Educação a Distância: do Ensino por Correspondência à Aprendizagem Virtual - Garantia de Sucesso? Resumo

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Transcrição:

Educação a Distância: do Ensino por Correspondência à Aprendizagem Virtual - Garantia de Sucesso? Cíntia Regina Lacerda Rabello NUTES/UFRJ Maurício Abreu Pinto Peixoto NUTES/UFRJ Resumo Embora em destaque nos dias de hoje, principalmente devido à disseminação das Tecnologias de Informação com a expansão da Internet, a Educação a Distância está longe de ser uma novidade. O artigo busca traçar um breve histórico da EAD com base em uma revisão de bibliografia que abrange os principais autores e teorias. Discute-se ainda a EAD dentro do cenário brasileiro e os desafios e possibilidades que se apresentam com a larga disseminação desta modalidade educacional nos dias atuais, além de refletir sobre habilidades essenciais para garantir o sucesso da aprendizagem neste contexto. Palavras-chave: EAD, Aprendizagem, Autonomia, Habilidades, Sucesso. Distance Education: From Correspondence to Online Learning - Guaranteed Success? Abstract Although very prominent nowadays, especially due to the advances of Information Technologies and the Internet, Distance Education is not something new. This paper aims at tracing a brief history of Distance Education based on a bibliographic review that comprises the main authors and theories. It also discusses this kind of education in the Brazilian scenario as well as the possibilities and challenges that flourish with the widespread dissemination of this educational modality nowadays, besides urging a 101

reflection on the essential abilities and skills in order to guarantee learning success in this context. Key words: Distance education, Learning, Autonomy, Abilities, Success. Introdução A Educação a Distância (EAD) é uma realidade no contexto educacional brasileiro e mundial. De acordo com o Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância (AbraEAD), no ano de 2007 mais de 2,5 milhões de brasileiros estudaram em cursos com metodologias a distância. Estes alunos distribuíram-se entre variadas instituições, desde as credenciadas pelo Sistema de Ensino, até as de ensino técnico e coorporativo, além de cursos de capacitação profissional e cursos livres, frutos de iniciativas públicas e privadas. Embora o Anuário não tenha apresentado dados nacionais mais atualizados, é visível o crescimento desta modalidade educacional em nosso país. Inúmeras universidades brasileiras, públicas e privadas, oferecem cursos de graduação, pós graduação e extensão a distância. Empresas que se especializam em oferecer serviços de criação e venda de cursos voltados para o mercado empresarial também têm se multiplicado. Hoje é possível encontrar uma gama variada de cursos oferecidos via web, que vão desde cursos livres de Administração do Tempo até cursos de Pós-Graduação em diversas áreas do conhecimento. Percebe-se, então, o grande mercado que se abre para negócios educacionais, no qual a EAD se tornou uma economia de escala, com grandes interesses comerciais. Por outro lado, não podemos negar o potencial da EAD como agente de inclusão social, permitindo que pessoas afastadas dos grandes centros urbanos tenham acesso à formação básica, superior e continuada por meio de diversas iniciativas como, por exemplo, os consórcios de universidades públicas. Tais iniciativas oferecem acesso a cursos superiores a uma população que, a princípio, não teria 102

como se deslocar longas distâncias até salas de aula presenciais. Nesse sentido, é possível reconhecer seu caráter de inclusão e democratização do ensino. No entanto, se nos afastamos deste caráter industrial de formação em massa, típico do modelo fordista de produção, podemos pensar a educação na pós-modernidade como um processo que move e modifica as pessoas. E então nos deparamos com a aprendizagem dos estudantes a distância inserindo-os no mundo atual e globalizado, favorecendo sua participação como sujeitos críticos e modificadores da realidade. Modelos de EAD que visam apenas à formação em massa por meio da transmissão vertical de conhecimento desconsiderando as necessidades e dificuldades dos alunos envolvidos no processo, pouco contribuem para o sucesso da aprendizagem e para uma educação realmente inclusiva. Este trabalho, desdobramento de uma pesquisa desenvolvida no âmbito do programa de Pós-Graduação do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde (NUTES/UFRJ) junto ao Consórcio CEDERJ (Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro) sobre aprendizagem na Educação Superior a Distância, realizada entre os anos de 2005 e 2007, no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas na modalidade semipresencial (RABELLO, 2007), visa debater possibilidades e desafios da EAD no contexto brasileiro por meio de uma perspectiva histórica e com foco no sucesso da aprendizagem, de forma que as possibilidades de formação e inclusão social realmente se concretizem. Afinal, o que é educação a distância? Definir educação a distância não é uma tarefa fácil, em função mesmo das diversas nomenclaturas estabelecidas em diferentes tempos e contextos: educação a distância, ensino a distância, aprendizagem a distância, estudo independente, estudo por correspondência, aprendizagem aberta, aprendizagem flexível, estudo residencial, estudos externos, entre outros. Keegan nos alerta para a existência da diversidade de terminologias e ressalta que nem todas são sinônimas: muitas delas foram utilizadas em diferentes épocas do seu processo evolutivo, e outras são 103

utilizadas especificamente em certos países. No entanto, esclarece que o termo educação a distância é um termo genérico que inclui a gama de estratégias de ensino e aprendizagem utilizadas por diferentes instituições que utilizam essa modalidade de educação, o que englobaria todas as demais terminologias apresentadas. Nesse sentido, o termo educação a distância é utilizado para unir dois elementos desse campo da educação: o ensino a distância e a aprendizagem a distância (KEEGAN, 1996, p. 34-38). Belloni, após apresentar uma série de definições de diversos autores para a EAD, conclui que estas definem a educação a distância pelo que ela não é, ou seja, a partir da perspectiva do ensino convencional da sala de aula (BELLONI, 2003, p. 27), ou seja, a separação física entre professor e aluno no processo educacional. Keegan endossa essa característica da separação entre professor e aluno na educação a distância, porém, não considera essa distância como necessariamente geográfica, uma vez que muitos alunos que buscam essa modalidade de educação nem sempre estão longe das instituições de ensino. Para ele, a separação professor-aluno se dá no afastamento entre o ato de ensinar e o ato de aprender (KEEGAN, 1996, p. 38-9). Algumas definições mais recentes de EAD abordam não somente a separação entre professor e aluno em contraposição ao ensino presencial, como clamam por maior ênfase na aprendizagem do que no ensino. Um exemplo é a definição de Levine na qual a EAD é o processo de ajudar pessoas a aprender quando elas estão separadas espacial ou temporalmente dos ambientes mais típicos de aprendizagem ao vivo nos quais a maioria de nós foi educada i (LEVINE, 2005, p. 7). Vianney, Torres & Farias (2003, p. 47) enfatizam ainda o papel das tecnologias de informação e comunicação (TICs) no conceito de EAD, uma vez que a partir do uso dos sistemas em rede, em particular dos ambientes virtuais de aprendizagem, que passaram a integrar professores e alunos em tempo real, a noção de distância entre professor e alunos modifica-se a partir do conceito de interatividade e de aproximação virtual. 104

Assim como são inúmeras as definições de educação a distância, também são muitas as teorias a seu respeito. Keegan enfatiza a importância de uma teoria sólida de educação a distância para a firme tomada de decisões políticas, financeiras, educacionais e sociais nesse campo. Afirma ainda que abordagens teóricas de EAD emergiram na década de 1970 e continuaram a ser desenvolvidas ao longo dos anos. Ressalta que a primeira grande teoria de EAD, e até então a mais abrangente, é a do pesquisador alemão Otto Peters (KEEGAN, 1996, p. 55). Para Peters, a EAD é um processo industrializado de educação, uma vez que compartilha características próprias da produção industrial de bens de consumo, tais como a racionalização e divisão do trabalho, a mecanização, a produção em série e em massa e a padronização, entre outros (idem, p. 80). Assim, a educação a distância constitui: [...] um método de transmitir conhecimento, habilidades e atitudes que é racionalizado pela aplicação da divisão do trabalho e princípios organizacionais e também pelo uso extensivo de mídia tecnológica, especialmente pelo propósito de reproduzir materiais de ensino de alta qualidade, o que possibilita instruir um enorme número de alunos ao mesmo tempo onde quer que eles morem. É uma forma industrializada de ensino e aprendizagem. (PETERS 1973, p. 206 apud KEEGAN, 1996, p. 41) Embora a teoria de industrialização de Peters ainda seja aceita no campo educacional da EAD, outras teorias surgiram ao longo dos anos, a fim de definir, explicar e fundamentar a EAD a partir de seu processo evolutivo. Michael G. Moore, pioneiro e uma das principais referências mundiais em EAD, propôs, na década de 1970, uma teoria de EAD baseada nos conceitos de currículo, chamados por ele de estrutura, instrução, ou diálogo, e uma teoria de aprendizagem, conhecida como autonomia do aprendiz. Posteriormente estas teorias passaram a ser conhecidas como Teoria da Distância Transacional (MOORE, 2003, p. 22). Para Moore, o processo educacional deve ser um processo de negociação entre professor e aluno, por ele denominado transaction. Como a característica essencial 105

da EAD é a distância física entre professores e alunos, essas transações ocorrem, hoje, na maioria das vezes e por algum tempo assim ocorreram exclusivamente por meio da mídia impressa ou eletrônica. Dessa maneira, o que caracteriza a EAD não é a distância geográfica entre professor e alunos, mas a distância psicológica e comunicacional entre eles, ou seja, a distância transacional. Essa distância pode ser descrita em forma de duas variáveis cruciais, diálogo e estrutura, que irão caracterizar maior ou menor distância entre os atores do processo educacional. Diálogo pode ser definido como a comunicação de duas vias entre professor e aluno, e estrutura como a medida de resposta às necessidades individuais dos alunos. Dessa maneira, Moore exemplifica que programas de EAD que encorajam a comunicação entre professor e alunos, permitindo um diálogo constante entre eles, apresentam um baixo nível de distância transacional. Da mesma forma, programas altamente estruturados, isto é, rígidos, pouco capazes de se adaptar às necessidades dos indivíduos, são transacionalmente distantes do aluno, ou seja, quanto maior o diálogo e menor a estrutura em programas de EAD, menor será a distância no processo educacional (MOORE, 1980, p. 19-22). O autor relaciona distância transacional e dimensão de autonomia do aprendiz, uma vez que, para ele, a EAD é um sistema que é constituído de três subsistemas distintos, porém interligados: o aprendiz, o professor e o método de comunicação. Afirma que para se compreender o sistema de aprendizagem é necessário desenvolver o conceito de aprendiz autônomo, de vez que a distância em relação ao professor força o aprendiz a assumir um nível considerável de autonomia (MOORE, 1973, p. 663). Assim, o sucesso da aprendizagem na EAD depende da extensão na qual o aluno pode estudar sem a interferência direta do professor, o que é determinado por sua competência enquanto aprendiz autônomo e autodirigido (MOORE, 1980, p. 22). Outra teoria de educação a distância que permeia a noção de autonomia de Moore e fundamenta este trabalho é a teoria de conversa didática de Börje Holmberg. Holmberg (1986, p.6) reforça a noção de autonomia do aprendiz ao afirmar que a 106

EAD é um exercício de independência, que envolve planejamento, organização do tempo e desenvolvimento do estudo individual. De acordo com esse autor, o aprendiz de EAD é na maioria das vezes o aprendiz adulto que precisa conciliar o estudo com outros compromissos, o que é muitas vezes um problema a ser resolvido. Enfatiza que o próprio aluno é quem deve tomar decisões de forma independente, decidindo o quê e como aprender. No entanto, Holmberg acredita que os aprendizes devem ser ajudados a alcançar essa independência, o que é possível por meio da conversa entre professor e aluno apoiada por diferentes mecanismos de suporte (WHITE, 2005b, p. 57). Baseado na noção de que o aluno de EAD necessita de apoio e comunicação, desenvolveu a teoria da conversa didática guiada como uma tentativa de chamar atenção para o problema dos elementos de anonimato e impessoalidade da EAD. Essa teoria apresenta, entre outras características, o aconselhamento explícito e sugestões aos alunos de o quê fazer e o quê evitar, convites para troca de opiniões, e tentativas de envolver o aluno emocionalmente. Partindo do pressuposto básico de que alunos tendem a gostar mais do aprendizado e a ter mais sucesso se for possível conversar com tutores e outros membros da instituição, Holmberg formaliza sua teoria de conversa didática guiada, na qual o núcleo do ensino é a interação entre professor e aluno, e essa interação deve conduzir ao envolvimento emocional entre ambos, contribuindo para o prazer na aprendizagem, prazer que gera motivação e colabora de forma produtiva para a aprendizagem (HOLMBERG, 1986, p. 5-6). Da correspondência à Internet: um breve histórico da EAD no mundo Apesar do boom da educação a distância no final do milênio, abrindo novas perspectivas de educação e treinamento como a criação das universidades virtuais e a disseminação do e-learning, não devemos nos esquecer que a EAD não é uma invenção do século XX, nem tampouco se restringe ao uso de computadores. Moore 107

nos adverte que muitas vezes o conhecimento acerca de EAD se limita nas referências à tecnologia. Embora reconheça a adoção de invenções tecnológicas como uma característica desse campo, chama a atenção para o fato de que ela não pode ser definida somente em termos de tecnologias de comunicação. Para ele, a emergência de certas tecnologias ocasionou mudanças na organização educacional e nas práticas de ensino da EAD, porém mais importante que a tecnologia é a mudança da organização de seres humanos e outros recursos e a mudança na prática de ensino que é consequência do uso dessa tecnologia (MOORE, 2003, p. 3). Holmberg (1995b, p. 47) afirma haver indícios de que a educação a distância tenha sido oferecida pela primeira vez nos Estados Unidos em 1728, porém Azevedo & Quelhas (2004, p. 14) observam a existência de uma rede de comunicação a distância a fim de transmitir ensinamentos científicos, filosóficos e evangélicos desde a antiguidade. Como exemplos, citam os escritos de Platão enviados a seus alunos sob forma de correspondência e cartas de Voltaire a seus alunos conhecidas como Cartas Filosóficas. Embora com propósitos e enfoques diferentes dos que reconhecemos hoje, e restrita a um pequeno número de alunos, não podemos negar que talvez a EAD seja uma modalidade educacional muito mais antiga do que imaginamos. Holmberg atribui o surgimento da EAD tradicional na segunda metade do século XIX, à necessidade de estudo sistemático combinado ao trabalho remunerado devido a preocupações sociais com educação e treinamento, Também o associa ao pensamento liberal preocupado com o desenvolvimento da personalidade dos alunos trabalhadores. Informa que embora diversas iniciativas de EAD por correspondência tenham surgido na Europa a partir da primeira metade do século XIX, de forma estruturada surgiu na apenas na Alemanha em 1856 com a criação de uma escola de línguas em Berlim para o ensino por correspondência. No final do século, a EAD era aplicada, sobretudo no ensino universitário e pré-universitário, além do treinamento ocupacional (HOLMBERG, 1995b, p.47-9). 108

Keegan (1996, p. 8) ressalta que o avanço da EAD não seria possível sem o desenvolvimento da tecnologia, principalmente nas áreas de transportes e comunicação, associada à Revolução Industrial. Holmberg afirma ainda que desde o seu início até 1970 houve uma expansão regular da EAD sem muitas mudanças radicais, mas com gradual inserção de métodos e mídias mais sofisticadas, como o uso de gravações de áudio e rádio (HOLMBERG, 1995b, p. 49). Moore (1973, p. 675) ressalta que o argumento para o desenvolvimento de sistemas de EAD abarca tanto aspectos econômico-sociais quanto psicológicos, e que a década de 70 marca essa maior demanda por EAD devido à crescente especialização da tecnologia e do trabalho. De volta à questão da tecnologia para a evolução da educação a distância, observamos que essa modalidade é comumente descrita em termos de gerações, de acordo com os diferentes meios (formas de comunicação) e tecnologias (veículos) empregados. A primeira geração é caracterizada pelo uso de material impresso distribuído aos alunos por meio de correspondência. Nessa geração, a EAD foi muitas vezes denominada, nos EUA, de estudo por correspondência e estudo independente. A segunda geração foi impulsionada pelo uso de meios de comunicação de massa, como o rádio e a televisão, no final dos anos 1950. Já a terceira geração foi marcada pela combinação dos meios e tecnologias da primeira e da segunda geração, em uma abordagem multimídia, além da introdução da computação nos anos de 1960 e 1970. A quarta geração de EAD foi desenvolvida em torno das comunicações mediadas por computador e gerada no final do século XX com o desenvolvimento da Internet, permitindo, entre outros, o acesso a banco de dados e bibliotecas virtuais, videoconferências, comunicação síncrona e assíncrona, por meio de chats e e-mails e participação em fóruns de discussão (RUMBLE, 2000, p. 46-7). Hoje podemos identificar uma quinta geração de EAD (MOORE & KEARSLEY, 2007, p. 44), que com a ampliação das redes de computadores e disseminação da banda larga permite a elaboração de aulas virtuais baseadas no computador e na web, muitas vezes desenvolvidas em ambientes virtuais de aprendizagem. Os AVAs, como são denominados, são ambientes criados a partir de ferramentas ou 109

softwares especialistas (...) utilizados para facilitar ou promover a aprendizagem (HAGUENAUER, MUSSI & CORDEIRO FILHO, 2009, p. 3). Muitos destes ambientes visam promover a aprendizagem colaborativa, e utilizam diversos recursos hipermídia (como textos, imagens, vídeos, áudio, etc) e diferentes ferramentas de comunicação, que permitem uma maior interação entre os participantes, tutores e equipe de apoio. Apesar de os avanços tecnológicos terem possibilitado a evolução da educação a distância e de muitas vezes nos maravilharmos com a infinidade de recursos e possibilidades oferecidas pela tecnologia à EAD, Levine nos chama a atenção para o fato de que o aspecto essencial de qualquer situação de ensino e aprendizagem deve ser o aprendiz (LEVINE, 2005, p. 17), e que, infelizmente, muitas vezes a preocupação com o uso da tecnologia distorce esse foco, deslocando para segundo plano o aprendiz e a aprendizagem. Educação a distância e a realidade brasileira No Brasil, a EAD tem sido uma prática muito utilizada desde a primeira metade do século XX, principalmente no ensino profissionalizante e na educação popular. Instituições como o Instituto Monitor e o Instituto Universal Brasileiro foram responsáveis pela formação profissional de mais de três milhões de brasileiros até o ano 2000 (VIANNEY, TORRES & FARIAS, 2003, p. 49). Nas áreas de educação popular, Belloni (2002, p. 129) destaca vários programas de iniciativas públicas e privadas como o MEB (Movimento de Educação de Base), o Projeto Minerva, o Telecurso 1º Grau e o Telecurso 2000. Muitos desses programas visavam à divulgação do conhecimento e à formação da cidadania por meio do uso do rádio e da televisão. A EAD assume, assim, valiosa posição na formação do indivíduo e sua inclusão na sociedade. Podemos dizer que os anos 1990 representam um marco para a EAD no Brasil, pois é nessa década que é oficializada como modalidade válida e equivalente para todos os níveis de ensino, a partir da publicação da lei de Diretrizes e Bases para a 110

Educação Nacional em dezembro de 1996. Por essa mesma época, a expansão da Internet e o destaque conferido na política educacional brasileira ao ensino superior O que é necessário para o sucesso na educação a distância? Muitos autores veem o sucesso na aprendizagem a distância relacionado a questões de autonomia e auto direção do aprendiz (MOORE, 1973, 1980, 2003; GIBSON, 1998; LEVINE, 2005; PAUL, 1990). Ainda que sejam características essenciais em qualquer situação de aprendizagem, verificamos que nem sempre são atingidas na EAD. Ainda em 1963, Wedemeyer chamava a atenção para o fato que nem todos os alunos serão capazes de ter sucesso no ensino por correspondência, uma vez que essa não era uma modalidade fácil de ensino. Como obstáculos para o sucesso da aprendizagem destacava o desenvolvimento de interesse pela tarefa, a motivação, e a preparação para o estudo. É muito difícil iniciar a EAD, e a taxa de desistência antes do início do curso é até hoje muito alta; dadas as barreiras para a compreensão da estrutura do conteúdo a ser estudado; a aprendizagem de habilidades de pensamento analíticas; e a auto avaliação da aprendizagem (KEEGAN, 1996, p. 65). O aluno deve ser informado sobre as habilidades que essa modalidade de ensino demanda desde o ato de inscrição no curso a distância, pois muitos aprendizes possuem ideias errôneas devido à distância entre o produto efetivo e aquele vendido pela propaganda da EAD. Muitas vezes, o que é reforçado é a conveniência e a flexibilidade, ao invés das dificuldades que muitos aprendizes encontram (PAUL, 1990, p. 86). Uma questão evidente a esse respeito é a questão do tempo. Muitos alunos se inscrevem em cursos de EAD com a ilusão de que essa modalidade lhe exigirá menos tempo de estudo e comprometimento pessoal, ou mesmo, que será mais fácil que a educação tradicional (JONAITIS, 2005, p. 125). Este ainda é um dos preconceitos a serem vencidos pela EAD, que muitas vezes é vendida como um curso para quem não tem tempo de estudar, o que tem se mostrado justamente o contrário. Embora na EAD haja a possibilidade de 111

flexibilidade de tempo e local de estudo, não sendo necessário o deslocamento até uma sala de aula tradicional em um dia e horário específicos, os níveis de comprometimento e dedicação são muito maiores; para o sucesso da aprendizagem a distância, habilidades de gerenciamento de tempo e autodisciplina são fatores essenciais. Baseada nessa falta de informação que muitos alunos têm a respeito da EAD, Jonaitis (2005) elaborou um guia para o aprendiz a distância no qual quatro áreas essenciais para o sucesso da aprendizagem são trabalhadas: (1) comprometimento pessoal e motivação; (2) familiaridade e atitude perante o uso da tecnologia; (3) habilidades e preferências comunicativas; e (4) sistemas pessoais de suporte. Segundo a autora, os alunos devem, antes de tudo, saber como o curso será entregue aos alunos, ou seja, quais os meios utilizados para a veiculação dos materiais didáticos e os meios de comunicação com a instituição, a fim de verificar se o curso atende suas necessidades e realidade. Em relação à motivação e comprometimento pessoal, a autora reforça a necessidade de desenvolver habilidades de autodisciplina e auto direção, disponibilidade de tempo para o estudo, e habilidades de gerência do tempo e hábitos de estudo. Em termos de familiaridade com a tecnologia, a autora destaca a necessidade de acesso à tecnologia necessária ao curso e a familiaridade com as ferramentas utilizadas, além da necessidade de conhecimento sobre oferta de suporte técnico pela instituição. Em relação às habilidades comunicacionais, a autora descreve a importância de receber e expressar ideias nas salas virtuais, seja por meio da comunicação escrita, por e- mail e a participação nos fóruns de discussão, ou oralmente, por meio das salas de bate-papo (chats). Além disso, Jonaitis destaca a necessidade de habilidades de leitura e escrita, uma vez que a leitura é geralmente a fundamentação do curso e da informação que os alunos recebem, e esclarece que alunos com dificuldades de leitura podem experimentar dificuldades e frustrações no contexto a distância. Por fim, os sistemas de suporte pessoais são de extrema importância, pois a opção por um curso a distância força o aluno a fazer mudanças em sua vida, principalmente nos aspectos familiar e profissional. Os alunos, seus familiares, amigos e 112

empregadores devem estar cientes dessas mudanças e dispostos a apoiar o aprendiz a distância durante sua empreitada, oferecendo o suporte emocional e afetivo necessários para seu sucesso (JONAITIS, 2005, p. 124-130). Associada ao conceito de autonomia na aprendizagem está a noção de aprendizagem autodirigida. Para Knowles, aprendizagem autodirigida descreve um processo pelo qual os indivíduos tomam a iniciativa, com ou sem a ajuda de outros, em diagnosticar suas necessidades de aprendizagem, formulando objetivos, recursos humanos e materiais, escolhendo e implementando estratégias de aprendizagem adequadas, e avaliando os resultados da aprendizagem. (KNOWLES, 1975, p. 18) O autor apresenta ainda três razões para a necessidade de auto direção na aprendizagem: (1) aprendizes que tomam iniciativa na própria aprendizagem aprendem mais e melhor do que aqueles que assumem uma postura passiva; (2) a aprendizagem autodirigida está em consonância com os nossos processos naturais de desenvolvimento psicológico, ou seja, conforme amadurecemos desenvolvemos a crescente responsabilidade de dirigirmos nossas próprias vidas; (3) as rápidas mudanças que estamos experimentando nos exigem o desenvolvimento de novas habilidades, como questionamento e responsabilidade pela própria aprendizagem. A educação a distância encontra-se em plena expansão no Brasil e no mundo. No entanto, as novas demandas que essa modalidade de ensino e aprendizagem exige devem estar claras tanto para os estudantes que buscam esse recurso instrucional, quanto para os professores e gestores que atuam nessa área. A fim de promover uma EAD que seja realmente inclusiva, é essencial que o aluno possua, ou desenvolva, as competências necessárias para garantir o sucesso na aprendizagem. Apesar de muitos acreditarem no papel da EAD como grande provedora de acesso à educação, e, consequentemente, de inclusão social, Gibson nos adverte: Sim, os alunos virão, mas temos que nos perguntar, eles terão sucesso? Oferecer acesso à 113

informação não é o mesmo que garantir uma experiência de aprendizagem bem sucedida (GIBSON, 1998, p. viii). EAD: limites e possibilidades Assim como acontece em relação à questão tecnológica apresentada anteriormente, muitas vezes nos fascinamos com as possibilidades educacionais e sociais proporcionadas pela educação a distância e passamos a ver a EAD como remédio milagroso para os problemas de formação e treinamento de pessoas. Apesar de a EAD oferecer uma gama de possibilidades, como a democratização do ensino e inclusão social; não podemos deixar de lado questões importantes como o despreparo para uma nova postura educacional e ainda altos percentuais de evasão, que denunciam desafios e limites dessa modalidade de educação. Keegan (1996, p. 4), por exemplo, vislumbra a EAD como uma solução para a falta de espaço nos sistemas educacionais, o que de certa forma pode assegurar o acesso ao ensino superior sem grandes investimentos em construção e manutenção de universidades. Menciona também a maior flexibilidade da aprendizagem, que transfere ao aprendiz as decisões sobre os rumos do estudo, adequando necessidades e realidades pessoais, o que faz dessa característica um dos pilares na defesa da EAD (idem, p. 29). White designa como marco importante da EAD a contribuição para o desenvolvimento de aprendizes autônomos, independentemente de suas circunstâncias de vida. Enumera como grandes contribuições o acesso à educação, o ajuste a novos ambientes de aprendizagem e o desenvolvimento do indivíduo, tanto em termos econômicos quanto em termos de experiências de aprendizagem, uma vez que possibilita ao aprendiz exercer maior autonomia, auto regulação e controle (WHITE, 2005a, p. 165). No entanto, muitas dificuldades e desafios limitam tais possibilidades. Alguns dos esforços a serem desenvolvidos devem encaminhar-se para a superação do 114

preconceito contra essa modalidade educacional, muitas vezes vista como educação de segunda categoria, dirigida apenas àqueles que não tiveram acesso ao ensino tradicional, ou aos que desejam obter um diploma sem muito esforço e comprometimento (GARCIA, 2000, p. 82). Apesar de diversos autores como Moore, Holmberg e White enfatizarem as possibilidades de exercício da autonomia na EAD, Preti afirma que a situação de aprendizagem individual é o calcanhar de Aquiles da EAD (PRETI, 2000, p. 125), uma vez que, embora considerada condição sine qua non para o sucesso da aprendizagem a distância, a responsabilidade da própria formação é uma das grandes dificuldades para muitos alunos de EAD. A esse respeito, Lowe (2005, p. 73) menciona os altos percentuais de evasão na educação a distância em comparação ao ensino presencial e, ao citar Gibson, ressalta a importância de instituições de EAD prepararem os alunos para essa nova realidade: Os aprendizes geralmente se deparam com a necessidade de habilidades de gerenciamento do tempo e do nível de estresse, o aumento da auto direção no estabelecimento de metas e adoção de estratégias para assumirem novos papéis e responsabilidades de ensino e aprendizagem, além da instigação de estratégias cognitivas e metacognitivas, entre outras. Mais frequentemente, esses alunos foram educados a serem recipientes passivos de informação, a competirem por notas em provas que requerem regurgitação de informação factual. Eles simplesmente não estão preparados para terem sucesso. (GIBSON, 1997 apud LOWE, 2005, p. 80) Finalizando, Brindley & Paul (1996, p. 1), devido aos altos investimentos em EAD alertam para o perigo da perpetuação do processo industrial de educação de massas, sem a preocupação com resultados de aprendizagem, o que gera baixas taxas de conclusão de cursos e a transmissão de conhecimentos de uma só via. 115

Considerações Finais Gibson sugere que os profissionais de EAD devam refletir sobre a prática educativa centrada no aluno. Para a autora, os programas de educação a distância devem responder à diversidade dos alunos, oferecendo-lhes suporte durante o processo de aprendizagem, o que irá prepará-los para o sucesso nessa experiência pedagógica. Para isso, ela descreve algumas práticas para apoio ao aluno, entre elas, a de conhecer o aprendiz e de oferecer orientação a ele (GIBSON, 1998, p. 140-143). Embora haja uma concordância entre os educadores que a EAD pressupõe um aluno autônomo e capaz de gerenciar a própria aprendizagem, este fato não condiz com a realidade. Na pesquisa realizada com alunos recém ingressos em um curso de graduação na modalidade semi-presencial, notamos que os discentes têm expectativas irreais a respeito da EAD, acreditando que o fato de não necessitar estar presente fisicamente em um local específico para participar do curso seja suficiente para a escolha dessa modalidade educacional. Há muitos outros quesitos que parecem não ser levados em conta na hora da decisão por esse tipo de formação, como a disponibilidade e habilidade de gerência do tempo para o estudo, a facilidade para o desempenho de estudo individual, a habilidade de leitura e escrita, entre outros. Na pesquisa, constatamos também que os alunos, sem perceber a diferença entre as duas modalidades, tendem a levar suas experiências com o ensino presencial para a educação a distância. Supomos que muitos alunos buscam o curso a distância desconhecendo suas características, despreparados, portanto, para atender às demandas dessa nova possibilidade de formação. Esses alunos, talvez, busquem a EAD como uma solução para a falta de tempo para se dedicar ao estudo, alimentando o conceito errôneo de que essa modalidade seja mais fácil do que a educação presencial, quando isto não é verdade. Nesta modalidade há exigência de diversas habilidades e competências pouco aparentes no ensino presencial, mas em destaque na EAD. Aqui o papel do aprendiz e compromisso com o estudo individual é condição básica para o sucesso da aprendizagem nesse contexto. 116

E, assim, nos parece fundamental que o aluno que se matricule em um curso a distância esteja ciente e consciente das competências necessárias para o investimento nessa modalidade, bem como o papel que deverá ser capaz de exercer durante esse processo. A capacidade de exercer um papel ativo e crítico perante o próprio processo de aprendizagem, além da capacidade de gerenciamento do tempo e das tarefas de aprendizagem, são condicionantes do sucesso. Por fim, assim como é fundamental que o aluno tenha a informação sobre o desenvolvimento de um curso a distância, sabendo o que será esperado dele nesse processo, é necessário que esteja instrumentalizado para poder iniciar sua formação na EAD. Sob essa perspectiva, à medida que os programas de EAD procurem conhecer seus alunos e oferecer-lhes o apoio necessário ao sucesso, estarão contribuindo para a promoção da qualidade em EAD e o sucesso da aprendizagem neste contexto. Referências AbraEAD Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância. Um em cada 73 brasileiros estuda a distância. São Paulo: Instituto Monitor, 2008. Disponível em: <http://www.abraead.com.br/noticias.cod=x1.asp>. Acesso em: 9 maio 2011.. Novos aliados e o que ainda temos a aprender com Sócrates. São Paulo: Instituto Monitor, 2008. Disponível em: < http://www.abraead.com.br/artigos_fredric.html >. Acesso em: 9 maio 2009. AZEVEDO, S. C. de; QUELHAS, O. L.G. Uma visão panorâmica da educação a distância no Brasil. Tecnologia Educacional, Rio de Janeiro, ano XXXI, n. 163/166, p. 13-24, out. 2003 set. 2004. BELLONI, M. L.. Educação a distância. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2003.. Ensaio sobre a educação a distância no Brasil. Educação & Sociedade, ano XXIII, n. 78, p. 117-142, abr. 2002. 117

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