TERCEIRA CÂMARA CÍVEL RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL Nº 74587/ CLASSE II COMARCA DE RONDONÓPOLIS

Transcrição

1 APELANTE: COMPANHIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO IPIRANGA APELADO: FORDIESEL COMÉRCIO DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA. Número do Protocolo: 74587/2006 Data de Julgamento: EMENTA RECURSO DE APELAÇÃO - DESPEJO - POSTO DE GASOLINA - CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEL - INADEQUAÇÃO DA MEDIDA - PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTOS CONTRADITÓTIOS - VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM - RECURSO IMPROVIDO. O contrato de locação é meio pelo qual distribuidora e revendedora se valem para a concretização dos seus reais objetivos, que são a distribuição, compra e venda de combustível. Daí a se concluir que a ação de despejo não é o meio adequado para desconstituir todas essas avenças. Além do mais, a opção do apelante pelo exercício do direito de acesso ao judiciário para pleitear uma tutela específica, de obrigação de fazer, confirma a sua intenção de dar continuidade ao contrato firmado, de modo a obstaculizar comportamentos tendentes a sua desconstituição. Vedação que se relaciona ao princípio que proíbe atitudes contrárias - venire contra factum proprium. Fl. 1 de 5

2 APELANTE: COMPANHIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO IPIRANGA APELADO: FORDIESEL COMÉRCIO DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. GUIOMAR TEODORO BORGES Egrégia Turma: Cuida-se de Recurso de Apelação interposto por Companhia de Petróleo Ipiranga S.A. de decisão que julgou extinta, sem análise de mérito, por ausência de interesse processual, a Ação de Despejo por Infração Contratual proposta em desfavor da apelada Fordiesel Comércio de Derivados de Petróleo Ltda.. A sentença considerou que o contrato de sublocação, objeto do pedido, constitui, na verdade, um conjunto de relações jurídicas e pactos vinculados a outros instrumentos contratuais, fato que, em última análise, afasta a utilidade da ação de despejo. Alega a apelante que a ação de despejo é medida adequada para promover a decretação da rescisão contratual e o despejo do apelado, por infringência da cláusula de exclusividade perpetrada no instrumento. Diz que a sublocação do imóvel estava condicionada ao cumprimento das cláusulas contratuais, dentre as quais destaca a obrigatoriedade da sublocatária em adquirir somente produtos com a bandeira Ipiranga. Pede o provimento do recurso a fim de afastar a preliminar de falta de interesse e, no mérito, o julgamento da lide para que seja decretada a rescisão do contrato de sublocação firmado entre as partes e determinado o despejo da apelada por infração contratual. Em contra-razões, a apelada defende, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido, e, no mérito, pugna pelo improvimento do recurso. É o relatório. Fl. 2 de 5

3 VOTO EXMO. SR. DES. GUIOMAR TEODORO BORGES (RELATOR) Egrégia Turma: A preliminar argüida pela apelada tem a ver com o próprio mérito da demanda, e como tal será analisada. Os fatos podem ser assim resumidos: a ora apelante, Companhia de Petróleo Ipiranga S/A, pactuou com a apelada, Fordiesel Comércio de Derivados de Petróleo Ltda., contrato destinado à comercialização de produtos combustíveis fabricados e/ou distribuídos exclusivamente por ela, apelante. Para dar azo à consecução do negócio, as partes firmaram um contrato de locação do imóvel onde iria funcionar o Posto de Serviço Ipiranga. Em virtude da alegada quebra de exclusividade assumida, a apelante ingressou com Ação de Cumprimento de Obrigações Contratuais, ação essa que se encontra conexa a outras duas, uma Medida Cautelar e uma Ação de Rescisão Contratual c/c Perdas e Danos e Lucros Cessantes, estas de autoria da apelada. O caso envolve, como se vê, uma relação jurídica travada entre a distribuidora de combustível e seu revendedor. A distribuidora que, por força de lei, não pode vender diretamente combustível ao público, loca o imóvel e depois o subloca, como parte de um acordo complexo, cuja principal função é a compra e venda de combustíveis. Pois bem, o apelante alega que o descumprimento do contrato de exclusividade dá ensejo, igualmente, ao despejo da sublocatária. Resta saber, portanto, se diante da relação jurídica entabulada entre as partes, cujo objeto principal não está na locação do imóvel, mas na distribuição, compra e revenda de combustíveis da apelante, seria o despejo, nos moldes da Lei 8.245/91, a ação adequada para a satisfação da pretensão da apelante. Fl. 3 de 5

4 Embora haja, realmente, um contrato de sublocação, tal instrumento não passa de meio pelo qual as partes se valeram para consecução dos seus reais objetivos, que era o de revender o combustível junto o público consumidor. Daí a razão pela qual o simples despejo da sublocatária não seria o suficiente para a composição da lide instaurada. Como ficariam, no caso, as avenças relativas ao contrato revenda, que é o objeto principal da relação instaurada entre as partes? A providência jurisdicional invocada passa, necessariamente, pela resolução dos conflitos atinentes a esse contrato. Tanto é verdade, que a própria apelante é autora de uma ação ordinária de obrigação de fazer, em que busca o cumprimento, pela apelada, das cláusulas objeto da avença, principalmente a que determina a aquisição de combustível exclusivamente da distribuidora. Assim o paradoxo: como cumprir o contrato se o despejo se concretizar? Daí se ver que o despejo aqui seria, realmente, inútil ao fim colimado pela empresa distribuidora. Falta-lhe interesse. Basta lembrar que para ter interesse processual, a parte deve ter necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático (NERY & NERY, CPC Comentado, 9ªed., p. 436). Além do mais, a opção do apelante pelo exercício do direito de acesso ao judiciário para pleitear uma tutela específica, de obrigação de fazer, confirma a sua intenção de dar continuidade ao contrato firmado, de modo a obstaculizar comportamentos tendentes a sua desconstituição. Trata-se de vedação relacionada ao princípio que proíbe atitudes contrárias - venire contra factum proprium. Posto isso, nego provimento ao recurso. É como voto. Fl. 4 de 5

5 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. ERNANI VIEIRA DE SOUZA, por meio da Turma Julgadora, composta pelo DES. GUIOMAR TEODORO BORGES (Relator), DES. ERNANI VIEIRA DE SOUZA (1º Vogal) e DR. AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR (2º Vogal convocado), proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, IMPROVERAM O RECURSO. Cuiabá, 09 de julho de DESEMBARGADOR ERNANI VIEIRA DE SOUZA - PRESIDENTE DA DESEMBARGADOR GUIOMAR TEODORO BORGES - RELATOR GEACOR Fl. 5 de 5