A ESTRATÉGIA DO HEZBOLLAH NA GUERRA CONTRA ISRAEL

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1 2006/08/02 A ESTRATÉGIA DO HEZBOLLAH NA GUERRA CONTRA ISRAEL Não é possível saber-se que avaliação faziam as Forças Armadas israelitas sobre as capacidades militares do Hezbollah, quando o Primeiro Ministro Olmert decidiu considerar o sequestro de dois soldados israelitas e a morte de mais oito, por forças desse movimento no dia 11 de Julho, como um acto de guerra e, a partir daí, reagir em conformidade, retaliando com ataques aéreos e um bloqueio geral ao Líbano. Pelos relativamente reduzidos progressos que a campanha militar israelita teve até ao final de Julho, muito ao invés dos sucessos militares a que as Forças Armadas de Israel nos tinham habituado no passado, conclui-se que Israel ou foi surpreendido por uma inesperada resistência ou tinha antecipadamente concluído ter que alterar radicalmente a tradicional estratégia de procura de uma vitória rápida e decisiva. Qualquer que seja a situação, o Hezbollah conseguiu até agora o que nenhum adversário de Israel tinha conseguido até hoje em confrontos militares, o que significa que se preparou cuidadosamente para o conflito em que se encontra envolvido e que, de algum modo, provocou criando um facto a que Israel, muito previsivelmente, nunca iria deixar de reagir energicamente. Tentaremos ver, noutra altura, que motivações o terão levado a desencadear esta algo inesperada crise. De momento, apenas pretendo referir à estratégia militar que montou para este confronto. Como não podia deixar de ser, não é uma estratégia de vitória. Escusado será explicar que isso não estaria nunca ao seu alcance. É, sobretudo, uma estratégia de resistência e prolongamento do conflito que, mais tarde, perante uma eventual ocupação militar do Líbano pelo Exército israelita, poderá evoluir, se necessário, para a instalação de um clima de insurreição, misturando guerrilha com terrorismo; experiência não lhe falta, depois dos 18 anos em que enfrentou a presença israelita, tendo acabado por conseguir pôr-lhe termo, depois de a confinar a uma área relativamente pequena. Até ao momento, conseguiu mais do que sobreviver aos pesados bombardeamentos da Força Aérea israelita, quer mantendo um constante ritmo de ataques com mísseis a território israelita, quer envolvendo-se em operações terrestres, como foi, por exemplo, o caso da emboscada que montou no passado dia 27 de Julho, provocando 8 mortos e 22 feridos entre as forças israelitas. Embora quase sem provocar baixas com o ataque de mísseis conseguiu paralisar a vida nas localidades mais afectadas e sujeitar as suas populações a um penoso regime de vida em abrigos subterrâneos que não se esperava ser capaz de provocar. Obviamente, não devem restar quaisquer dúvidas à liderança do Hezbollah que a correlação de forças acabará por ditar um desfecho militar que lhe reduzirá drasticamente, senão mesmo totalmente, a sua capacidade combatente. Espera, porém, protelar o mais possível esse desfecho, resistindo à ofensiva, voltando aos ataques com mísseis sempre que possível e fazendo subir o preço (em número de baixas sofridas) da inevitável vitória israelita. Para essa finalidade, o Hezbollah tentará obrigar os israelitas a envolverem-se num combate próximo, nas imediações da rede de fortificações em que assenta o eixo central da sua estratégia de defesa. As suas forças não farão, portanto, uma guerra de movimento; lutarão onde se encontram, entregues a si próprias, isto é, contando apenas com a sustentação logística que organizaram localmente, para não ficarem dependentes de linhas de abastecimento com o exterior. Procurarão tirar partido do facto de estarem instaladas no terreno de uma forma que muito dificultará aos israelitas evitarem danos colaterais; contam, aliás, que fazendo prolongar a campanha e levando os israelitas a destruírem cada vez mais estarão a virar a opinião pública mundial contra a causa de Israel ou pelo menos diminuir as simpatias de que ainda pode beneficiar. Presume-se que tenham montado um dispositivo em profundidade, calculando que Israel quererá penetrar em território libanês para além do rio Litani, pelo menos cerca de mais 20 quilómetros para norte, ao longo da costa se, de facto, pretender controlar toda a área de onde Israel possa ser

2 atacado com mísseis. Quando confrontadas com a impossibilidade de continuar a resistir, recuarão o necessário para preservar a capacidade de subsequentemente lançarem uma luta de guerrilha e acções de terrorismo que, mais uma vez, torne muito difícil uma eventual ocupação militar pelo Exército de Israel e que desencoraje a implantação de uma força multinacional. Para este fim e também para se reconstituir e rearmar, contarão com uma implantação social na população libanesa que é muito forte e profunda e os apoios que não lhe serão negados, quer daí, quer a nível internacional, dos seus dois principais apoiantes (Irão e Síria). Até que ponto vai ter sucesso esta estratégia é o que veremos nos próximos dias, talvez dentro dos 10 a 14 dias de que falam os responsáveis israelitas para resolver a situação. No final, como se referiu acima, com mais ou menos dificuldades, o previsível é que Israel consiga desferir um duro revés nas capacidades militares do Hezbollah. Infelizmente, isso não vai ser sinónimo directo da solução do problema de fundo que se vive no Médio Oriente; até é bem possível que venha a originar um recrudescimento do sectarismo e afastamento das partes em relação a uma solução política que seja realmente duradoira. 99 TEXTOS RELACIONADOS: 2012/08/26 EGIPTO. DA PRIMAVERA ÁRABE PARA A PRIMAVERA ISLÂMICA 2012/07/02 UM GOVERNO DE TRANSIÇÃO PARA A SÍRIA? 2012/06/12 INTERVIR MILITARMENTE NA SÍRIA? 2012/05/31 A ENCRUZILHADA EGÍPCIA 2012/05/23 AS DECLARAÇÕES FINAIS DA CIMEIRA DE CHICAGO 2012/05/05 A CIMEIRA DE CHICAGO E O RELACIONAMENTO TRANSATLÂNTICO 2012/03/28 A DESPESA COM AS FORÇAS ARMADAS E A LINGUAGEM DOS NÚMEROS João Pires Neves[1] 2012/03/24 A CIMEIRA DE CHICAGO: RUMO AO FUTURO Pedro Santos Jorge[1] 2012/02/20 O QUE PODE SALVAR ASSAD NO CURTO PRAZO 2011/12/21 A TURQUIA E A ARÁBIA SAUDITA PERANTE A CRISE SÍRIA 2011/11/16 QUE DEVE SER FEITO EM RELAÇÃO AO IRÃO? 2011/09/23 PALESTINA, O ESTADO 194º DAS NAÇÕES UNIDAS?

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