Acordam no Tribunal da Relação de Évora
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- Geovane Pais Balsemão
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1 PN.: 859/001; AP.: TC Loulé; Ap.e2: SPIMM, ; Ap.o3 Acordam no Tribunal da Relação de Évora 1. A A. pediu que a R., reconhecido direito de servidão por destinação do pai de família, lhe restituísse o acesso do parque de estacionamento do Ed. Avenida, e daí a terreno seu; que fosse também condenada a pagar-lhe uma indemnização a liquidar em execução de sentença pelos prejuízos que lhe determina a recusa: (a) Por escritura pública, , procedeu à compra dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da Freguesia de Almancil sob os nºs 2504 (à data da escritura), 2917 e 2918, prédios que foram fisicamente unificados (constituindo uma unidade económica única), o 1º descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº 2578/180488, e os 2 últimos formando o descrito na mesma Conservatória sob o nº 2577/180488; (b) Deste conjunto, foi utilizada para construção urbana uma faixa situada do lado N., adjacente à Av. 5 de Outubro, na qual foi erguido um edifício destinado à habitação e comércio, faixa essa que foi desanexada do prédio descrito sob o nº 2577/180488; 1 ML (581.00) MM ( ) 2 Adv.: Dr.. 3 Adv.ª:. 1
2 (c) Com a construção do aludido prédio, deixou a parte restante do conjunto de ter comunicação com a via pública, que porém foi acautelada através da construção de um túnel, com portão, de acesso às traseiras do edifício, seguido de um outro portão que permite aceder ao parque de estacionamento situado logo a seguir, passagem que a A. desde sempre utilizou; (d) E tal serventia tem vindo a ser praticada, desde há mais de 40 anos, por destinação do pai de família, dado que os prédios foram pertença do mesmo titular e entre eles existem sinais aparentes de passagem para um através do outro (p. ex.: o 2º portão); (e) Não obstante a R. procedeu à mudança das fechaduras do portão do túnel e do cadeado do 2º portão, o que impede agora a A. de passar para o parque de estacionamento referido, que para além do mais é parte comum do condomínio de que também faz parte. 2. Na contestação, impugnada a versão da A. (apenas procedeu à mudança das fechaduras, porque estavam danificadas, e as chaves estão à disposição da parte contrária na sede da Administração, nenhum dos condóminos as retendo), a R. alegou ainda que o terreno daquela confronta a N. com o arruamento constante da descrição 5921/170194, Almancil, arruamento que irá ser efectuado de acordo com as previsões do plano de pormenor da localidade. 3. No saneador, foi proferida a decisão recorrida, julgando improcedente qualquer dos pedidos: (a) Inexistem os requisitos de que a lei faz depender a constituição de servidão predial por destinação do pai de família; (b) Na verdade, basta confrontar os documentos juntos ao requerimento inicial da providência cautelar apensa com o requerimento da oposição ocorrida na mesma para concluir que, no momento da desanexação da parcela de terreno em que foi construído o Ed. Avenida, já a A. havia outorgado com a Câmara Municipal de Loulé em escritura de doação, onde, para além do mais, dispôs a favor desta de uma parcela de terreno destinada a arruamento público (não 2
3 podendo ser afectada a outro fim, e situada nas traseiras do Ed. Avenida), a destacar do prédio onde este foi construído; (c) Tal parcela destinada a arruamento veio depois a ser efectivamente destacada e constitui agora o prédio descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº05921/170194; (d) E é este que confronta hoje, pelo lado S., com o terreno que permanece na propriedade da A., e pelo lado N., com o estacionamento contíguo ao Ed. Avenida; (e) Claramente se retira por conseguinte que no momento em que se procedeu à divisão dos prédios a A. apenas acautelou o acesso à parte que continuava a pertencer-lhe exclusivamente através da entrega à Câmara Municipal da parcela de terreno de construção do arruamento; (f) Por outro lado, há que dar por assente, em face da posição da R. não impugnada pela A., que o acesso ao parque de estacionamento nunca lhe esteve vedado; (g) Não há que responsabilizar a R., deste modo, pelos prejuízos alegados. 4. Concluiu a recorrente: (a) Verifica-se, desde o momento da separação dos prédios, a existência dos sinais visíveis e permanentes da servidão por destinação do pai de família; (b) A existência de tais sinais (túnel e 2º portão) não poderá ser interpretada e apreciada de per si, isoladamente, mas sim em conjunto e complementarmente, tendo em conta a vontade da Ap.e na constituição dessa servidão; (c) Ao tempo da separação dos prédios, com a desanexação, passou a não existir nos documentos respectivos qualquer declaração oposta à constituição de servidão, presumindo-se que recorrente e recorrida quiseram perpetuar esse encargo, e cabendo a prova de contrariedade a quem nega a servidão; (d) Mas a recorrida nenhuma prova disso fez; (e) A sentença violou o art. 1549º CC; 3
4 (f) Deve ser revogada, na parte em que julgou improcedente o pedido de reconhecimento do direito de servidão por destinação do pai de família, e na parte em que denegou a indemnização. 5. Nas contra-alegações disse-se: (a) A pretensão da Ap.e é infundada, porque não se encontram preenchidos os requisitos legais do art. 1549º CC, e que permitam a constituição de uma servidão por destinação do pai de família; (b) Na verdade, não foi vontade da Ap.e a constituição de tal servidão, aquando da separação dos prédios; (c) E o túnel de acesso ao estacionamento, bem como o portão implantado na vedação deste, no seu conjunto, não constituem sinais de qualquer servidão; (d) É que o único e exclusivo fim do túnel é permitir o acesso dos condóminos do Ap.o ao parque de estacionamento do Ed. Avenida; (e) Ora, esse parque de estacionamento foi construído por exigência camarária, em local cedido pela Ap.e à Câmara Municipal de Loulé, precisamente para tal fim; (f) Aliás, no Plano de Pormenor de Almancil já foram demarcados todos os acessos quer ao prédio da Ap.e, quer aos prédios contíguos, não existindo qualquer prédio encravado; (g) Por outro lado, o prédio da Ap.e para além de ser beneficiado, nesse Plano de Pormenor, por um acesso próprio, tem, como sempre teve, acesso sem qualquer dificuldade pelas traseiras do mesmo, e agora, pelo lado Poente (como foi demonstrado nas fotografias juntas4); (h) É por conseguinte infundada a pretensão da Ap.e, que em boa verdade se destina a obter que materiais de construção e futuros moradores do prédio que vier a construir passem pelos limites da propriedade do Ap.o; (i) É falsa, em todo o caso, a alegada necessidade de acesso ao armazém onde a Ap.e guarda produtos perecíveis, porque o mesmo nunca foi licenciado para esse ou qualquer outro fim; 4
5 (j) E ainda, mesmo que por mera hipótese académica se admita que alguma vez tivesse sido licenciado, o certo é que aquele foi demolido por ordem da Ap.e, em ; (k) Bem como é falsa a alegada necessidade de acesso ao prédio da Ap.e através do túnel para tratar de plantas e colher frutos, pois existe acesso nas traseiras por onde aquela sempre acedeu, e na parte lateral, a Poente do prédio da Ap.e; (l) Aliás, a maior parte das árvores foram derrubadas por instruções da Ap.e; (m) O Ap.o, por fim, não determinou quaisquer prejuízos à Ap.e; logo, não existem danos a indemnizar; (n) Deve manter-se inteiramente a sentença recorrida. 6. O recurso está pronto para julgamento. 7. Deve ter-se como assente, em face dos documentos juntos e das posições das partes: (a) Por escritura notarial de compra e venda, , 1º C. Not. Loulé, fls.111vo/113vo, Lv.191B, a A. procedeu à compra dos seguintes prédios: (1) prédio urbano, inscrito na matriz predial de Almancil sob o art. U-8400 (anterior 2504), descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº02578/180488, composto, à data, por uma construção urbana térrea para comércio, com dois compartimentos e superfície coberta de 92m2, mais logradouro com área de 1400m2; (2) Prédio urbano térreo, para habitação, com vários compartimentos e superfície coberta de 80m2, mais logradouro de 1085m2, inscrito na matriz, à data, sob o nº2917, descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº2577/180488; (3) Prédio urbano térreo, com um compartimento para indústria, com a área de 15m2, inscrito na matriz, à data, sob o art. 2918, também descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº2577/180488; 4 Doc. junto com as contra-alegações, e aceite. 5
6 (b) Deste conjunto, foi entretanto utilizada para construção urbana, uma faixa situada ao N., adjacente à Av. 5 de Outubro, tendo sido levantado um edifício destinado à habitação e comércio, constituído em regime de propriedade horizontal (Ed. Avenida, concluído em ) o qual veio a constituir o prédio descrito na C. Reg. P. Loulé sob o nº05.918/170194, resultante de desanexação do prédio descrito sob o nº02577/180488; (c) Após esta desanexação, a parte sobrante do conjunto ficou a constituir os prédios descritos sob os nºs 02577/ e 02578/180488; (d) Anteriormente à construção do Ed. Avenida, o conjunto dos prédios confinava a N. com a Av. 5 de Outubro; (e) Com a construção deixou a parte sobrante de ter confrontação directa com essa via; (f) Porém a ligação à via pública foi directamente acautelada, tendo sido construído um túnel de acesso às traseiras do Ed. Avenida, a que se segue um parque de estacionamento; (g) Ao parque corresponde a descrição predial sob o nº5920/ Almancil, da C. Reg. P. Loulé: prédio rústico, com área de 179m2, destinado a estacionamento, Nasc. e outro, S. Autora; com inscrição da aquisição a favor de Câmara Municipal de Loulé; (h) Mas este parque de estacionamento, de exigência legal e regulamentar, encontra-se separado do resto do terreno do conjunto inicial por meio de uma vedação em rede, com abertura de outro portão, já que o túnel também tem um; (i) A A. sempre utilizou, desde a construção do edifício, o acesso através do túnel e dos portões, para passagem de pessoas, utensílios, ferramentas e equipamentos diversos, também produtos perecíveis, usados no giro comercial de um dos sócios (pasteleiro); (j) Por outro lado, no dito terreno sobrante do conjunto inicial existem diversas árvores de fruto, nomeadamente laranjeiras e outros citrinos, que sempre foram tratadas e regadas pela A., e que até ao presente têm dado frutos, colhidos; 6
7 (k) Sobretudo a A. pretende dar de imediato destino ao terreno em causa, em termos de proceder à urbanização do mesmo; (l) E só depois das obras que esta implicará poderá passar a haver outro acesso à via pública, nos termos do projecto a aprovar; (m) Todavia, a R., no dia , procedeu à mudança de fechadura do portão do túnel de acesso às traseiras do Ed. Avenida e do cadeado e corrente relativos ao outro portão por onde se acede do parque de estacionamento ao terreno sequente; (n) Por escritura pública, , celebrada perante um notário privativo da Câmara Municipal de Loulé,, na qualidade de sócios gerentes da A., declararam fazer doação à edilidade (que disse aceitar) de duas parcelas de terreno, uma com a área de 169m2, a N., destinada a estacionamento e zona pública, e outra, com área de 145m2, nas traseiras, destinada a arruamento público, não podendo ser afecta a qualquer outro fim, ambas a destacar de um talhão de terreno para construção urbana, com a área de 1180m2, sito em Almancil, omisso na matriz, confrontando do N. com a R. 5 de Outubro, Po. com Francisco Gonçalves e outro, Nasc. com e S. com a A.; (o) A 2ª parcela referida na escritura em causa, está descrita presentemente sob o nº5921/ Almancil, C. Reg. P. Loulé: prédio rústico, com área de 145m2, destinado a arruamento, Nasc., N. estacionamento, Po. e outro, S. Autora; com inscrição da aquisição em favor da Câmara Municipal de Loulé. 8. Não pode dar-se como assente, como na sentença recorrida se fez, que não houve impedimento à passagem da A. para o parque de estacionamento, e manifestamente foi constituída uma servidão de passagem para o mesmo, como a parte contrária aceita, sem dúvida. Porém tal circunstância demonstra ser irrelevante, porque a A. pretende é passar depois através do parque de estacionamento para o terreno contíguo a este, onde 7
8 projecta construir, e passar com todos os materiais, pessoas e utensílios necessários à obra. Ora, está claro também que entre o parque de estacionamento, de propriedade da Câmara Municipal de Loulé, e o prédio onde a A. previu o empreendimento urbanístico existe outro prédio, também pertença da edilidade, destinado a futuro arruamento. Como bem se defende na decisão recorrida, nestas circunstâncias, claudica de todo a pretensão da A.. Na verdade, não houve destinação do pai de família, mas no momento da construção do Ed. Avenida a previsão de que, para além do parque de estacionamento, outra via de acesso e ligada à rede viária, seria implantada em benefício do prédio a urbanizar. A A. disponibilizou a desanexação e largou mão tanto do parque de estacionamento como da faixa em causa, que se constituíram como novos prédios, potenciando o desencravamento, visto numa estrita relação com o edifício urbano que ocupa a linha de confrontação com a Av. 5 de Outubro. É por ela que deve pois obter a passagem que todavia intenta conseguir também a partir do túnel do Ed. Avenida. Mas a R. está numa posição de extraneidade em relação ao problema, não podendo aceitar-se, em face das alegações da recorrente, e por isso mesmo que o novo prédio se destinou a integrar a malha de circulação urbana, que a passagem não é possível senão pelo acesso que pretende ver aberto. Assim, improcedem os argumentos recursivos, já que como dissemos, na economia da lide, o acesso ao parque de estacionamento é objectivo dispiciendo. 9. Atento o exposto, visto o art. 1549º CC, decidem manter inteiramente a sentença recorrida. 10. Custas pela Ap.e, sucumbente. 8
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