Regressão do tipo II em estudos de crescimento relativo de Brachyura (Crustacea, Decapoda)
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- Giuliana Marreiro Ximenes
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1 Regressão do tipo II em estudos de crescimento relativo de Brachyura (Crustacea, Decapoda) 1 Introdução Carlos Eduardo Rocha Duarte Alencar 1 Fúlvio Aurélio de Morais Freire 1, 2 Historicamente desde a década de 40 (Huxley & Teissier 1936) o estudo alométrico, também chamado de crescimento relativo, foi realizado ostensivamente em Brachyura, pela necessidade de entender os primeiros passos da história natural e pela grande importância ecológica e sócio-econômica (recurso pesqueiro artesanal e industrial) deste táxon. Desde então, o crescimento relativo é calculado pela relação alométrica (y=ax b ) a partir da dimensão padrão (largura da carapaça) e outra dimensão como variável dependente (medidas da ca rapaça, abdomen, pleópodos; Hartnoll 1974). Para a equação logaritimizada (ln y= ln a + b ln x) o ajuste linear utilizado geralmente é o OLS (Ordinary Least Square ou, regressão do ti po I) e a comparação entre retas era analisada por uma análise de Covariância (ANCOVA). Recentemente, Warton et al. (2006) indentificaram pontos fundamentais no ajuste e comparação de retas em estudos alométricos, destacando as diferenças entre regressões lineares tipo I e tipo II, a ineficiência do ajuste pela regressão linear tipo I em estudos alométricos e, a inapropriedade da ANCOVA para comparação de retas. Logo, estas proposições levam a questionamentos sobre o impacto desses resultados na história natural dos organismos que possuem avaliações alométricas, principalmente os Brachyura que possuem uma extensa e sólida base matématica aplicada a sua biologia e ecologia. O objetivo deste trabalho foi comparar os resultados de crescimento alométrico ontogenético em Brachyura através dois métodos: regressão do tipo I (OLS) e regressões do tipo II (Reduced major axis) e suas implicações ecológicas utilizando dados do braquiúro Ucides cordatus coletados no estuário do Rio das Conchas, Rio Grande do Norte, como exemplo. 2 Materiais e Métodos 2.1 Coleta de dados 1 Grupo de Estudos em Ecologia e Fisiologia de Animais Aquáticos GEEFAA, Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN. carlosce2002@gmail.com 2 Núcleo de estudos em Biologia, Ecologia e Cultivo de Crustáceos NEBECC, Universidade Estadual Paulista UNESP 1
2 Amostras mensais do caranguejo-uçá, Ucides cordatus foram coletadas durante um ano, no período de novembro de 2009 a outubro de 2010, no estuário do Rio das Conchas, Porto do Mangue, litoral norte do Estado do Rio Grande do Norte, Brasil ( ,8 S; ,2 O). A identificação dos caranguejos baseou-se em Melo (1996) e a distinção do sexo dos indivíduos foi realizada baseando-se na observação da forma do abdome (estreito, para machos e largo, para fêmeas) e no número de pleópodos (2 pares em machos e 4 pares em fêmeas). Para cada caranguejo coletado foram tomadas as seguintes medidas biométricas, utilizando-se um paquímetro de aço (0,01 mm): largura, comprimento e altura da carapaça LC, CC e HC; largura do abdome LA; comprimento, largura e altura do própodo do quelípodo maior CPQ, HPQ e LPQ; comprimento do gonopódio para machos CG1. Para as medidas tomadas dos quelípodos foram adotados sempre os quelípodos maiores. Nos casos de homoquelia, para as fêmeas foram adotadas as medidas da quela direita. 2.2 Crescimento Relativo Os dados foram tratados quanto a ocorrência de outliers multivariados, pela inspeção dos gráficos de dispersão de dados. Em seguida, os dados foram análisados pela equação alométrica (y=ax b ) na sua forma logaritmizada (ln y= ln a + b ln x). A variável LC foi considerada a variável independente enquanto as outras variáveis biométricas (CC, HC, CPQ, HPQ, LPQ, LA, CG1) foram consideradas dependentes. O tipo de crescimento foi estabelecido a partir do valor de "b", podendo ser isométrico (b=1), alométrico positivo (b>1) ou alométrico negativo (b<1). O crescimento alométrico foi avaliado por dois métodos: (1) ajuste de reta de regressão tipo I (OLS) e (2) ajuste de reta de regressão tipo II. Na regressão do tipo I (OLS) os dados são ajustados a uma linha pelo método dos mínimos quadrados dos resíduos em direção a variável independente Y enquanto a variável dependente X é condicionada, ou seja, tem seu efeito fixo (Kendall & Stuart 1973, Sokal & Rohlf 1985). Para testar se as retas das regressões de machos e fêmeas, de cada relação alométrica, apresentavam diferenças de angulação ( b), ou seja, no coeficiente alométrico, foram realizadas análises de covariância (ANCOVA) (Castiglioni & Negreiros-Fransozo, 2004). Na regressão do tipo II foi utilizado a técnica reduced major axis (RMA). Este método é baseado no cálculo de um eixo principal (major axis, equivalente a primeira componente principal) padronizado que minimiza a soma dos quadrados das menores distâncias das amostras em relação ao eixo. Os coeficientes alométricos das retas de cada sexo, por relação morfométrica, foram comparados através do teste de likelihood ratio, uma vez que nos modelos de regressão major axis a estatística F não pode ser calculada (detalhes completos em Warton et al. 2006). Todas as análises foram realizadas no software R (R Development Core 2
3 Team 2012). O pacote smatr foi utilizado para as análises RMA (Warton et al. 2012). Em todas as análises realizadas o nível de significância adotado foi de 5% (Zar 2010). 3 Resultados Foram analisados 476 exemplares, sendo 338 machos e 138 fêmeas. Comparando cada relação morfométrica entre os métodos de regressão, somente para as relações LC vs. CC, LC vs. HC e LC vs. LA foram observados níveis alométricos (NA) diferenciados. Em todas as regressoões do tipo RMA os valores dos coeficientes angulares foram maiores do que o calculado na regressão OLS, dentre estes alguns valores discrepantes como nas relações LC vs. LPQ e LC vs. HPQ. Enquanto nos resultados da ANCOVA (método OLS) houve diferença entre as retas de machos e fêmeas em todas as relações morfométricas, no método RMA, o teste de diferença Likelihood ratio não atestou diferenças dos ângulos das retas para as relações LC vs. CC e LC vs. CPQ (Tabela 1). 4 Discussão e conclusões Estudos alométricos frequentemente buscam alternativas de regressões lineares, principalmente, porque um dos objetivos é geralmente os ajustes lineares para estimar quanto uma variável possuem relação escalar com a outra (Warton et al. 2006). Os resultados à nível alométrico de algumas relações morfométricas diferiram entre os dois métodos analisados. Tomando como exemplo, para a relação LC vs. CC, cujos resultados tanto para machos quanto para fêmeas foram isométricos no método OLS, apresentaram ambos alometria positiva para o método RMA. Esta mudança alométrica acarreta uma série de implicações na biologia do animal, no caso isométrico, a taxa de crescimento específico é constante para ambas as variáveis, no entanto, no cenário alométrico positivo, CC cresce em uma taxa de crescimento específico maior que LC. No cenário isométrico, a justificativa seria de que durante o cresimento ontogenético, tanto machos quanto fêmeas não apresentam investimento energético diferenciado para a medida CC. Já no cenário de crescimento alométrico positivo destacado anteriormente, pode ser decorrente dos machos necessitarem de uma carapaça mais ampla, que o favoreceria na hora da disputa por uma fêmea, para acasalamento, ou na disputa por território (Ivo et al. 1999). Já para as fêmeas, isto pode estar relacionado a uma maior capacidade funcional interna da carapaça para desenvolvimento das gônadas. De acordo com Warton et al (2006) os métodos de regressão major axis, especialmente, o método RMA são os mais indicados para estudos alométricos em que se busca um melhor ajuste dos dados a uma reta enquanto o método OLS possui maior aplicação em análises que buscam a 3
4 predição da variável Y em função de X. Neste estudo as relações LC vs. CC e LC vs. CPQ não apresentaram diferença sinificativa entre machos e fêmeas, implicando que o crescimento alométrico destas duas variáveis dependentes não são suficientes para diferenciar o crescimento ou não possuem participacão efetiva na diferenciação de gêneros na espécie. Tabela 1 Crescimento relativo (regressão alométrica) do caranguejo Ucides cordatus coletado em Porto do Mangue, RN através de dois métodos de regressão: tipo I (OLS) e tipo II (RMA Reduced major axis). Relação Sexo N Equação Linear RMA b NA* b RMA NA RMA * F p (F) L/R p (L/R) LCxCC LCxHC LCxCPQ LCxHPQ LCxLPQ LCxLA M 310 lncc = 1.14*lnLC F 131 lncc = 1.13*lnLC M 315 lnhc = 1.01*lnLC F 120 lnhc = 1.16*lnLC M 297 lncpq = 1.79*lnLC F 108 lncpq = 1.87*lnLC M 293 lnhpq = 1.84*lnLC F 120 lnhpq = 3.01*lnLC M 287 lnlpq = 2.15*lnLC F 117 lnlpq = 4.15*lnLC M 331 lnla = 1.26*lnLC F 130 lnla = 1.66*lnLC LCxCG1 M 328 lncg1 = 1.30*lnLC <0.01* <0.01* <0.01* <0.01* <0.01* <0.01* <0.01* <0.01* 55.4 <0.01* <0.01* N número de animais analisados, b coeficiente angular (alométrico), NA nível alométrico (+ alometria positiva, - negativa, 0 isometria), F valor estatístico F para ANCOVA, L/R valor estatístico para o teste Likelihood ratio. O resultados indicaram que as técnicas atuais de estimar ajuste de retas alteraram os resultados matemáticos e, principalmente, a interpretação biológica e ecológica. Logo, deve ser levado em consideração explorar as regressões lineares do tipo II, tomando-se o cuidado de trabalhar com variáveis que apresentam uma boa correlação (acima de 0.7). Correlações abaixo deste valor podem gerar valores discrepantes como no caso das relações LC vs. LPQ e LC vs. HPQ e, portanto, devem ser retirada das análises. Em adição, sugerimos que estas comparações de métodos sejam realizadas com outras espécies de Brachyura para melhor entendimento dos padrões alternativos entre um método e outro. 4
5 Referências CASTIGLIONI, D. DE S.; NEGREIROS-FRANSOZO, M. L. Ciclo reprodutivo do caranguejoviolinista Uca rapax (Smith) (Crustacea, Brachyura, Ocypodidae) habitante de um estuário degradado em Paraty, Rio de Janeiro, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, n.23, v.2, p HARTNOLL, R. G. Variation in growth pattern between some secondary sexual characters in crabs (Decapoda, Brachyura). Crustaceana, n.27, v.2, p HUXLEY, J. S. Problems of relative growth. Mcthuen: London. Reprinted 1972, Dover Publications: New York HUXLEY, J. S.; TEISSER, G. Terminology of Relative Growth. Nature, v.137, p KENDALL, M.G.; STUART, A. The Advanced Theory of Statistics, volume 2. Charles Griffin, London MELO, G. A. S. Manual de identificação dos Brachyura (caranguejos e siris) do litoral brasileiro. São Paulo: Editora Plêiade pp. R DEVELOPMENT CORE TEAM R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. ISBN SOKAL, R. R.; ROHLF, F. J. Biometry. 3rd Edition. W,H, Freeman and Co., New York WARTON, D. I.; DUURSMA, R. A.; FALSTER, D. S. AND TASKINEN, S. smatr 3 - an R package for estimation and inference about allometric lines. Methods in Ecology and Evolution, v.3, n.2, p WARTON, D.I.; WRIGHT, I.J.; FALSTER, D.S.; WESTOBY, M. Bivariate line-fitting methods for allometry. Biological Reviews, v. 81, n. 2, p ZAR, J. H. Biostatistical Analysis. 5th Edition. Pearson Prentice-Hall, Upper Saddle River, NJ pp. 5
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