PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO - 34ª CÂMARA

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO 34 a Câmara Seção de Direito Privado Julgamento sem segredo de justiça: 06 de outubro de 2006, v.u. Relator: Desembargador Irineu Pedrotti. APELAÇÃO SEM REVISÃO Nº /0 São Paulo Apelante: I.T.G. C. e I. L.. Apelada: M. C. de M. B. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CUMULADA COM COBRANÇA. CÁLCULO DISCRIMINADO DO DÉBITO. INÉPCIA DA INICIAL. NÃO-OCORRÊNCIA. A narração dos fatos permite uma conclusão lógica, fornecendo os elementos necessários para a defesa da Apelante, com a indicação dos valores em atraso. Está instruída com o contrato de locação que permite à Recorrente verificar e calcular os alugueres e os encargos, cujo pagamento se obrigou e que ensejaram a propositura da ação pela falta de quitação. MORA. NÃO-PAGAMENTO. O pedido é de retomada do imóvel locado em face de inadimplemento das contraprestações a cargo da Locatária que, citada, não negou a relação jurídica e nem o atraso no pagamento dos aluguéis. CIENTIFICAÇÃO AOS FIADORES. RECURSO DE APELAÇÃO. PRETENSÃO DE DISCUTIR QUESTÃO NÃO DEBATIDA NO PROCESSO. INCOGNOSCIBILIDADE. Em ações como a presente, onde se debate sobre direito patrimonial disponível, o Código de Processo Civil e o princípio da eventualidade impõem à Apelante que alegue toda a matéria de defesa na contestação, sob pena de, em assim não agindo, ser-lhe vedado suscitar na Instância seguinte aquilo que não preqüestionou no momento próprio. É inadmissível a inovação da lide em fase recursal por ferir o princípio do duplo grau de jurisdição. Voto n o Visto, M. C. DE M. B. ingressou com AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CUMULADA COM COBRANÇA DE ALUGUÉIS E ACESSÓRIOS DA LOCAÇÃO (folha 2 destaques do original), contra I.T.G. C. E I. L., qualificação e caracteres das partes nos autos, com fundamento no contrato de locação do imóvel situado na Rua Mesquita, nº 142, Cambuci, nesta Capital, por débito a partir de janeiro de Formalizada a angularidade (folha 22) a Requerida habilitou-se (folhas 23/37) e, em seguida, apresentou contestação (folhas 40/48), que foi impugnada (folhas 49/51). Seguiu-se a entrega da prestação jurisidicional: "... JULGO PROCEDENTE a ação para decretar o despejo da requerida, que terá o prazo de 15 (...) dias para desocupação voluntária, sob pena de despejo compulsório, arcando o R. com os valores em aberto, cf. o pacto, apurando-se oportunamente por cálculo, pagando as custas e a honorária de 10% sobre o débito final... (folha 53 destaques do original). I.T.G. C. E I. L. opôs Embargos de Declaração (folhas 56/60), que foram rejeitados (folha 60 verso) e, em seguida, recorreu. Persegue a reforma da decisão alegando que: Não demonstrou a Apelada a exigibilidade do quantum relativo ao aluguel mensal cobrado na ação, tornando inepta a peça exordial. O inciso I do artigo 62 da Lei 8.245/91 exige a apresentação de com a inicial de cálculo discriminado do valor do débito, o que não ocorreu no caso em tela. (folha 65) - 1 -

2 ... o fiador tem o direito de tomar conhecimento acerca da inadimplência do afiançado (...) assim, terá condições, mais facilmente, de pagar o devido e, querendo, até mesmo exonerar-se da fiança... (folha 66).... considerando a entrega do imóvel antes da r. sentença, restando como discussão apenas e tão somente os valores em aberto, nos quais houve sensível alteração com afastamento da aplicação da multa de 03 (...) locativos, conclui-se que ambas as partes forma vencedores e vencidos, recaindo na hipótese do artigo 21 do Código de Processo Civil. (folha 70) M. C. DE M. B. apresentou contra-razões defendendo o acerto da decisão (folhas 76/82). Relatado o processo, decide-se. O recurso, no caso, deve ser apreciado nos limites especificados pelas razões para satisfação do princípio tantum devolutum quantum appellatum. A inicial não é inepta. A narração dos fatos permite uma conclusão lógica, fornecendo os elementos necessários para a defesa da Apelante, com a indicação dos valores em atraso. Além disso, veio instruída com o contrato de locação que permite à Recorrente verificar e calcular os alugueres e encargos cujo pagamento se obrigou e que ensejaram a propositura da ação pela falta de quitação. O pedido é de retomada do imóvel locado em face de inadimplemento nas contraprestações a cargo da inquilina que, citada, não negou a relação jurídica e nem o atraso no pagamento dos aluguéis e dos encargos. Verifica-se que após ter contestado a ação, a Apelante restituiu sponte sua a posse do imóvel à Locadora (folha 72), ato que implicou em tácita confissão do pedido de retomada, remanescendo, apenas, a discussão sobre os valores postos em cobrança. Admitindo o débito sem envidar esforços para saldá-lo ou indicar meio judicial ou extrajudicial para liquidá-lo, não afastou a responsabilidade pela caracterização da mora. Não houve, tecnicamente, alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da Autora (Apelada). A confessada mora ficou sem emenda. A dúvida quanto ao valor a ser depositado não isenta o devedor da obrigação de emendar a mora e depois discutir sobre o quantum que entender indevido." 1 Se o locatário, em lugar de purgar a mora, resolve contestar o pedido e o faz atacando pontos que não guardam relação com a lide, assume o risco de ter o despejo decretado, especialmente se, ao se referir vagamente sobre valores locativos, acaba, implicitamente, admitindo a legalidade de parte do locativo, cuja mora não foi purgada." 2 Nos termos do artigo 62, inciso IV, da Lei Inquilinária, é permitido o depósito inferior àquele reclamado pelo senhorio, com o prosseguimento do pedido de rescisão pela diferença, de tal sorte que no processamento da ação de despejo já não mais existe a proibição da simultaneidade da contestação e do pedido de emenda parcial do débito. Quedando-se, porém, inerte o inquilino, deixando de depositar os aluguéis que entendia devidos, a mora em que incidiu resta bem caracterizada." JTA 151/ ext. 2º TACivSP - Ap. s/ Rev ª Câm. - Rel. Juiz ACLIBES BURGARELLI - J ext. 2º TACivSP - Ap. s/ Rev ª Câm. - Rel. Juiz ANDREATTA RIZZO - J

3 Em se tratando de ação de despejo por falta de pagamento cumulada com ação de cobrança, a única prova exigida da Requerente era a apresentação do contrato de locação com a afirmativa de que a locatária não pagou os encargos vencidos, competindo à Requerida o ônus de provar o pagamento. Em ação de despejo por falta de pagamento a única prova que se exige do autor é a apresentação do contrato de locação e a afirmativa de que o locatário não pagou os locativos e encargos, cabendo ao devedor o ônus da prova para desconstituí-las." 4 O que autorizaria a inversão do desfecho dado em primeiro grau, seria a comprovação de que a Apelante havia pago os aluguéis, ou de que a tanto não estaria obrigada, situação jurídico-processual que não foi verificada, de onde a procedência da ação tornou-se medida irrecusável. Sustenta a Apelante:... o fiador tem o direito de tomar conhecimento acerca da inadimplência do afiançado. Isso porque, assim, terá condições, mais facilmente, de pagar o devido e, querendo, até mesmo exonerar-se da fiança é forçoso concluir que a ausência de intimação do fiador em AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA é fundamental, razão pela qual requer seja reconhecida a nulidade da sentença... (folha 69 destaques do original). Preclusão é o fenômeno que preserva a certeza e a segurança das relações jurídicas de natureza processual, quer pela perda de uma faculdade, ou pelo não exercício dela na ordem legal, ou por haver-se realizado uma atividade incompatível, ou, ainda, por já ter sido ela validamente exercitada. Em ações como a presente, onde se demanda sobre direito patrimonial disponível, o Código de Processo Civil e o princípio da eventualidade impõem à Requerida que alegue "toda a matéria de defesa" na contestação 5, sob pena de, em assim não agindo, ser-lhe vedado suscitar na Instância seguinte aquilo que não preqüestionou no momento próprio. Inviável o expediente de introduzir-se novidade na lide, revelado na pretensão de discutir questão que não foi ventilada em primeira instância cientificação dos fiadores - que não é daquela cognoscível ex officio. "A norma contida no art. 515, 1º, do CPC não autoriza o tribunal a inobservar o princípio do duplo grau de jurisdição. 6 "A questão não suscitada (nem discutida no processo) não pode ser objeto de apreciação pelo tribunal, no julgamento da apelação. De questão de fato, presa ao interesse da parte, não pode o tribunal tomar conhecimento de ofício. Hipótese em que ocorreu ofensa ao Art. 515, 1º, do CPC. 7 "As questões não suscitadas e debatidas em 1º grau não podem ser apreciadas pelo Tribunal na esfera de seu conhecimento recursal, pois, se o fizesse, ofenderia frontalmente o duplo grau de jurisdição. 8 Por força do artigo 515, 'caput' do Código de Processo Civil, prevalece a regra inscrita na expressão 'tantum devolutum quantum appellatum', sendo ao 4 - TJSP - Ap. s/ Rev /4-26ª Câm. - Rel. Des. FELIPE FERREIRA - J Artigo STJ REsp RJ 4ª T. - Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO - j STJ REsp PR 3ª T. - Rel. Min. NILSON NAVES - j JTA 111/

4 Tribunal permitido conhecer apenas matéria impugnada tempestivamente, sob pena de afronta ao princípio do contraditório e do duplo grau de jurisdição. 9 Ainda que fosse admitida a discussão sobre o tema, a cientificação aos fiadores sobre a ação de despejo é irrelevante. A responsabilidade dos fiadores emana do contrato.... tratando-se de ação de despejo por falta de pagamento, dela, necessariamente, não tem de ser cientificado o fiador, pois o pedido e a causa de pedir buscam a desocupação do imóvel e somente o inquilino, e não o fiador, é que poderá ser despejado. Por outro lado, embora seja possível, são raríssimos os casos em que o fiador pessoalmente se apresente em juízo para purgar a mora, pois isto implicaria na continuidade da relação jurídica e, se o inquilino já demonstrou ser mau pagador, por certo continuará a sê-lo. Logo, interessa ao fiador a resilição da locação com a extinção da garantia que evidentemente não se prolonga além dela. 10 A jurisprudência orienta em igual sentido: A cientificação da ação de despejo ao fiador, tem o condão de apenas possibilitar a execução dos encargos da lide (custas e verba honorária da ação de despejo), sem que possa alegar desconhecimento. 11 Não exige a lei civil que, sendo cobrado o devedor, disso se deva dar concomitante ciência ao garante. Ausência de cientificação que não afeta a responsabilidade solidária, não subtrai do fiador a expectativa da sub-rogação e nem atinge o direito de recuperar, com juros, o que foi pago. Cientificação que, bem por isso, não é exigida pela lei que disciplina a ação de despejo. 12 A lei de regência da locação não obriga, em nenhum dos seus dispositivos, a notificação do fiador quando da ação de despejo promovida contra o locatário, ficando porém ao locador vedada a cobrança dos encargos sucumbenciais havidos naquela demanda. 13 Na condenação em honorários advocatícios sobrelevam dois princípios: o (princípio) da sucumbência, pelo qual a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte, em cujo favor se efetiva; o (princípio) da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à propositura ou à instauração de ação judicial, ou incidente processual, deve responder pelas despesas daí decorrentes. Considerando que a Apelada decaiu de parte mínima do pedido, a Apelante deve arcar com as custas e honorários advocatícios, bem fixados pela sentença. Em ocorrendo sucumbência mínima do autor, o réu responderá por inteiro pelas despesas e honorários advocatícios conforme disposto no parágrafo único do artigo 21 do Código de Processo Civil. 14 Se o autor decai de parte mínima do pedido, inexiste sucumbência, devendo os demandados responderem, por inteiro, pelos encargos da lide, em face do que dispõe o parágrafo único, do artigo 21, do Código de Processo Civil." ext. 2 TACivSP - Ap. s/ Rev /0-3ª Câm. - Rel. Des. CARLOS GIARUSSO SANTOS - J ext. 2º TACivSP - Ap. c/ Rev /6-2ª Câm. - Rel. Juiz FELIPE FERREIRA - J ext. 2º TACivSP - Ap. s/ Rev /5-12ª Câm. - Rel. Juiz RIBEIRO DA SILVA - J ext. 2º TACivSP - Ap. c/ Rev /6-12ª Câm. - Rel. Juiz ARANTES THEODORO - J ext. 2º TACivSP - Ap. c/ Rev /2-5ª Câm. - Rel. Juiz S. OSCAR FELTRIN - J TJSP -Ap. s/ Rev /7-27ª Câm. - Rel. Des. CARLOS GIARUSSO SANTOS - J TJSP - Ap. s/ Rev /9-35ª Câm. - Rel. Des. ARTUR MARQUES - J

5 Em face ao exposto, nega-se provimento ao recurso. IRINEU PEDROTTI Desembargador Relator - 5 -