PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado ROBERTO OLIVEIRA VINTURA. ACORDAM, em 1ª Câmara Criminal Extraordinária do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores NUEVO CAMPOS (Presidente) e HERMANN HERSCHANDER. São Paulo, 10 de março de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: São Paulo Apelante: Ministério Público Apelado: Roberto Oliveira Vintura VOTO Nº Apelação. Falsificação de selo ou sinal público. Pleito almejando a condenação do apelado. Reconhecimento de firma adquirido de forma que inibe dúvidas quanto à sua ilicitude. Acervo probatório farto e robusto, suficiente à condenação. Provido. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público contra sentença de primeiro grau (fls. 218/221), prolatada em 25 de julho de 2011, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Érika Soares de Azevedo Mascarenhas, da 6ª Vara Criminal da Comarca da Capital, que absolveu ROBERTO OLIVEIRA VINTURA do delito tipificado no art. 296, 1º, I, do Código Penal. Irresignado, o membro do parquet interpôs recurso de apelação visando à condenação do apelado, ante a robustez do acervo probatório. Em suas contrarrazões, o apelado bateuse pelo acerto do decisum, salientando ter acreditado na Apelação nº

3 idoneidade do reconhecimento da firma. A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer, endossou as razões ministeriais, opinando pelo provimento ao apelo. É o relatório. Consoante ponderáveis fundamentos bem lançados nas razões recursais, o apelo ministerial comporta provimento, merecendo reforma a r. decisão atacada. Segundo descreve a denúncia, no dia 7 de abril de 2009, o apelado dirigiu-se até o Cartório de Vila Prudente almejando reconhecer a firma de Richard Alex Schlicht, contudo, diante da fila de espera, contratou os serviços de um desconhecido, que se apresentou como Lourival, a quem pagou R$ 30,00 pela autenticação da assinatura. Ato contínuo, o apelado seguiu até o Centro de Atendimento ao Contribuinte da Delegacia de Administração Tributária da Receita Federal, onde foi constatada a falsificação do reconhecimento da assinatura. A materialidade e a autoria delitiva restaram amplamente demonstradas no decorrer da instrução processual, conforme provas documentais e testemunhais, todas produzidas em perfeita consonância, restando de rigor a condenação do apelante. O contador Rubenilson Alves de Melo relatou (fls. 189/190) que o apelado desempenhava a função de auxiliar administrativo em seu escritório de contabilidade, sendo incumbido de providenciar a documentação necessária à abertura, alteração e encerramento de empresas. Em relação ao Apelação nº

4 caso em tela, disse ter tomado conhecimento a partir da intimação para prestar declarações perante a autoridade policial, não sabendo afirmar, ao certo, o que ocorreu. Por fim, salientou que o apelado permanece trabalhando em seu escritório, sendo bom funcionário e deveras honesto. A testemunha Edna Lúcia Brito Zucato pouco colaborou para a elucidação dos fatos, cingindo-se (fl. 191) aos bons antecedentes do apelado. O apelado, em seu interrogatório (fls. 194/196), esclareceu ter ido ao Cartório de Vila Prudente para saber onde estava registrada a assinatura de Richard, sendo que, nas dependências da repartição, conheceu um sujeito de prenome Lourival, o qual se apresentou como auxiliar de despachante e disse que poderia descobrir o cartório e reconhecer a firma no documento, tudo pelo adimplemento de R$ 30,00. Cerca de uma hora depois, Lourival encontrou-se novamente com o apelado e lhe entregou o documento com a assinatura reconhecida, o qual foi protocolizado perante a Receita Federal. Somente após 40 dias o apelado tomou ciência da falsificação do reconhecimento de firma, quando retornou a sede da Receita Federal. As peças informativas do procedimento nº / (fls. 09/32), instaurado pelo Ministério Público Federal, são suficientes à materialidade delitiva, certificando a falsidade da autenticação contida no documento acostado a fl. 13. Muito embora devidamente demonstradas a Apelação nº

5 autoria e materialidade delitiva, foi proferido decreto absolutório pautado na ausência de prova da autoria da falsificação referida na denúncia e não demonstração do dolo do agente. Entretanto, não agiu com o costumeiro acerto o magistrado a quo, posto o delito capitulado pelo art. 296, 1º, I, do Código Penal se configura pelo simples uso do selo ou sinal falsificado, pouco importando, para tanto, a quem tenha sido imputada a contrafação. Dessa feita, sendo ou não autor da falsificação, a conduta do apelado em apresentar à Receita Federal documento no qual estava aposto o falso selo é típica, sendo suficiente à configuração do mencionado delito. No mesmo passo, o dolo também é evidente, porquanto, conforme exaustivamente mencionado pelas provas orais, o apelado desempenha a função de auxiliar administrativo, sendo incumbido de providenciar a documentação necessária à abertura, alteração e encerramento de empresas, demonstrando, de forma inequívoca, ser conhecedor do procedimento lícito para obtenção de reconhecimento de firma. Conforme se verifica, o apelado realiza, reiteradamente, procedimentos de regularização de empresas, perante repartições públicas, nos moldes legalmente previstos. Entretanto, no caso em tela, recorreu ao meio inidôneo, adquirindo a falsa autenticação, frise-se, sem nem mesmo aguardar na fila do cartório, tampouco falar com o tabelião ou outro funcionário daquela unidade. Apelação nº

6 Com efeito, sendo o apelado familiarizado aos trâmites administrativos, não se demonstra crível não lhe ter despertado mínima desconfiança o procedimento deveras simplório, através do qual obteve a falsa autenticação. Não obstante, segundo afirmou em seu interrogatório, o pagamento do valor acordado foi realizado no ato e, após uma hora, Lourival trouxe o documento autenticado. Evidentemente, o apelado deve ter anotado algum contato desse sujeito ao qual entregou o documento e o dinheiro, até mesmo como garantia de restituição. Todavia, é de se estranhar não ter o apelado trazido aos autos qualquer prova como endereço, telefone ou nome completo que possibilitasse a localização do suposto sujeito autor da falsa autenticação. Tais fatores sinalizam não só o descrédito da versão defensiva, como a presença de dolo na conduta do apelado, ao conscientemente socorre-se de meio irregular para a obtenção do reconhecimento da assinatura de Richard. Dessa feita, de rigor, a condenação do apelado, devidamente respaldada no farto e harmônio conjunto probatório coligido na fase instrutória, fixando a reprimenda da seguinte forma: Na primeira fase, uma vez inexistentes circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em seu mínimo legal, totalizando 2 anos de reclusão, cujo regime aberto demonstra-se adequado, bem como ao pagamento de 10 diasmulta, no piso legal, tornando-a definitiva ante a ausência de Apelação nº

7 agravantes e atenuantes ou causas de aumento e diminuição. Por fim, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, concedo a substituição por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, por igual prazo, e prestação pecuniária no valor de um salário mínimo em favor de entidade assistencial, a ser designada pelo juízo das execuções criminais. Ante o exposto, dou provimento ao apelo ministerial, para condenar ROBERTO OLIVEIRA VINTURA, como no art. 296, 1º, I, do Código Penal, à pena de 2 anos de reclusão, e pagamento de 1 dias-multa, no piso legal, a qual substituo por penas restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, por igual prazo, e pagamento de um salário mínimo em favor de entidade assistencial, a ser designada pelo juízo das execuções criminais. SOUZA NUCCI Relator Apelação nº