A INTERFERÊNCIA DA PRODUÇÃO VERBAL NA APLICAÇÃO DO AUTISM BEHAVIOR CHECKLIST EM CRIANÇAS AUTISTAS VERBAIS E NÃO VERBAIS
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- Giuliana Peres Ferrão
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1 A INTERFERÊNCIA DA PRODUÇÃO VERBAL NA APLICAÇÃO DO AUTISM BEHAVIOR CHECKLIST EM CRIANÇAS AUTISTAS VERBAIS E NÃO VERBAIS Ana Carina Tamanaha, Márcia Regina Fumagalli Marteleto, Jacy Perissinoto Departamento de Fonoaudiologia Universidade Federal de São Paulo Palavras chave: Transtorno Autista Linguagem - Comunicação INTRODUÇÃO Os quadros clínicos que compõem os Distúrbios do Espectro Autistico caracterizam-se por prejuízos severos e persistentes nas áreas de interação social, comunicação verbal e não verbal e repertório restrito de interesses e atividades. (1,2) Dentre essas condições encontram-se o Autismo Infantil, a Síndrome de Asperger e os Transtornos Globais do Desenvolvimento Sem Outra Especificação. Diversos são os instrumentos utilizados para identificar e caracterizar crianças pertencentes a esses transtornos. O Autism Behavior Checklist (ABC), por exemplo, é uma listagem de comportamentos não adaptativos (3) traduzido e pré-validado para Língua Portuguesa, (4) que busca identificar crianças pertencentes ao espectro autístico. Permite a descrição detalhada das características comportamentais atípicas de cada indivíduo. Incorpora pontuações balanceadas (faixa de 1 a 4 pontos), que variam de acordo com a ocorrência de cada comportamento na patologia. Contempla diversas áreas do desenvolvimento: Sensorial (9), Relacional (12), Uso do Corpo e Objeto (12), Linguagem (13) e Pessoal-Social (11). As características comportamentais que com exatidão descrevem o indivíduo são marcadas e na seqüência os pontos são somados. A partir da pontuação geral, um perfil comportamental é traçado, o que permite ao clínico analisar a severidade da patologia e o acompanhamento do desenvolvimento de seus pacientes. Quanto maior for a pontuação, ou seja, a quantidade de comportamentos observados, maior também será o grau de severidade do quadro. Uma pontuação igual a 68 tem sido considerada de alta probabilidade para classificação do Autismo Infantil, visto que no estudo realizado originalmente (3), 99% das crianças que atingiram pontuação igual ou acima de 68, tinham esse diagnóstico prévio. Entre 67 e 54 pontos, há moderada probabilidade de classificação; e entre 53 a 47 pontos, a probabilidade é baixa, e neste caso, os autores recomendam o uso das outras partes que compõem o ASIEP-2 (Autism Screening Instrument for Educational Planning-2), de onde o ABC se origina, com caráter diagnóstico.
2 Embora seja usado amplamente na literatura, alguns estudos têm apontado para interferência dos itens que caracterizam a produção verbal, no grau de severidade observado no resultado final. (4,5,6,7) Ou seja, o fato da área da Linguagem ser composta por 13 itens, dos quais 7 caracterizam as inabilidades verbais, em seus aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos, tais como: uso inadequado de pronomes; fala monótona e sem ritmo; raramente usa eu ou sim ; usa de 0 a 5 palavras diariamente; repete constantemente, palavras ou sons; repete frases e perguntas ditas por outras pessoas; usa mais que 15 e menos que 30 frases diariamente para comunicar-se, haveria interferência no resultado geral uma vez que as crianças autistas verbais comparativamente às não-verbais, pontuariam mais. (4,5) Sendo assim, o objetivo deste estudo é verificar a interferência da produção verbal na aplicação do ABC, comparando crianças autistas não verbais e verbais. A hipótese que consideramos neste estudo é a de que apesar dos itens da área da Linguagem contemplarem alguns comportamentos não adaptativos verbais, isto não deve interferir diretamente na pontuação final, visto que as inabilidades nas demais áreas decorrentes de prejuízos sociais e cognitivos serão identificadas mais freqüentemente, pelos cuidadores de crianças não-verbais. METODOLOGIA Trata-se de um estudo transversal (CEP n 0585/09) cuja amostra foi constituída por 68 crianças autistas, de ambos os sexos, na faixa etária entre 3 a 12 anos, diagnosticadas por equipe multidisciplinar de acordo com os critérios do DSM IV Tr (1) e atendidas no Núcleo de Investigação Fonoaudiológica de Linguagem Oral da Criança e Adolescente Transtornos Globais do Desenvolvimento (NIFLINC-TGD) do Depto de Fonoaudiologia da UNIFESP ou Associação Amigos dos Autistas (AMA-SP). O Autism Behavior Checklist foi aplicado em forma de questionário e respondido em forma de entrevista para minimizarmos o efeito de escolaridade das mães. Para análise dos resultados as crianças foram divididas em dois grupos: 28 crianças não verbais (Grupo GANV) e 40 crianças verbais (Grupo GAV). Método Estatístico Para análise dos dados foi utilizada medidas descritivas e o Teste T - Student para compararmos os escores médios dos grupos, tanto nos valores totais, quanto em cada uma das áreas do ABC.
3 RESULTADOS Tabela 1 Valores Totais e das áreas do ABC em ambos os grupos ABC Sensorial Relacional Uso do Corpo Linguagem PessoalSocial Total GANV Média 13,03 21,57 17,10 8,96 13,96 74,28 DP 6,18 8,31 8,02 3,28 4,67 19,46 Média 11,6 19,27 16,05 15,92 14,77 77,62 GAV DP 6,65 8,13 8,63 6,33 4,49 25,28 p valor 0,37 0,26 0,60 0,00 0,47 0,54 Os grupos GANV e GAV não diferiram entre si nos escores Total, e nas áreas Sensorial, Relacional, Uso do Corpo e Objeto e Pessoal Social. Somente na área Linguagem o GV apresentou média significantemente maior (p = 0,000). Ao excluirmos todos os comportamentos desta área as médias dos valores totais e das áreas não mostraram diferença estatisticamente significante (p = 0,44). DISCUSSÃO Todas as mães puderam identificar os comportamentos não adaptativos de suas crianças, independentemente da presença ou ausência de comunicação verbal. O cuidado em relação aos pais seja proporcionando-lhes acolhimento, orientação ou transformando-os em parceiros na atuação clínica, é fator fundamental e complementar ao atendimento da criança, especialmente por acreditarmos que os pais são fatores de proteção para o desenvolvimento infantil. (4,8,9,10,11) Além disso, a adesão dos pais na identificação das habilidades e inabilidades de suas crianças pode diminuir a sobrecarga emocional visto sob estresse parental, uma vez que permite a eles uma melhor compreensão da dinâmica social e comunicativa dos sujeitos pertencentes aos Distúrbios do Espectro Autistico. (7,11,12,13,14) Na análise dos resultados propriamente ditos, não houve diferença estatisticamente significante entre os valores totais do ABC dos grupos GANV e GAV. O mesmo ocorreu nas áreas: Sensorial, Relacional, Uso do Corpo e Objeto e Pessoal Social, embora os índices das três primeiras áreas tenham mostrado tendência de maiores valores no GANV. Somente na área Linguagem o GAV apresentou média significantemente maior (p = 0,000). Salientamos que nesta área a presença da verbalização ou de atipias relacionadas à fala aumenta a pontuação, sem distinguir ambas as situações. Sendo
4 assim, crianças autistas falantes podem apresentar índices maiores, ainda que a sua produção verbal nem sempre seja funcional. (3,5,6,7,11,17) Ou seja, a simples presença de verbalização não garante à criança autista verbal o engajamento e a sustentação dialógica, pois sua produção muitas vezes é constituída apenas por uso inadequado de pronomes, segmentos de fala ecolálica, idiossincrasias, assuntos perseverativos. (7,8,9,10,11,17) Ao excluirmos os comportamentos da área da Linguagem, as médias dos valores totais e das demais áreas não mostraram diferença estatisticamente significante. (6,7,11,15,16) Provavelmente, por ter havido tendência de maior severidade do GANV, especialmente nos valores das áreas Sensorial, Relacional e Uso do Corpo e Objeto. Os índices de ambos os grupos mantiveram-se equivalentes (p= 0,44), demonstrando, portanto que a interferência da pontuação dos itens verbais da área da Linguagem do ABC não comprometeu o resultado final da testagem. Ou seja, confirmamos a hipótese deste estudo ao observarmos que apesar dos itens da área da Linguagem contemplarem alguns comportamentos não adaptativos verbais elevando a pontuação de crianças falantes, isto não interferiu diretamente na pontuação final, visto que as inabilidades nas demais áreas decorrentes de prejuízos sociais e cognitivos foram reconhecidas e identificadas pelos cuidadores das crianças não-verbais. CONCLUSÃO As crianças com Distúrbios do Espectro Autístico, tanto não verbais como verbais, apresentaram comportamentos atípicos demonstrando prejuízo severo no desenvolvimento adaptativo. As crianças verbais apresentaram maior pontuação na área da Linguagem, mas não necessariamente maior comprometimento. Ao excluirmos todos os comportamentos desta área as médias dos valores totais e das demais áreas não mostraram diferença estatisticamente significante entre os grupos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. American Psychiatric Association Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM IV-Tr. Porto alegre, Artes Médicas, American Speech-Language-Hearing Association. Guidelines for Speech- Language Pathologists for diagnosis, assessment, and treatment of autism spectrum disorders across the life span. acessado: www. asha.org/members
5 3. Krug D A; Arick J R; Almond P J Autism screening instrument for educational planning ASIEP 2, Pro-ed, Austin, Marteleto MRF; Pedromônico MRM Validity of Autism Behavior Checklist (ABC): preliminary study. Rev Bras Psiquiatr, 27 (4): , Miranda-Linné FM, Melin L. A comparison of speaking and mute individuals with autism and autistic-like conditions on the Autism Behavior Checklist. J Autism Dev Disord. 2002, 27 (3): Miilher LD, Fernandes FDM. Uso do Autism Behavior Checklist em crianças com distúrbios psiquiátricos. Anais do XV Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia. Gramado, RS, Marteleto MRF, Tamanaha AC, Perissinoto, J. Estudo comparativo entre crianças autistas não verbais e verbais no Autism Behavior Checklist: a interferência da produção verbal. Anais do XIX Congresso Brasileiro de Psiquiatria. Brasilia DF, Fernandes FDM. Terapia de Linguagem em crianças com Transtornos do Espectro Autístico In Ferreira LP; Befi-Lopes DM; Limongi SCO (Org). Tratado de Fonoaudiologia, Roca, São Paulo, 2004: Pedromonico MRM. O desenvolvimento da comunicação e da linguagem no autismo In Perissinoto J (Org) Conhecimentos essenciais para atender bem a criança com autismo. Pulso, São José dos Campos, 2003: Perissinoto J. Linguagem da criança com autism In Perissinoto J (Org) Conhecimentos essenciais para atender bem a criança com autismo. São José dos Campos, Pulso. 2003: Tamanaha AC, Perissinoto J, Chiari BM. A evolução da criança autista baseada na resposta materna ao Autism Behavior Checklist. Pró Fono, 4:99-101, Rutter M. Resilience in the face of adversity. Brit J Psychiatr. 1985, 147: Favero MAB, Santos MA. Autismo e estresse familiar: uma revisão sistemática da literature. Psicologia: Reflexão e Crítica. 2005, 18 (3): McConachie H; Randle V; Hammal D; Le Couteur A. A controlled trial of a training course for parents of children with suspected autism spectrum disorder. J Pedriatr, 147: , Bildt A, Sytema S, Ketelaars C, Kraijer D, Volkmar F, Minderaa R. Measuring pervasive developmental disorders in children and adolescents with mental retardation. J Autism Dev Disord. 2003, 33 (6): Bildt A, Sytema S, Kraijer D, Sparrow S, Minderaa R. Adaptative functioning and behavior problems in relation to level of education in children and adolescents with intellectual disability. J Intelect Disabilities Res. 2005, 49 (9): Marteleto MRF, Tamanaha AC, Perissinoto J, Chiari BM. Aplicação do inventário do comportamento autista ABC: a concordância na análise das observações entre pais e profissionais em dois contextos de intervenção. Rev Bras Psiquiat. 23:567-69, 2008
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