uma semana. Nos escoamentos fluvas, a escala longtudnal característca é muto maor que a escala vertcal e a escala temporal característca é pequena (doravante desgnar-se-á por pouco profundos os escoamentos com estas característcas) e, consequentemente, a dstrbução vertcal de pressões é hdrostátca. Assumndo, adconalmente, que os gradentes de tensões turbulentas normas são desprezáves, obtêm-se as equações do tpo Sant-Venant (shallow water equatons na lteratura de língua nglesa). São estas as equações ncorporadas na grande maora dos códgos comercas aplcáves a escoamentos pouco profundos, un- ou bdmensonas (HEC-RAS, MIKE 11, MIKE 1, ISIS, SOBEK, entre outros). Todava, nestes códgos, a nteracção entre o escoamento e a frontera rugosa e os obstáculos depende essencalmente de uma fórmula de resstênca calbrada ad hoc, por exemplo as fórmulas de Chézy ou de Mannng-Strckler, ambas váldas estrtamente para escoamentos permanentes unformes com camada lmte plenamente desenvolvda e sem formas de fundo ou outros obstáculos onde ocorra separação. Por exemplo, em escoamentos em planíces de nundação com corredores de vegetação emersa ou com edfcado, a calbração de um coefcente de Mannng-Strckler é dependente da largura da malha utlzada nos cálculos, o que decorre do facto da resstênca ser nfluencada por fenómenos com um vasto leque de escalas, as maores das quas não contempladas na fenomenologa para a qual a fórmula de Mannng- Strckler fo desenvolvda.

Na últma década, têm sdo regstados avanços na descrção dos processos que decorrem da nteracção entre o escoamento com superfíce lvre e elementos de rugosdade ou obstruções (NIKORA et al. 001), nomeadamente quanto à caracterzação da varabldade espacal quando o escoamento se processa em domínos multplamente conexos, por exemplo o leto de ros de montanha, os letos com formas de fundo ou zonas com vegetação ou edfícos. Desgna-se por Metodologa de Méda Dupla espáco-temporal, MMD, (Double-Averagng methodology, DAM, na lteratura de língua nglesa) a técnca pela qual se deduzem as equações que expressam os prncípos de conservação da massa, quantdade de movmento e energa aplcáves a domínos multplamente conexos cuas dmensões são, em cada drecção em planta, maores que o comprmento de onda domnante da heterogenedade do escoamento médo temporal. Mostra-se na Fgura 1 o exemplo de um domíno multplamente conexo, um conunto de quarterões num aglomerado urbano sueto a uma chea. À dreta, na Fgura 1a, mostra-se o domíno de cálculo dscretzado de forma acetável para equações do tpo RANS ou de Sant-Venant D. A dscretzação deverá ser a mas fna possível para que a perda de carga resultante de eventuas separações sea explctamente contablzada. Na prátca, e porque o esforço computaconal é frequentemente demasado e mpede a obtenção de soluções em tempo útl, os modelos comercas são geralmente usados com malhas grosseras como a representada na Fgura 1b. A perda de carga ntroduzda pela nteracção escoamento-edfícos é ntroduzda por ntermédo de um coefcente de resstênca, calbrado em cada caso concreto de aplcação do modelo. Para obvar as ncorrecções conceptuas nerentes a este processo de calbração, o propósto da MMD é expressar as equações de conservação para que seam váldas em domínos da ordem de grandeza do comprmento de onda característco da varabldade espacal do escoamento (, no exemplo da Fgura 1). a) b) Fgura 1. Exemplo de domíno multplamente conexo, um conunto de quarterões num aglomerado urbano sueto a uma chea. a) Domíno e malha computaconal para equações do tpo Sant-Venant. b) Domíno e malha computaconal para equações do tpo Dupla Méda Sant-Venant. O parâmetro é o comprmento de onda característco da varabldade espacal do escoamento. Assm, a dscretzação que se mostra na Fgura 1b é demasado grossera para equações do tpo RANS ou de Sant-Venant D mas é deal para a aplcação de equações do tpo MD-Sant-Venant ou MD-Naver Stokes (MDNS). O tempo de computação assocado à resolução das equações MDNS num domíno dscretzado como na Fgura 1b, envolvendo a parte fluda e a parte sólda, sera consderavelmente reduzdo. Não se comprometera a qualdade da solução uma vez que a formulação matemátca englobara toda a complexdade dos fenómenos envolvdos na nteracção entre o escoamento médo temporal e os obstáculos. Formalmente, esta últma condção requer que as equações MD, váldas 3

em domínos da ordem de grandeza de (em planta), ncorporem os termos que contablzam a nfluênca das pequenas escalas espacas sobre o escoamento médo no espaço e no tempo. Por outras palavras, em cada cota, as equações de conservação MD não são váldas pontualmente mas em volumes de dmensão mínma sendo que os fenómenos que ocorrem a escalas menores que terão que ser descrtos por equações adconas (equações de fecho). Essas equações de fecho tornarão desnecessára a calbração de coefcentes de resstênca para atender à nteracção escoamento-estruturas. Os esforços de nvestgação até à data não conduzram anda a equações de fecho geras, váldas ndependentemente do problema fluval partcular. De facto, o problema conceptual apresentado na Fgura 1 não tem anda solução no âmbto da metodologa MD. Assm, o obectvo prncpal deste trabalho é apresentar avanços na caracterzação de escoamentos fluvas, no âmbto da metodologa MD, contrbundo para a formulação de equações de fecho MD geras. Para cumprr os obectvos propostos, apresenta-se, na Secção, os fundamentos da teora MD. Na Secção 3 descrevem-se os procedmentos de obtenção de dados em trabalhos laboratoras que vsem a caracterzação dos termos específcos das equações de conservação MD. Na Secção 4 apresentam-se exemplos de aplcação, nomeadamente a caracterzação de escoamentos em ros de montanha suetos a transporte sóldo e a quantfcação da resstênca ao escoamento em zonas densamente povoadas por vegetação emersa. Neste trabalho adopta-se o ponto (.) como separador decmal.. FUNDAMENTOS TEÓRICOS.1 Breve hstóra da metodologa MD As equações de conservação MD são expressas em quantdades médas no tempo e no espaço, defndas numa anela maor que o produto dos comprmentos de onda domnantes em cada drecção horzontal. Necesstam de termos adconas que expressam os efetos advectvos das escalas contdas na anela espacal onde é aplcado o operador méda espacal (escalas não resolvdas) sobre as escalas maores que essa anela espacal (escalas resolvdas). Esses termos são habtualmente desgnados por tensões de forma, ou dspersvas, nas equações de conservação da quantdade de movmento. A taxa de produção de energa cnétca turbulenta (ECT) e os fluxos de ECT assocados a estas tensões são os termos adconas que mporta caracterza na equação de conservação da ECT. As tensões de forma surgem pela prmera vez nos trabalhos de WHITAKER (1967) e GRAY e LEE (1977) no âmbto do estudo de escoamentos em meos porosos. A prmera aparção destes termos no âmbto da hdráulca fluval ocorre no trabalho de SMITH e MCLEAN (1977), aplcado à descrção do escoamento sobre dunas no Ro Columba (EUA). RAUPACH e SHAW (198), no âmbto da caracterzação da regão nteror da camada lmte atmosférca, formalzaram o procedmento de aplcação do operador méda espacal, descrevendo as prncpas propredades do mesmo (ver anda RAUPACH et al. 1991). Os domínos de aplcação do operador méda espacal consstam em planos horzontas de muto reduzda espessura que ntersectavam as hastes da vegetação ou as copas das árvores. Este é, anda, o procedmento canónco para a aplcação do operador méda espacal, embora FINNIGAN (000) tenha proposto uma técnca de aplcação da méda espacal a volumes com dmensão vertcal fnta. O termo tensões de forma for proposto por GIMENEZ-CURTO & CORNIERO LERA (1996) para descrever as tensões que são geradas na estera de elementos de rugosdade. Em canas hdráulcos, a aplcação e a formalzação da metodologa MD deve-se, essencalmente, a NIKORA et al. (001, 007) e POKRAJAC et al (008). Recentemente, a metodologa MD tem sdo aplcada a város problemas de caracterzação de escoamentos fluvas, nomeadamente a caracterzação de letos rugosos encouraçados 4

(ABERLE et. al. 008, FRANCA et al. 008), a caracterzação de escoamentos com transporte sóldo (FERREIRA et al. 009a) e a caracterzação de escoamentos em zonas com vegetação densa (WHITE & NEPF 008, FERREIRA et al. 009b).. Equações de conservação MD Apresentam-se, de seguda, os prncípos fundamentas da metodologa MD para a dedução das equações de conservação MD. Os prncpas passos serão lustrados com exemplos relatvos às equações de conservação da quantdade de movmento (Naver-Stokes). As equações de Naver-Stokes são equações dferencas não lneares que permtem a descrção do escoamento de fludos newtonanos, expressando um equlíbro de forças. Para escoamentos ncompressíves escrevem-se (SCHLICHTING 1968) u u p u u g, (1) t x x xx em que u é a componente do vector de velocdades nstantâneas, p é a pressão, é a massa w volúmca do fludo, g é a componente da aceleração gravítca e é a vscosdade do fludo. Nesta equação, g representa as forças de massa (por undade de volume), t representa o tempo, x representa as coordenadas espacas ( x1 x é a coordenada longtudnal, x y é a coordenada lateral, x3 z é a coordenada vertcal). Os termos p x e u x x são as forças de contacto de pressão e vscosas, respectvamente, por undade de volume. As equações RANS obtêm-se a partr das equações de NS procedendo à méda temporal de cada um dos termos da Eq. (1), após ntroduzr a decomposção de Reynolds ( x, yzt,, ) ( xyz,, ) '( xyzt,,, ), () em que ( x, yzt,, ) representa valores nstantâneos, ( x, yz, ) representa valores médos temporas, '( x, yzt,, ) representa flutuações temporas e u ou p. Em regme permanente as equações RANS escrevem-se uu ' ' p u u u g x x x xx 0. (3) O termo u' u' representa o tensor das tensões de Reynolds, traduz o efeto sobre o escoamento médo do transporte de quantdade de movmento pelas flutuações de velocdade e surge devdo à não lneardade do termo da aceleração convectva. As equações de Naver-Stokes médas no espaço e no tempo (MDNS) obtêm-se por aplcação do operador méda espacal às RANS, após a ntrodução da decomposção espacal ( x, yz, ) ( z) ( xyz,, ) (4) em que () z representa a méda dupla espacal e temporal, a uma dada cota z, e ( x, yz, ) representa a flutuação espacal. Por convenênca de notação, usar-se-á ( x, yz, ) ( xyz,, ). O operador méda espacal tem as seguntes propredades (RAUPACH et al. 1991), 1 1, 1 1 (5) 5

No entanto, a propredade comutatva entre os operadores dferencal e méda espacal não é válda quando o volume de controlo ntersecta os elementos sóldos (FINNIGAN 000, NIKORA et al. 007),.e. x x e t t. Assm, os seguntes teoremas aplcam-se nas zonas multplamente conexas Teorema da méda espacal 1 1 n d S nt S x x (6) f Equação geral do transporte 1 1 ( I ) S u d nt n S t t (7) f Nos teoremas (6) e (7), é uma varável do escoamento defnda apenas no volume de fludo, S nt é a superfíce de nterface entre a parte sólda e a parte líquda do volume de controlo; ( z) Af ( z)/ A expressa a percentagem de vazos, ou sea, a relação entre a área ocupada pelo fludo, A f, e a área total do domíno de aplcação do operador méda espacal, A, para uma dada cota z ; Vf òaf é o volume de fludo no volume de controlo sendo ò uma espessura neglgencável face à varação vertcal dos elementos de rugosdade para uma dada cota z ; n é a componente do vector untáro normal à nterface ( ) sóldo/líqudo drgda da parte sólda para o escoamento, u I é a componente do vector velocdade na nterface sóldo/líqudo e as restantes varáves têm o sgnfcado anterormente apresentado. Devdo à condção de não escorregamento, se a velocdade dos elementos sóldos for nula e a frontera não porosa, ( I ) tem-se u 0, pelo que o últmo termo da equação (7) se torna nulo. Sempre que não houver ambgudade de notação, prescndr-se-á do sobrescrto ( I ). Como exemplo de aplcação do operador méda espacal e dos teoremas (6) e (7) deduzem-se de seguda os termos de pressão e as tensões de forma das equações MDNS. No caso dos termos de pressão tem-se, por aplcação drecta de (6): p 1 p 1 S pn d nt S x x (8) f O prmero termo do lado dreto da Eq. (8) representa o gradente de pressões MD equvalente para a totaldade do domíno. O segundo termo, 1 f S pn d nt S, representa a força de arrastamento de forma (por undade de volume) que o fludo exerce sobre os elementos sóldos nserdos no escoamento (elementos de rugosdade ou outros obstáculos). Assm, nas equações MDNS os termos de resstênca devdos à nteracção entre o escoamento e os elementos sóldos surgem por aplcação drecta dos prncípos teórcos de conservação. Todava, nformação empírca será sempre necessára para caracterzar o ntegral da pressão na frontera de forma prátca. A forma mas habtual é 1 1 S pn d nt S CDU f, (9) em que C D é um coefcente de arrastamento e U é a velocdade méda (em profunddade) do escoamento na zona nterceptada pelos elementos de rugosdade. O coefcente C D pode ser determnado em laboratóro em função do número de Reynolds do escoamento médo e em função da geometra dos obstáculos sendo, portanto, ndependente da malha de cálculo. Em escoamentos com grande heterogenedade espacal e zonas de separação, os consumos de quantdade de movmento não se esgotam na Eq. (9), sendo necessáro caracterzar as tensões 6

dspersvas. Estas obtêm-se por aplcação do teorema (6) aos termos convectvos da Eq. (3) e consderando que o termo ntegral desaparece devdo à condção de não-escorregamento da velocdade nas fronteras sóldas. Smbolcamente w uu u u u u w w u u w uu (10) x x x x O prmero termo do lado dreto da Eq. (10) representa os termos convectvos MD. O termo uu representa o tensor das tensões dspersvas (ou tensões de forma). As tensões dspersvas representam, para o operador méda espacal, o que as tensões de Reynolds representam para o operador méda temporal. Assm, uu expressa o efeto sobre o escoamento médo espacal e temporal do transporte de quantdade de movmento pelas flutuações espacas da velocdade méda temporal. Aplcando a decomposção espacal, o operador méda espacal, os teoremas (6) e (7) e as propredades do operador méda espacal a todos os termos das Eqs. (3), obtêm-se as equações MDNS para regmes permanentes e para elementos de rugosdade e obstáculos móves e de forma constante no tempo u u 1 p 1 uu 1 uu 1 u g x x x x x x 1 1 u d d ( ) S pn w nt S S n nt S (11) x onde os termos ' ' f f ( ) uu, uu e w u x representam, respectvamente, as tensões de Reynolds (ou turbulentas), as tensões dspersvas e as tensões vscosas, sendo estas últmas desprezáves em escoamentos turbulentos (por smplcdade de notação omte-se a massa volúmca do fludo, expressando-se as tensões em dmensões de velocdade ao quadrado). Os termos 1 V f pn ds e V u x n ds são sumdouros de quantdade de movmento, relaconados com as f Snt forças de resstênca de pressão (ou de forma) e vscosa (por undade de volume), respectvamente. O termo de resstênca vscosa será, em geral, desprezável face ao termo de resstênca de forma. Em qualquer caso, o coefcente de arrastamento da Eq. (9) poderá expressar ambos os tpos de resstênca. Para contablzar os sumdouros de quantdade de movmento devdo ao transporte sóldo, sob a hpótese de transporte unto ao leto de pequenas quantdades de sedmentos, FERREIRA et al. (008), propuseram o termo de arrastamento adconal 1 h b (1) 1V p n ds f 0 0 C C u u dz 0 0 f s x D b p 0 S nt em que C b é a concentração de sedmentos na camada de transporte, u p é a velocdade méda temporal das partículas, h b é a espessura da camada de transporte. A equação MD de conservação da massa (equação da contnudade), de acordo com as mesmas hpóteses, escreve-se Snt 7

u x A equação de conservação MD da energa cnétca turbulenta (ECT) obtém-se da equação de conservação da ECT méda temporal por aplcação da decomposção (4) segudo da aplcação do operador méda espacal e dos teoremas (6) e (7). Desprezando a taxa de produção assocada ao transporte sóldo unto ao fundo obtém-se u u u 1 u' u' u' u' u' u' u' k u' ' x p (14) x x x é a energa cnétca turbulenta (por undade de massa), é a taxa de dsspação de ECT, u Ps u' u' (15) x é a taxa de produção de ECT devdo ao trabalho das tensões de Reynolds, u u u u Pw u' u' u' u' u' u' u' u' (16) x x x x é a taxa de produção de ECT assocada à heterogenedade espacal e 1 em que k u' u' 0 (13) 1 u' k u' ' p x (17) é a dfusão de ECT, ncorporando o gradente do fluxo de ECT e a dfusão devdo à pressão. A solução das equações MDNS (Eqs. 11) não é anda possível uma vez que não exstem anda equações de fecho para o tensor das tensões dspersvas. Uma hpótese de trabalho consste em aplcar a hpótese de Boussnesq a este tpo de tensões, por analoga ao procedmento adoptado para determnar as equações de fecho das tensões de Reynolds. Assm, se se encarar a advecção de quantdade de movmento a pequenas escalas espacas como um processo dfusvo, obtém-se u ( d ) u uu k x x 3 (18) O desafo expermental consste em determnar expressões geras para a vscosdade cnemátca ( d ) equvalente. Nas próxmas secções mostra-se trabalho empírco conducente a uma melhor caracterzação do tensor das tensões dspersvas. 3. RECOLHA DE DADOS EXPERIMENTAIS NO ÂMBITO DA METODOLOGIA MD A defnção de quantdade méda espacal e temporal, mplícta na Eq. (4), é z 1 ddd xyz V V (19) 0 em que V 0 ò A, A (ver secções 1 e.). Consderando que, na grande maora dos casos, é apenas possível obter amostras dscretas dos valores de velocdade e pressão (é o caso de medções com f 8

Acoustc Doppler Velocmeter, ADV, com velocmetra ou anemometra Laser, LDV/LDA ou com transdutores de pressão), a defnção (19) deve ser expressa em termos dscretos. Assm, propõe-se NN0( z) NN0( z) ( z) ( za ) ( z) A( z) em que Ak ( z ) é a área do subdomíno convexo x, y 0, L 0, L e tal que k k x y N0( ) (0) N( z) k 1 k k k k1 k1 k, defnda como a área de nfluênca de k, N corresponde ao número total de subdomínos e z ao número de subdomínos, à cota z, para o qual as varáves do escoamento não estão defndas. Deve notar-se que NN0 ( z) Ak ( z) Apara N0( z) 0 e que A Lx Ly é a área do domíno. k1 O prmero passo no desenvolvmento de um trabalho laboratoral consste em determnar as dmensões do domíno em que se aplcará o operador méda espacal. Dos exemplos serão desenvolvdos, a caracterzação do escoamento em zonas povoadas por vegetação emersa rígda (exemplo A) e a caracterzação do escoamento turbulento em ros de montanha suetos a transporte de area (Exemplo B). Mostra-se, na Fgura, as áreas mínmas para aplcação da metodologa MD. Fgura. Domínos para aplcação da metodologa MD. Esquerda: exemplo A, escoamento em zonas povoadas por vegetação emersa rígda (adaptado de RICARDO 008). Dreta: exemplo B, caracterzação do escoamento turbulento em ros de montanha (adaptado de FERREIRA 008). O domíno mínmo de aplcação da metodologa DM está dentfcado a vermelho. Lnhas paralelas revelam potencas planos de amostragem. No caso do exemplo A, o comprmento de onda característco será o espaçamento médo entre hastes. Menores densdades de vegetação permtrão maores domínos de aplcação do operador MD. No exemplo B não é fácl estmar o comprmento de onda característco sem recurso a uma análse espectral das rregulardades do leto. Uma estmatva expedta será x 5 10D90 em que D 90 é o dâmetro do penero que retém 10 % do peso do materal granular do leto. No exemplo B o comprmento de onda lateral poderá ser menor que o longtudnal uma vez que o escoamento é essencalmente DV, excepto na vznhança dos elementos de rugosdade. O passo segunte consste em determnar os pontos de amostragem no nteror do domíno. RICARDO (009) consttu um dos poucos trabalhos em que se procurou determnar o número sufcente e o posconamento dos pontos de amostragem, com ênfase no posconamento. O número de perfs deverá depender de uma medda da heterogenedade do escoamento, por exemplo a vortcdade. No entanto, o estado actual dos conhecmentos não permte anda o estabelecmento de regras smples. Em cada ponto 9

de amostragem deverá ser realzado um perfl de varáves do escoamento. Em cada cota ao longo desse perfl deverá ser medda uma sére temporal sufcentemente longa para que todas as escalas turbulentas seam representadas e para que a méda temporal na Eq. () tenha sgnfcado estatístco. Uma vez calculado o perfl médo das quantdades hdrodnâmcas relevantes deverá determnar-se a área de nfluênca de cada perfl, para que se possa aplcar a Eq. (0). Em geral, área de nfluênca de cada perfl é determnada pelo método dos polígonos de Voronoï centrados no ponto de amostragem (detalhes em FERREIRA 008 ou RICARDO 008). A caracterzação da função de vazos,, deverá ser feta antes do começo das medções hdrodnâmcas. Mostra-se, na Fgura 3, exemplos de ( z) num leto de um canal preparado para smular o leto de um ro de montanha sueto a almentação excessva de area. Fracção de vazos Fracção de vazos a) Altura normalzada b) Altura normalzada Fgura 3. Função de vazos correspondente ao leto do exemplo B, caracterzação do escoamento turbulento em ros de montanha. a) Leto na stuação prstna. b) Leto após a ntrodução de area e níco do transporte sóldo das fracções de area. As alturas são normalzadas pela espessura do leto (adaptado de FERREIRA 008). A determnação de ( z) pode ser feta, como prmera aproxmação, com base no DEM (modelo de elevação dgtal) do leto. Se Fb ( z ) for a função de dstrbução das rregulardades do fundo, a função de b vazos será ( z) 1 F ( ) z b z pbe bz em que pe b é uma correcção para que o valor de no fundo sea gual ao da porosdade do substrato,.e. da porosdade da regão abaxo das cotas correspondentes às cavas mas profundas do leto, e em que b é um coefcente que garante que a correcção só altera os valores no terço nferor do leto. FERREIRA (008) e RICARDO (008) mostram exemplos de medção da função de vazos. 4. APLICAÇÕES 4.1 Cálculo do coefcente de resstênca assocado a hastes emersas rígdas Com este estudo laboratoral pretendeu-se caracterzar e quantfcar o escoamento no nteror de zonas com vegetação rígda e emersa e quantfcar o coefcente de arrastamento da fórmula de resstênca hdráulca assocada às hastes (Eq. 9), relaconando-o com as varáves que caracterzam o escoamento. Reproduzu-se, em laboratóro, um sstema físco típco de planíces de nundação suetas a cheas e zonas húmdas de sapal ou uncal. Os detalhes deste estudo podem ser consultados em RICARDO (008) e FERREIRA et al. (009a). O trabalho expermental fo conduzdo no canal de recrculação e nclnação varável (CRIV) do Laboratóro de Hdráulca e Recursos Hídrcos do Insttuto Superor Técnco. O CRIV tem 1 m de 10

comprmento efectvo, 40.8 cm de largura e paredes lateras de vdro transparente que permte a fácl observação do escoamento e medções baseadas em regstos vídeo. O fundo do canal fo coberto com uma camada de area com dâmetro médo d 50 0.9 mm. Sobre a camada de area, horzontal e lsa, colocou-se, num troço de 3.1 m ao longo do canal, estacas com dâmetro d 1.1 cm que smularam caules rígdos de elementos de vegetação (Fgura -esquerda). As estacas foram colocadas no leto de area de forma aleatóra e de acordo com uma dstrbução unforme. Apresentam-se resultados referentes a um ensao laboratoral realzado com caudal gual a.33 l/s. A densdade de hastes fo m 399 hastes/m. Na secção de medção a velocdade longtudnal méda fo U 0.11 m/s, a altura méda do escoamento h 5.5 cm, o gradente longtudnal da altura do escoamento d h / dx 0.0056 e número de Reynolds assocado às hastes Rep 116. O leto encontrava-se na emnênca de movmento ncpente e era hdraulcamente de transção (YALIN 197). A velocdade nstantânea fo medda com Partcle Image Velocmetry (PIV) D em 5 posções lateras alnhadas paralelamente ao escoamento (Fgura -esquerda). Foram também realzadas medções de velocdade no plano horzontal (detalhes em RICARDO 008). O PIV utlzado caracterza-se por uma energa de 30 mj em cada pulso, emtndo no espectro verde (comprmento de onda de 53 nm) e fo operado com uma frequênca de aqusção de 15 Hz. Os traçadores consstram em partículas de Polyamde com massa volúmca gual a 1.03 g/cm 3. Aplcando a teora de HJEMFELT e MOCKOS (1996) verfca-se que a menor escala turbulenta capturada é de cerca de 40 Hz, maor que a frequênca Nyqust do PIV (7.5 Hz), pelo que os traçadores são adequados (RICARDO 008). Para a aplcação da metodologa MD usaram-se de 60 perfs obtdos a partr de nstâncas de aqusção ndependentes com 490 mapas nstantâneos em cada nstânca. Mostra-se, na Fgura 4, exemplos de posconamento dos perfs. A heterogenedade do escoamento pode ser comprovada quer na Fgura 4 quer na Fgura 5 vortcdade e lnhas de corrente nstantâneas. a) b) Fgura 4. Posconamento dos perfs para a medção de velocdades nstantâneas: a) ao longo de um plano vertcal alnhado com o escoamento (adaptado de RICARDO 009) e b) num plano horzontal (adaptado de RICARDO 009). A varável em fundo é o módulo da velocdade méda no plano (m s 1 na Fgura 4a e em cm s 1 na Fgura 4b). Na Fgura 6 apresenta-se os perfs médos das tensões tangencas de Reynolds e dspersvas, da velocdade longtudnal e das tensões normas longtudnas de Reynolds e dspersvas. Verfca-se que as tensões dspersvas não podem ser consderadas desprezáves face aos fluxos turbulentos, o que contradz a convcção até agora acete (e.g. TANINO & NEPF 008), especalmente no que dz respeto às tensões tangencas. 11

a) b) Fgura 5. a) Mapa da vortcdade nstantânea perpendcular ao plano horzontal (s 1 ). b) Lnhas de corrente num dado nstante. z = 0.95 cm em ambos os mapas (adaptado de RICARDO 009). z/h (-) uw ' ' / U; uw / U u / U u' / U ; u / U Fgura 6. Perfs vertcas das a) tensões tangencas de Reynolds ( ) e dspersvas ( ), b) da velocdade longtudnal e c) das tensões normas longtudnas de Reynolds ( ) e dspersvas ( ). A mportânca relatva das tensões dspersvas acentua-se com o aumento da densdade da vegetação (detalhes em RICARDO 008). Como consequênca, o valor do coefcente de arrastamento da Eq. (9) deve ser nfluencado pelos gradentes destas quantdades. Com efeto, a equação de quantdade de movmento méda na coluna de água e na drecção longtudnal pode rescrever-se para o cálculo de C D ' 1 1 u md U C h D U 1 u 1 g h x g h x x g h x x g h x x (1) em que representa o operador méda na coluna de água. RICARDO (008) e FERREIRA et al (009) verfcaram, com base na análse dos termos da Eq. (1), que é mportante conservar os termos convectvos e que os gradentes das tensões normas longtudnas dspersvas e de Reynolds são mportantes para explcar o aumento do valor de C com o aumento da densdade da vegetação. D 4. Estudo das alterações hdrodnâmcas resultantes da ntrodução de area em letos de sexo Neste estudo, cuos detalhes podem ser encontrados em FERREIRA (008) e FERREIRA et al (009a), pretendeu-se caracterzar as alterações nas varáves hdrodnâmcas turbulentas em resultado da ntrodução, em excesso, de fracções fnas (area) em ros de montanha. Foram reproduzdas em laboratóro 1

condções semelhantes às encontradas em meo natural, smulando três stuações dstntas, com dferentes característcas morfológcas e dferentes taxas de transporte sóldo, com o obectvo de dentfcar dferenças nas varáves hdrodnâmcas. O trabalho laboratoral decorreu no canal descrto na secção anteror. O leto, na stuação orgnal, pode ser observado na Fgura -dreta. Os prncpas parâmetros que caracterzam os ensaos compreendem o caudal, Q 3.3 ls 1, o declve do leto, 0 0.00445, o número de Froude, Fr 0.5. Os sexos do leto apresentavam um ( g ) ( g ) dâmetro médo d50 8.0 mm e um desvo padrão geométrco, 1.4. A area utlzada D ( s) d mm e um desvo padrão geométrco ( s) apresentava um dâmetro médo 50 0.9 D 1.6. Os dados de base obtdos no trabalho laboratoral compreendem campos de velocdade nstantânea, meddos com PIV, e mcrotopografa do fundo. A metodologa MD fo aplcada de acordo com os prncípos expressos na secção 3. Foram selecconados 48 perfs, meddos num domíno de 1 x 6 cm (longtudnal x lateral, Fgura -dreta), cuos valores médos foram calculados com base em séres temporas com não menos que 1000 entradas. Os perfs das grandezas médas temporas velocdades longtudnas e vertcas e tensões de Reynolds mostram-se na Fgura 7. Sublnhe-se a varabldade espacal evdencada nos perfs, em especal na regão nferor do escoamento. Fgura 7. Perfs vertcas da a) velocdade méda longtudnal, b) da velocdade méda vertcal, c) das tensões tangencas de Reynolds (adaptado de FERREIRA 008). A varabldade espacal das velocdades médas e das tensões de Reynolds é notóra na Fgura 7. Os perfs médos temporas foram ntroduzdos na Eq. (0) para o cálculo das grandezas respectvas MD. O procedmento fo aplcado aos resultados dos testes com transporte sóldo e sem transporte sóldo. A dferença mas marcada entre os ensaos com e sem transporte sóldo fo regstada nos termos de produção de ECT. Mostra-se, na Fgura 8, os perfs vertcas da taxa de produção de ECT assocada às tensões de Reynolds e a taxa de produção assocada à nteracção entre os elementos de rugosdade e o escoamento. a) b) Fgura 8. Perfs vertcas da taxa de produção de ECT a) assocada às tensões de Reynolds ( P s ) e b) assocada à nteracção entre os elementos de rugosdade e o escoamento ( P w ). Z é a coordenada vertcal, Z é a cota das crstas e é a espessura do leto. c 13

Na Fgura 8a não se regstam dferenças evdentes entre os escoamentos com e sem transporte sóldo. Todava, na Fgura 8b, é notóro que o leto da stuação prstna (sem ntrodução de area) apresenta maor produção de ECT assocada aos elementos de rugosdade. O prncpal mpacto da ntrodução de area será a redução deste tpo produção, o que está assocado a uma redução da rugosdade do leto. 5. CONCLUSÃO Fo apresentada uma metodologa de caracterzação de escoamentos trdmensonas sobre fronteras rugosas baseada na aplcação do operador Méda-Dupla espáco-temporal. As equações de conservação MD permtem o tratamento teórco da resstênca ao escoamento e não necesstam de calbração das equações de resstênca devdo à nteracção entre o escoamento e os elementos sóldos no seu seo. Mostrou-se que a metodologa MD concede uma sólda base teórca para o estudo dos parâmetros que nfluencam o coefcente de arrastamento em zonas povoadas com vegetação emersa e rígda, constatando-se que o aumento do valor das tensões dspersvas explca parcalmente o aumento do valor do coefcente de arrastamento. A metodologa MD permte anda estudar o efeto do transporte sóldo sobre as varáves hdrodnâmcas característcas de um ro de montanha. Verfca-se, macroscopcamente, que a ntrodução de fracções fnas contrbu para reduzr a rugosdade do leto. Essa observação é faclmente explcável no âmbto da metodologa MD, na medda em que se verfca que a produção da energa cnétca turbulenta assocada aos elementos de rugosdade é fortemente reduzda nos ensaos com transporte sóldo. Futuros estudos no âmbto da metodologa MD vsarão a aplcabldade da hpótese de Boussnesq para permtr a resolução numérca das equações de quantdade de movmento (MDNS). AGRADECIMENTOS Este estudo fo parcalmente fnancado pela Fundação Portuguesa para a Cênca e Tecnologa (FCT) pelo proecto PTDC/ECM/6544/006. Em memóra do Sr. Vctor Sena, técnco do laboratóro de Hdráulca do Insttuto Superor Técnco, que muto contrbuu para este trabalho. BIBLIOGRAFIA ABERLE, J., KOLL, K.A., & DITTRICH, A. 008. Form nduced stresses over rough gravel-beds. Acta Geophysca 56(3): 584-600, 008. FERREIRA, L. - Impact of Sedment Overfeedng n Gravel-Bedded Rver s Salmond Habtats. MSc thess. Insttuto Superor Técnco, Unversdade Técnca de Lsboa, 008. FERREIRA, RUI. M. L.; FRANCA, MÁRIO. J.; LEAL, J.G.A.B. - Flow resstance n open-channel flows wth moble hydraulcally rough beds, n Rver Flow 008, Altnakar et al. (eds). Vol. 1, 008: 385-394. FERREIRA, R.M.L.; FERREIRA, L.; RICARDO, A. M.; FRANCA, M.J. Imposed sand transport on gravel-bedded streams. Impacts on flow varables and consequences for salmond spawnng stes. Rver Research and Applcatons, 5(10) DOI 10.100/rra.1307, 009a. FERREIRA, RUI M. L.; RICARDO, ANA M.; FRANCA, MÁRIO J. Dscusson of 'Laboratory Investgaton of mean drag n a random array of rgd, emergent cylnders' by Hed M. Nepf and Yuke 14

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