PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante CLERIDE LAURIANO BERTACO sendo apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao apelo defensivo, mantendo-se, in totum, a r. sentença atacada, por seus próprios e jurídicos fundamentos. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores NEWTON NEVES (Presidente sem voto), ALBERTO MARIZ DE OLIVEIRA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 13 de dezembro de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: São Paulo Apelante: CLERIDE LAURIANO BERTACO Advogada: Daniela Singer Carneiro de Albuquerque VOTO Nº Apelação Apropriação indébita Afastamento da majorante relativa à profissão Fragilidade probatória Inocorrência Palavra das testemunhas em consonância às demais provas carreadas Acervo probatório seguro, farto e robusto Condenação mantida Improvido. Trata-se de recurso de apelação interposto por CLERIDE LAURIANO BERTACO contra sentença de primeiro grau (fls. 145/150), prolatada em 23 de abril de 2009, pelo MM. Juiz de Direito, Dr. Augusto Antonini, da 14ª Vara Criminal da Capital, que o condenou a pena de 1 anos e 4 meses de reclusão, em regime aberto, cumulados ao pagamento de 13 dias-multa, no piso legal, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, em igual prazo, e prestação pecuniária, no valor de 2 saláriosmínimos, em favor da empresa vítima, declarando-o incurso no art. 168, 1º, III, do Código Penal. Irresignado, interpôs recurso de apelação (fls. 158/167), objetivando absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, o afastamento da causa de aumento relativa Apelação nº

3 ao ofício, emprego ou profissão. Em suas contrarrazões (fls. 169/173) o Ministério Público bateu-se pelo acerto do decisum, salientando a suficiência das provas para condenação e a correta fixação da reprimenda. A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer (fls. 178/181), endossou as contrarrazões ministeriais, opinando pelo improvimento ao apelo. É o relatório. Em que pesem os ponderáveis fundamentos lançados nas d. razões recursais, o apelo defensivo não comporta provimento, merecendo subsistir a r. decisão atacada. Consoante descreve a denúncia, em 27 de outubro de 2005, na Rua Egídio Alves da Costa, n. 406, o apelante apropriou-se de computador notebook, marca Acer, pertencente a empresa Helmain Brasil Indústria e Comércio Ltda., de que tinha posse em razão da profissão. A materialidade e autoria delitiva restaram amplamente demonstradas no decorrer da instrução processual, conforme provas testemunhais, todas produzidas em perfeita consonância, restando de rigor a condenação do apelante. A vítima Christian Artur Hanssen esclareceu (fls. 109/110) que adquiriu o computador fazendo o primeiro contato com o próprio réu sendo que 15 dias após receber percebeu que não estava funcionando a contento, pelo que telefonou para ele visando o conserto; o réu então mandou Apelação nº

4 um motoboy retirar o equipamento; outros dez dias se passaram e novos contatos foram feitos, tendo o depoente percebido que haveria dificuldade para obter o conserto pretendido; somente após um mês o acusado disse que pretendia devolver o dinheiro pago porque não tinha condições de promover os necessários reparos; vários outros contatos foram buscados com o acusado e num determinado momento o depoente já não mais conseguia localizá-lo; não recebeu o equipamento de volta nem o dinheiro pago por ele. De igual forma, a testemunha Alexandre Souza Bispo acrescentou (fls. 141/142) que trabalha na empresa 'Dexpress' há cerca de 4 anos; tal empresa prestava serviços de entrega e coleta de materiais diversos, cujo proprietário é o réu aqui presente, que ora reconhece, inclusive porque já fez entrega e coleta de materiais ao próprio réu; realmente, em data que não se recorda, retirou o aparelho de notebook da empresa 'Helmain Brasil Indústria e Comércio Ltda.' e o entregou na empresa 'BLC Brasil Ltda' nas mãos de Rerison Lemes Bertaco, filho do réu, para conserto, conforme nota fiscal que passou pelas mãos do depoente. A testemunha Rerison Lemos Bertaco, filho do apelante e sócio da empresa BLC Brasil Ltda., (fl. 140) reconheceu a assinatura de fls. 37 como sendo sua; afirma que tal documento de fls. 37 refere-se a um serviço de transporte praticado por um motoboy contratado pela empresa do depoente, o qual não sabe precisar qual era. O apelante, em seu interrogatório (fls. Apelação nº

5 74/75 e 144), declarou que à época dos fatos, era proprietário da empresa denominada `BFC Brasil` e de fato vendi um notebook da marca Acer para a empresa `Helmain Brasil Ind. Com. Ltda.`; o referido notebook teria apresentado problemas técnicos e como minha empresa não prestava assistência técnica, mas apenas comercializava os produtos de informática, ficava a cargo do comprador remeter o produto adquirido para a rede autorizada; de fato a empresa `DXRESS` - empresa de motoboys prestava serviço para minha empresa, mas em nenhum momento determinamos a retirada de referido aparelho na empresa `Helmain`; na delegacia de polícia o motoboy inicialmente dizia que não teria retirado o notebook, sendo que posteriormente apareceu um boleto copiado a fls. 37, cujo endereço estranhamente está preenchido à mão; na data mencionada no boleto de fls. 37 a empresa `DXPRESS` prestou um serviço para minha empresa no município de Osasco,onde talvez tivesse demorado o número de horas constante neste boleto; a empresa `Helmain` emitiu uma nota fiscal contra nossa empresa, quando na verdade esta nota fiscal deveria ter sido emitida contra a empresa que iria prestar a assistência técnica, isto para ficar legal perante o Fisco; nego com veemência prática do delito descrito na denúncia; o documento copiado a fls. 37 efetivamente foi assinado pelo meu filho, mas como o endereço foi lançado à mão e posteriormente, não teria como afirmar qual serviço teria sido prestado pela nossa empresa; fui processado pelo delito de estelionato e fui absolvido. Com efeito, restou isolada e desamparada a Apelação nº

6 versão do apelante, o qual não trouxe aos autos quaisquer fatores capazes de alicerçar a variante. A vítima Christian asseverou ter confiado o microcomputador ao motoboy Anderson, conveniado à empresa do apelante, visando o reparo do aparelho. O motoboy Anderson confirmou a retirada do equipamento, bem como sua entrega na sede da empresa do apelante, recebido, em mãos, pelo filho deste, Rerison. Rerison, por sua vez, reconheceu sua assinatura no boleto de entrega do microcomputador, contudo sem recordarse a qual objeto se referia. Diante do quadro, inexistem dúvidas quanto ao recebimento do microcomputador pela empresa do apelante, visando o reparo do equipamento. Não obstante, possível depreender, inclusive, ter o aparelho danificado chegado às mãos do apelante, o qual, por sua vez, percebendo serem os defeitos irreparáveis, comprometeu-se a devolver o dinheiro pago porque não tinha condições de promover os necessários reparos, consoante afirmou Christian. Com efeito, rechaçada a aventada hipótese de responsabilização objetiva do apelante quanto ao eventual desaparecimento do aparelho dentro das dependências de sua empresa, porquanto, diante do quadro, irrefutavelmente o microcomputador foi recebido e avaliado diretamente pelo apelante. Também sem razão o pleito de afastamento da causa de aumento, prevista no inciso II, do 1º do art. 168, sobre a qual vimos entendendo: Ofício, emprego ou profissão: a apropriação, quando cometido por pessoas que, por conta das suas atividades Apelação nº

7 profissionais de um modo geral, terminam recebendo coisas, através de posse ou detenção, para devolução futura, é mais severa. Por isso, o autor merece pena mais severa 1. In casu, o apelante recebeu o equipamento danificado visando, exclusivamente, a efetuação de reparos e posterior devolução à vítima, estando patentemente caracterizada a incidência da causa de aumento. Dessa feita, de rigor, a condenação do apelante, e o reconhecimento de incidência da mencionada causa de aumento, devidamente respaldada no farto e harmônio conjunto probatório coligido na fase instrutória. De tal sorte, amplamente demonstradas autoria e materialidade do delito, irreprochável a condenação do apelante como incurso na conduta delitiva prevista no art. 168, 1º, III, do Código Penal, restando de rigor a manutenção integral do decisum, cuja reprimenda aplicada demonstra-se adequada, escorreita e razoável, inclusive no tocante a benéfica substituição concedida. Ante o exposto, nego provimento ao apelo defensivo, mantendo-se, in totum, a r. sentença atacada, por seus próprios e jurídicos fundamentos. SOUZA NUCCI Relator 1 NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, RT. 10ª Ed., p Apelação nº