Advanced Planning and Scheduling Por Soraya Oliveira e Raquel Flexa A importância do planejamento Uma cadeia de suprimentos é composta por diversos elos conectados que realizam diferentes processos e atividades e que produzem valor para o cliente, em forma de produtos e serviços. As decisões tomadas a todo instante por cada um dos elos pode impactar o desempenho da operação de toda a cadeia. Motivado por este fato, surgem os esforços de integração dos processos de planejamento das diversas empresas que compõem a cadeia, de modo a garantir melhores resultados e desempenhos. A Evolução dos sistemas de planejamento da produção Em meados dos anos 50 e 60, a escassez de produtos, oriunda da segunda guerra mundial, fazia com que as indústrias não se preocupassem com questões relativas à previsão da demanda, dado que a esta se mostrava superior à capacidade instalada. Entretanto, havia a preocupação quanto à priorização de pedidos, visto que não era possível atendê-los por completo. Anos depois, com a normalização da economia, a preocupação passa a ser outra e emerge a maior necessidade de planejamento dos sistemas produtivos. A intenção envolvida nesta preocupação é o tratamento de questões como o melhor uso da capacidade, políticas para a formação de estoques e formas de entendimento das necessidades de mercado e desdobramento para o contexto industrial. Com isso, o planejamento da produção começa a demandar métodos mais robustos que consigam suportar os novos processos impostos por esta realidade. Como resposta a este movimento, surgiram os sistemas MRP (Material Requirements Planning), que apresentavam como principal diferencial a funcionalidade de explodir a árvore de materiais (BoM Bill of material) de um certo produto, formado por vários componentes intermediários, sendo capaz de determinar o que, quanto e quando tais componentes precisariam ser produzidos ou comprados, para que fosse possível entregar o produto acabado no prazo acordado. Esse sistema trazia como ganho a redução de problemas relacionados com faltas e sobras de materiais. Uma das premissas do MRP é que os componentes dos produtos (itens e quantidades), bem como seus respectivos tempos de fabricação ou aquisição são conhecidos. Com base em um planejamento futuro de necessidades de produtos acabados, o MRP realiza o cálculo das necessidades de componentes e materiais, definindo a data de início de produção ou aquisição de cada componente ou material. Embora tenha trazido ganhos em um primeiro momento, o MRP se mostrou deficiente no tratamento e consideração sobre a capacidade dos recursos produtivos para atender ao plano gerado. Desta forma, atrasos de entregas eram constantes e, para buscar resolver este problema, algumas empresas adotaram práticas de superestimar os lead times de produção, formando uma folga de tempo. Esta forma de atuação prejudicava 1
o desempenho da indústria no critério velocidade de entrega e ainda não era capaz de tratar os tempos de fila variáveis em função da carteira de pedidos. Esta deficiência dos sistemas MRP fez com que surgisse o MRP II (Manufacturing Resource Planning), que passou a não somente analisar o que, quanto e quando produzir, mas também como produzir, através da inclusão do cálculo de capacidade dos recursos na realização da programação de produção. Além disso, o MPR II é orientado por um planejamento hierárquico de decisões e cálculos, a fim de alcançar uma programação de produção viável, tanto em relação à disponibilidade de materiais, quanto à capacidade necessária. A gestão de capacidade no MRPII é tratada por três diferentes métodos: RRP (Resource Requirements Planning), que trata do planejamento de longo prazo, subsidiando as decisões do S&OP (Sales and Operations Planning); RCCP (Rough Cut Capacity Planning), que trata do planejamento de médio prazo, subsidiando as decisões do Plano Mestre de Produção; CRP (Capacity Requirements Planning), que trata do planejamento de curto prazo, subsidiando as decisões do MRP. Mesmo apresentando este grande incremento no que tange a programação de produção, o MRP II ainda apresenta algumas limitações. Entre elas, é possível verificar que o planejamento de capacidade fino (CRP), por exemplo, trata a alocação dos recursos de forma agregada, sem considerar sequencia das ordens de produção, setups variáveis e possibilidade de uso de roteiros alternativos de produção. Os métodos de gestão de capacidade do MRP II apenas geram alertas ao programador quando a capacidade de algum recurso é insuficiente, mas não é capaz de mostrar como o nivelamento de carga de um recurso pode afetar a programação fina dos demais recursos de um mesmo roteiro de produção. Para cenários produtivos mais complexos, onde a forma de sequenciar as ordens de produção pode gerar níveis de desempenho superiores, é possível melhorar os resultados do MRP II através do uso de sistemas de programação com capacidade finita ou APS (Advanced Planning and Scheduling). Conceito de Programação Fina ou Advanced Planning and Scheduling (APS) O conceito de APS pode ser frequentemente encontrado na literatura a partir de dois pontos de vista. O primeiro deles considera APS como um sistema com um conjunto de módulos que buscam auxiliar não somente o sequenciamento das operações no chão de fábrica, como também todas as atividades envolvidas no planejamento da produção, tanto em níveis mais agregados, quanto mais detalhados. Kilger e Stadtler (2008) colocam que tais categorias de APS fazem tanto o planejamento de uma única unidade fabril para diferentes horizontes, como também pode promover o planejamento horizontal entre os elos da cadeia de suprimentos. 2
Figura 1: Planejamento na Cadeia de Suprimento Fonte: Kilger C., Stadtler, H., (2008), pg 87. Com as exigências impostas pelo mercado com relação ao desempenho de entregas, as necessidades de reduzir custos através da manutenção de baixos níveis de estoques e a dificuldade para obtenção de investimentos em capacidade, sistemas de carregamento finito ganham importância. Estas ferramentas permitem que toda a estrutura do produto seja programada de forma detalhada, obedecendo às restrições de capacidade e das operações. Outros autores enxergam o APS como ferramenta para o sequenciamento da produção de uma instalação produtiva propriamente dita, considerando suas diversas restrições do chão de fábrica. Os sistemas APS levam em consideração a real capacidade dos recursos produtivos ao longo do tempo (taxa de ocupação, eficiência real, produtividade variável por produto ou por turnos, por exemplo) e oferecem funcionalidades que permitem obter programações de produção mais confiáveis e que fazem o melhor uso da capacidade instalada da empresa no atendimento ao mercado (CARVALHO, 2010). Figura 2: Exemplo de telas de um Sistema APS Figura 3: Elementos tratados pelos Sistemas de Sequenciamento da Produção Os sistemas do tipo APS apresentam algumas funcionalidades que os caracterizam como sistemas de capacidade finita, por exemplo: Suportar modelos que considerem as múltiplas restrições, tais como: operadores e ferramentas, cálculos de tempo de setup dependentes da sequência com base em múltiplos atributos de produto, restrições de tempo mínimo e máximo entre operações, dentre outras;. 3
Suportar diferentes regras (algoritmo+sentido da programação) de sequenciamento que englobem todas as restrições do modelo, demonstrando rapidez na visualização da programação da produção com a regra escolhida; Serem facilmente parametrizáveis, para que possam atender à dinamicidade dos negócios; Sequenciar com precisão usando recursos como referência (não somente centros de trabalho), considerando capacidades finita e infinita, com eficiências e turnos distintos para cada recurso. O uso de sistemas do tipo APS permite realizar análises relacionadas com diversos elementos da administração da produção, tais como: planejamento de capacidade, promessa de data de entrega, programação da produção e gestão de materiais. A seguir, são descritas questões que podem ter suas respostas suportadas por este tipo de técnica. Quanto aos pedidos dos clientes: Para quando é possível prometer, de forma confiável, a data de entrega de um pedido? Caso seja colocado um pedido emergencial, há capacidade para atendê-lo? Qual o impacto que este atendimento terá sobre os demais pedidos já programados? Quais são os impactos que uma quebra de máquina ou uma manutenção corretiva podem gerar nas entregas? Quanto à capacidade de produção Onde adicionar novos equipamentos de modo a aumentar efetivamente a capacidade produtiva? Caso um novo equipamento seja adquirido, a demanda poderá ser totalmente atendida? Caso um novo turno seja implementado, a demanda poderá ser totalmente atendida? Onde estão os gargalos da produção? Quais os tipos de investimentos podem ser feitos para minimizar esta restrição? Quanto à programação da produção O que está programado para o curto prazo no chão de fábrica (próximos dias)? E para o médio prazo (próximos meses)? Para um dado mix de produtos, qual a regra de sequenciamento que melhor atende as prioridades estabelecidas pela empresa? Quanto aos materiais Qual o momento exato de chegada de determinados insumos? Aplicabilidade de um Advanced Planning and Scheduling (APS) Pode-se perceber que em alguns ambientes industriais o impacto da implementação de um sistema APS é mais perceptível do que em outros. As principais características de uma empresa que indicam vantagens na adoção de processos de programação fina da produção são: Roteiros de produção complexos; 4
Intenso compartilhamento de equipamentos entre linhas de produtos; Existência de restrições secundárias como ferramentas, equipes, materiais de apoio etc.; Lead times variáveis conforme o tamanho da fila e carga dos recursos; Necessidade de alterações constantes nas prioridades dos pedidos com a avaliação do impacto destas mudanças nas datas de entrega. podem retratar a situação vigente de seus processos. Todavia, se neste ponto foi identificada a necessidade de melhoria dos processos de programação fina da produção, deve-se partir para a fase de projeto, por meio da especificação das melhorias e redesenho destes processos. O próximo passo então, é a parametrização da solução APS escolhida à realidade da empresa e a integração com os demais sistemas, como o MES e o ERP, por exemplo. Soma-se, também, os casos em que o recurso gargalo pode ser dinâmico, ou seja, variar conforme o mix de produtos sequenciados em um determinado período. Nesse caso, o APS pode realizar diversas simulações para que o recurso gargalo tenha sua utilização maximizada. Implementação de uma solução Advanced Planning and Scheduling (APS) Liddel (2009) afirma que uma solução APS é implementada através de seis fases: avaliação, projeto, desenvolvimento do protótipo, testes, implementação e pósimplementação. Na primeira fase, a de avaliação, busca-se identificar onde a empresa está atualmente e onde ela deseja chegar em seus processos de programação da produção. A partir da identificação deste gap, exploram-se quais as soluções podem auxiliar em sua minimização. Sendo assim, os processos de negócios servem como ferramenta para esta fase, dado que Figura 4: Mapa Geral da Solução APS Fonte: Liddel, 1944, p.82 Na fase de desenvolvimento de protótipo, são utilizadas bases de dados de teste para avaliar o quão aderente a solução está do projeto inicial. Na fase de testes, são realizados dois tipos de testes. O primeiro deles é o unitário, onde a solução é testada a partir de suas funcionalidades básicas propostas. Já o outro é um teste de integração, onde são testadas as trocas de informações entre o sistema APS e os demais sistemas da organização. A fase seguinte é a de implementação, onde a solução é finalmente colocada em funcionamento. Nesta fase, deve ser elaborado um plano de ação para a 5
migração do antigo processo de programação da produção para o novo processo suportado pelas técnicas de sequenciamento fino da produção. A última fase é a de pós-implantação onde, a partir da recorrência de execução do novo processo, são identificadas novas necessidades, a fim de melhorar sua forma de operação. Tais sugestões devem ser incorporadas à solução em ciclos posteriores de melhorias. Ganhos relacionados com Advanced Planning and Scheduling (APS) Através do tratamento adequado das restrições de produção por intermédio de processos de programação avançada, é possível obter os seguintes ganhos: Maior precisão na promessa de prazos de entrega e, consequentemente, atendimento com maior confiabilidade dos pedidos dos clientes; Aumento da visibilidade dos impactos gerados por eventos imprevistos na programação de produção e na data de promessa do pedido, possibilitando que o programador tenha tempo hábil para realocar as ordens de forma a não comprometer a data prometida de entrega; Distribuição da capacidade feita de forma mais eficiente, possibilitando a identificação de possíveis gargalos que necessitam ser focos de atenção e outros recursos subordinados que podem, por exemplo, ter seu turno reduzido; Facilita a programação de manutenção preventiva, que poderá ser prevista de forma integrada e precisa com a programação de produção; Redução dos estoques, tanto de produto acabado quanto de estoque em processo; Melhor gerenciamento das compras de materiais e serviços, pois permite saber o tempo exato em que estes serão necessários; Permite elaborar diferentes cenários, como a priorização de um produto, a compra de uma nova máquina ou a adição de um novo turno, por exemplo; Permite criar políticas de atendimento distintas para cada cliente, com capacidade de previsão do impacto destas sobre a carteira de pedidos. Conclusão A discussão aqui exposta permite verificar que a complexidade e o dinamismo do mercado geram maior complexidade na gestão da produção nas empresas. Para se adaptarem a este contexto, as organizações precisam de soluções que suportem processos de programação flexíveis e de rápida resposta. Estes processos, quando suportados por soluções tecnológicas como sistemas do tipo APS, conseguem melhorar seus resultados. Este incremento de desempenho pode ser observado através de um planejamento de produção e materiais mais confiável e preciso, aumento da confiabilidade do cliente, 6
redução dos estoques e redução de horas extras. A versatilidade e a flexibilidade das soluções APS, permitem que sejam aplicáveis a diversos segmentos, tanto do ramo industrial quanto o de serviços, trazendo incrementos substanciais de performance e desempenho para a organização. Concepts, Models, Software and Case Studies. Springer-Verlag, Berlim, 2008. Referências Bibliográficas Carvalho, D. APS - Advanced Planning Systems. Disponível em <http://www.tecmaran.com.br/apsadvanced-planning-systems.html>, acessado em 05/2010. Corrêa, H.L., Gianesi, I.G.N e Caon, M. Planejamento, programação e controle da produção: MRPII/ERP: conceitos, uso e implantação. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2001. Günther, H. e Beek P. Advanced Planning and Scheduling Solutions in process industry. Springer-Verlag, Berlim, 2003. Liddel, Mike. O pequeno livro azul da programação da produção. Edição brasileira: Tecmaran, Espírito Santo, 2009. Stadtler, H. e Kilger, C. Supply chain management and advanced planning. 7