PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito nº , da Comarca de Santo André, em que é recorrente JOSÉ LUIZ DOS SANTOS, é recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso, nos termos do v. acórdão. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), OSNI PEREIRA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 10 de março de Guilherme de Souza Nucci PRESIDENTE E RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Recurso em Sentido Estrito nº Comarca: Santo André Recorrente: JOSÉ LUIZ DOS SANTOS Recorrido: Ministério Público VOTO Nº Recurso em Sentido Estrito. Homicídio simples. Pleito defensivo de absolvição sumária por legítima defesa. Excludente demonstrada. Acusado, responsável pela segurança de estabelecimentos na região, foi acionado em razão de brigas iniciadas pela vítima embriagada, que o golpeou com um pedaço de pau, resultando em sérios ferimentos, foi alvejada com três disparos de arma de fogo. Testemunha presencial confirma a versão defensiva. Recurso provido. Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pela douta defesa de JOSÉ LUIZ DOS SANTOS, contra decisão (fls. 218/221), prolatada em 19 de fevereiro de 2014, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Milena Dias, da Vara do Júri da Comarca de Santo André, que pronunciou o recorrente como incurso no art. 121, caput, do Código Penal. Irresignada, a defesa interpôs o presente recurso (fls. 235/238), pleiteando, em síntese, a absolvição sumária por legítima defesa. Em suas contrarrazões (fls. 241/242), o Ministério Público se bateu pelo acerto do decisum, reiterando Recurso Em Sentido Estrito nº

3 manifestação anterior, consoante art. 2º, caput do Ato nº. 536/2008-PGJ-CGMP. A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer (fls. 260/262), endossou as razões ministeriais, opinando pela manutenção da decisão do juízo a quo. É o relatório. Devidamente processado, o pleito comporta provimento, merecendo reforma a r. decisão atacada. A materialidade restou comprovada pela recognição visuográfica (fls. 9/18), pelo laudo de exame necroscópico (fls. 80/81) e laudo pericial do local do crime (fls. 116/120). A autoria, por sua vez, restou comprovada e nem mesmo o acusado nega a prática delitiva, sendo que confessou judicialmente ser o autor dos disparos, porém sua alegação de legítima defesa é comprovada pela única testemunha presencial. Consoante descreve a denúncia, no dia 7 de agosto de 2011, por volta das 19h11min, na Estrada do Pedroso, altura do n.º 280, Vila Luzita, na cidade e comarca de Santo André, José Luiz dos Santos, mediante disparos de arma de fogo, matou a vítima Paulo Ferreira de Alvarenga. Segundo consta, o acusado prestava serviço de vigilância para os comerciantes do bairro e, na noite dos fatos, foi avisado por um dos proprietários dos estabelecimentos que a vítima estaria alcoolizada e importunando-os. Recurso Em Sentido Estrito nº

4 Chegando ao local dos fatos, iniciou-se uma discussão entre as partes, o que culminou em agressões físicas recíprocas. Embora ferido, o acusado conseguiu desferir três disparos de arma de fogo contra o ofendido que, apesar de socorrido com vida, não sobreviveu aos ferimentos. Diversos comerciantes do local foram ouvidos em juízo e todos afirmaram ser o recorrente boa pessoa e prestar serviços gerais na região. Quanto aos acontecimentos, apenas puderam narrar os comentários feitos no bairro, no sentido da vitima estar embriagada no dia dos fatos, causando problemas aos comerciantes, que prontamente chamaram José Luiz. Segundo ficaram sabendo a vítima atacou o recorrente com um pedaço de pau, ferindo-o gravemente na cabeça, nesse momento, para se defender teria atirado contra o ofendido. A única testemunha presencial, Fabio Ferreira Barros, afirma, tanto na delegacia, quanto em juízo, que possui uma Lan House na rua dos fatos e, por volta das 19h, fechava seu comércio, quando percebeu o acusado se atracando com outra pessoa, a uns 10 metros de onde estava. Pôde perceber que o recorrente tentava tirar algo da cintura da vítima, porém não soube precisar do que se tratava. Assim que conseguiu retirar o objeto, o ofendido apanhou um pedaço de madeira e partiu para em direção de Jose Luiz. Nesse momento, temendo por sua integridade física, a Recurso Em Sentido Estrito nº

5 testemunha retornou ao seu comércio, ficando no corredor, onde escutou disparos de arma de fogo. O acusado, por sua vez, reafirma em juízo o narrado na delegacia, onde admite os disparos, porém alega que foram efetuados em legítima defesa. Segundo narra, pediu para a vítima se retirar do local e que parasse de incomodar os comerciantes e clientes, esta se negou e acabaram por entrar em vias de fato. Durante a contenda, percebeu que, na cintura do ofendido estava uma arma e conseguiu retirá-la antes dele, momento que foi atingido por um caibro de madeira, culminando em um ferimento de 10cm em sua cabeça (laudo de lesão corporal de fl. 94). Para conter as fortes agressões acabou por efetuar os disparos. Assustado com o ocorrido, evadiu-se do local e, depois de alguns dias, apresentou-se na delegacia. Desse modo, a excludente de ilicitude alegada é confirmada pela única testemunha presencial e, até mesmo pelo ferimento da vítima. Assim, nos termos do art. 415, do Código de Processo Penal, a absolvição sumária está demonstrada, não havendo prova do crime doloso contra a vida. Nesse sentido vimos defendendo: A possibilidade de o magistrado togado evitar que o processo seja julgado pelo Tribunal Popular está de acordo com o espírito da Constituição, visto ser a função Recurso Em Sentido Estrito nº

6 dos jurados a análise de crimes contra a vida. Significa que a inexistência do delito faz cessar, incontinenti, a competência do júri. Estando o juiz convencido, com segurança, desde logo, da licitude da conduta do réu, da falta de culpabilidade ou da inexistência do fato ou de prova de autoria, não há razão para determinar que o julgamento seja realizado pelo Tribunal Popular. Não fosse assim e a instrução realizada em juízo seria totalmente despicienda. Se existe, é para ser aproveitada, cabendo, pois, ao magistrado togado aplicar o filtro que falta ao juiz leigo, remetendo ao júri apenas o que for, por dúvida instransponível, um crime doloso contra a vida. 1 1 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. RJ Forense. 13ª Ed., Art. 415, p Recurso Em Sentido Estrito nº

7 Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso defensivo, para absolver sumariamente o acusado, nos termos do art. 415, IV, do Código de Processo Penal. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Recurso Em Sentido Estrito nº