CAPITALISMO CONSCIENTE Os diretores do Instituto Capitalismo Consciente, Carlos Bremer e Thomas Eckschmidt vieram falar sobre o tema. Carlos Bremer - diretor do Instituto Capitalismo Consciente Thomas Eckschmidt - diretor do Instituto Capitalismo Consciente O que é o Capitalismo Consciente? O Capitalismo Consciente existe para gerar prosperidade de forma humanizada baseada em valores e propósitos. O capitalismo baseado no lucro em primeiro lugar não se sustenta mais e tende a ser substituído por um novo modelo econômico, onde a principal razão de existir de uma empresa não é mais o seu resultado financeiro, mas o seu propósito e a diferença que ela faz na vida das pessoas. É insustentável em vários aspectos e que, portanto, precisa ser substituída por uma nova abordagem, capaz de produzir valor com ética e justiça. 80% do valor das empresas é intangível, está na marca, reputação. Todos nós precisamos de sentido e propósito em nossas vidas. É uma das coisas que nos diferencia dos outros animais. Propósito nos ativa e nos motiva. Ele nos impele a levantar pela manhã, sustenta-nos quando as coisas ficam difíceis, disse Thomas Eckschmidt, diretor geral do Instituto Capitalismo Consciente, desde 2010, e fez questão de deixar claro: Gosto de começar dizendo que sou capitalista e acredito no lucro. Visitei a Alemanha, quando ainda era dividida em ocidental e oriental, antes da unificação, e qual a minha surpresa sair de um país impressionante de primeiro mundo e chegar, num outro, de terceiro mundo, caído, velho. Isso tudo porque faltava o lucro. Desde o surgimento do mercado livre até os dias de hoje, a maior inovação do ponto de vista da espécie, no que tange a reunir riqueza, foi a empresa, e por intermédio dela, o empreendedor. Ele vê necessidades, cria um empreendimento para atender a demanda, visando lucro. 25
Negócios Conscientes nos fornecem esse senso de sentido e propósito Ao focar em seu Propósito mais profundo, uma empresa consciente inspira, envolve e energiza os seus stakeholders (partes interessadas). Funcionários, clientes e outros confiam, e até mesmo amam, empresas que têm um propósito inspirador. Fornecedores e funcionários satisfeitos prestam um serviço melhor, e isso deixa os clientes felizes. E clientes felizes são a melhor publicidade para um negócio e isso beneficia os acionistas. Capturada no acrônimo TACTILE, em inglês: Trust (Confiança) Authenticity (Autenticidade) Caring (Cuidado) Transparency (Transparência) Integrity (Integridade) Learning (Aprendizado) Empowerment (Empoderamento) O referido instituto foi fundado em 2013 para incentivar, inspirar e ajudar empresários, empreendedores e líderes a aplicarem os princípios do capitalismo consciente em suas organizações. É formado por 24 conselheiros voluntários. Se olharmos um pouco para trás, há 150 anos, a escravidão era normal e as pessoas sequer imaginariam a economia prosperar sem a escravidão, o modelo mental era diferente. 100% do voto feminino era proibido, hoje é inimaginável. Há 75 anos, havia o trabalho infantil. Há 50 anos, metade dos EUA não aceitavam o voto de negros. Somente 77 mulheres participavam da maratona. São dogmas que criamos e não têm fundamento obrigatório, disse Thomas. Convidou a plateia para um exercício de projeção para o ano 2050 a fim de perceber se o que fazemos hoje, em 2015, teria sentido. Vocês perceberam, nesse exercício de abstração, que mesmo conscientes das dificuldades, todos nós alimentamos sonhos positivos. Isso nos move. 4 PILARES do Capitalismo Consciente 1. PROPÓSITO MAIOR: ao atuarem segundo um propósito maior, as empresas vão além da simples geração/maximização do lucro e passam a criar um impacto positivo muito maior para todos os seus stakeholders. O propósito e os valores constituem o núcleo de uma empresa consciente. 2. INTEGRAÇÃO DE STAKEHOLDERS: para os autores, stakeholders são todas as entidades que impactam ou são impactadas por uma organização, as quais são igualmente importantes e estão conectadas por um senso de propósito e valores compartilhados. Dessa forma, a relação entre esses atores deve ser pautada pela busca de soluções do tipo ganha- 26
ganha, preservando a harmonia e a integração entre as partes. 3.LIDERANÇA CONSCIENTE: A concretização do Capitalismo Consciente requer a plena atuação de líderes conscientes, dotados de elevados níveis de inteligência analítica, emocional e espiritual, de forma que sejam capazes de refletir sobre o negócio e conduzílo de forma sofisticada e complexa. 4.CULTURA E GESTÃO CONSCIENTES: Tanto a forma de gestão quanto a cultura organizacional são fatores fundamentais para a prática do Capitalismo Consciente, na medida em que devem garantir a força e a estabilidade necessárias para a preservação do propósito maior da empresa. Confiança, responsabilidade, transparência, integridade, igualitarismo, justiça, crescimento pessoal, amor e cuidado são algumas das características comuns de uma cultura consciente. Não abro mão dos meus valores dentro da empresa. O que as pessoas mais temem é uma vida sem significado. Líderes que propagam isso criam uma cultura de felicidade. Essa cultura faz com que as pessoas sejam elas mesmas e não um crachá. Autonomia na ponta para viver os valores da organização. Não cria valor só para o acionista, tomar decisão pelo coletivo, defendeu. Inteligência espiritual nada tem a ver com religião ou fé, e sim, com fazer a coisa certa, agir com propósito elevado. A pergunta fica clara: por que não exercitar meus (seus) valores mais nobres na organização?, conclui Thomas. Primórdios do Capitalismo Consciente Jonh Mackey, na década de 70, tinha um mercado e um dia perdeu tudo por conta de um alagamento. Endividado, teve que fechar a loja. Os vizinhos sentiram falta da comida de qualidade e perguntaram quando ele reabriria. Numa prova de confiança, ajudaram a reformar o estabelecimento e, em 90 dias, estava reaberto. Então John pensou: Opa! Criei um negocio de valor! Hoje, a Whole Foods Market, é líder mundial na venda de alimentos naturais e orgânicos, com mais de 340 lojas espalhadas pelos Estados Unidos, Reino Unido e Canadá e cujas prateleiras são reconhecidas por abrigar somente produtos de altíssima qualidade e, de forma geral, relacionados a uma alimentação saudável. Raj Sisodia é um professor e pesquisador, autor de sete livros sobre organizações e negócios que estava pesquisando marcas. A pergunta era a seguinte: as pessoas sentiriam falta se a sua marca desaparecesse hoje? E num estudo de valoração da marca percebeu que 80% do valor era intangível, ligado a marca e reputação, e as pessoas insistiam em gastar milhões para capturar isso, muitas vezes, sem sucesso Como se deu o encontro entre John e Raj? Thomas conta um pouco mais dessa história... Raj Sisodia cursou engenharia na Índia e trabalhava numa sala sem ar condicionado. Soube que aqueles que tinham MBA poderiam migrar para uma sala com temperatura condicionada. E assim cursou o MBA. Depois, ficou sabendo, por um grupo de amigos, que poderia fazer doutorado em administração ou marketing nos Estados Unidos. Lá foi ele 27
prestar e foi o único do grupo que passou. E assim, o destino, por exclusão, o levou para os EUA. Raj impressionou-se ao perceber que o que as empresas americanas investiam em marketing era três vezes maior que o PIB da Índia e nem sempre tinham resultados. Por outro lado, pesquisou 60 empresas que investiam muito menos em marketing, mas adotavam um comportamento mais atento com funcionários e consumidores e tinham bons resultados, inclusive na bolsa de valores. Raj registrou isso em um livro Empresas Humanizadas. Um sistema corporativo que tem um ecossistema que gera valor para os stakeholders e para a sociedade, nas palavras de Raj, fazem o melhor negócio. Uma empresa pode ser transformadora do seu setor, da sociedade, se tiver um propósito claro. É possível atender as demandas da sociedade com a sua empresa, seja ela grande ou uma start up. O que Raj fala também é que os líderes engajados tem valores ligados à família, e à religiosidade, valores que na verdade vem do nível da espiritualidade. O capitalismo e seus líderes emblemáticos que continuaram por extrema ganância, desejos egoicos buscando a monopolização, deixaram como rastro também o excesso de sindicalização, uma guerra, entre aqueles que deviam operar na parceria. Na Whole Foods, por exemplo, ninguém é sindicalizado. John e Raj se encontraram num avião, apresentados por um amigo comum, Raj já usava o exemplo da rede em seus livros e John ficou encantado com isso. Ambos criaram o Capitalismo Consciente, em 2005, na intenção de resgatar o espírito heroico do empreendedor CAPITALISMO CONSCIENTE Para ampliarmos a percepção do tema, Capitalismo Consciente, seguem trechos do livro Capitalismo Consciente Como Liberar o Espírito Heroico Dos Negócios, de Mackey, John; Sisodia, Raj: Negócios não têm a ver com fazer o máximo de dinheiro possível. Têm a ver com a criação de valor para as partes interessadas. (pág. 23) Ser consciente significa estar totalmente desperto e lúcido para enxergar realidade com 28
clareza e para entender todas as consequências de nossas ações, a curto e a longo prazo. Significa estar atento ao que se passa dentro de nós mesmos e na realidade externa, bem como aos impactos disso tudo sobre o mundo. Significa, também, ter um forte compromisso com a verdade e agir do modo mais responsável, de acordo com o que entendemos ser verdadeiro. (pág. 31) As organizações florescem a partir do compromisso e da criatividade do ser humano. (pág. 77) Um dia, praticamente todas as empresas irão funcionar com uma orientação para seus propósitos maiores, integrando os interesses de todas as partes interessadas, desenvolvendo e promovendo líderes conscientes e construindo uma cultura de confiança responsabilidade e cuidado. (pág. 286) A proposta central do capitalismo consciente é apresentar uma forma diferente de se operar o modelo Capitalista, na qual o lucro não seja a única ou principal razão de ser das organizações. Segundo os autores, uma empresa consciente deve possuir propósitos mais elevados e buscar a geração de valor, de maneira equilibrada e sustentável, para todas as partes interessadas (stakeholders). 29