TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 12 a CÂMARA CÍVEL Desembargador Mario Guimarães Neto APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000496-11.2007..19.0024 ORIGEM: 2 a VARA CÍVEL DA COMARCA DE ITAGUAÍ APELANTE: GRUPO HOSPITALAR DO RIO DE JANEIRO LTDA ASSIM SAUDE APELADO : REGINA CELIA VASCONCELLOS CORREA APELAÇÃO CÍVEL - DECISÃO MONOCRÁTICA - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PLANO DE SAÚDE - RELAÇÃO DE CONSUMO - RECUSA DA OPERADORA DE SAÚDE EM AUTORIZAR CIRURGIA DE URGÊNCIA, SOB A ALEGAÇÃO DE DOENÇA PREEXISTENTE E NÃO CUMPRIMENTO DO PRAZO DE CARÊNCIA - EXPRESSA RECOMENDAÇÃO MÉDICA PARA INTERNAÇÃO E REALIZAÇÃO DE CIRURGIA, ANTE O QUADRO DE INFLAMAÇÃO GRAVE DA VESÍCULA, - ATENDIMENTO EMERGENCIAL OBRIGATÓRIO ARTIGO 35-C DA LEI 9656/9 RISCO IMINENTE DE MORTE OU DE GRAVE DANO À SAÚDE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ARTIGO 14 DO CDC RESPONSABILIDADE OBJETIVA DANOS MATERIAIS REEMBOLSO DAS DESPESAS MÉDICO-HOSPITALARES - DEVIDO - DANOS MORAIS - CONFIGURAÇÃO - QUANTUM FIXADO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE - SENTENÇA QUE SE MANTÉM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS - NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO RECURSO, COM BASE NO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de ação indenizatória movida por REGINA CELIA VASCONCELLOS CORREA em face de GRUPO HOSPITALAR DO
RIO DE JANEIRO LTDA ASSIM SAUDE, objetivando a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano material e moral. Alega que em 30/06/2006 celebrou contrato de prestação de serviços de saúde com prazo de carência de 720 (setecentos e vinte) dias para tratamento de doenças preexistentes. Narra que em 22/10/2006 necessitou ser internada para a realização de uma cirurgia de emergência, em razão de um quadro de vesícula hidrópica com paredes espessadas e microcálculos, agravada por diabetes mellitus, tendo sido a autora imediatamente internada para ser submetida a procedimento cirúrgico, ante o iminente risco de vida e/ou dano irreparável à saúde. Esclarece que a ré não autorizou o procedimento cirúrgico, sob a alegação, sob a alegação de que se tratava de doença preexistente. Sentença de fls. 22/2, julgando procedente em parte o pedido para condenar a ré a pagar à autora a quantia de R$ 6.15,01 (seis mil oitocentos e quinze reais e um centavo) por danos materiais, acrescidos de correção monetária e juso de 1% ao mês a partir da data do desembolso e de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescidos de correção monetária e juros legais a contar da publicação da sentença. Apelação da ré às fls. 290/300, sustentando que o contrato celebrado entre as partes estava sob carência contratual, nos termos da Lei n. 9.656/9. Assevera que a autora faltou com o princípio da boa-fé, já que era um dever fornecer todas as informações pertinentes sobre a sua saúde, inclusive de que era portadora de doença preexistente, sendo o prazo de carência de 720 (setecentos e vinte) dias, nos termos do inciso VI, do item 13.1, da Cláusula 13 do contrato e que a cobertura para atendimento de urgência se limita às primeiras 12 horas de atendimento (Cláusula n. 10.3). Sustenta, ainda, a ausência de qualquer falha nos seus serviços hábeis a ensejar reparação por danos morais. Requer a reforma da sentença, julgando improcedentes os pedidos, ou, caso assim não se entenda, que seja reduzido o quantum indenizatório por dano moral. Contrarrazões às fls. 337/340, prestigiando a solução alvitrada. É o relatório. Decido.
Inicialmente, cumpre registrar que a relação havida entre as partes, é de consumo razão pela qual, aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor. No caso sob exame, a autora deparou-se com um quadro agudo de inflamação da vesícula (colecistite aguda abscedada com necrose de veísicula), agravado, supostamente, por diabetes, tendo necessitado ser submetida à cirurgia em caráter de emergência, consoante laudo de fls. 22, cuja autorização foi negada pela ré, sob a alegação de que a autora estava acometida de doença preexistente, devendo se submeter ao prazo de carência contratual de 720 (setecentos e vinte dias). Com efeito, verifica-se que a prova pericial (fls. 195/205) concluiu que o quadro da autora era agudo e necessitava de cirurgia de emergência, esclarecendo que nem sempre há sintomatologia prévia e quando manifestada a doença, há necessidade de que seja feito o tratamento imediato. No que tange à diabetes mellitus, ponderou o expert que a autora não tem diagnóstico seguro de ser portadora da referida moléstia, ressalvando que a elevada dosagem de glicemia poderia ser fruto de fatores externos tais como, de não estar em jejum, administração de soro fisiológico, etc. Merece destaque a resposta ao quesito n. 2 formulado pela ré (Queira o senhor perito informar se a patologias que motivaram sua internação preexistem à formação do contrato), sendo oportuna sua transcrição para fins de espancar quaisquer dúvidas a respeito da controvérsia debatida nos autos, verbis: A formação litiásica biliar é um processo lento e progressivo. Certamente esse processo se iniciou antes de a autora ter feito sua declaração de saúde, mas não existe nos autos nenhum documento que comprove que ela era sintomática naquele momento, o que faz crer que a primeira manifestação da doença se deu através da colecistite aguda em 22/10/2006. A despeito da minucioso trabalho do perito, a apelante debatese para tentar convencer que a doença da autora era preexistente e não tendo a mesma cumprido o prazo de carência, seria legítima a recusa na internação. O artigo 35-C da lei 9656/9 preceitua que é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de emergência e urgência.
Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Artigo incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24..2001) I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; e (Inciso incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24..2001) II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional. (Inciso incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24..2001) Parágrafo único. A ANS fará publicar normas regulamentares para o disposto neste artigo, observados os termos de adaptação previstos no art. 35. (Parágrafo incluído pela MPV nº 2.177-44, de 24..2001) Ressalte-se que a lei em seu inciso I, obriga a cobertura do atendimento quando houver risco imediato de vida, em qualquer circunstância, sem especificar se a doença seria pré ou pós existente. Neste sentido tem se manifestado a jurisprudência majoritária desta Egrégia Corte: AGRAVO INOMINADO. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE SEGURO SAÚDE. OBESIDADE MÓRBIDA. CIRURGIA DE REDUÇÃO DE ESTÔMAGO (BARIÁTRICA). DOENÇA PRÉ- EXISTENTE E MÁ-FÉ DO CONSUMIDOR NÃO COMPROVADAS. RISCO IMEDIATO DE VIDA OU DE LESÕES IRREPARÁVEIS PARA O PACIENTE. EMERGENCIA QUE NÃO SE SUBMETE AO PRAZO DE CARENCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Se o plano de saúde não exige o prévio exame do segurado ou comprova a má-fé do mesmo, não cabe admitir a alegação de doença préexistente como fundamento de negativa de cobertura ao tratamento de saúde. Sendo a cirurgia bariátrica a única indicada para o tratamento de obesidade mórbida, que apresenta riscos cardiovasculares imediatos ao paciente
portador de hipertensão arterial e dislipidemia, aquela não se submete ao período de carência exigido pelo plano de saúde. Hipótese de Incidência do disposto no art. 35 C da lei 9.656/9. Circunstancia em que o procedimento cirúrgico não pode se submeter a qualquer lapso temporal de tratamento, sob pena de risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis. Hipótese que se subsume ao disposto no art. 557, caput do Código de Processo Civil. Conhecimento e desprovimento do Agravo Inominado. (0095149-37.200..19.0002 - APELACAO - 2ª Ementa DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA - Julgamento: 01/02/2011 - NONA CAMARA CIVEL). Desta forma, conclui-se que a recusa na cobertura em razão da alegação de carência, foi ilegal e abusiva, motivo pelo qual deve ser mantida a condenação da ré em arcar com os danos materiais referentes ao reembolso do procedimento cirúrgico pago pela paciente. Incontestável que, ante a flagrante deficiência das ações e serviços de saúde disponibilizados pelo Poder Público, vasta parcela da população contrata os serviços prestados por planos de saúde, visando o pronto e célere acesso a tratamentos de saúde, marcação de consultas, realização de procedimentos cirúrgicos e diversos outros. Nesse sentido, injustificada e odiosa a resistência da operadora de saúde em autorizar o aludido procedimento cirúrgico, diante do grave estado de saúde da autora. Com efeito, verifica-se que houve falha na prestação do serviço, consistente na indevida recusa em autorizar o tratamento e a internação da segurada, cuja necessidade ficou constatada através dos laudos médicos que atestaram risco iminente de morte, restando configurado o dano in re ipsa, o qual prescinde de qualquer prova documental ou oral, pois se torna fácil deduzir a humilhação, o sofrimento e até a revolta, resultantes de uma necessidade desatendida. Cumpre ressaltar a inaplicabilidade da Súmula 75 do TJRJ, eis que a hipótese dos autos ultrapassa a esfera do mero aborrecimento, porquanto a recusa no atendimento praticada pelo apelante atentou contra a dignidade da parte. Neste trilhar, entendo que o quantum arbitrado pelo juízo singular no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), mostra-se justo
para compensar o gravame à honra subjetiva da requerente, eis que atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, certo que a reparação possui caráter punitivo-pedagógico, devendo, portanto, ser mantido. Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO, com base no art. 557, caput, do CPC, ante sua manifesta improcedência, mantendo-se a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. Rio de Janeiro, 12 de junho de 2012. Desembargador MARIO GUIMARÃES NETO Relator Certificado por DES. MARIO GUIMARAES NETO A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br. Data: 12/06/2012 20:14:3Local Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0000496-11.2007..19.0024 - Tot. Pag.: 6