O IMPACTO DOS DISTÚRBIOS DE DESENVOLVIMENTO DE LINGUAGEM NA APRENDIZAGEM NOEMI TAKIUCHI*
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- Sara Alencar Amaro
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1 O IMPACTO DOS DISTÚRBIOS DE DESENVOLVIMENTO DE LINGUAGEM NA APRENDIZAGEM NOEMI TAKIUCHI* * Professora Adjunta da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Doutora em Semiótica e Linguística Geral pela FFLCH USP, Coordenadora do Comitê de Linguagem da Infância e Adolescência da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia. O desenvolvimento de linguagem e a aquisição de uma língua nas crianças constituem-se como processos surpreendentes. Em trinta e seis meses de vida o desenvolvimento linguístico ainda não está completo, mas a maioria das crianças já domina a língua materna em seus aspectos fonológico, semântico-lexical, morfológico, sintático e pragmático, sendo capazes de se engajar em conversas com interlocutores adultos e de se fazer compreender. Esse domínio se torna ainda mais surpreendente se considerarmos que as crianças desenvolvem linguagem e aprendem uma língua sem qualquer tipo de instrução formal, e sem esforço para essa aprendizagem. Além disso, apesar das grandes variações ambientais a que são expostas, inclusive do ambiente linguístico, na maioria das crianças essas variações não afetam a competência lingüística. Porém, o desempenho pode se mostrar diverso, e a variabilidade na aquisição dentro de um continuum de normalidade tem sido descrita pelos estudiosos em linguagem como a norma desse processo. Essa naturalidade no processo de desenvolvimento da linguagem associada à grande variabilidade na aquisição dos principais marcos linguísticos provoca na comunidade leiga e mesmo nos profissionais de saúde e educação, uma postura de tranqüilidade em relação a esse processo. Para um grupo de crianças, no entanto, o processo de desenvolvimento de linguagem não transcorre de maneira tão tranquila, apesar de apresentarem desenvolvimento adequado em todas as outras áreas. Para elas, toda a complexidade da linguagem torna-se um grande problema a solucionar com os desafios da percepção e produção da fala, as dificuldades de comunicação e de significados compartilhados, ou o domínio da gramática e a necessidade de utilizar a linguagem com criatividade. O quadro apresentado por esse grupo de crianças é chamado de Distúrbio Específico de Desenvolvimento da Linguagem. Na epidemiologia dos distúrbios de
2 desenvolvimento na infância, caracteriza-se como um dos quadros mais prevalentes, afetando de 5 a 10% das crianças em idade pré-escolar. Na sala de aula, o domínio da linguagem e da língua enquanto código se constituem como principal meio para ensinar e aprender, além de a aprendizagem acontecer como uma atividade social, mediada também pela comunicação. O papel da linguagem oral na escola não se limita às bases para o desenvolvimento da leitura e da escrita, mas se estende para o acesso a todo o currículo e o desenvolvimento global da criança. É esperado que uma criança inicie o ensino fundamental com capacidade de compreender muitas das informações que recebe, de se expressar com clareza, de compartilhar seus sentimentos e tornar suas necessidades conhecidas. Este nível de proficiência em fala, linguagem e comunicação é crítico para o desenvolvimento cognitivo, social e emocional da criança. Estudos têm comprovado repetidamente a relevância do falar e do ouvir como elementos da prontidão para a aprendizagem. Crianças com distúrbios de fala, linguagem e comunicação podem apresentar dificuldades na aprendizagem e no acesso ao conteúdo curricular. Estudos longitudinais também indicam que, na ausência de suportes adequados, essas crianças podem manifestar quadros persistentes com impactos abrangentes também no desenvolvimento emocional e social, e menores oportunidades acadêmicas e profissionais na vida adulta. Atrasos de linguagem, frequentemente por desvantagem socioeconômica, também constituem riscos para o início da educação formal. Vocabulários reduzidos e desconhecimento de estruturas sintáticas mais elaboradas podem tornar a aprendizagem de conceitos e a compreensão de informações um grande desafio. A identificação de problemas de desenvolvimento pelo profissional ou mesmo pela família da criança parece depender de vários aspectos. Quanto maior a gravidade da alteração do desenvolvimento de uma criança, maior é a facilidade e rapidez de sua identificação pelo profissional de saúde. Um outro aspecto se refere à área na qual a alteração se manifesta. Assim, alterações do desenvolvimento motor são mais facilmente identificáveis do que alterações de linguagem e cognitivas. No entanto, estas últimas têm maior correlação com o prognóstico do futuro desenvolvimento. Embora as deficiências graves possam ser reconhecidas ainda na infância, distúrbios de linguagem não são comumente diagnosticados antes dos quatro anos de idade. Da mesma forma, distúrbios de aprendizagem raramente são identificados antes do ingresso da criança na escola. Alguns estudos sugerem que os profissionais podem estar sub-identificando crianças com dificuldades de comunicação, principalmente os casos menos graves.
3 Dificuldades persistentes de linguagem tornam essas crianças muito vulneráveis em relação à educação, representando risco para problemas também na aquisição de leitura/escrita e para baixo rendimento acadêmico. Níveis aumentados de frustração, falta de compreensão, e inabilidade para acompanhar o currículo podem resultar em comportamento agressivo e dificuldades emocionais como consequência, como também falha em compreender outras crianças e adultos. Crianças com distúrbios específicos de desenvolvimento de linguagem também apresentam dificuldades quanto ao desenvolvimento social e emocional. Essas dificuldades parecem estar relacionadas a fatores como frustração, rejeição pelos pares, problemas de auto-estima devido ao distúrbio de linguagem. Muitas crianças com distúrbios de fala e linguagem apresentam estilo de interação social mais isolado, com menos iniciativa comunicativa, brincam mais isoladas ou com poucos parceiros, e são menos populares que seus pares na classe. Na adolescência e idade adulta, as dificuldades apresentadas podem levar a menores oportunidades acadêmicas e profissionais, com redução da capacidade de promover o autos-sustento, problemas de autoestima e risco aumentado para o desajuste social e a delinquência, assim como para problemas psiquiátricos como a depressão ou distúrbios de comportamento. As dificuldades sociais e comportamentais não são problemas de curto prazo para as crianças com distúrbios de fala e linguagem. Ao contrário, as dificuldades sociais parecem aumentar, demonstrando o impacto duradouro do distúrbio e justificando o desenvolvimento de instrumentos e procedimentos de identificação bem como de intervenção precoce dessas crianças, a fim de minimizar as conseqüências e proporcionar uma competência em linguagem que possibilite seu pleno desenvolvimento e inserção social.
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