Superior Tribunal de Justiça

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1 RECURSO ESPECIAL Nº ES (2006/ ) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE : LUCIANO DA SILVA MAYRINK ADVOGADO : LUCIANA MARQUES DE ABREU JÚDICE E OUTRO(S) RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO DE MÉDICOS SÃO PAULO - BLUE LIFE ADVOGADO : LUÍS ARMANDO VIOLA E OUTRO(S) EMENTA Civil. Ação de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Negativa ilegal de cobertura, pelo plano de saúde, a atendimento médico de emergência. Configuração de danos morais. - Na esteira de diversos precedentes do STJ, verifica-se que a recusa indevida à cobertura médica pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito daquele. Recurso especial provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 07 de outubro de 2008 (Data do Julgamento). MINISTRA NANCY ANDRIGHI Relatora Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 1 de 8

2 RECURSO ESPECIAL Nº ES (2006/ ) RECORRENTE : LUCIANO DA SILVA MAYRINK ADVOGADO : LUCIANA MARQUES DE ABREU JÚDICE E OUTRO(S) RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO DE MÉDICOS SÃO PAULO - BLUE LIFE ADVOGADO : LUÍS ARMANDO VIOLA E OUTRO(S) RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Recurso especial interposto por LUCIANO DA SILVA MAYRINK contra acórdão proferido pelo TJ/ES. Ação: de indenização por danos materiais e compensação por danos morais, ajuizada pelo ora recorrente em desfavor de ASSOCIAÇÃO DE MÉDICOS SÃO PAULO - BLUE LIFE. Segundo consta da inicial, o autor é filiado ao plano de saúde em questão. Tendo sofrido um assalto, foi ferido nas duas mãos e antebraços por disparos de arma de fogo; ao procurar atendimento médico de urgência, porém, a cobertura de seus gastos foi negada sob fundamento de que a última mensalidade ainda estava em aberto após quinze dias da data de seu vencimento. Requer a indenização pelos valores pagos de seu próprio bolso pelo atendimento, assim como fixação de compensação por danos morais, em face da angústia experimentada. Sentença: declarou nula a cláusula do contrato que autoriza a suspensão imediata de cobertura em face do atraso no pagamento da mensalidade, por afronta ao art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.656/98, segundo o qual a rescisão unilateral só pode ocorrer após sessenta dias de mora e a partir de notificação prévia, de forma a julgar procedente o pedido indenizatório. Contudo, afastou o pedido de compensação por danos morais. Acórdão: negou provimento à apelação do ora recorrente, afastando Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 2 de 8

3 novamente a compensação por danos morais, nos termos da seguinte ementa: APELAÇÃO CIVIL DANOS MORAIS CONTRATO SEGURO-SAÚDE INADIMPLEMENTO DO SEGURADO IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DO ATENDIMENTO POR FORÇA DA LEI Nº 9.656/98, ART. 13, ÚNICO, II DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS. 1. Comprovando-se nos autos, inconfundivelmente, a mora do apelante quanto ao pagamento do prêmio mensal na forma contratada, improcede o pedido de compor alegado dano moral pela recusa pro parte da seguradora em autorizar procedimentos hospitalares. 2. Não ocorre, evidentemente, a suspensão do atendimento ao segurado, por força da lei específica (Lei nº 9.656/98, art. 13, único, II) que veda a suspensão ou rescisão unilateral do contrato por inadimplência inferior a sessenta dias. 3. O ato da não autorização, entretanto, por si só, não torna evidente a concretização dos danos morais. Necessária a comprovação de ofensa à dignidade do Apelante ou de qualquer situação constrangedora, o que não sucede no presente caso. 4. Recurso improvido (fls. 172). Embargos de declaração: rejeitados. Recurso especial: alega violação aos arts. 159 do CC/16, 6º do CDC e 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.565/98, além de divergência jurisprudencial, porque evidente o dano moral sofrido, uma vez constatada a irregularidade da recusa do plano de saúde em cobrir o tratamento necessário. É o relatório. Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 3 de 8

4 RECURSO ESPECIAL Nº ES (2006/ ) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI RECORRENTE : LUCIANO DA SILVA MAYRINK ADVOGADO : LUCIANA MARQUES DE ABREU JÚDICE E OUTRO(S) RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO DE MÉDICOS SÃO PAULO - BLUE LIFE ADVOGADO : LUÍS ARMANDO VIOLA E OUTRO(S) VOTO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): Cinge-se a controvérsia, unicamente, a estabelecer a necessidade ou não de compensação por danos morais a cliente de plano de saúde que, em momento de emergência resultante de ferimento causado por arma de fogo, tem a cobertura recusada por parte do convênio. Na presente hipótese, o acórdão recorrido inicialmente consignou de forma expressa que a recusa ao atendimento foi indevida, pois o atraso de quinze dias na última mensalidade do plano não é, de acordo com as normas legais específicas (Lei nº 9.656/98), causa para tanto, na medida em que a seguradora fica obrigada a cobrir eventuais gastos pelo período de sessenta dias após o início da mora. Apesar da declaração de nulidade da cláusula contratual que permitia a imediata suspensão do atendimento a partir do primeiro dia de mora, o acórdão resolveu afastar os danos morais ao entendimento de que o ato da não autorização, por si só, não torna evidente a concretização dos danos morais. Necessária a comprovação de ofensa à dignidade do Apelante ou de qualquer situação constrangedora, o que não sucede no presente caso (fls. 175). Tal posicionamento, porém, está em dissonância com a jurisprudência do STJ, pois esta tem adotado, especificamente quanto à situação fática aqui analisada relativa ao relacionamento entre segurado e plano de saúde Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 4 de 8

5 em momentos críticos de atendimento de urgência entendimento mais elástico, no sentido de que é evidente o dano moral sofrido por aquele que, em momento delicado de necessidade, vê negada a cobertura médica esperada. Em recente precedente de minha relatoria Resp nº /DF, 3ª Turma, DJ de traçou-se um levantamento histórico da jurisprudência específica do STJ a respeito desse pedido de danos morais, ficando ali consignado que, de início, o Tribunal não reconhecia o direito à compensação, vislumbrando mero inadimplemento contratual nessas circunstâncias; porém, a partir de 2004, passou-se a adotar tese segundo a qual o dano moral pela indevida recusa em fornecer o serviço de seguro esperado pelo consumidor, em momento de extrema angústia como a que se analisa nos presentes autos, decorre diretamente desse próprio fato (...). Embora se reconheça que a regra geral, nessa matéria, seja a de que o mero inadimplemento contratual não gera, por si só, dano moral, verifica-se que, nas hipóteses como a que por ora se examina, a jurisprudência do STJ tem aberto uma exceção, pois na própria descrição das circunstâncias que perfazem o ilícito material é possível verificar conseqüências bastante sérias de cunho psicológico que são resultado direto do inadimplemento culposo. O i. Min. Jorge Scartezzini proferiu voto bastante claro nesse sentido ao julgar o Resp nº /PR, consignando na própria ementa que já tem decidido esta Corte, em casos como este 'não é preciso que se demonstre a existência do dano extrapatrimonial. Acha-se ele in re ipsa, ou seja, decorre dos próprios fatos que deram origem à propositura da ação' (4ª Turma, j. em , DJ de ) (Resp nº /DF, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de ). Na presente hipótese, estão presentes os requisitos necessários à configuração do dano moral, pois restou devidamente consignado pelo acórdão recorrido que: i) havia relação jurídica entre as partes, estando a ora recorrida obrigada a fornecer cobertura médica adequada, sem que fosse possível argüir que o tratamento requerido estava fora do âmbito de proteção contratual; e ii) o atraso de quinze dias na última parcela não era causa para a recusa ao atendimento, pois a legislação só dá esse efeito à mora do consumidor a partir do Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 5 de 8

6 prazo de sessenta dias. Sendo o quanto basta à caracterização do dano, passa a ser necessário definir o valor da compensação, o que pode ser feito nos termos do art. 257 do RISTJ. Ainda fazendo referência ao quanto decidido no citado Resp nº /DF, verifica-se que os precedentes similares ficam entre sete e cinqüenta mil reais, variação essa perfeitamente aceitável e até necessária, em face da impossibilidade de se proceder ao que seria uma espécie de 'tabelamento' dos danos morais (nesse sentido, o Resp nº /PR, de minha relatoria). Na presente hipótese, há que se considerar, em primeiro plano, o fato de que o motivo gerador do atendimento médico ferimento à bala nas mãos e braços conquanto sério, aparentemente não era gerador de risco de vida ao consumidor. Tal fato é relevante, pois as compensações mais altas têm sido reservadas aos casos de cirurgias de risco relacionadas, especialmente, a transplantes, assim como à recusa em honrar tratamentos complexos, como o relacionado ao câncer. O próprio valor dos danos materiais indenizados por determinação da sentença R$ 1.888,46 (um mil, oitocentos e oitenta e oito reais e quarenta e seis centavos), em valores de 1999, indicam que o procedimento exigido não era dos mais traumáticos. Assim, dentro dos parâmetros já definidos em casos similares, entendo justo o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais). Forte em tais razões, CONHEÇO do recurso especial e a ele DOU PROVIMENTO para condenar a ré ao pagamento do valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) a título de compensação pelos danos morais sofridos, com incidência de Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 6 de 8

7 correção monetária a partir desta data e juros de mora desde o evento danoso (Resp nº /RS). Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 7 de 8

8 ERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA Número Registro: 2006/ REsp / ES Número Origem: PAUTA: 07/10/2008 JULGADO: 07/10/2008 Relatora Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. JUAREZ ESTEVAM XAVIER TAVARES Secretária Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO AUTUAÇÃO RECORRENTE : LUCIANO DA SILVA MAYRINK ADVOGADO : LUCIANA MARQUES DE ABREU JÚDICE E OUTRO(S) RECORRIDO : ASSOCIAÇÃO DE MÉDICOS SÃO PAULO - BLUE LIFE ADVOGADO : LUÍS ARMANDO VIOLA E OUTRO(S) ASSUNTO: Civil - Contrato - Plano de Saúde CERTIDÃO Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso especial e deu-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília, 07 de outubro de 2008 SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO Secretária Documento: Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 20/10/2008 Página 8 de 8