PODER JUDICIÁRIO. Voto n º

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1 APELAÇÃO COM REVISÃO Nº /8 São Bernardo do Campo Apelante: Maria Cândida Esteves Apelados: Boa Esperança Comercial e Administradora Ltda. Pedra Grande Sociedade Civil Ltda. Unibanco Seguros S. A. Enplanta Engenharia Ltda. Partes: Felíssimo Restaurante e Cervejaria Ltda. Adriano Augusto Ferreira EMBARGOS À EXECUÇÃO. LOCAÇÃO. TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. O Instrumento Particular de Confissão de Dívida é líquido porque permite determinar a quantia devida, bastando meros cálculos aritméticos para apuração do valor. A certeza decorre da expressão de direito e objeto conhecidos. É exigível porque indica as obrigações assumidas, e o não pagamento das prestações, garantidas por notas promissórias, está incontroverso. É apto ao aparelhamento da ação de execução nos termos artigo 585, incisos I, II e IV do Código de Processo Civil. LOCAÇÃO ATÍPICA. SHOPPING CENTER. DESPESAS DE CONDOMÍNIO. FUNDO DE PROMOÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL. DÉBITO CONFESSADO. O débito confessado tem origem em contrato atípico de locação de unidade localizada em 'Shopping Center', com características próprias, tendo sido as cláusulas aceitas livremente pelo Locatário e pelos Fiadores no momento da celebração, tanto que não poderiam ignorar a obrigação assumida pelas despesas acessórias da locação, como as de manutenção do empreendimento e as de fundo promocional, expressamente reconhecidas no termo de confissão de dívida, cuja contribuição atinge a todos os lojistas instalados no 'Shopping'. DESCONTO POR PONTUALIDADE. É vedada a desconsideração do desconto por pontualidade quando cumulada com a multa moratória, para afastar eventual "bis in idem". MULTA MORATÓRIA. "BIS IN IDEM". No cálculo discriminado do débito confessado já está incluída a multa moratória de 10% prevista no contrato de locação. A incidência da multa moratória ajustada no termo de confissão de dívida não pode prevalecer, porque caracteriza "bis in idem", vedado pelo ordenamento jurídico. Voto n º

2 Visto, MARIA CÂNDIDA ESTEVES opôs Embargos à Execução que BOA ESPERANÇA COMERCIAL E ADMINISTRADORA LTDA., PEDRA GRANDE SOCIEDADE CIVIL LTDA., UNIBANCO SEGUROS S. A. e ENPLANTA ENGENHARIA LTDA. movem contra si e FELÍSSIMO RESTAURANTE E CERVEJARIA LTDA. e ADRIANO AUGUSTO FERREIRA, qualificação e caracteres das partes nos autos, alegando que o título não se reveste da liquidez, certeza e exigibilidade e que existe excesso de execução. Recebido o incidente, os Embargados impugnaram as razões. Em 25 de maio de 2001 estes autos foram apensados aos Embargos do Devedor opostos por FELÍSSIMO RESTAURANTE E CERVEJARIA LTDA. e ADRIANO AUGUSTO PEREIRA. Inviabilizada a conciliação e vencida a instrução, seguiu-se a entrega da prestação jurisdicional concluindo pela improcedência do incidente, com a condenação da Embargante ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios de 15% do valor débito corrigido (folhas 51/57). MARIA CÂNDIDA ESTEVES opôs Embargos de Declaração que foram rejeitados e, em seguida, recorreu. Persegue a reforma da decisão alegando preliminarmente que: - 2 -

3 "... os documentos que embasam a execução não estão revestidos do caráter de liquidez, certeza e exigibilidade..." (folha 76). No mérito aduziu que: "... há excesso de execução..." (folha 78). "... as taxas cobradas a título de 'fundo de promoção' pertencem com exclusividade à Associação de Lojistas do Shopping Center..." (folha 78). "... não demonstraram o rateio das despesas relativas aos encargos..." (folha 79). "... postularam as apeladas a cobrança de multa em duplicidade...". "... ainda inseriram no acordo outra multa agora disfarçada sob o título de 'abono de pontualidade'". "... impossibilidade da cumulação da multa moratória com a perda do abono de pontualidade..." (folha 80). BOA ESPERANÇA COMERCIAL E ADMINISTRADORA LTDA., PEDRA GRANDE SOCIEDADE CIVIL LTDA., UNIBANCO SEGUROS S. A. e ENPLANTA ENGENHARIA LTDA. contrariaram as razões defendendo o acerto da decisão (folhas 84/95). É o relatório, adotado no mais o da r. sentença. PEDRA GRANDE SOCIEDADE CIVIL LTDA., BOA ESPERANÇA ADMINISTRAÇÃO E EMPREENDIMEN- TOS LTDA., UNIBANCO SEGUROS S. A., ENPLANTA ENGENHARIA LTDA. ingressaram com Ação de Execução contra FELÍSSIMO RESTAURANTE E CERVEJARIA LTDA., ADRIANO AUGUSTO FERREIRA e MARIA CÂNDIDA ESTEVES, com fundamento no "... Instrumento Particular de Confissão de Dívida pelo qual os - 3 -

4 devedores assumiram a obrigação de pagar o montante de R$ ,37..." (folha 3). Alegaram que pagas as quatro primeiras parcelas "... deixaram os devedores de efetuar o pagamento das demais parcelas do débito..." (folha 3). O r. Juízo julgou improcedente o incidente. MARIA CÂNDIDA ESTEVES insiste na ausência de liquidez, certeza e exigibilidade do título executivo e no excesso de execução. O Instrumento Particular de Confissão de Dívida foi firmado por PEDRA GRANDE SOCIEDADE CIVIL LTDA., BOA ESPERANÇA ADMINISTRAÇÃO E EMPREENDIMENTOS LTDA., UNIBANCO SEGUROS S. A., ENPLANTA ENGENHARIA LTDA., Locadoras, e por FELÍSSIMO RESTAURANTE E CERVEJARIA LTDA., outorgante devedora, nele intervindo como fiadores, ADRIANO AUGUSTO FERREIRA e MARIA CÂNDIDA ESTEVES. O débito ali reconhecido tem origem no "Instrumento Particular de Contrato Atípico de Locação" firmado entre as partes em 5 de maio de 1995 tendo por objeto a loja n 111 do Center Shop São Bernardo (cláusula 1ª - folha 57 do apenso). O título, assinado por duas testemunhas e com firmas reconhecidas, configura-se líquido porque permite determinar a quantia devida, bastando meros cálculos aritméticos para apuração do valor. A certeza decorre da expressão de direito e objeto conhecidos. É exigível porque indica as obrigações assumidas e, no caso, o não pagamento das prestações garantidas por notas promissórias, está incontroverso

5 O título tem caráter executivo porque não houve contrariedade fundamental sobre os seus aspectos substanciais. Está apto ao aparelhamento da ação de execução nos termos artigo 585, incisos I, II e IV do Código de Processo Civil. Como bem observado pelo r. Juízo: "... Ao contrário do alegado pela embargante, os títulos exeqüendos encontram-se formalmente em ordem, e não há nos autos referência de que o ajuste celebrado entre as partes tenha sido obtido mediante ardil ou engodo. A ordem jurídica concede ao interessado o direito de contratar ou não, e de estabelecer os termos do ajuste..." (folha 54). "... Na hipótese, a embargante confessou a dívida e assinou as notas promissórias..." (folha 55). Contrato é um acordo de vontades, escrito ou não, que, conforme a lei, tem por finalidade, adquirir, resguardar, transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos. É ato jurídico (negócio jurídico) que reclama os requisitos de validade do Código Civil. A liberdade dos contratantes sobre a criação ou a estipulação de vínculos obrigacionais está subordinada às normas jurídicas e ao interesse coletivo. Em razão do princípio da obrigatoriedade dos contratos e, como regra geral, não é permitido que os contratantes se arrependam do negócio avençado. Quando alguém abona obrigação de outrem para com o seu credor, caso o devedor não a cumpra - 5 -

6 ou possa cumpri-la, dá-se o contrato de fiança, que é acessório, distinto da locação, mas não exclui a responsabilidade do garante pelas obrigações resultantes desses contratos. A liberdade dos contratantes sobre a criação ou a estipulação de vínculos obrigacionais, está subordinada às normas jurídicas e ao interesse coletivo. A Apelante MARIA CÂNDIDA ESTEVES assumiu a condição de fiadora de forma livre e consciente. Não negou que assinou o pacto adjeto de fiança em relação ao termo de confissão de dívida (decorrente do contrato de locação anteriormente firmado), nem questionou seu conteúdo. Não se pode afastar, no caso, a responsabilidade da Fiadora sobre as obrigações assumidas, espontaneamente, até a completa e integral satisfação do débito confessado pelo devedor (Locatário). No "Instrumento Particular de Confissão de Dívida" foi consignado: "... A OUTORGANTE gozará de um desconto de R$ 2.749,84 (...) em cada parcela, se pago no vencimento...". "... O atraso no pagamento de qualquer das parcelas estabelecidas implicará na imediata exigibilidade de multa de 10%..." (folha 58). O abono estabelecido para pagamento pontual da prestação, desconsiderado no atraso, implica em penalidade moratória com cumulação impedida por igual fundamento, por acarretar bis in idem na cobrança

7 Esse pretenso abono nada mais é do que multa ou penalidade moratória, que confronta com a multa moratória e burla as normas especiais incidentes. Desconto por pontualidade é multa disfarçada de liberalidade." 1 Claro está que a concessão do desconto, sob a roupagem ostensiva de premiar o inquilino pontual, constitui forma velada de aplicação de penalidade moratória quando excedido o prazo para pagamento do aluguel. Confunde-se, pois, com a razão justificativa da multa, de modo que sua cobrança conjunta resulta em inadmissível bis in idem." 2 "Ausente cláusula de reajuste em período inferior ao permitido à época, mas presente duplicidade de multa moratória, uma delas disfarçada de abono ou desconto por pontualidade, afasta-se a segunda, com o parcial acolhimento dos embargos dos fiadores à execução de aluguéis e encargos." 3 A multa moratória consiste em previsão que pode não se concretizar no mundo dos fatos. Seu objetivo principal é infundir na vontade do devedor e impeli-lo a pagar nos respectivos vencimentos. No cálculo discriminado do débito confessado (folhas 35/36) já está incluída a multa moratória de 10% prevista no contrato de locação. A incidência de outra (multa moratória) lançada no termo de confissão de dívida não pode prevalecer, porque caracteriza bis in idem, vedado pelo ordenamento jurídico. É admissível a inclusão das despesas do fundo de promoção e dos encargos condominiais, expressamente reconhecidas no termo de confissão de dívida, porque o débito confessado tem origem em contrato atípico de locação de unidade localizada em 1-2º TACivSP - Ap. s/ Rev ª Câm. - Rel. Juiz ANTONIO VILENILSON - J º TACiv SP Ap. s/ Rev ª Câm. Rel. Juiz EUCLIDES DE OLIVEIRA. 3-2 TACivSP - Ap. c/ Rev /7-4ª Câm. - Rel. Juiz CELSO PIMENTEL - J

8 'Shopping Center', de características próprias, sendo as cláusulas aceitas livremente pelo Locatário e pelos Fiadores no momento da celebração. Logo, eles não poderiam ignorar a obrigação assumida pelas despesas acessórias da locação, como as de manutenção do empreendimento e as de fundo promocional, com contribuições a cargo de todos os lojistas instalados no 'Shopping'. "Não há obstáculo a que a proprietária do "shopping center" e locadora arrecade de seus locatários a verba do fundo de promoção que será repassada à associação de lojistas para administração. Desnecessário que a própria associação, por si ou mandatário, arrecade tal verba por não se tratar de receita própria, ou seja, valor a ela pertencente." 4 Em face ao exposto, rejeitada a matéria preliminar, dá-se parcial provimento ao recurso (para que seja deduzido o desconto por pontualidade de cada prestação devida e excluída a multa moratória prevista no instrumento de confissão de dívida, mantida no mais a sentença). IRINEU PEDROTTI Desembargador Relator 4-2 TACivSP - Apelação c/revisão n /7 - Rel. Juiz DIOGO DE SALLES