Waste to Energy: Uma alternativa viável para o Brasil? Yuri Santos, Sérgio Oliveira e Ricardo Correa
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- Carlos Eduardo Fagundes da Cunha
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1 Waste to Energy: Uma alternativa viável para o Brasil? Yuri Santos, Sérgio Oliveira e Ricardo Correa
2 2 Promon Intelligens Promon Intelligens 2013
3 Introdução O tema da gestão sustentável dos Resíduos Sólidos Urbanos nunca esteve tão em evidência no Brasil. Isto se deve em grande parte aos complexos desafios que se apresentam ao longo de todas as etapas da cadeia de gestão dos resíduos, em destaque após a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos PNRS. Entre estes desafios, destacam-se: a geração de resíduos com crescimento constante, reflexo do aumento do consumo das famílias brasileiras um modelo de coleta e triagem de resíduos de baixa eficiência a falta de incentivos e de mecanismos de aumento de competitividade da indústria de reciclagem a aceitação limitada por parte do mercado consumidor de materiais ou produtos reciclados. Há desafios em cada um dos elos da cadeia produtiva, como ilustrado em detalhes na Figura 1, destacando-se aqueles relacionados à coleta e triagem de resíduos. Na nossa avaliação, há que considerar ainda questões sistêmicas, como a dinâmica evolutiva das tecnologias adotadas pelos diversos atores da gestão de resíduos, que pode levar a uma importante descontinuidade na geração e distribuição de valor ao longo desta cadeia. A adoção de modelos de coleta e triagem mais mecanizados, acoplados a sistemas de recuperação energética de resíduos, representaria um destes possíveis breakthroughs de tecnologia, para o qual não podemos deixar de adotar uma visão crítica sobre sua viabilidade e prazo de adoção. Promon Intelligens 3
4 Descarte Pós-Consumo Suprimentos Coleta + Triagem Reciclagem Aplicação Taxa de geração de resíduos superior ao crescimento populacional O panorama de geração de resíduos varia conforme a região em que está localizada Necessidade de maior engajamento em programas de educação ambiental para separação dos resíduos na fonte A coleta regular é realizada através de contratos de longo prazo de concessão pública A abrangência da coleta seletiva nos municípios é limitada, 98% do total coletado vai para aterro e lixão A triagem é um gargalo alta informalidade e baixo grau de organização dos catadores Aterros/Lixão O suprimento de material reciclável é o elo frágil da cadeia e impede que o setor cresça de forma mais expressiva Pontualmente, existem materiais (alumínio e PET) que são referências mundiais em índice de reciclagem A tributação é um desafio do setor A inserção de novos produtos a partir de material reciclado sofre barreiras técnicas e de mercado O valor energético presente nos resíduos ainda não é explorado Figura 1 - Desafios na cadeia de Gestão dos Resíduos Sólidos. Fonte: Análise Promon Intelligens Até que sejam criadas as condições favoráveis para se implementar plenamente novos modelos, o mercado deve voltar seus esforços para testar novas tecnologias e aproveitar de forma sustentável os resíduos industriais gerados no processo produtivo ou resíduos pós-consumo estes últimos através da estruturação de uma eficiente e inclusiva logística reversa. Esse artigo discute inicialmente aspectos chave do aproveitamento energético dos resíduos sólidos urbanos no Brasil através de tecnologias de Waste to Energy WtE, considerando o panorama atual e as projeções futuras. Apresenta também, cenários em que sua implementação se viabiliza, e complementa a reciclagem de materiais pós-consumo. 4 Promon Intelligens
5 Aterros sanitários como disposição final não são sustentáveis a longo prazo A PNRS é um importante marco para a regulação do setor de resíduos sólidos e contempla importantes princípios, dentre eles: a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; o princípio do poluidor-pagador e protetor-recebedor; e a visão sistêmica na gestão dos resíduos. A legislação estabelece que se deve seguir uma ordem de prioridade nas ações previstas na gestão dos resíduos (Figura 2) a fim de valorizar-se ao máximo os materiais e gerar a menor quantidade possível de resíduos, até que se esgotem as opções tecnológicas viáveis. O rejeito, então, deve ser disposto em aterros sanitários. Figura 2 Ordem de Prioridade na gestão de resíduos. Fonte: PNRS Não gerar Reduzir Reutilizar Reciclar Tratar Dispor Promon Intelligens 5
6 A disposição final em aterros, entretanto, não deveria ser uma solução definitiva, visto que os aterros: emitem maior quantidade de gases de efeito estufa que outras soluções com aproveitamento energético desperdiçam energia renovável têm custo crescente devido à expansão urbana e valorização imobiliária. Na Comunidade Europeia, essas soluções estão sendo banidas, devendo estar totalmente extintas até Países como Alemanha e Holanda já erradicaram as destinações para aterros sanitários. A recuperação de gás desses aterros deveria ser apenas uma ação paliativa para a desativação e recuperação de antigos lixões/aterros, como exemplo os aterros de Bandeirantes e São João, ambos desativados em São Paulo em 2005 e 2007, respectivamente. Com capacidades esgotadas em 25 milhões de toneladas, hoje vendem créditos de carbono o aterro Bandeirantes arrecadou cerca de R$ 75 milhões em três leilões de crédito de carbono. As tecnologias de recuperação energética são expressamente consideradas na legislação como opção na etapa Tratar da pirâmide de prioridades, desde que comprovada sua viabilidade técnica e ambiental, e desde que acompanhada por um programa de monitoramento de gases aprovado pelo órgão ambiental. Isto significa que, antes de seguir para aterros sanitários, os resíduos devem ser tratados de alguma forma: através de biodigestão, compostagem, produção de Combustível Derivado de Resíduos CDR ou tratamento térmico com geração de energia, entre outras. 6 Promon Intelligens
7 1% Apesar da legislação definir a ordem de prioridade de forma a só destinar o que for rejeito para aterros sanitários, as metas definidas no Plano Nacional de Resíduos Sólidos parecem não representar essa realidade. Projetamos o cenário futuro do impacto das metas de redução dos resíduos secos e úmidos destinados a aterros até 2031 no panorama de destinação final dos resíduos. O resultado desta projeção, como ilustrado na Figura 3, mostra que em 2031 ainda serão destinados a aterros sanitários 57% do total gerado de resíduos. Mesmo em um cenário conservador, parte significativa do total de resíduos ainda dispostos em aterros possui um potencial para geração de energia a partir de tecnologias de Waste to Energy (WtE). Considerou-se apenas o redirecionamento de materiais cuja destinação final seria o aterro sanitário. 1% 98% Hoje WtE Aterro Compostagem Reciclagem 15% 15% 27% 27% 57% Metas PNRS (2031) 12% 45% Com WtE Figura 3 Projeção de panorama de destinação de resíduos sólidos. Fonte: Análise Promon Intelligens Promon Intelligens 7
8 Rotas tecnológicas alternativas que valorizam o resíduo e podem ser viáveis no Brasil Em um mapeamento das principais tecnologias no mundo de aproveitamento energético a partir de resíduos sólidos urbanos, identificamos tecnologias que são amplamente usadas e outras que ainda estão em estágio de desenvolvimento para se viabilizar em escala industrial. A Quadro 1 resume algumas destas tecnologias e seleciona aquelas com maior aplicabilidade ao cenário brasileiro. Uma delas é a recuperação do gás metano da fração orgânica dos resíduos a fim de usar o biogás para geração de energia, e a outra é a recuperação energética dos resíduos através da sua combustão. O uso dessas tecnologias no Brasil depende de diversos fatores que devem ser analisados de forma sistêmica. 8 Promon Intelligens
9 Digestão Anaeróbica Usina de Recuperação Energética (URE) Gaseificação Processamento da fração orgânica dos resíduos com geração de biogás para posterior geração de energia Tratamento térmico ( ºC) com geração de vapor que é usado para geração de energia Tratamento térmico em ambiente controlado de oxigênio, produz gás de síntese (syngas) e biogás para produção de energia Limitantes: requisitos de granulometria uniforme e baixa umidade do material Pirólise Tratamento térmico em ambiente livre de oxigênio e recuperação de calor para geração de energia Limitantes: projetos ainda sem escala industrial Plasma Tratamento térmico em altas temperaturas (sem oxigênio) até a ionização do gás denominado plasma com geração de gás combustível para geração de energia Limitantes: Investimentos muito altos Tecnologia viável Quadro 1 - Resumo das principais tecnologias de geração de energia a partir de resíduos Promon Intelligens 9
10 As URE já são amplamente disseminadas nos países desenvolvidos A recuperação energética já é uma realidade comprovada em países desenvolvidos. Na Europa são mais de 450 usinas ativas processando 70 milhões de toneladas de resíduos urbanos com potencial de geração de 35 milhões MWh energia por ano. O panorama europeu, além de comprovar a viabilidade da tecnologia, mostra a sua complementariedade com o mercado de reciclagem. A Figura 4 evidencia tal afirmação na medida em que os países que mais reciclam são também os que mais aproveitam a energia dos resíduos através de usinas de recuperação energética. Reciclado e Compostado Incinerado Aterro Sanitário Figura 4 - Tratamento de resíduos urbanos na Europa. Fonte: CEWEP e EUROSTAT (2010) 10 Promon Intelligens
11 O processo de mass burning, geração de energia elétrica através do vapor gerado pela combustão de resíduos sólidos urbanos, é amplamente conhecido e utilizado na Europa. Até os anos 1990, não se tinha visibilidade dos impactos ambientas da tecnologia e nem o controle eficiente das emissões atmosféricas. Após regulamentação do setor, passou-se a controlar rigorosamente as emissões e tratar os gases da combustão dos resíduos, atingindo hoje níveis irrelevantes de emissão. Na Europa, a diretiva IED 2010/75/EU atribui os mais rigorosos limites diários de emissão para as Unidades de Recuperação Energética. A Figura 5 é um diagrama esquemático de uma usina de recuperação energética, mostrando um sistema tradicional de combustão em conjunto com um sofisticado sistema de limpeza de gases. Os benefícios associados à valorização energética dos resíduos sólidos urbanos não-recicláveis posicionam esta tecnologia como uma solução complementar aos desafios da gestão de resíduos. Alguns destes benefícios, já capturados principalmente por players e governos na Europa, são: Aproveitamento do conteúdo energético dos resíduos, evitando a utilização de combustíveis fósseis Redução em mais de 90% do volume dos resíduos Redução de gases de efeito estufa já que evita que os resíduos sejam destinados a aterros que emitem metano Eliminação de substâncias tóxicas e agentes patogênicos do ecossistema Processamento de grande variedade de resíduos, mesmo com alto teor de umidade Geração de receita através da comercialização de energia, vapor e materiais. Figura 5 Diagrama esquemático de uma Usina de Recuperação Energética. Fonte: CNIM Promon Intelligens 11
12 Como viabilizar a recuperação energética no Brasil? A realidade brasileira e dos países em desenvolvimento enfrenta desafios específicos na gestão de resíduos. As soluções para o setor, portanto, devem ser muito bem estruturadas em torno das melhores práticas adaptadas às condições da realidade local. O Brasil tem alto potencial de gerar energia elétrica a partir de resíduos urbanos. Se considerarmos os 90 milhões de pessoas que vivem em regiões metropolitanas gerando 1,2 Kg de resíduo cada por dia e que 45% do total gerado seria o potencial endereçado para o WtE, isso significa que 17,5 milhões de toneladas de resíduos por ano teriam o potencial de gerar 8,7 milhões de MWh utilizando-se as tecnologias das usinas de recuperação energética. Apesar de ainda não existir nenhuma URE no Brasil, já existem iniciativas avançadas próximas de se viabilizar, como é o caso dos municípios de Barueri e São Bernardo do Campo que já consideram em seus Planos municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PGIRS) a recuperação energética dos resíduos sólidos urbanos. 12 Promon Intelligens
13 O desenvolvimento no setor depende de uma modelagem do negócio que envolve fatores técnicos, políticos e sociais: Disponibilidade de Resíduos não recicláveis: Os municípios, de forma isolada ou em consórcios, devem ter no mínimo 500 mil habitantes para garantir a escala de produção da URE. Arranjos Institucionais: A formatação de Parcerias Público-Privada PPP para viabilizar os investimentos iniciais com contratos de longo prazo para garantir o fornecimento de resíduos com custo de destinação (tipping fee) bem dimensionado e a formatação de PPA (Power Purchase Agreement) para garantir a venda de energia são essenciais para viabilizar economicamente o negócio. Modelagem econômico-financeira: O desenho do modelo de negócio com dimensionamento cuidadoso do Capex e do Opex dará maior credibilidade na captação de investimentos. Por ser um empreendimento novo no país, devem-se desenvolver fornecedores locais e estrangeiros que detenham a tecnologia de ponta. Educação Ambiental: Ainda existem muitos mitos a respeito da recuperação energética que geram pressões de caráter social contra a tecnologia. A conscientização acontecerá conforme a informação for disseminada através dos dados e fatos já comprovados dos benefícios da adoção desta tecnologia. Em resumo, o aproveitamento energético de resíduos a partir da adoção de tecnologias emergentes, adaptadas ao mercado brasileiro, pode ser viável, desde que uma visão integrada na gestão de resíduos seja efetivamente seguida. As usinas de recuperação energética devem ser vistas como uma solução complementar na hierarquia de destinação de resíduos e não como concorrente das demais soluções em adoção na cadeia de reciclagem de resíduos sólidos. Dessa forma, o Brasil poderá aproveitar no futuro o enorme potencial energético que hoje é desperdiçado com a destinação de valiosos recursos em aterros sanitários. Promon Intelligens 13
14 Informações para contato Yuri Santos Consultor +55 (11) Sérgio Oliveira Diretor +55 (11) Ricardo Correa +55 (11) São Paulo Av. Pres. Juscelino Kubitschek, (11)
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