1.1 CONCEITO DE DIREITO PENAL

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1 1.1 CONCEITO DE DIREITO PENAL O Direito Penal é um ramo do direito público e consiste em um conjunto de normas jurídicas que tem por objeto a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes penas e medidas de segurança 1. Essa é a definição de direito penal enquanto um direito positivo ou legislado. A expressão Direito Penal também pode ser utilizada para caracterizas a atividade de interpretação e sistematização do direito positivo que busca estabelecer o alcance, os limites e os objetivos das normas penais, estabelecendo critérios para sua aplicação ou seja, como Ciência do Direito Penal ou Dogmática Penal. Numa perspectiva que leva em conta a relação do Direito Penal com a Sociedade, Direito Penal é o segmento do ordenamento jurídico que detém a função de selecionar os comportamentos mais graves e perniciosos à coletividade, capazes de colocar em risco valores fundamentais para a convivência social, e descrevê-los como infrações penais, cominando-lhes, em consequência, as respectivas sanções, além de estabelecer todas as regras complementares e gerais necessárias à sua correta e justa aplicação CARACTERES DO DIREITO PENAL São três as principais características do direito penal: valorativo, finalista e sancionador. 3 a) Valorativo: porque tutela os valores mais elevados da sociedade e os dispõe em uma escala hierárquica, valorando os fatos de acordo com a sua gravidade e impondo uma sanção proporcional à gravidade do fato. b) Finalista: porque tem a finalidade de prevenir lesões aos bens e interesses jurídicos merecedores da tutela mais gravosa disponível ao Estado, que utiliza como meio a ameaça legal de aplicação de sanções de maior poder intimidatório a pena. c) Sancionador: por meio da sanção penal reforça a tutela jurídica dos bens já regidos pela legislação extrapenal, de forma que não cria os bens jurídicos, mas apenas acrescenta sua sanção aos mais importantes. Excepcionalmente, entretanto, pode ter caráter constitutivo, protegendo bens jurídicos não tutelados pelas leis extrapenais. 1 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral ed. São Paulo: Saraiva, p CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral ed. São Paulo: Saraiva, p. 33-4; MIRA- BETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

2 1.3 FUNÇÕES DO DIREITO PENAL Grande parte da doutrina entende que a principal e mais legítima função do Direito Penal é ser instrumento de proteção de bens juridicamente relevantes. São citadas pela doutrina diversas funções do Direito Penal, tais como: a) proteção de bens jurídicos: não se admite a criação de norma incriminadora que não vise à proteção de um bem jurídico. É a principal função. b) controle social: a ameaça de penalização de condutas danosas, em teoria, contribui para a paz pública. No entanto, ante a incerteza da efetiva aplicação da norma e da ausência de políticas públicas que visem à redução da criminalidade, não se consegue promover um efetivo controle social. c) função ético-social: parte minoritária da doutrina entende que o Direito Penal exerce função ética, fornecendo uma base de valores à sociedade. Trata-se, entretanto, da reafirmação dos éticos da sociedade e não da imposição de uma ética não aceita pela coletividade. d) função de garantia: o Direito Penal também tem como função limitar o poder punitivo estatal, de modo a garantir ao cidadão que não será alvo de arbitrariedades por parte do poder público. e) função simbólica: é o efeito psicológico que a proibição gera na sociedade. A criminalização de uma conduta vem carregada de um simbolismo que visa produzir um efeito psicossocial nos cidadãos de que o Estado está agindo efetivamente para reprimir determinados comportamentos. f) função promocional: uma corrente minoritária da doutrina vê no Direito Penal uma função de transformação social, promovendo certos valores sociais. Assim, a criminalização não depende dos valores da sociedade, pois a criação de delitos serve justamente para transformar tais valores. g) prevenção de vingança privada: o Direito Penal, ao conferir ao Estado o monopólio da pretensão punitiva, exerce o papel de evitar que vítimas façam justiça com as próprias mãos. h) função motivadora: por meio da ameaça de uma sanção, o Direito Penal motiva os indivíduos a não realizarem determinadas condutas DIREITO PENAL COMUM E ESPECIAL A divisão entre Direito Penal Comum, que se aplica a todas as pessoas, e Direito Penal Especial, dirigido a uma categoria específica de indivíduos, com certas características específicas. O melhor critério para a distinção utiliza como critério o órgão jurisdicional encarregado pela aplicação. Assim, são Direito Penal Comum: o Código Penal e as leis penais extravagantes, tais como a Lei de Contravenções, Lei de Tóxicos, Lei de Falências etc., que são aplicadas pela Justiça Comum. São Direito Penal Especial: Direito Penal Militar, aplicado pela Justiça Militar, e a lei do impeachment, aplicada pelo Congresso Nacional (alguns autores também consideram o Direito Penal Eleitoral).

3 Não se deve confundir Direito Penal Especial com legislação penal especial. Esta é toda legislação penal não prevista no Código Penal, que é a legislação penal comum. 1.5 A CIÊNCIA CONJUNTA DO DIREITO PENAL: DOGMÁTICA PENAL, POLÍTICA CRIMINAL E CRIMINOLOGIA Franz von Liszt, penalista alemão, cunhou a expressão Ciência Conjunta do Direito Penal, como a integração entre Dogmática Penal, Criminologia e Política Criminal. Estas três, entretanto, apesar de serem complementares, são disciplinas autônomas, com características e objetos de estudo próprios. a) Criminologia: é uma ciência empírica, descritiva e interdisciplinar que tem como objetos de estudo o crime e suas causas, o criminoso, a vítima e o controle social de comportamentos criminosos. Tem como função, entre outras, apontar os problemas sócias decorrentes da aplicação do Direito Penal, fornecendo dados para a formulação de políticas criminais. a.1.) Escola Positiva Italiana: a criminologia surge como criminologia positivista (com enorme influência das ciências naturais, como a biologia) e buscava explicar as causas naturais do crime (etiologia criminal), entendendo o crime como uma doença e o criminoso como um doente que poderia ser tratado. Tem como principais expoentes Cesare Lombroso, que desenvolveu a teoria do criminoso nato, indivíduo que seria biologicamente predisposto à prática de crimes; Enrico Ferri, que fundamentava a responsabilidade penal no determinismo social, afastando a tese do livre arbítrio; e Rafaelle Garofalo, que idealizou a teoria psicologicista segundo a qual os criminosos irrecuperáveis deveriam ser afastados do convívio social pela deportação ou pela morte. a.2.) Criminologia Crítica: a criminologia desenvolveu-se e atualmente as correntes mais populares entendem o crime como um fenômeno social que tem suas causas não em fatores biológicos, mas em problemas e conflitos sociais, de forma que critica a estrutura social, o Direito Penal e o controle institucional de crimes, como a atuação das polícias, por exemplo (esta corrente tem diversas divisões). a.3.) Criminologia da Reação Social: é uma corrente de origem norte-americana, que entende a sociedade como uma rede de interações sociais que origina símbolos (chamada por isso de interacionismo simbólico). O crime é um desses símbolos criados pela interação social, de forma que o crime não tem existência ontológica (ou natural) e, portanto, o criminoso é alguém que foi etiquetado pela sociedade (teoria do etiquetamento ou labelling approach). Tem como principal expoente Howard Becker. b) Política Criminal: é a ciência que estuda e sistematiza estratégias para a prevenção e repressão estatal eficiente da criminalidade, de forma a maximizar a segurança pública sem violação de direitos fundamentais dos cidadãos (inclusive o criminoso). As políticas criminais são papel da política e sua implementação, portanto, depende da atuação dos legisladores. Entretanto a Política Criminal enquanto ciência não se trata das políticas concretas existentes em um país, mas do estudo de estratégias para fazer boas políticas 3

4 criminais. Ademais, a criminalização de condutas e aumento das penas não são os únicos meios recomendados pela Política Criminal para a diminuição da criminalidade, sendo preferíveis políticas preventivas e sociais. c) Dogmática Penal: como já referido, é atividade de interpretação e sistematização do direito positivo que busca estabelecer o alcance, os limites e os objetivos das normas penais, estabelecendo critérios para sua aplicação. Está mais vinculada ao direito positivo do que a Criminologia e a Política Criminal. 2.1 PRINCÍPIO DA EXCLUSIVA PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS O Direito Penal tem como principal objetivo a proteção de bens jurídicos, isto é, de interesses ou valores jurídicos dignos de proteção penal. Este princípio determina que uma norma penal incriminadora apenas pode ser criada para proteger um valor ou interesse digno de proteção pelo direito penal, excluindo a possibilidade de criminalização de meras imoralidades, ideologias, crenças pessoais ou ainda por razões religiosas. Atualmente busca-se relacionar o bem jurídico digno de proteção penal com a Constituição, de forma que os valores ou interesses passíveis de tutela pelo Direito Penal devem estar implícita ou explicitamente ancorados no texto constitucional. O princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos, portanto, define os possíveis objetos de tutela da norma penal, com o escopo de oferecer limites à atividade legislativa, de forma que não seria possível a criminalização de condutas que não causam lesão ou perigo de lesão a qualquer valor ou interesse jurídico socialmente relevante PRINCÍPIO DA LEGALIDADE A legalidade é um princípio consagrado em Direito Penal, manifestando-se no brocardo latino nullum crimen, nulla poena sine lege. O princípio objetiva dar segurança jurídica ao cidadão, para que ele saiba as condutas que configuram crimes e, assim, possa evitá-las. Trata-se de um limite à possibilidade de punição de comportamentos pelo Judiciário, de forma que só podem ser punidos fatos criminalizados por meio de lei. Com isso exclui, por exemplo, a possibilidade de punição de fatos que não estão previstos em lei e a criminalização de comportamentos por meio de outras espécies de atos normativos (como decretos e regulamentos). O princípio da legalidade penal está previsto no art. 5º, inc. XXXIX, da Constituição Federal com a seguinte redação não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Redação semelhante está prevista no art. 1º do Código Penal. Existe também um princípio da legalidade geral, que aplica-se em geral a todos os ramos do direito, consagrado pelo art. 5º, inc. II, da Constituição Federal, segundo o qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Como se percebe, o princípio da legalidade do direito penal é mais restrito, determinando que tanto o comportamento proibido quanto a pena devem estar previstos previamente em lei para que seja possível a punição de um fato.

5 A partir do conteúdo do princípio da legalidade resta vetada a possibilidade (a) de retroatividade da lei penal para criminalizar ou agravar a pena de fato anterior, (b) de o costume ou atos normativos distintos de lei serem utilizados para criminalizar ou agravar penas, (c) de a analogia ser utilizada para tornar puníveis condutas que não estão criminalizadas por leis ou agravar as penas de crimes, e (d) de indeterminação dos tipos legais e das sanções penais PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE DA LEI PENAL OU DA LEX PRAEVIA O princípio da legalidade determina que para um fato seja punido como crime, deve ele estar descrito em lei penal criminalizadora previamente à data do fato. Este princípio está explicitado no próprio texto do citado art. 5º, inc. XXXIX, da Constituição Federal, que dispõe que a lei que define o crime deve ser anterior. Quando se trata de norma penal em branco, somente serão consideradas criminosas as condutas praticadas depois da entrada em vigor da norma complementar (STF, Inq. 1915, j ) IRRETROATIVIDADE DA LEI PENAL MAIS GRAVOSA Como decorrência do princípio da anterioridade, é proibida a aplicação de uma nova lei que criminalizadora ou que aumente a punição de um crime a um fato passado. Caso se pudesse punir um fato por meio de uma lei criada posteriormente (ex post facto) à data de sua ocorrência, a segurança jurídica que se pretende garantir com o princípio restaria esvaziada. A irretroatividade se aplica também às normas de execução penal (STF, HC 68416/DF, Brossard, 2ª. T., u., ). Não se pode, por exemplo, negar o indulto ao delito incluído no rol dos crimes hediondos pela Lei 8930/94, ainda que o Decreto exclua os crimes hediondos, se o fato em questão foi cometido antes da lei nova mais gravosa (STF, HC /SP, Eros Grau, 2ª. T., u., ). A irretroatividade não se aplica às normas processuais penais, que tem vigência imediata (STF, AI AgR-ED/MG, Celso de Mello, 1ª. T., u., ) RETROATIVIDADE DA LEI PENAL MAIS BENÉFICA Já uma nova lei que favoreça ao réu, descriminalizando uma conduta, reduzindo a pena, tornando o cumprimento da penal mais benéfico etc., aplica-se aos fatos anteriores à sua vigência. Neste sentido, o art. 2º, único, do Código Penal dispõe que: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. No mesmo sentido, o art. 107, inc. III, do Código Penal arrola como causa que exclui a punibilidade a retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso. 5

6 2.2.2 PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL OU LEX SCRIPTA A legalidade exigida no Direito Penal é a da lei no sentido formal. Assim, exclui-se desde logo a possibilidade de legitimar-se a existência de um crime bom base em costumes. Além disso, é preciso que haja uma lei elaborada pelo Poder Legislativo Federal, o que faz com que as espécies normativas mais comuns para a criminalização de condutas sejam as leis ordinárias e complementares. Medidas provisórias, leis delegadas, resoluções e decretos legislativos não podem criminalizar condutas. Os tratados e convenções internacionais podem conter mandados de criminalização, entretanto a concreta existência do crime no âmbito interno depende sempre da criação da tipificação da conduta por meio de lei formal PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DE ANALOGIA OU DA LEX STRICTA A analogia, ou seja, a aplicação de regra semelhante para caso no qual não haja expressa regulamentação legal é vedada em Direito Penal sempre que prejudicial ao réu, seja para punir um fato que não está criminalizado ou para agravar a punição de crimes existentes proibição analogia in malam partem (STF, Inq. 1145, Maurício Corrêa, Pl., u., ). Por outro lado, a aplicação de regra semelhante para caso não regulado expressamente é admitida quando favorável ao réu, restringindo o poder punitivo do Estado admissão da analogia in bonam partem. Demais particularidades serão abordadas em tópico posterior dedicado exclusivamente à analogia em Direito Penal PRINCÍPIO DA TAXATIVIDADE OU LEX CERTA O princípio da legalidade exige a descrição da conduta criminalizada não seja genérica ou vaga, de forma que o cidadão não possa conhecer exatamente o conteúdo da conduta proibida. Caso contrário não se realizaria o objetivo de propiciar segurança jurídica. 2.3 PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE O princípio da culpabilidade determina que apenas podem ser responsabilizados criminalmente agentes quando sua conduta for subjetivamente desvalorosa. É tradicionalmente conhecido pelo brocardo latino nulla poena sine culpa ou por sua variante nullum crimen sine culpa. A constitucionalidade do princípio é extraída do art. 5º, inc. LVII, da Constituição Federal, o qual dispõe que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. A partir do princípio da culpabilidade é possível derivar três consequências 5 : (a) só pode ser punido o agente que tenha agido com alguma vinculação subjetiva em relação ao fato isto é, com dolo ou culpa, não sendo admita a responsabilidade objetiva em Direito Penal (essa característica é por vezes abordada como um princípio a parte, chamado de princípio da responsabilidade subjetiva); (b) o comportamento do agente deve ser reprovável nas circunstâncias 4 ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p

7 em que ocorreu, o que é verificado pela imputabilidade do agente, pela possibilidade de compreender a ilicitude do fato (potencial consciência da ilicitude) e pela exigibilidade de conduta diversa; (c) a medida da pena deve sofre influência do grau de culpabilidade do agente (p.ex., um crime doloso deve receber pena maior que um crime culposo e uma mitigação na possibilidade de conhecer a ilicitude do fato deve, igualmente, mitigar a pena). Em relação a esse último aspecto, o art. 59 do Código Penal dispõe expressamente que a culpabilidade é um dos critérios para a fixação da pena. 2.4 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA Sendo o Direito Penal o ramo jurídico mais danoso aos direitos fundamentais dos cidadãos, afetando a liberdade individual, deve ser ele guardado para situações de extrema gravidade, quando estejam em jogo bens jurídicos fundamentais para a comunidade e que não sejam passíveis de ser protegidos por meio de outros ramos do Direito. A origem remete à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, cujo art. 8º dispõe que a lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias Deste princípio decorrem dois outros: a subsidiariedade e a fragmentariedade do Direito Penal O CARÁTER SUBSIDIÁRIO DO DIREITO PENAL OU PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE O princípio da subsidiariedade determina que o Direito Penal deve ser subsidiário em relação à outras estratégias de proteção de bens jurídicos. A pena criminal, por ser a sanção mais grave disponível ao Estado, só deve ser utilizada quando outros ramos do direito como o direito civil ou o direito administrativo não sejam capazes de proteger suficientemente o bem jurídico O CARÁTER FRAGMENTÁRIO DO DIREITO PENAL OU PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE O princípio da fragmentariedade determina que o Direito Penal deve apenas lidar com fragmentos de ilicitude. O crime é uma ilicitude qualificada pela gravidade da ofensa (lesão ou perigo de lesão) ao bem jurídico, de forma que a pena criminal só pode ser utilizada quando o fato seja altamente danoso aos valores e interesses comunitários. Por exemplo, tanto um descumprimento contratual como um furto causam ofensa ao mesmo bem jurídico (patrimônio), entretanto apenas o segundo é um crime, isto em razão da maior gravidade do comportamento. 2.5 PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE Segundo o princípio da ofensividade, não pode haver crime ser uma efetiva ofensa (lesão ou perigo de lesão) a um bem jurídico. Equivale ao brocardo latino nullum crimen sine iuria. O princípio atua em dois âmbitos: ao legislador determina que não pode criminalizar condutas em 6 ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p

8 que não haja previsão de uma lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico; ao julgador determina que deve interpretar os tipos penais de forma a verificar se houve lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal, pois apenas neste caso existe de fato um crime. A partir da ofensividade discute-se na doutrina brasileira a constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, nos quais o perigo é presumido. a) Porte de arma de fogo desmuniciada: É típica a conduta de portar arma de fogo sem autorização ou em desconformidade com determinação legal ou regulamentar, ainda que desmuniciada, por se tratar de delito de perigo abstrato, cujo bem jurídico protegido é a incolumidade pública, independentemente da existência de qualquer resultado naturalístico (STJ, HC /SP, j. 15/09/2015). b) Roubo praticado com arma desmuniciada: Conforme o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o emprego de arma de fogo desmuniciada tem o condão de configurar a grave ameaça e tipificar o crime de roubo, no entanto não é suficiente para caracterizar a majorante do emprego de arma, pela ausência de potencialidade lesiva no momento da prática do crime (STJ, AgRg no REsp /SC, j. 15/10/2015) PRINCÍPIO DA ALTERIDADE OU TRANSCENDÊNCIA Como corolário do princípio da ofensividade, tem-se que a lesão ou perigo de lesão deve ser em relação à bem jurídico alheio, sendo impuníveis as lesões a bens jurídicos próprios, como, por exemplo, mutilações ou a tentativa de suicídio. Como exceção, punem-se as autolesões quando cometidas com o fim de fraudar seguro, quando caracteriza estelionato (art. 171, 2º, inc. V, do CP), ou para criar incapacidade física que inabilite o convocado para o serviço militar, quando caracteriza crime militar (art. 184 do CPM). Frisa-se, entretanto, que em verdade tais exceções não contrariam o princípio da transcendência, uma vez que não se pune as autolesões nesse caso em virtude da ofensa à integridade física do agente, mas em razão da tentativa de usá-la como meio para ofender um bem jurídico alheio PRINCÍPIO DA EXTERIORIZAÇÃO DO FATO Também chamado simplesmente de princípio do fato, determina que não se pode sancionar penalmente condutas internas do agente, isto é, meros pensamentos que não chegam a sair do âmbito da consciência. Exige-se, para que haja um crime, que haja uma exteriorização na forma de condutas concretas que possam gerar ao menos um perigo de lesão a um bem jurídico. Esse princípio relaciona-se com o chamado direito penal do fato, no qual se pune alguém pelo que faz, e que opõe-se ao chamado direito penal do autor, no qual se pune alguém pelo que é. 2.6 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL A teoria da adequação social, desenvolvida inicialmente pelo penalista alemão Hans Welzel, determina que um fato que é aceito como normal pela generalidade da sociedade não pode ser crime. Assim, apesar se adequar à descrição legal (tipicidade formal), uma conduta não pode ser considerada materialmente típica quando se estiver de acordo com as práticas comuns da sociedade. 8 8

9 Como exemplo, é possível citar a colocação de um brinco que, apesar de se adequar formalmente ao tipo penal da lesão corporal e causar uma ofensa à integridade física de crianças, é uma prática socialmente aceita e por isso não pode ser considerada crime de lesão corporal. 7 Importante: o STF, no julgamento do HC , j (noticiado no Informativo 615), entendeu não ser aplicável o princípio da adequação social ao art. 229 do CP ( manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente ), sob o argumento de que apenas o legislador pode revogar ou modificar a lei penal em vigor. 2.7 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA O princípio da insignificância, desenvolvido inicialmente por Claus Roxin, determina que um fato que causa uma ofensa de pouca relevância ao bem jurídico protegido pela norma penal não deve ser considerado crime 8. Portanto, assim como na adequação social, embora adequada à descrição legal (tipicidade formal), uma conduta não pode ser considerada materialmente típica quando a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico é ínfimo, isto porque não a conduta não é suficientemente grave a ponto de justificar a intervenção do Direito Penal. O princípio da insignificância exige uma certa proporcionalidade entre a gravidade do fato e a gravidade da intervenção estatal. Como exemplo, é possível citar um beliscão ou a subtração de um cigarro, que embora de adequem formalmente aos tipos penais de lesão corporal e furto e causem lesões aos bens jurídicos integridade física e patrimônio, não são considerados crimes em razão da irrelevância da ofensa, restando excluída a tipicidade material. O STF fixou no HC , j. 19/10/2004, relatado pelo Ministro Celso de Melo quatro critérios para a exclusão da tipicidade material em razão da insignificância: (i) a mínima ofensividade da conduta do agente; (ii) a nenhuma periculosidade social da ação; (iii) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e (iv) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Tais critérios consolidaram-se na jurisprudência do STF e do STJ. A insignificância em relação a crimes específicos: a) inaplicável em crimes praticados com violência ou grave ameaça contra pessoa, como roubo e resistência (v. Informativos STJ 439 e 441); b) inaplicável ao crime de moeda falsa (v. Informativo STJ 437). c) inaplicável ao crime de tráfico de drogas (STJ, HC , j. 18/09/2012); d) nos crimes contra a ordem tributária como o descaminho tem sido aceito de forma majoritária quando o valor sonegado não ultrapassa R$ ,00 (STF, HC , j. 7 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p ROXIN, Claus. Politica criminal y sistema del derecho penal. Trad. Francisco Muñoz Conde. 2. ed. Buenos Aires: Hamurabi, 2002, p

10 13/11/2012). Obs.: há decisões que aceitam a insignificância no crime de descaminho quando o valor sonegado não ultrapassa R$ ,00 (fundamento: Portaria n.º 75/2012 do Ministério da Fazenda). Precedente: TRF-4ª Região, Apelação Criminal , j. 18/12/2012. e) nos crimes contra a administração pública há decisão do STF admitindo a aplicação (Informativo STF 624). f) inaplicável ao crime de furto quando há continuidade delitiva e quando há destruição de obstáculo (STF, HC , dje. 16/08/2012; STF, HC , dje. 08/08/2012). g) inaplicável quando o agente tiver registros criminais pretéritos, conforme reiterada jurisprudência (HC , j. 12/06/2012). h) em crimes ambientais, o STF já admitiu a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância (Informativo STF 676). 2.8 PRINCÍPIO NE BIS IN IDEM O princípio determina que não se pode punir alguém duas vezes pelo mesmo fato. Alguns autores 9 afirmam que está implícito na Convenção Americana de Direitos Humanos, no art. 8º, n. 4, segundo o qual o acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. Assim, se não se pode submeter a novo julgamento quem foi absolvido por sentença com trânsito em julgado, com mais razão não se pode julgar novamente quem já foi punido. O ne bis in idem incide também sob a aplicação da pena, de forma que um mesmo fato ou circunstância não pode ser utilizado para fundamentar distintos aumentos de pena. 2.9 PRINCÍPIO DA HUMANIDADE DAS PENAS Determina que o apenado deve ser tratado com humanidade, de forma que a pena não pode atingir a dignidade humana ou a integridade física dos condenados. O princípio da humanidade das penas está consagrado na Constituição Federal, em diversos incisos do art. 5º: III- ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada (...); b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação Também está previsto em tratados internacionais: a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1948, dispõe que todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal (art. III) e que ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante (art. V) ; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p

11 dispõe no art. 7º que ninguém será submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas. Importante: com base no princípio da humanidade das penas, as Cortes superiores, em algumas decisões recentes, vêm entendendo que o prazo máximo de duração da medida de segurança aplicável aos inimputáveis de trinta anos, em analogia ao art. 75 do CP que define o tempo máximo das penas (STF, HC , 24/05/2011) ou o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito (STJ, 6ª Turma, HC 91602, j. 20/09/2012). A Súmula Vinculante 11 do STF, que restringe o uso de algemas a casos em que há receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros tem influência do referido princípio, prevendo tratamento digno ao preso PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS PENAS O princípio da individualização da pena determina que a espécie e a medida da pena devem ser adequadas à culpabilidade do agente e à conduta por ele praticada. Não pode haver aplicação de penas padronizadas, sem consideração das especificidades do crime. Há previsão constitucional no art. art. 5º, inc. XLVI, da Constituição Federal, que prescreve aos legisladores o dever de fixar um método de individualização da pena e fixa espécies de penas que deverão ser adotadas, nos seguintes termos: a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos. Também o inc. XLVIII estabelece um dever de diferenciação da execução das penas de acordo com a natureza do crime e as características do agente: a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado. O processo de individualização ocorre em três etapas distintas 10 : (a) a legislativa, na qual há fixação das espécies de penas e do marco penal (pena mínima e máxima) de cada crime, das qualificadoras e das circunstâncias que podem agravar/majorar ou atenuar/minorar as penas, das hipóteses de substituição, de fixação de regimes etc. em síntese: do método que deve ser seguido para a fixação judicial da pena; (b) a judicial, na qual os julgadores, obedecendo ao métodos, aos critérios e aos limites fixados pelo legislador e analisando as circunstâncias do caso concreto, fixam a pena; (c) a executiva, nas possibilidades de progressão e regressão de regime, remição, liberdade condicional etc. Corolário lógico do processo de individualização é a possibilidade de serem condenados a penas diferentes corréus no mesmo feito (STF, HC 70022/RJ, Celso de Mello, 1ª. T., u., ; STF, HC , Moreira Alves, RTJ 157/138), conforme variarem as circunstâncias referentes a uns e outros, até mesmo por aplicação dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade, impondo-se a diferenciação para corréus cuja participação no crime foi distinta (TRF4, EIAC /PR, Amir Sarti, 1ª S., m., , DJ ). Não há, entretanto, obrigatoriedade de se chegar a penas diferentes. Podem ocorrer casos em que, idênticas as circunstâncias objetivas e subjetivas, impor-se-á a mesma pena (STF, HC 10 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p. 78 e ss. 11

12 70931/RJ, Pertence, 1ª. T., v.u.u., ; STF, HC , Celso de Mello, 1ª T., v.u.u., DJ ). Em outras palavras, o fato de se cuidar de um processo de individualização não sugere, necessariamente, apenamento em quantitativos diferentes a diferentes pessoas. A diferenciação no resultado final dependerá, então, da existência de circunstâncias diversas, devidamente referidas na sentença, não sendo razoável o tratamento diferenciado dado a corréus, no mesmo processo, sem que tenha sido declinado o fundamento para tanto (STJ, REsp /PR, Félix Fischer, v.u.u., DJ ) ou quando o juiz afirma presentes as mesmas circunstâncias (TRF4, AC , Penteado, 8ª T., u., ). Sobre o tema da individualização da pena, deve-se atentar ainda para a Súmula 471 do STJ: Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n.º /2007 sujeitam-se ao disposto no art. 112 da Lei n.º 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) para a progressão de regime prisional. Com isso, todo delito que tenha sido praticado antes da vigência da referida lei (ou seja, até 29 de março de 2007 ), seja ele hediondo ou não, terá como requisito objetivo para progressão de regime o cumprimento de 1/6 da pena no regime mais gravoso. Se o delito foi praticado após a entrada em vigência da lei e não for hediondo, terá como requisito objetivo o cumprimento de 1/6 da pena no regime anterior para a progressão; se for hediondo ou assemelhado (tortura, tráfico de drogas e terrorismo), requisito objetivo será de 2/5 (réu não reincidente) ou 3/5 (réu reincidente) PRINCÍPIO DA PESSOALIDADE DAS PENAS Também chamado de princípio da responsabilidade pessoal ou da intranscêndência da pena, determina que apenas o condenado é que pode se submeter à pena. Está previsto no art. 5º, XLV, da Constituição Federal, o qual dispõe que nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. Não importa a espécie de pena aplicada, se privativa de liberdade, restritiva de direitos, multa ou prestação de serviços à comunidade, não se poderá exigir que outrem que não o réu se submeta a ela, o que não impede a possibilidade de, nos casos de multa ou prestação pecuniária, alguém voluntariamente pague 11. Como se percebe, porém, a própria disposição constitucional excetua duas hipóteses nas quais as obrigações derivadas do processo penal podem passar da pessoa do réu, atingindo seus sucessores: a reparação do dano e o perdimento de bens. São ainda consequências deste princípio: a) a extinção da punibilidade pela morte do agente (CP, art. 107, I); b) a impossibilidade de substituição do condenado por terceiro no cumprimento da pena, ainda que se trate de PSC (STF, HC 68309, Celso de Mello, 1ª. T., ) PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE A proporcionalidade é um princípio geral de Direito que tem por escopo regular a relação entre os meios e fins, com especial aplicabilidade em conflitos entre direitos fundamentais. É 11 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p

13 composta por três subprincípios: (a) a idoneidade ou adequação, que verifica se um meio é idôneo para alcançar o fim que se busca através dele; (b) necessidade ou exigibilidade, que verifica se não existem meios idôneos para alcançar o fim buscado e que causam menos danos aos direitos fundamentais dos cidadãos a eles submetidos; (c) proporcionalidade em sentido estrito, que pondera o valor do direito fundamental sacrificado com o do bem que se pretende proteger. Em âmbito penal, o princípio da proporcionalidade é importante tanto na análise da existência do crime, pois pode-se considerar que não há ofensa suficientemente grave ao bem jurídico que justifique a consideração do fato como crime, como na aplicação da pena, pois a pena deve ser um meio idôneo, necessário e adequado para a proteção do bem jurídico. Algumas consequências decorrentes desse princípio são: a) deve-se analisar a necessidade concreta da pena: o perdão judicial (art. 121, 5º; art. 129, 8º) é um caso de análise da desnecessidade da pena em concreto, deixando o julgador de aplicar a pena mesmo diante da culpabilidade do réu; b) deve-se analisar a suficiência da pena alternativa (substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, na forma do art. 44 do CP); c) princípio da proibição de excesso (Übermassverbott) ou do garantismo negativo: a proporcionalidade é utilizada como proteção contra os excessos ou abusos do Estado (proibição da pena de morte, por exemplo); d) princípio da proibição de insuficiência (Untermassverbot) ou do garantismo positivo: a proporcionalidade é utilizada como proteção contra a omissão estatal diante dos direitos fundamentais (punir o crime de extorsão mediante sequestro com pena mais grave que a do homicídio significa violação à necessária tutela do bem vida) CONCEITO As fontes do Direito dizem respeito à origem das normas jurídicas. 12 Como o Direito Penal é vinculado ao princípio da legalidade, suas fontes dizem respeito primacialmente à origem da lei penal. As fontes dividem-se em fontes materiais, substanciais ou de produção, que dizem respeito a quem tem competência para a produção de leis penais, e fontes formais, de conhecimento ou de cognição, que dizem respeito ao modo pelo qual o Direito Penal se exterioriza, pelo qual se dá a conhecer ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

14 3.2. FONTES MATERIAIS, SUBSTANCIAIS OU DE PRODUÇÃO As fontes materiais, conforme já referido, dizem respeito ao órgão encarregado pela produção do Direito Penal. A Constituição Federal, no art. 22, inc. I, dispõe que compete privativamente à União legislar sobre direito penal. Portanto, apenas a União poderá legislar sobre normas gerais de Direito Penal, assim como criminalizar condutas. O único do art. 22, entretanto, prescreve que lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. Desde a promulgação da Constituição, não ocorreu de lei complementar autorizar os Estados-membros ou o Distrito Federal a legislar sobre matéria penal. Caso isto ocorra, certamente surgirão muitas discussões a respeito do tema, uma vez que o entendimento geral é de que as normas penais devem se aplicar igualmente a todos os cidadãos, em respeito ao princípio da isonomia. Deve-se frisar ainda que o citado art. 22, inc. I, não regula especificamente o Direito Penal, de forma que seria possível discutir se a autorização do único também o abrange FONTES FORMAIS, DE CONHECIMENTO OU DE COGNIÇÃO As fontes formais dizem respeito à forma de exteriorização do Direito Penal, o que corresponde ao exame das espécies normativas que podem exprimir normas penais. A doutrina brasileira comumente subdivide as fontes formais em diretas ou imediatas e indiretas ou mediatas FONTES FORMAIS IMEDIATAS A única fonte formal imediata do Direito Penal é a lei em sentido estrito, pois se trata de uma exigência do princípio da legalidade. Em geral, a criminalização de condutas ocorre por meio de leis ordinárias. Análise das demais espécies normativas: a) leis complementares: podem regular matéria penal. A Lei Complementar 105/2001, por exemplo, institui em seu art. 10 que A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. b) emendas à Constituição: podem regular matéria penal. Embora possa parecer estranha a criminalização de condutas por meio de emendas à Constituição, é mais facilmente cogitável a possibilidade de instituir princípios ou direitos fundamentais em matéria penal. Deve-se atentar para o art. 60, 4º, da Constituição Federal, segundo o qual emendas à Constituição não podem restringir direitos e garantias individuais. c) leis delegadas: não podem regular matéria penal. O art. 68, 1º, II, da Constituição Federal veda a delegação ao Presidente da República de legislação sobre direitos individuais. Tratando as leis penais sempre da liberdade (ou pelo menos com o patrimônio) do indivíduo, não podem ser delegadas

15 d) medidas provisórias: não podem regular matéria penal. Há expressão vedação no art. 62, 1º, inc. I, b, da Constituição Federal, modificado pela Emenda Constitucional n.º 32/2001. e) resoluções e decretos legislativos: não podem regular matéria penal FONTES FORMAIS MEDIATAS São comumente apontados como fontes mediatas do Direito Penal o costume e os princípios gerais de direito. É possível citar também como fontes mediatas os atos administrativos, o referendo e plebiscito. Importante: os costumes e os princípios gerais de direito são também considerados meios para a integração do ordenamento jurídico-penal. a) Costumes: costumes são regras não escritas, consideradas juridicamente obrigatórias e seguidas de modo reiterado e uniforme pela coletividade 14. Difere do hábito, porque neste não há convicção da obrigatoriedade jurídica. O costume pode ser: (i) contra legem, quando contraria a prescrição da lei; (ii) praeter legem, quando preenche a lacuna ou a ausência de leis; e (iii) secumdum legem, quando esclarece o conteúdo de leis. Os costumes contra legem não revogam a lei, conforme disposição do art. 2º, 1º, da LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942). Os costumes praeter legem e secumdum legem são admissíveis no Direito Penal, desde que não contrariem a norma penal ou ampliem o conteúdo do tipo para além dos seus limites semânticos, servindo como importantes instrumentos de adaptação do conteúdo das leis penais às práticas sociais. Importante ressaltar que o costume não pode criar crimes ou cominar penas, em razão do princípio da legalidade. b) Princípios gerais de direito: são normas éticas extraídas por indução do material legislativo, expressamente fixadas em lei ou consolidadas historicamente e que auxiliam na integração do ordenamento jurídico. Dispõe o art. 4º da LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942) que: Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Em razão do princípio da legalidade, os princípios gerais de direito não podem criar crimes ou cominar penas, entretanto podem guiar a interpretação das leis penais existentes, inclusive ampliando as causas de exclusão da ilicitude e da culpabilidade. No caso da mãe que fura as orelhas da filha para colocarlhe brincos, não obstante a concepção moderna indique uma causa de exclusão da tipicidade em razão da adequação social, alguns penalistas 15 irão aplicar os princípios gerais de direito para afastar a ilicitude do fato. Importante: embora o art. 4º da LINDB faça referência à analogia, sabe-se que no Direito Penal ela só é aceita em benefício do réu (in bonam partem), mas nunca em seu prejuízo (in malam partem). c) Atos administrativos: leis penais em branco podem ser, em alguns casos, complementadas por atos da Administração Pública. Exemplo tradicionalmente citado é o do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei /2006) em cujo tipo consta o termo drogas, cabendo à Anvisa, agência reguladora vinculada ao Ministério da Saúde (Poder Executivo), a listagem por meio de ato administrativo das substância que são considerados drogas. Deve-se repetir, entretanto, que a criação de crimes e a cominação de penas não pode ocorrer por meio de ato administrativo. 14 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p Como Mirabete e Damásio de Jesus. 15

16 d) Referendo e plebiscito: o Congresso Nacional pode autorizar referendo e convocar plebiscito (art. 49, XV, da Constituição Federal), instrumentos estes que podem ser utilizados para aprovar ou rejeitar lei penal a ser criada ou já materializada pelos parlamentares. Veja-se, por exemplo, o caso do art. 35 do Estatuto do Desarmamento (Lei n.º /03), que previa o referendo, ocorrido em 23 de outubro de 2005, para mera aprovação de dispositivo de lei, e não para criação desta. Vencido o não, a norma que tratava da proibição da venda de armas de fogo e munição no País não entrou em vigor, estando permitida, hoje, a sua comercialização CONCEITO E DISTINÇÃO ENTRE NORMA PENAL E LEI PENAL Norma penal é o imperativo ou comando dirigido ao cidadão para realizar (mandamento) ou deixar de realizar (proibição) uma determinada conduta. É diferente da lei penal, que se trata de um ato formal e escrito por meio do qual os legisladores criam, publicizam e tornam obrigatórias as normas. Percebe-se, portanto, que embora sejam distintas, norma e lei se relacionam. Por exemplo, no homicídio, a lei penal (art. 121 do Código Penal) dispõe Art Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos, já a norma penal implícita é não se deve matar. Note-se: a lei penal apenas descreve uma conduta e vincula a ela uma sanção, a norma penal dá um comando ( não se deve ) ESTRUTURA DA LEI PENAL INCRIMINADORA A lei penal estrutura-se em dois elementos: a) Preceito primário ou disposição: descreve a conduta criminosa (ex: matar alguém ). b) Preceito secundário ou sanção: fixa a sanção aplicável sua espécie e os limites mínimo e máximo (ex: reclusão, de seis a vinte anos ). O imperativo derivado do preceito primário da lei penal (chamado de norma de comportamento) dirige-se a todos os cidadãos, impondo o dever de realizar ou deixar de realizar uma conduta. O imperativo derivado do preceito secundário (chamado de norma de sanção), por outro lado, dirige-se aos julgadores, impondo o dever de punir aqueles que realizam a o preceito primário. São eles, portanto, os destinatários da norma de sanção. Este não pode se dirigir ao criminoso, pois inexiste dever de autopunição 16 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p

17 CARACTERÍSTICAS DA LEI PENAL A lei penal possui as seguintes características 17 : a) Imperatividade: a pena é imposta a todos que realizam a conduta descrita no preceito primário, independentemente da vontade ou concordância; b) Generalidade: incide sobre todos os cidadãos ou ao menos sobre todos os cidadãos com determinadas características objetivamente definida. Existem crimes que, por exemplo, só podem ser cometidos por funcionários públicos, como no peculato (art. 312 do Código Penal). Isto, entretanto, não viola a generalidade da lei, pois a definição de funcionário público é fixada objetivamente (art. 327 do Código Penal: Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública ), incidindo a lei sobre todos os cidadãos que se encaixem nessa definição. c) Impessoalidade: não pode se referir a pessoas determinadas. Como decorrência da impessoalidade também é possível extrair que a lei não pode se aplicar a casos passados, uma vez que seria possível criar lei buscando criminalizar condutas praticadas por certas pessoas ou grupos. d) Exclusividade: somente ela pode definir crimes e cominar sanções INTERPRETAÇÃO A interpretação ou hermenêutica é o método utilizado para compreensão do conteúdo da lei penal, de forma a extrair seu sentido e alcance. Pode-se dizer que, por meio da interpretação, extrai-se a norma penal a partir da lei penal CLASSIFICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO QUANTO AO SUJEITO QUE A REALIZA OU QUANTO À ORIGEM a) autêntica: é quando o próprio legislador cria dispositivo que interpreta disposição legal. Por ser legalmente definida, obriga o interprete judicial a segui-la (exemplo é a definição de funcionário público do art. 327 do Código Penal). b) jurisprudencial: é a interpretação dada pelos julgadores (precedentes e súmulas) e, no Brasil, não obriga o interprete judicial a segui-la. Exceção são as Súmulas Vinculantes, que devem ser obrigatoriamente seguidas. c) doutrinária: é a interpretação dado pelos professores e pesquisadores do Direito Penal. Não vincula o intérprete judicial. 17 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p. 32; ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p

18 CLASSIFICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO QUANTO AO MEIO OU MÉTODO: a) gramatical ou literal: examina-se o sentido literal das palavras e expressões constantes na lei penal. b) sistemática: é a interpretação que leva em conta a totalidade do ordenamento jurídico, de forma a compreender a lei penal de forma coerente e não contraditória com outros dispositivos. c) histórica: é a interpretação da lei penal a partir do contexto histórico em que foi criada, de forma a se compreender quais os problemas e necessidades que justificaram sua criação. d) teleológica: é a interpretação que leva em conta os fins que a lei penal objetiva, de forma que deve ser compreendida de forma a realizar tal escopo CLASSIFICAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO QUANTO AOS SEUS RESULTADOS: a) declarativa: ocorre quando o texto legal não é ampliado nem restringido, apenas esclarecendo-se o sentido de termos obscuros. b) restritiva: ocorre quando o sentido de expressões ou termos legais é restringido. c) extensiva/ampliativa: ocorre quando o sentido de expressões ou termos legais é ampliado. A interpretação extensiva é comumente admitida em Direito Penal, pois mantém-se dentro dos limites semânticos da linguagem utilizada na descrição legal INTEGRAÇÃO A integração é a superação de lacunas do ordenamento jurídico. Uma das características do ordenamento jurídico é sua completude, ou seja, ele deve poder dar uma resposta a qualquer fato social que aconteça. Portanto, quando existe algum fato social para o qual não há regulação expressa, utiliza-se das técnicas de integração. As técnicas de integração comumente citadas pela doutrina são a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Todas essas técnicas são explicitamente citadas no art. 4º da LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942): Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Os costumes e os princípios gerais de direitos são comumente apontados pela doutrina também como fontes formais mediatas do Direito Penal, de forma que já foram analisados em tópico acima. Portanto nos ateremos à analogia ANALOGIA A analogia é a aplicação de regra prevista para caso semelhante ao caso para o qual não há expressa regulamentação legal. O fundamento é o brocardo ubi eadem legis ratio, ubi eadem legis dispositio ( onde há a mesma razão legal, aplica-se o mesmo dispositivo ).

19 Para que seja possível o recurso à analogia, exige-se dois requisitos: (a) que o fato não esteja regulado pelo legislador e (b) que haja norma regulando caso semelhante, cujo fundamento seja compatível com o caso não regulado 18. Importante frisar que, por ser a analogia um método de integração do ordenamento jurídico pelo julgador, a não regulação deve ser involuntária e não uma opção deliberada do legislador de dar tratamento diverso à matéria (STF, HC 94777, Direito, 1ª. T., u., ) ANALOGIA IN MALAM PARTEM O recurso à analogia é vedado em Direito Penal sempre que prejudicial ao réu, seja para punir um fato que não está criminalizado ou para agravar a punição de crimes existentes (STF, Inq. 1145, Maurício Corrêa, Pl., u., ). Isso é uma consequência do princípio da legalidade, que em seu corolário da reserva de lei determina que crimes e sanções só podem ser fixados por lei. A 2ª Turma do STF declarou a atipicidade da conduta de condenado pela prática do crime descrito no art. 155, 3º, do CP ( Art. 155 Subtrair para si ou para outrem, coisa alheia móvel:... 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico ), por efetuar ligação clandestina de sinal de TV a cabo. Reputou-se que o objeto do aludido crime não seria energia e ressaltou-se a inadmissibilidade da analogia in malam partem em Direito Penal, razão pela qual a conduta não poderia ser considerada penalmente típica. Precedente: STF, HC , j. 12/04/2011. O STJ possui decisões em sentido contrário ANALOGIA IN BONAM PARTEM O recurso à analogia, com aplicação de regra semelhante para caso não regulado expressamente pelo legislador, é admitida quando favorável ao réu, restringindo o poder punitivo do Estado. A analogia em benefício do réu é muitas vezes necessária para que não se chegue a soluções absurdas a casos semelhantes. Portanto, se não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não exceda a quota a que tem direito o agente (art. 156 do CP), igualmente não poderá ser punível o dano de coisa comum fungível nas mesmas circunstâncias. A admissão da analogia in bonam partem e a vedação da analogia in malam partem segue uma tendência geral do Direito Penal de sempre, no conflito entre a liberdade individual e o poder de punir do Estado, privilegiar a primeira APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI PENAL Admite-se, entretanto, a chamada aplicação analógica da lei penal, que ocorre quando a própria lei penal autoriza a aplicação de uma regra a casos semelhantes, normalmente após um rol exemplificativo. É o que ocorre, por exemplo, no art. 121, 2º, inc. I, do Código Penal, segundo o qual o homicídio é qualificado se é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe. Ou seja, paga e promessa de recompensa são exemplos dados pela lei de motivos torpes, entretanto a lei autoriza o julgador a considerar qualificado o homicídio se houver outra motivação torpe, semelhante a essas duas. 18 ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p

20 ANALOGIA E PROCESSO PENAL A utilização da analogia é comumente admitida no processo penal. O art. 3º do Código de Processo Penal dispõe que A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito LEI PENAL EM BRANCO A lei penal em branco é aquela na qual o preceito primário é incompleto, de forma que faz-se necessária a complementação por outra espécie normativa. O preceito secundário, entretanto, é determinado. O fundamento para o uso da técnica da norma penal em branco é permitir a adequação da norma penal a outros ramos do direito, permitindo, assim, uma atualização automática da norma penal em caso de modificação da norma que a complementa. Além disso, a técnica confere maior agilidade em caso de necessidade de atualização da norma, que poderá ser feita por ato da autoridade administrativa, e não da lei formal, que demanda procedimento mais complexo e moroso, sujeito, ainda, às complexidades políticas inerentes ao parlamento. Importante: somente serão consideradas criminosas as condutas praticadas depois da entrada em vigor da norma complementar (STF, Inq. 1915, Pertence, Pl., m., ) LEIS PENAIS EM BRANCO HOMOGÊNEAS, EM SENTIDO LATO OU IMPRÓPRIAS São aquelas nas quais o complemento é feito também por lei em sentido estrito (lei ordinária, complementar etc.). As leis penais homogêneas subdividem-se em: a) homovitelínea: complementada por lei penal. Exemplo é o crime de prevaricação, do art. 319 do Código Penal, é complementado pelo art. 327 também do Código Penal, que define funcionário público. b) heterovitelínea: complementada por lei extrapenal. Exemplo é o crime de contrair casamento conhecendo a existência de impedimento que lhe cause a nulidade absoluta, previsto no art. 237 do Código Penal que é complementado pelo art do Código Civil, que define as causas de impedimento LEIS PENAIS EM BRANCO HETEROGÊNAS, EM SENTIDO ESTRITO OU PRÓPRIAS São aquelas nas quais o complemento é feito também por espécie normativa distinta de lei em sentido estrito

21 Exemplo clássico é a Lei de Drogas (Lei n.º /06) que utiliza o termo droga. De acordo com o art. 1º, único, da mesma lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Portanto, trata-se de lei penal em branco, complementada por ato administrativo (Portaria SVS/MS 344/98, da Anvisa) LEIS PENAIS EM BRANCO AO AVESSO, AO REVÉS OU INVERTIDAS Alguma doutrina penal 19 cita uma terceira classificação, as chamadas normas penal em branco ao avesso ou ainda de lei penal incompleta 20. É quando, ao contrário das outras hipótese, o preceito primário é completo, sendo o preceito secundário incompleto. Exemplo é a Lei de Genocídio (Lei n.º 2.889/56), que não traz pena específica para o genocídio, mas remete às sanções penais de outros crimes LEI PENAL EM BRANCO X TIPO PENAL ABERTO Não se deve confundir lei penal em branco com tipo penal aberto. A lei penal em branco possui uma incompletude que é complementada sempre por ato normativo, já os tipos penais abertos possuem conceitos jurídicos indeterminados cuja complementação é realizada pela doutrina e pela jurisprudência, por meio de interpretação. Exemplos de tipos penais abertos são os crimes culposos (art. 18, II, CP), a rixa (art. 137 do CP) e o ato obsceno (art. 233 do CP) LEI PENAL NO TEMPO VIGÊNCIA DA LEI PENAL Não há processo legislativo especial para a elaboração de leis penais, de forma que o procedimento é o previsto na Constituição Federal para a elaboração das espécies normativas (lei ordinária, lei complementar etc.). De forma geral, a vigência da lei é regulada a lei começa a vigorar em todo o País quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada, conforme disposição do art. 1º da LINDB. Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei penal, quando admitida, inicia-se três meses depois de oficialmente publicada. O prazo existente entre a data da publicação da lei e a 19 Por exemplo, Luiz Flávio Gomes. 20 ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p

22 data da sua efetiva produção de efeitos é denominado vacatio legis, e possui dupla finalidade: possibilita o conhecimento da norma antes de ela tornar-se obrigatória e, às autoridades incumbidas de fazê-la executar, bem como às pessoas a que se endereça, a oportunidade de prepararem-se para a sua aplicação. Entretanto a vacatio legis não obrigatória, podendo as leis entrar em vigor na data da sua publicação, assim como ser fixado prazo maior ou menor do que 45 dias, desde que haja disposição expressa nesse sentido. A lei penal se aplica aos fatos ocorridos durante a sua vigência, não podendo retroagir quando prejudicial ao réu, mas retroagindo sempre que em benefício deste A REVOGAÇÃO DA LEI PENAL A lei permanece em vigor até que seja revogada. A revogação pode ser (a) por derrogação: revoga parte da lei; e (b) por ab-rogação: revoga a lei em sua totalidade. Conforme o art. 2º, 1º, da LINDB, a lei posterior revoga a anterior: (a) quando expressamente o declare (revogação expressa), (b) quando seja com ela incompatível (revogação tácita, implícita ou indireta) ou (c) quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior (revogação global). Não há óbice à revogação de uma lei antes que entre em vigência, isto é, antes do término do período de vacância (vacatio legis). A lei pode trazer no seu respectivo texto o período de sua vigência. Há duas possibilidades: (a) lei temporária: traz expressamente disposição sobre o período de sua vigência; (b) lei excepcional: não menciona expressamente o período de vigência, mas condiciona a sua eficácia à duração das certas circunstâncias (epidemia, guerra, estado de sítio etc.). Nesse caso foge-se à regra geral, pois o término de vigência dessas leis não depende de revogação por lei posterior há uma autorrevogação CONFLITO DE LEIS PENAIS NO TEMPO O conflito de leis penais no tempo ocorre quando há sucessão de leis penais regulando a mesma matéria. O art. 2 do Código Penal dispõe que: Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. No conflito entre leis penais, como já visto quando da análise do princípio da legalidade, vige o princípio da irretroatividade da nova lei penal mais severa (lex gravior), mas da retroatividade da nova lei que de qualquer forma beneficiar o réu (lex mitior). O fundamento está no art. 5º, incs. XXXVI ( a lei não prejudicará o direito adquirido ) e XL ( a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu ), da Constituição Federal. Retroatividade significa a aplicação da lei a fatos ocorridos antes da sua vigência. Da mesma forma, diz-se que há ultra-atividade da lei mais benigna (lex mitior) e não-ultraatividade da lei mais severa (lex gravior). Ultra-atividade é a qualidade da lei de manter a sua eficácia mesmo depois de cessada a sua vigência. Retroatividade e ultra-atividade são espécies de extra-atividade, que significa aplicação da lei fora do período de vigência

23 LEX MITIOR ABOLITIO CRIMINIS É quando a lei nova torna atípico fato antes incriminado. A abolição do delito constitui fato jurídico extintivo da punibilidade, nos termos do art. 107, III, do CP. Além disso, segundo o caput do art. 2º do CP cessam, em consequência da abolitio criminis, a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. A lei que descriminaliza conduta retroage, excluindo todos os efeitos jurídico-penais da conduta antes considerada delituosa. Consequências: a) se ainda não houve oferecimento de denúncia: o processo não pode ser iniciado; b) se a ação penal está em andamento: deverá ser trancada mediante decretação de extinção da punibilidade; c) após a prolação de sentença condenatória com trânsito em julgado: a pretensão executória não pode ser efetivada, ou seja, a pena não poderá ser executada; d) se o condenado está cumprindo a pena: deverá ser solto, mediante decretação da extinção da punibilidade. Efeitos extrapenais da condenação: de acordo com art. 2º, caput, do Código Penal, cessam os efeitos penais da sentença condenatória, perdurando, por isso, os de natureza civil. Assim, a sentença condenatória transitada em julgado continua valendo como título executivo na esfera cível e o condenado continua obrigado a reparar o dano causado pelo delito (art. 91, I, do CP). Confrontando-se com a abolitio criminis, o juiz do processo deve, de ofício, declarar extinta a punibilidade, depois de ouvido o Ministério Público. Se os autos, em virtude de recurso, estiverem em segundo grau, o próprio tribunal competente para apreciar a inconformidade deverá declarar extinta a punibilidade. Caso já exista sentença condenatória transitada em julgado, a declaração de extinção da punibilidade competirá ao juízo da execução, conforme art. 66, I e II, da LEP e Súmula 611 do STF. Importante: a) Princípio da continuidade normativo-típica: caso haja mera revogação formal de determinado tipo penal, com mera readequação típica e modificação do nomen iuris (nome do crime), não há abolitio criminis, pois fato continua previsto no ordenamento jurídico-penal como crime. 1º exemplo: o rapto violento (art. 219 do CP) foi revogado pela Lei n.º /05, mesma legislação que criou a figura do sequestro ou cárcere privado qualificado porque praticado com fins libidinosos (art. 148, 1º, V, do CP). Portanto, não há abolitio criminis de rapto violento, já que a conduta ainda é prevista como delituosa dentro do Código Penal. Nesse sentido: STF, HC , j , noticiado no Informativo º exemplo: também em respeito ao princípio da continuidade normativa típica, não há que se falar em abolitio criminis de atentado violento ao pudor, já que a Lei n.º /09 apenas revogou formalmente o art. 214 do CP, passando a modalidade delituosa ali prevista para dentro do art O crime, portanto, continua existindo, hoje com o nome de estupro. b) Abolitio criminis indireta ou temporária: A 'abolitio criminis' temporária, prevista na Lei n /2003, aplica-se ao crime de posse de arma de fogo de uso permitido com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado, praticado somente até 23/10/2005 (Súmula 513 do STJ). 23

24 NOVATIO LEGIS IN MELLIUS É quando uma nova lei torna menos gravosa a situação do réu, embora mantenha a criminalização da conduta. Está disciplinada no art. 2º, único, do Código Penal: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. Exemplos: a) lei que comina pena menos gravosa; b) lei que cria causa extintiva da ilicitude, da culpabilidade ou da punibilidade; c) lei que facilita a obtenção do sursis ou do livramento condicional. Caso assim ocorreu quando da edição da Lei n.º 9.714/98, que permitiu a aplicação de penas restritivas de direitos a todos os delitos cuja pena privativa de liberdade não superasse quatro anos de reclusão ou detenção, quando dolosos e não violentos. Não foram abolidas penalidades, mas apenas abrandada a punição e aumentados os benefícios LEX GRAVIOR NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA É quando a nova lei que criminaliza conduta antes considerada penalmente lícita. Não retroage, pois prejudicial ao agente. Como não há crime sem lei anterior que o defina (art. 5º, inc. XXXIX, Constituição Federal e art. 1º do Código Penal), a lei nova incriminadora não pode retroagir para alcançar fatos praticados antes da sua vigência NOVATIO LEGIS IN PEJUS É quando a nova lei, embora sem criar novas incriminações, modifica o tratamento dado à matéria, agravando de qualquer modo a situação do agente. Exemplos: a) exclusão de circunstâncias atenuantes ou de causas de diminuição de pena; b) inclusão de qualificadoras, agravantes ou causas de aumento de pena; c) agravação da pena ou da medida de segurança etc. Caso assim ocorreu com o advento da Lei n.º /05, que transferiu parte da conduta atinente ao rapto violento, previsto no revogado art. 219 do CP ( raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude, para fim libidinoso. Pena reclusão, de 2 a 4 anos ) para o art. 148, 1º, inciso V, do CP ( privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado, com pena de reclusão de 2 a 5 anos, se o crime é praticado com fins libidinosos ). Como o rapto era mesmo considerado, por grande parte da doutrina, como um sequestro para fins libidinosos, passou então a figurar em capítulo adequado, com pena máxima abstratamente cominada maior, implicando verdadeira novatio legis in pejus. Dessa forma, se o agente, em data anterior à entrada em vigor da Lei n.º /05, foi condenado por rapto, pois privou a liberdade de uma mulher honesta, para fim libidinoso, haverá a manutenção do decreto condenatório, devendo continuar o cumprimento da pena, pois a figura, como dito acima, permanece no sistema jurídico-penal brasileiro, hoje como sequestro para fins libidinosos (continuidade típica normativa). Incidindo o princípio da irretroatividade da lex gravior, a pena mais severa, no exemplo anterior, não poderá ser adotada se o fato foi praticado antes da entrada em vigor da Lei n.º /

25 LEI INTERMEDIÁRIA É quando o agente pratica o fato sob a vigência de uma determinada lei, mas após o fato ela é revogada por nova lei que regula a matéria e esta é mais uma vez revogada por uma terceira lei. Se a lei intermediária for a mais benigna, ela é que se aplica ao fato. Trata-se, na verdade, de um conflito intertemporal entre duas leis apenas, a segunda e a terceira, já que a primeira, por ser mais severa, é ab-rogada pela intermediária. Esta, portanto, mais favorável que as outras duas, retroage em relação à primeira e possui ultra-atividade em relação à terceira (dupla extra-atividade). Em resumo, quando após um fato há uma sucessão de mais de duas leis penais no tempo regulando conduta, aplica-se aquela mais favorável ao réu COMBINAÇÃO DE LEIS, CONJUGAÇÃO DE LEIS OU LEX TERTIA A combinação de leis ocorre quando une-se partes de leis distintas para aplicação ao caso concreto. Normalmente se trata de utilização do preceito primário (descrição da conduta) de um tipo penal vinculado ao preceito secundário (sanção) de outro tipo penal. Portanto, o juiz poderia tomar os preceitos mais favoráveis da lei anterior e, ao mesmo tempo, os da lei posterior, combinando-os e aplicando-os ao caso concreto, de forma a extrair o maior benefício ao réu. Embora haja divergência, predomina a posição de que a combinação de leis criando uma terceira lei (lex tertia) não é admissível, mesmo em favor do réu. É esta a posição que tem sido adotada pelas Cortes Superiores. Veja-se STF, Pleno, RE /MS, j. 07/11/2013. Ainda: Súmula 501 do STJ: É cabível a aplicação retroativa da Lei n /2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n /1976, sendo vedada a combinação de leis LEIS EXCEPCIONAIS OU TEMPORÁRIAS Lei temporária é aquela que traz expressamente disposição sobre o período de sua vigência. Ex.: Lei Geral da Copa do Mundo de 2014 (Lei 12663/12). Lei excepcional é aquela que não menciona expressamente o período de sua vigência, mas condiciona a sua eficácia à duração das certas circunstâncias (epidemia, guerra, estado de sítio etc.). O término da vigência dessas leis não depende de revogação por lei posterior há uma autorrevogação. Em ambos os casos, a lei segue sendo aplicável depois de sua vigência (têm ultratividade), pois, do contrário, seria destituída de qualquer efeito coercitivo, uma vez que todos saberiam de antemão da impossibilidade de sua aplicação com a cessação do prazo de vigência ou das circunstâncias excepcionais que autorizaram sua publicação. Assim dispõe o art. 3.º do Código Penal: A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência. 25

26 RETROATIVIDADE E LEI PENAL EM BRANCO Em regra, como o tipo penal da lei penal em branco exige complemento, a modificação da espécie normativa que a complementa, se benéfica ao réu, retroage. Exemplo seria a retirada da lista da ANVISA de alguma das substâncias consideradas drogas, que afetaria os tipos penais previstos na Lei de Drogas (Lei n.º /06). Haverá abolitio criminis em relação à substância. Entretanto, se a alteração do complemento for acidental, temporária ou excepcional não haverá abolição do crime. Exemplo é o caso da revogação ou alteração da tabela de preços em caso de crime contra a economia popular caracterizado pela violação do tabelamento (STF, RE 80544, Cordeiro Guerra, 2ª. T., ). Somente haverá revogação se a modificação for essencial, como segue: Em princípio, o artigo 3º do Código Penal se aplica a norma penal em branco, na hipótese de o ato normativo que a integra ser revogado ou substituído por outro mais benéfico ao infrator, não se dando, portanto, a retroatividade. - Essa aplicação só não se faz quando a norma, que complementa o preceito penal em branco, importa real modificação da figura abstrata nele prevista ou se assenta em motivo permanente, insusceptível de modificar-se por circunstâncias temporárias ou excepcionais, como sucede quando do elenco de doenças contagiosas se retira uma por se haver demonstrado que não tem ela tal característica (STF, HC 73168, Moreira Alves, 1ª. T., u., ). Em sentido contrário, porém, já decidiu o próprio STF, em caso assim descrito: PENAL. TRAFICO ILICITO DE SUBSTANCIA ENTORPECENTE. LEI 6368/76, ARTIGO 36. NORMA PENAL EM BRANCO. PORTARIA DO DIMED, DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, CONTENEDORA DA LISTA DE SUBSTANCIAS PROSCRITAS. LANCA-PERFUME: CLO- RETO DE ETILA. I. O paciente foi preso no dia , por ter vendido lança-perfume, configurando o fato o delito de trafico de substancia entorpecente, já que o cloreto de etila estava incluído na lista do DIMED, pela Portaria de Sua exclusão, entretanto, da lista, com a Portaria de , configurando-se a hipótese do "abolitio criminis". A Portaria 02/85, de , novamente inclui o cloreto de etila na lista. Impossibilidade, todavia, da retroatividade desta. II. Adoção de posição mais favorável ao réu. III. H.C. deferido, em parte, para o fim de anular a condenação por trafico de substancia entorpecente, examinando-se, entretanto, no Juízo de 1º grau, a viabilidade de renovação do procedimento pela eventual pratica de contrabando (STF, HC 68904, Velloso, 2ª. T., u., ) RETROATIVIDADE E JURISPRUDÊNCIA Não há direito subjetivo à ultra-atividade da jurisprudência mais favorável, podendo ser aplicada o entendimento mais rigoroso aos casos julgados, ainda que a nova orientação tenha se firmado depois da prática do fato (STJ, RE , Moreira Alves, ; STF, HC 75793, Pertence, 1ª. T., u., ). Não assim, porém, quando a mudança é firme, como nos casos em que o STF publica ou revoga uma súmula, ou declara a inconstitucionalidade de uma regra legal desfavorável, casos em que a aplicação aos casos anteriores é imperativa, sob pena de violação do princípio da igualdade. Assim ocorreu, por exemplo, com a determinação de que os condenados por crime hediondo cumprissem a pena em regime integralmente fechado, ainda que já tenha ocorrido o trânsito em julgado (STF, RE , Peluso, 2ª. T., u., )

27 RETROATIVIDADE, LEI PROCESSUAL PENAL E REGRA CONSTITUCIONAL a) Lei processual penal: tem incidência imediata, podendo ser aplicada aos processos relativos a fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, ainda que desfavorável, nos temos do disposto no art. 2 do CPP, como é o caso da lei que aumenta os valores da fiança (STF, ARE ED, Mendes, ). No entanto, se o dispositivo legal for de caráter misto, contendo regulando simultaneamente direito material e processual, prevalecerá o âmbito material, ainda que desfavorável, de modo que o dispositivo somente será aplicado a fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, como decidido em relação à alteração do art. 366 do CPP (STF, HC , Pertence, 1ª. T., ). As normas que regulam a extradição, veiculadas por lei nacional ou tratado internacional, aplicam-se mesmo a fatos anteriores a sua entrada em vigor, pois não tem natureza material (STJ, Ext. 864, Pertence, Pl., ). b) Regra Constitucional: aplica-se retroativamente, ainda que disponha sobre matéria penal, como é o caso da previsão de perda dos direitos políticos aos condenados imposta pelo inc. III do art. 15 da CF/88 (STF, RE , Pertence, 1ª. T., ) TEMPO DO CRIME Para se compreender se o crime é anterior ou posterior à vigência da lei penal (seja ela mais benéfica ou mais prejudicial), é preciso saber o tempo do crime. O art. 4º do CP dispõe que: Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. A teoria adotada no dispositivo é a teoria da atividade, que considera praticado o crime no momento da conduta. Seu fundamento é que a norma penal atua como desestímulo psicológico ao agente, importando para isso o momento da ação e sendo o resultado irrelevante. Existem outras duas importantes teorias sobre o tempo do crime: a teoria do resultado, igualmente conhecida como teoria do evento ou do efeito, segundo a qual o crime é praticado no momento da produção do resultado; e a teoria mista ou da ubiquidade, para a qual o tempo do crime é considerado tanto o momento da conduta ou o da produção do resultado. No crime continuado (CP, art. 171), em que vários fatos são considerados como crime único, por ficção legal, considera-se como tempo do crime todo o período desde a primeira ação até a última, de forma que se há alteração legal que dá tratamento mais gravoso no decorrer desse período, não haverá óbice à aplicação da lei mais gravosa. O mesmo ocorre em relação aos crimes permanentes, nos quais a ação ou omissão perdura no tempo (exemplo é o crime de sequestro). Assim dispõe a Súmula 711 do STF, segundo a qual A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. 27

28 5.2. LEI PENAL NO ESPAÇO PRINCÍPIOS DE APLICAÇÃO Citam-se comumente cinco princípios que procuram solucionar os conflitos de leis penais no espaço: PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE Foi aquele adotado como regra geral pelo Código Penal, no art. 5º, que dispõe que: Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. Este princípio determina que a lei penal é aplicada dentro do território do Estado-Nação que a promulgou, não importando a nacionalidade do sujeito ativo do crime ou a titularidade do bem jurídico ofendido. Divide-se em territorialidade absoluta e territorialidade temperada. Para o primeiro, só a lei penal brasileira é aplicável aos crimes cometidos no território nacional. Segundo a territorialidade temperada, a lei brasileira é aplicada, como regra, ao crime cometido no território nacional, mas excepcionalmente a lei estrangeira poderá ser aplicada a delitos cometidos no território nacional, total ou parcialmente, quando houver determinação em tratado ou convenção internacional. Está-se diante do instituto conhecido como intraterritorialidade, vez que a lei estrangeira estaria sendo aplicada dentro do território nacional. O princípio adotado no Brasil é o da territorialidade temperada, como se observa no art. 5º, caput, do CP. Falaremos mais sobre esse princípio no tópico abaixo sobre a territorialidade PRINCÍPIO DA PERSONALIDADE OU NACIONALIDADE Determina que a lei penal é aplicada pelo Estado a seus cidadãos, ainda que estejam no exterior. Divide-se em nacionalidade ativa e nacionalidade passiva. Para o princípio da nacionalidade ou personalidade ativa, o que importa é o sujeito ativo ( criminoso ), de forma que se este é brasileiro, é punido de acordo com a lei penal brasileira. Para o princípio da nacionalidade ou personalidade passiva, o que importa é o sujeito passivo ( vítima ), de forma que se este é brasileiro, o agente ativo é punido de acordo com a lei penal brasileira. 21 Fundamenta as seguintes hipóteses: CP, art. 7º, I, d; II, b; e 3º PRINCÍPIO REAL, DA DEFESA OU DE PROTEÇÃO Determina a aplicação da lei penal brasileira sempre que lesionado bem jurídico público nacional, independentemente do local do crime ou da nacionalidade do sujeito ativo. A lei penal brasileira, de acordo com esse princípio, seria aplicada sempre que o fato criminoso, cometido no estrangeiro, lesasse interesse nacional. Fundamenta as seguintes hipóteses: CP, art. 7º, I, a, b e c. 21 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

29 PRINCÍPIO DA JUSTIÇA PENAL UNIVERSAL, DA JUSTIÇA PENAL COSMOPOLITA OU DA UNIVERSALIDADE Determina que o país no qual esteja o criminoso pode aplicar sua lei penal, qualquer que seja sua nacionalidade, o local do crime ou o bem jurídico atingido, fundamentando-se no dever de solidariedade na repressão de certos delitos, cuja punição interessa a todos os povos. Fundamenta as seguintes hipóteses: CP, art. 7º, I, alínea d e II, alínea a PRINCÍPIO DA REPRESENTAÇÃO, DA SUBSTITUIÇÃO, SUBSIDIÁRIO, DA BANDEIRA OU DO PAVILHÃO Determina que lei penal nacional é aplicável aos delitos cometidos em embarcações e aeronaves privadas, quando realizados no estrangeiro e lá não sejam julgados. CP, art. 7º, II, alínea c TERRITORIALIDADE Como referido acima, foi aquele adotado como regra geral pelo art. 5º do Código Penal e determina que a lei penal é aplicada dentro do território do Estado-Nação que a promulgou, não importando a nacionalidade do sujeito ativo do crime ou a titularidade do bem jurídico ofendido. Isto decorre da própria noção de soberania nacional, bem como de respeito à soberania dos demais países, os quais, usualmente, também aplicarão a sua própria lei a fatos ocorridos em seus respectivos territórios nacionais. Além disso, haveria dificuldades para investigar e aplicar a lei penal de um país a fatos ocorridos fora do seu território O TERRITÓRIO BRASILEIRO Conforme os parágrafos do art. 5º do Código Penal: 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar. 2º É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. a) mar territorial: conforme o art. 1º da Lei 8.617/93: O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítima de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil. b) espaço aéreo: o Brasil adota a teoria da absoluta soberania em relação ao espaço sobrejacente ao território nacional e ao mar territorial (veja-se Código Brasileiro de Aeronáutica - Lei 7565/86, art. 11 e Lei 8.617/93, art. 2º). 29

30 c) aeronaves: conforme o art. 3 do Código Brasileiro de Aeronáutica, consideram-se situadas no território do Estado de sua nacionalidade: I - as aeronaves militares, bem como as civis de propriedade ou a serviço do Estado, por este diretamente utilizadas (artigo 107, 1 e 3 ); II - as aeronaves de outra espécie, quando em alto mar ou região que não pertença a qualquer Estado. Parágrafo único. Salvo na hipótese de estar a serviço do Estado, na forma indicada no item I deste artigo, não prevalece a extraterritorialidade em relação à aeronave privada, que se considera sujeita à lei do Estado onde se encontre LUGAR DO CRIME O art. 6º do Código Penal dispõe que: Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzirse o resultado. A teoria adotada no dispositivo é a teoria da ubiquidade, que considera praticado o crime tanto no local da conduta como no local do resultado. Existem outras duas importantes teorias sobre o local do crime: a teoria da atividade (da ação ou da conduta), que considera local do crime aquele em tiver sido executada a conduta; e a teoria do resultado (do evento ou do efeito), que considera local do crime aquele em tiver se produzido o resultado. Adotada a teoria da ubiquidade, fica resolvido o problema dos crimes à distância, ou seja, aqueles nos quais a ação se dá em lugar diferente do resultado, como no exemplo da carta-bomba. Em tais casos, considera-se local do crime tanto o local da ação quanto aquele do resultado. Desse modo, aplica-se a lei brasileira se o crime, de algum modo, tocou o território nacional, como nos casos seguintes: a) latrocínio em que a vítima foi sequestrada no Brasil e morta no exterior, tendo sido subtraídos seus bens (STJ, HC 41892, Arnaldo Lima, 5ª. T., ); b) de uso de passaporte português falso perante o controle de fronteiras do Brasil visando ao ingresso nos EUA, onde a fraude foi detectada (STJ, CC , Reis, 3ª. S., ) EXTRATERRITORIALIDADE Trata-se da aplicação da lei penal brasileira aos crimes praticados no exterior. É regulada pelo art. 7º do Código Penal EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA O agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro (art. 7º, 1º, CP). Ocorre em relação aos crimes previstos no inc. I do referido artigo: a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil.

31 EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA A aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: a) entrar o agente no território nacional; b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável (art. 7º, 2º, CP). Ocorre em relação aos crimes previstos no inc. II do referido artigo: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiro; c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. Ademais, conforme o 3º: A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça EXTRATERRITORIALIDADE E LEGISLAÇÃO ESPECIAL a) Lei da Tortura (Lei 9455/97): Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrandose o agente em local sob jurisdição brasileira. b) Lei da Lavagem de Dinheiro (Lei 9613/98): Art. 2º O processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei: (...) II - independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes, ainda que praticados em outro país, cabendo ao juiz competente para os crimes previstos nesta Lei a decisão sobre a unidade de processo e julgamento. c) Contravenções: as regras sobre extraterritorialidade não se aplicam às contravenções, que somente são puníveis quando praticadas em território nacional, nos termos do art. 2º da LCP: A lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada no território nacional LEI PENAL EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS Possuem imunidade penal absoluta em relação à Justiça Penal do país onde estão lotados os diplomatas, como é o caso do Embaixador, Cônsul e Vice-Cônsul (STF, RHC 49183, Oswaldo Trigueiro, Pl., u., ) e seus familiares, nos termos do art. 31 da Convenção de Viena (D /65). Seus auxiliares diretos também possuem imunidade, mas relativa, pois restrita à atividade em que atuam na embaixada. Quer dizer: Restringem-se as imunidades e isenções aos assuntos diplomáticos, ao pessoal oficial da missão e aos membros das respectivas famílias; excluídos são assim, dos benefícios, os secretários particulares, datilógrafos, mordomos, criados ou motoristas, que constituem o pessoal não oficial. Quando extensivos lhes fossem, privilégio que é combatido por autoridades na matéria, necessário fora que pertencessem à mesma nacionalidade do chefe da missão (STF, RHC 34029, Edgard Costa, 2ª. T., ). 31

32 Em tais casos é possível que o país acreditante renuncie à imunidade diplomática ou, o que é mais comum, especialmente em casos mais graves, que seja ele declarado persona non grata e determinado o retorno do diplomata ao seu país. Nesse caso, há causa pessoal de exclusão de jurisdição, podendo, assim, o diplomata ser processado no país que representa IMUNIDADES DO CHEFE DE GOVERNO Conforme o 4º do art. 86 da CF: O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. Se praticar crime, o processo somente poderá ter início após o término do mandato. Ademais, o Presidente da República, o Vice-Presidente e os Ministros de Estado possuem a prerrogativa de somente serem processados, seja por crimes comuns, seja por crimes de responsabilidade, após autorização de pelo menos dois terços da Câmara dos Deputados (CF, art. 51, I), cabendo o julgamento ao STF, em caso de crimes comuns, e ao Senado Federal, em caso de crime de responsabilidade. Por fim, é certo que: Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito à prisão (CF, art. 85, 3º) IMUNIDADES PARLAMENTARES As imunidades parlamentares (CF, art. 53), são estabelecidas em razão da função exercida e não da pessoa do parlamentar, ou seja, são prerrogativas da função, e referem-se às opiniões, palavras e votos, que guardem relação com o exercício da função, cuidando-se de imunidade material, de modo que não haverá crime por ausência de tipicidade (STF, Inq. 2674, Britto, Pl., m., ). As imunidades têm por fim garantir a independência do parlamentar, de modo que possa desempenhar suas funções livre de pressões (STF, Pet 4444 AgR, Celso de Mello, Pl., u, ), de modo que não representam violação do princípio da igualdade, sendo irrenunciáveis (STF, Inq. 510). A imunidade material é absoluta em relação a atos de opinião praticados no recinto do parlamento. Já em relação a atos praticados fora do espaço do parlamento, a imunidade é aplicável quando os atos guardarem relação com o exercício do mandato parlamentar (STF, Inq 3814, Rosa Weber, 1ª. T., ; STF, Inq 3672, Rosa Weber, 1ª. T., ). Com efeito, as imunidades parlamentares não são ilimitadas e não favorecem o congressista, quando, na condição de candidato a qualquer cargo eletivo, vem a ofender, moralmente, a honra de terceira pessoa, inclusive a de outros candidatos, em pronunciamento motivado por finalidade exclusivamente eleitoral, que não guarda qualquer conexão com o exercício das funções congressuais, uma vez que: O postulado republicano que repele privilégios e não tolera discriminações impede que o parlamentar-candidato tenha, sobre seus concorrentes, qualquer vantagem de ordem jurídico-penal resultante da garantia da imunidade parlamentar, sob pena de dispensar-se, ao congressista, nos pronunciamentos estranhos à atividade legislativa, tratamento diferenciado e seletivo, capaz de gerar, no contexto do processo eleitoral, inaceitável quebra da essencial igualdade que deve existir entre todos aqueles que, parlamentares ou não, disputam mandatos eletivos. Em tal circunstância, poderá o parlamentar sofre interpelação judicial, nos termos do art. 144 do CP Não se beneficiam da imunidade: a) o suplente (STF, Inq. 1684);

33 b) o parlamentar licenciado para ocupar outro cargo na administração (CF, art. 56, I; STF, Inq. 105, HC 78093), estando cancelada a Súmula 4 do STF pela jurisprudência posterior, que mantém o foro privilegiado (STF, Inq. 1070). Assim, se o parlamentar passar a ocupar um cargo de Ministro do Estado, remanesce apenas a prerrogativa de foro, mas ficam excluídos os demais efeitos do art. 53, pertinentes à imunidade parlamentar. No que diz respeito aos crimes comuns, o parlamentar responde normalmente, mas além do foro especial perante o STF (CF, art. 53, 1º) sua casa legislativa pode determinar o trancamento da ação penal em curso (CF, art. 53, 3º). Nesse caso, o processo fica suspenso, e também a prescrição, até o dia em que o agente deixa de exercer mandato. Essa imunidade processual é, como se vê, relativa, e sua natureza jurídica é causa pessoal condicionada e temporária de exclusão de jurisdição. A suspensão em questão é limitada às: ações contra parlamentares que tiverem como objeto de apuração crimes cometidos após a diplomação do mandato em curso, o mesmo não sendo possível em relação aos mandatos de legislaturas pretéritas (STF, RE AgR, Lewandowski, 1ª. T., u., ). A prisão daqueles que exercem mandato no Poder Legislativo, após a expedição do diploma, só pode ocorrer na hipótese de flagrante de crime inafiançável, oportunidade na qual os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à casa legislativa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão (CF, art. 53, 2º). Ressalte-se que essa imunidade abrange a prisão civil e penal. Aos Deputados Estaduais aplica-se o mesmo regime de imunidades previsto para os membros do Congresso Nacional (CF, art. 27, 1 ). A seu turno, o inc. VIII do art. 29 da CF estabelece a: inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município. Como se vê, a imunidade do vereador é limitada ao exercício do mandato parlamentar sendo respeitada a pertinência com o cargo e o interesse municipal (STF, RE AgR, Grau, 2ª. T., u., ) SIGNIFICADO É quando duas leis penais vigentes parecem regular a mesma matéria, oferecendo respostas divergentes para o mesmo caso. Diz-se que o conflito é aparente em razão da completude, coerência e harmonia do sistema jurídico-penal, de forma que o conflito é não é real, uma vez que o próprio ordenamento jurídico, por meio de regras e princípios, oferece a solução para o caso. 33

34 Importante: o conflito aparente de normas ocorre entre leis penais vigentes, pois se houve entre elas sucessão no tempo, deve-se observar as regras sobre aplicação da lei penal no tempo. Da mesma forma, deve-se atentar que em razão do princípio ne bis in idem não se pode punir por dois crimes distintos o mesmo fato, de forma que se deve resolver qual das leis incide sobre o caso PRINCÍPIOS PARA A SOLUÇÃO DO CONFLITO APARENTE DE NORMAS O PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE (LEX SPECIALIS DEROGAT LEGI GENERALIS) Aplica-se quando uma norma é considerada especial em relação à outra (geral). Referindose as duas ao mesmo fato, a primeira possui uma particular condição (objetiva ou subjetiva) e apresenta, por isso mesmo, uma diferença de severidade. Havendo lei especial regulando o fato, fica excluída a aplicação da norma geral. Lei especial, portanto, é a que contém todos os elementos da lei geral e ainda acrescenta outros, chamados de elementos especializantes. Fica afastado, dessa forma, o bis in idem, uma vez que o comportamento do agente somente é enquadrado na norma incriminadora especial, embora também descrito pela geral. Exemplos de especialidade são as relações existentes entre delitos simples, qualificados e privilegiados: o tipo fundamental será excluído pelo qualificado ou privilegiado, que deriva daquele. Assim, o art. 121, 1º, do CP é especial em relação ao art. 121, caput, do mesmo Código. Outro exemplo é o infanticídio (delito específico), que exclui a aplicação do homicídio (delito genérico). A escolha pela lei especial deve ser determinada pela comparação abstrata, ou seja, da leitura da lei especial percebe-se também a lei geral. Enquanto o homicídio possui como descrição típica matar alguém, o infanticídio agrega a essas elementares outros elementos especializantes: matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após. Veja-se que os elementos da lei geral ( matar alguém ) já estão contidos na lei especial. Importante: não importa se a norma especial é mais severa ou mais benéfica ao réu, ela sempre afasta a norma geral O PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE (LEX PRIMARIA DEROGAT LEGI SUBSIDIARIAE) Aplica-se quando a norma que prevê uma ofensa maior a um determinado bem jurídico exclui a aplicação da norma que prevê um ofensa menor ao mesmo bem jurídico. A relação de primariedade e subsidiariedade existe, portanto, entre normas que descrevem graus de violação distintos do mesmo bem jurídico, de modo que o delito descrito pela lei subsidiária, por ser de menor gravidade que o da lei primária, é absorvido por esta. A subsidiariedade pode ser: a) expressa ou explícita: a própria lei declara formalmente que somente será aplicada se o fato não constituir crime mais grave. Ex.: na lesão corporal seguida de morte, prevista no art. 129, 3º, do CP, há necessidade de que o agente não queira o resultado (morte) e nem assuma o risco de produzi-lo. A norma é subsidiária, pois somente será aplicada quando ausente o dolo do homicídio;

35 b) tácita ou implícita: o respectivo tipo penal, embora não se referindo expressamente ao seu caráter subsidiário, somente terá aplicação nas hipóteses de não-ocorrência de um crime mais grave, o qual, nesse caso, afastará a aplicação da norma subsidiária. Ex.: a ameaça (art. 147 do CP), funcionando como elementar típica do constrangimento ilegal (art. 146 do CP), apresenta-se na hipótese como norma subsidiária O PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO OU ABSORÇÃO (LEX CONSUMENS DEROGAT LEGI CONSUMPTAE) Aplica-se quando o fato definido por uma norma incriminadora, sendo mais amplo e mais grave, absorve outros fatos, menos amplos e menos graves, que funcionam como fase normal de preparação ou de execução ou como mero exaurimento. Os fatos, aqui, não se apresentam em relação de gênero e espécie, de meio a fim, de fração a inteiro. Atente-se para a nomenclatura: no conflito, o crime consuntivo é que absorve o de menor gravidade; o crime consunto é o absorvido. Pode apresentar-se nas seguintes hipóteses: a) crime complexo (puro ou em sentido estrito): existe quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes. A definição vem disposta no art. 101 do CP. Delito complexo, portanto, é o que resulta da soma de dois ou mais crimes autônomos, que passam a funcionar como elementares ou circunstâncias no tipo complexo. No latrocínio, por exemplo, que é constituído pelo roubo + homicídio, aplicando-se o princípio da consunção os fatos integrantes do tipo complexo ficarão absorvidos pelo crime-fim, ou seja, aquele que resulta da fusão dos delitos autônomos. O agente responderá apenas pelo latrocínio, ficando o roubo e o homicídio consumidos pelo primeiro. Atenção para a subespécie: crime complexo impuro ou em sentido amplo, que é o que resulta da soma de fato típico e fato atípico (estupro, que advém da fusão entre constrangimento ilegal + relação sexual); b) crime progressivo: existe crime progressivo quando o agente, para atingir determinado resultado, necessariamente passa por uma conduta inicial que produz um evento menos grave que aquele. Veja-se que o sujeito, desde a origem, deseja produzir o resultado mais grave, desenvolvendo fases sucessivas, as quais constituem, de per si, infrações penais. O crime é plurissubsistente, pois compreendido por diversos atos, embora uma única vontade comande a conduta do agente. O último ato, mais grave e causador do resultado inicialmente pretendido pelo sujeito, absorve todos os anteriores, que ocasionam violações menos severas ao bem jurídico tutelado. O homicídio, por exemplo, pressupõe um resultado anterior, que é a lesão corporal causadora da morte. Não há morte (plus) sem a precedente lesão corporal (minus), ficando esta absorvida pelo crime doloso contra a vida; c) progressão criminosa (em sentido estrito): ocorre quando o dolo do agente, no mesmo contexto fático, sofre mutação. O agente que, após envolver-se em discussão de bar, começa a injuriar a vítima, resolvendo depois agredi-la e terminando por matá-la, deve responder apenas pelo homicídio. Há, como se vê, uma multiplicidade do dolo. Veja-se que o crime progressivo pressupõe um único fato; a progressão criminosa, por sua vez, pressupõe uma pluralidade de fatos cometidos de forma continuada; 35

36 d) fato anterior não punível: ocorre o antefactum impunível quando um fato anterior menos grave precede a outro mais grave, funcionando como meio necessário ou normal de realização. Observe-se que o fato anterior, integrante da fase de preparação ou de execução, somente será consumido se for de menor gravidade. O porte ilegal de arma de fogo ficará absorvido pelo homicídio, a menos que a arma não seja utilizada pelo agente ou não se trate do mesmo contexto fático. O mesmo ocorre em relação à falsificação de documento, que será absorvida pelo estelionato, desde que não haja maior potencialidade lesiva (Súmula 17 do STJ: Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido ); e) fato posterior não punível: dá-se o postfactum impunível quando o agente, depois de realizar a conduta, torna a atacar o mesmo bem jurídico, desta vez visando a obter vantagem em relação à prática anterior. Assim, após o furto, o agente destrói a res furtiva; o moedeiro falso põe em circulação a moeda que acabou de fabricar. O fato posterior deverá ser considerado como mero exaurimento O PRINCÍPIO DA ALTERNATIVIDADE Aplica-se quando a norma penal descreve várias formas de realização da figura típica, todas modalidades de um mesmo delito, em que a realização de um verbo nuclear ou de vários configura infração penal única. O princípio da alternatividade serve, na verdade, para resolver conflitos nos chamados tipos mistos alternativos, que descrevem crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado, como a participação em suicídio, o tráfico de drogas, o porte ilegal de arma de fogo, o escrito ou objeto obsceno, a supressão de documento etc. Dessa forma, se o agente oculta a arma de fogo de uso permitido em casa, e depois a transporta no seu veículo, para, finalmente, portá-la em via pública e cedê-la a terceiro, só responderá por um crime: aquele previsto no art. 14, caput, do Estatuto do Desarmamento (Lei n.º /03) CONCEITOS DE CRIME (FORMAL, MATERIAL, ANALÍTICO) a) Conceito formal: sob o aspecto legislativo, é a descrição de uma conduta em lei e previsão de uma sanção penal para sua realização; sob o aspecto judicial, é a realização da conduta descrita em uma lei penal. Foca no aspecto meramente formal da relação entre o comportamento e a lei. b) Conceito material ou substancial: é a conduta que causa lesão ou perigo de lesão a valores ou interesses socialmente relevantes (bens jurídicos). Foca no aspecto material, ou seja, no fundamento de uma conduta se tornar crime c) Conceito analítico: é a subdivisão do crime em elementos ou categorias cuja função é facilitar a análise da existência de um crime pelo Judiciário. Nesse conceito estão as

37 maiores divergências doutrinárias. Alguns dos entendimentos acerca dos elementos que compõem o crime são que se trata de: a) um fato típico e antijurídico; b) um fato típico, antijurídico, culpável e punível, c) um fato típico, antijurídico e culpável (teoria tripartida). A teoria tripartida é a corrente majoritária no Brasil O CRIME NA TEORIA GERAL DO DIREITO O crime é um fato jurídico, uma vez que se trata de conduta humana cujos efeitos jurídicos (a sanção penal) não são desejados pelo agente e que contraria o ordenamento jurídico (é um ilícito). Não se trata de ato jurídico, uma vez que neste o agente quer as consequências jurídicas de seu comportamento. Também não se trata, por evidente, de negócio jurídico CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES CRIMES MATERIAIS, FORMAIS E DE MERA CONDUTA a) Crimes materiais: aqueles cuja descrição legal se refere a um resultado natural e exige produção de um dano efetivo para a consumação do delito, caso contrário, haverá apenas tentativa. b) Crimes formais: aqueles cuja descrição legal se refere a um resultado natural que, contudo, não precisa se verificar para que ocorra a consumação (p. ex.: ameaça). c) Crimes de mera conduta: aqueles cuja descrição legal não faz alusão alguma a resultado natural para a configuração do fato típico, ou seja, se consumam com o simples agir (p. ex.: porte ilegal de arma) CRIMES INSTANTÂNEOS, PERMANENTES E DE EFEITOS PERMANENTES a) Crimes instantâneos: aqueles cuja consumação se perfaz num só momento certo e determinado (p.ex. homicídio). b) Crimes permanentes: aqueles cuja consumação se estende no tempo (p. ex.: cárcere privado). c) Crimes instantâneos de efeitos permanentes são crimes instantâneos que se caracterizam pela índole duradoura de suas consequências (p.ex.: confecção de uma certidão falsa, fazendo uso dela por período prolongado no tempo) 22 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

38 CRIMES COMISSIVOS, OMISSIVOS PRÓPRIOS E OMISSIVOS IMPRÓPRIOS a) Crimes comissivos: aqueles praticados mediante uma conduta positiva (uma ação). b) Crimes omissivos próprios ou puros: caracterizam-se por um não agir, quando era exigida a ação, ou seja, por um conduta negativa (uma omissão). São próprios porque a lei prevê a conduta em modalidade omissiva, além de que a consumação independe do resultado. (p.ex. omissão de socorro) c) Crimes omissivos impróprios ou impuros: também caracterizam-se por um não agir, quando era exigida a ação, ou seja, por um conduta negativa (uma omissão). São impróprios porque a lei não prevê a conduta em modalidade omissiva, sendo imputado um crime comissivo ao agente porque ele tinha dever de agir para evitar o resultado (art. 13, 2º, CP). Além disso, a consumação depende do resultado CRIMES SIMPLES, PRIVILEGIADOS E QUALIFICADOS a) Crime simples: é o tipo penal em sua forma básica (p.ex. homicídio). b) Crime qualificado: quando existem circunstâncias previstas na sequência do tipo penal (normalmente parágrafos) que aumentam as penas mínima e máxima previstas (p.ex. homicídio qualificado). c) Crime privilegiado: quando existem circunstâncias previstas na sequência do tipo penal (normalmente parágrafos) que diminuem as penas mínima e máxima previstas (p.ex. homicídio privilegiado) CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO E PRETERDOLOSOS a) Crime preterdoloso ou preterintencional: é aquele em que o tipo prevê dolo (na conduta) e culpa (no resultado). b) Crime qualificado pelo resultado: é quando a um tipo penal é adicionada previsão de pena mais grave para quando realizado o resultado CRIMES DE DANO E DE PERIGO a) Crimes de dano: são os que se só se consumam com a efetiva lesão do bem jurídico protegido pela norma penal b) Crimes de perigo: são aqueles que se consumam com a simples criação do perigo para o bem jurídico protegido pela norma penal. O perigo pode ser presumido ou abstrato aqueles em que a lei presume o perigo ou concreto o perigo precisa ser provado, isto é, a situação de risco deve ser demonstrada.

39 CRIMES COMUNS, PRÓPRIOS E DE MÃO PRÓPRIA a) Crimes comuns: aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa. b) Crimes próprios: aqueles que só podem ser cometidos por determinadas pessoas, pois pressupõe no agente uma particular condição ou qualidade. Essa qualidade pode ser de fato, referente à natureza humana (p.ex.: mãe no infanticídio) ou de direito, referente à lei (p.ex.: funcionário público, peritos). b) Crimes de mão-própria: exige sujeito ativo qualificado o qual deve cometer pessoalmente a conduta típica, ou seja, a execução não pode ser repassada a terceiros. Por isso não admite coautoria, somente participação (p.ex.: falso testemunho) CRIMES UNISSUBJETIVOS E PLURISSUBJETIVOS a) Crimes unissubjetivos, monossubjetivos ou de concurso eventual: podem ser cometidos por uma só pessoa ou por várias pessoas. O concurso de agentes, entretanto, não é necessário (p. ex.: furto, homicídio, estupro). b) Crimes plurissubjetivos ou de concurso necessário: aqueles que só podem ser cometidos por mais de uma pessoa (p. ex.: crimes de quadrilha ou bando; rixa) CRIMES UNISSUBSISTENTES E PLURISSUBSISTENTES a) Crime unissubsistente: é o que se realiza com um único ato que não pode ser fracionado (p.ex. injúria verbal). Não admite tentativa. b) Crime plurissubsistente: é o que pode se realizar por meio de vários atos (p.ex. homicídio). Admite tentativa CRIMES PROGRESSIVOS E PROGRESSÃO CRIMINOSA a) Crime progressivo: é aquele em que o tipo penal contém, implicitamente, ações que compõem outro crime. A intenção é de praticar o crime mais grave, mas é preciso passar (progredir) pelo menos grave. Por exemplo, no homicídio está implícita a lesão corporal, de forma que o agente pode iniciar disparando um tiro que fere a vítima, mas cujo objetivo é causar sua morte. b) Progressão criminosa: é quando o agente inicia uma ação criminosa querendo o crime menos grave, mas no decorrer do iter criminis decide-se por cometer um crime mais grave. Por exemplo, o agente dispara um tipo querendo ferir a vítima, mas na sequência decide matá-la e dispara mais dois. 39

40 CRIMES HABITUAIS É a prática de um só crime por meio da reiteração da mesma conduta criminosa, que se traduz em um estilo ou hábito de vida, indesejado pela lei penal (p.ex. exercício ilegal de medicina) CRIMES DE AÇÃO ÚNICA E DE AÇÃO MÚLTIPLA a) Crimes de ação única: o tipo penal possui apenas um verbo nuclear (p.ex. homicício, furto). b) Crimes de ação múltipla: o tipo penal possui mais de um verbo nuclear, de forma que a realização de qualquer deles configura o crime (p.ex. receptação simples) CRIMES COMPLEXOS Há duas possibilidades de definição dos crimes complexos na doutrina: crimes que protegem mais de um bem jurídico ou crimes que são a fusão de dois ou mais tipos penais. Os resultados, entretanto, são semelhantes. Para qualquer das definições o roubo é um crime complexo, pois protege dois bens jurídicos (patrimônio e integridade física) e é a fusão de dois tipos penais (furto e ameaça). Outro exemplo é a extorsão mediante sequestro INFRAÇÃO PENAL, CRIME E CONTRAVENÇÃO Infração penal é gênero, do qual crime e contravenção são espécies. A diferença entre as duas espécies está fundamentalmente na sanção aplicada, conforme disposição do art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal (Decreto-Lei nº 3.914/41): Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente CRIME E ATO INFRACIONAL Quando uma conduta prevista em um tipo penal incriminador é cometida por um adolescente (entre 12 e 18 anos), não há crime, mas ato infracional. Ato infracional é uma conduta descrita como crime ou contravenção penal (art. 103 do ECA) praticada por inimputável em razão da idade, assim considerados os menos de 18 anos, aos quais não são aplicadas as penas constantes no CP, mas as medidas previstas no ECA. (art. 104 do ECA). A idade considerada é a da data do fato (art. 104, único, do ECA), de forma que se quando for condenado tiver mais do que 18 anos, ainda assim será submetido às medidas previstas no ECA MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS As medidas que podem ser aplicadas estão previstas no art. 112 e seguintes do ECA e são: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - 23 ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p

41 liberdade assistida; V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. As medidas previstas nos incisos I a IV do art. 101 são: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos. Aos menor de 12 anos não serão aplicadas as medidas previstas no art. 112 do ECA, mas apenas aquelas previstas no art A medida socioeducativa mais grave prevista no ECA é a de internação, que, conforme o art. 121, constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Diferentemente da pena privativa de liberdade aplicada aos adultos, não tem prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. Ademais, em nenhuma hipótese sua duração excederá três anos. Atingido este prazo, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. A liberação também é obrigatória quando o adolescente completar vinte e um anos de idade. Art. 122 do ECA determina que a medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta TIPO PENAL Por exigência do princípio da legalidade, somente a lei pode criminalizar condutas. A criminalização é feita pelo legislador por meio da descrição em lei da conduta (ação ou omissão) proibida a esse comportamento descrito em lei se chama de tipo penal ou tipo legal de crime. 41

42 CARACTERES ELEMENTARES E CIRCUNSTANCIAIS DO TIPO PENAL ELEMENTARES DO TIPO PENAL Elementar é todo componente essencial, imprescindível para a existência do tipo penal. Ausente a elementar, o tipo penal desaparece (atipicidade absoluta) ou o tipo penal será outro (atipicidade relativa). Estão comumente no caput do dispositivo incriminador, por isso o caput é chamado de tipo fundamental. Existem, no entanto, algumas figuras típicas descritas em parágrafos; essas figuras, chamadas de figuras equiparadas, são as únicas exceções. As elementares subdividem-se em três espécies: a) Elementos objetivos ou descritivos: são aqueles cujo significado depende de mera observação, tornando desnecessária qualquer interpretação. Todos os núcleos (verbos) do tipo constituem elementos objetivos (exemplos: matar, falsificar etc.). São aqueles que independem de juízo de valor, existem concretamente no mundo (exemplos: mulher, coisa móvel, filho etc.). Os elementos objetivos dão mais segurança ao cidadão, porque a margem de interpretação é reduzida. b) Elementos subjetivos (especiais ou específicos): trata-se de descrição no tipo penal de uma finalidade especial do agente. Determinados tipos não se satisfazem com a mera realização do verbo de forma dolosa (ou, excepcionalmente, culposa), exigindo uma finalidade específica. Existirá um elemento de ordem subjetiva sempre que houver no tipo as expressões com a finalidade de, para o fim de etc. (exemplo: rapto com fim libidinoso). O elemento subjetivo será sempre a finalidade especial que a lei exige. c) Elementos normativos ou valorativos: são aqueles que dependem de interpretação para se extrair o significado, ou seja, é necessário um juízo de valor sobre o elemento (exemplo: mulher honesta). O que é mulher honesta? Observe-se que os elementos normativos trazem a possibilidade de interpretações equívocas, divergentes, oferecendo um certo grau de insegurança. Ademais, existem duas espécies de elementos normativos: (i) elemento normativo jurídico, que é aquele que depende de interpretação jurídica (exemplos: funcionário público, documento etc.); (ii) elemento normativo extrajurídico ou moral, que é aquele que depende de interpretação não jurídica (exemplo: mulher honesta ) CIRCUNSTÂNCIAS DO TIPO PENAL Circunstância é o dado acessório ou contingente agregado ao tipo penal e cuja função é influenciar na fixação da pena. A circunstância não é imprescindível para a existência do crime, tendo função de torná-lo mais grave ou menos grave. Ressalte-se que o crime será mais ou menos grave em decorrência da circunstância, entretanto será sempre o mesmo crime (exemplo: furto durante o repouso noturno; trata-se de circunstância, tendo em vista que, sendo ou não durante o repouso noturno, ainda assim existirá o furto). A circunstância não integra a essência do tipo penal, ou seja, se o fato não for, o crime não deixa de existir. As circunstâncias estão dispostas em parágrafos (exemplo: agravantes, majorantes etc.), não servindo para compor a essência do crime, mas sim para influir na pena.

43 AGRAVANTES X QUALIFICADORAS Conforme já se posicionou o STJ: A exclusão de circunstância agravante, pela sentença, não implica na exclusão do crime, pois a agravante é algo que se põe ao redor do tipo, não integrando sua essência. É acidental, acessória, e somente serve para elevar a pena, posto que sua incidência significa que a culpabilidade do agente foi tal que merece maior reprovabilidade. O reconhecimento ou não da agravante não influi no tipo, já que ela é elemento que adere ao delito, sem alterar-lhe a essência (REsp /PR, Dipp, 5ª T., u., DJ ). A qualificadora, por sua vez, estabelece novo mínimo e novo máximo de pena em abstrato, integrando o tipo penal qualificado, sendo tratada, para esse efeito, como elementar e avaliada no momento da adequação típica, antes mesmo da aplicação da pena (STF, HC , Moreira Alves, 1ª. T., u., ). É o caso, por exemplo, do homicídio (CP, art. 121), do furto (CP, art. 155, 4º) e do art. 8º da Lei nº 8.072/ BEM JURÍDICO (OU OBJETO JURÍDICO) O bem jurídico ou objeto jurídico do crime é o interesse ou valor socialmente relevante que se busca proteger por meio do tipo penal, de forma que todo o tipo penal deve ser interpretado de forma a maximizar sua proteção (dentro dos limites semânticos da conduta descrita) e de não punir as condutas que não causem ofensa a ele. Importante: não se deve confundir o bem jurídico ou objeto jurídico com o objeto material que é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta. Por exemplo, no crime de furto (art. 151, CP), o objeto jurídico ou bem jurídico tutelado é o patrimônio, já o objeto material é a coisa alheia móvel que é subtraída, ou seja, a coisa furtada (um celular, um carro etc.). Ademais, o objeto material pode coincidir com o sujeito passivo (vítima), como ocorre no homicídio, no qual a pessoa morta é simultaneamente sujeito passivo e objeto material do crime (o objeto jurídico, entretanto, é a vida). No exemplo do furto, o sujeito passivo é a pessoa que foi furtada, diferenciando-se do objeto material FUNÇÕES DO TIPO PENAL São três as funções do tipo penal 24 : a) Função garantidora ou de garantia: é decorrência do princípio da legalidade e da pretensão de segurança jurídica que este pretende oferecer ao cidadão. Assim, todas as condutas penalmente proibidas estão descritas em um tipo penal, de forma que o cidadão pode conhecer todas aquelas situações que, se praticar, poderá ter como consequência a aplicação de uma sanção criminal. Ele pode saber, antes de praticar qualquer conduta, se ela é punível ou não e só pode ser punido por uma conduta descrita em um tipo penal. b) Função fundamentadora: o tipo também serve como fundamento para a punição. Havendo descrição de uma conduta em um tipo penal e realizada essa conduta por um cidadão imputável, o Estado terá legitimado o exercício de seu poder de punir, impondo a sanção penal sobre o agente. A violação do tipo penal, portanto, fundamenta a aplicação do Direito Penal. 24 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p

44 c) Função selecionadora de condutas: é por meio dos tipos penais que os legisladores selecionam aquelas condutas socialmente danosas e que causam ofensa a bens jurídicos socialmente relevantes, descrevendo-as e vinculando uma sanção penal à hipótese de sua realização TIPOS INCRIMINADORES E NÃO INCRIMINADORES a) Tipos incriminadores: são todos aqueles que descrevem uma conduta a qual atribuem uma sanção penal à hipótese de sua realização. É uma proibição penal. b) Tipos não incriminadores, tipos permissivos ou tipos justificadores: são aqueles que descrevem condutas ou hipóteses nas quais uma conduta é permitida, embora esteja descrita em um tipo incriminador. Normalmente trata-se de uma exceção à punição do cidadão que realiza um tipo penal incriminador. É uma permissão penal. Por exemplo, são tipos permissivos as causas justificantes previstas no art. 23 do Código Penal: Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Importante: não se deve confundir os tipos permissivos, que permitem a conduta, considerando-a lícita em certas circunstâncias, com causas que previsões que excluem a culpabilidade ou a punibilidade do agente, pois estar não permitem a conduta, mas apenas consideram que o agente não pode ser responsabilizado ou punido, mas a conduta é ainda considerada ilícita TIPOS DOLOSOS E TIPOS CULPOSOS Dolo e culpa são os chamados elementos subjetivos dos tipos penais, definindo o grau de vinculação do agente com sua conduta (como visto anteriormente, o princípio da culpabilidade impede a responsabilização objetiva no direito penal). O art. 18 dispõe que o crime é doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo e culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. O único acrescenta que salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. Portanto, em regra os tipos exigem o dolo para que restem configurados, devendo haver cláusula expressa para que possa ser punido na modalidade culposa. É importante ainda notar que o dolo e a culpa não estão previstos em cada tipo penal, pois são elementos subjetivos genéricos. Mas é possível que o tipo penal exija uma intenção específica do agente para que o tipo se realize, tais elementos são chamados de elementos subjetivos específicos. Mais sobre o tema será explorado quando da abordagem do dolo e da culpa TIPICIDADE CONCEITO DE TIPICIDADE Como visto, o tipo penal é a descrição em lei da conduta proibida. Mas quando há um comportamento real de algum sujeito que realiza o tipo penal (a conduta descrita em lei), ocorre a tipicidade (ou adequação típica). Importante, portanto, saber que há diferença entre tipo penal e tipicidade penal. O tipo legal é um dos postulados básicos do princípio da reserva legal, que

45 Constituição Federal consagra expressamente que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (artigo 5.º, inciso XXXIX), deixando à lei a tarefa de definir, descrever, os crimes. a) Adequação típica ou tipicidade imediata: é o ajuste integral, perfeito, entre o fato e o tipo penal, sem que para a sua subsunção se exija o concurso de qualquer outra norma. b) Adequação típica ou tipicidade mediata, ampliada ou por extensão: o fato não se enquadra imediatamente ao tipo penal, de forma que para restar configurada a tipicidade exige-se o concurso de outra disposição legal (há uma extensão do tipo penal que, sozinho, não abarcaria a conduta realizada). É o que ocorre na omissão imprópria (art. 13, 2º, do CP) tentativa (artigo 14, inciso II, do CP) e o concurso de agentes (artigo 29 do CP) em todos os casos há uma previsão de ampliação do tipo penal original. As normas que ampliam o tipo penal funcionam como um elo, evitando que o fato fique sem enquadramento típico. São chamadas normas de extensão ou ampliação da figura típica. Adequação mediata por ampliação causal: Na omissão imprópria, há uma extensão causal, porque a forma pela qual se pode causar o resultado é ampliada, de forma que um tipo que exigiria originalmente uma conduta positiva (ação) para a configuração da tipicidade, passa a admitir que também a punição de uma conduta negativa (omissão), desde que o agente tenha dever de agir. Adequação mediata por ampliação temporal: No caso da tentativa, a extensão ocorre no tempo, pois o modelo descritivo alcança o fato momentos antes de sua consumação a conduta só deveria subsumir-se no tipo penal com a consumação, mas a norma que trata da tentativa faz com que retroceda no tempo e alcance o fato antes de sua realização completa. Adequação mediata por ampliação espacial: No caso da participação, a extensão ocorre no espaço, pois o partícipe é aquele que não pratica o núcleo descrito na norma, decorrendo daí a impossibilidade de adequação direta. O artigo 29 do Código Penal liga a conduta do partícipe ao modelo legal. A extensão opera-se de uma pessoa (autor principal) para outra (partícipe) TIPICIDADE FORMAL E TIPICIDADE MATERIAL a) Tipicidade formal: é a mera análise da subsunção entre a conduta real e o texto do tipo penal. Observa-se a conduta do agente e analisa-se se ela se amolda à conduta descrita em lei em caso positivo, ela é formalmente típica; em caso negativo, ele é formalmente atípica. b) Tipicidade material: é a análise do tipo penal de acordo com o bem jurídico que ele objetiva proteger e com a gravidade da ofensa (lesão ou perigo de lesão) a ele. Assim, analisa-se se a conduta do agente causou lesão ou perigo de lesão grave ao bem jurídico tutelado pela norma penal em caso positivo, ela é materialmente típica; em caso negativo, ele é materialmente atípica. A análise da tipicidade material é um passo posterior em relação à análise da tipicidade formal, isto é, primeiro verifica-se se a conduta se enquadra no texto da lei penal e depois se ela causou lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado por esta lei. 45

46 Importante: o princípio da adequação social e o princípio da insignificância, analisados anteriormente, são considerados causas de exclusão da tipicidade material. Existe doutrina 25 que também considera o princípio da intervenção mínima como excludente da tipicidade. (Sobre o conteúdo destes princípios, veja-se o capítulo sobre princípios penais.) c) Atipicidade: como visto, é quando a conduta real não se amolda à descrição legal (atipicidade formal) ou não causa lesão ou perigo de lesão relevante ao bem jurídico tutelado pela norma penal (atipicidade material) TIPICIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA A tipicidade ainda pode ser dividida em objetiva (composta por conduta, resultado e relação de causalidade) e subjetiva (dolo ou culpa). Na sequência far-se-á um estudo analítico destes elementos ELEMENTOS OBJETIVOS DO FATO TÍPICO (OU TIPICIDADE OBJETIVA) O fato típico é composto dos seguintes elementos objetivos: Conduta (ação ou omissão); Resultado (apenas nos crimes materiais); Nexo de causalidade entre a conduta e o resultado (apenas nos crimes materiais); Importante: alguns autores 26 adicionam como um quarto elemento objetivo a tipicidade (enquadramento da conduta real à descrição típica), no qual analisam o que vimos acima nos tópicos: conceito de tipicidade e caracteres elementares e circunstanciais do tipo penal CONDUTA TEORIAS DA CONDUTA a) Conceito causal ou naturalista de ação: criado por Franz von Liszt, a ação é considerada biologicamente, como uma inervação muscular produzidas por um impulso cerebral, que causa uma modificação causal no mundo físico. É a exteriorização do pensamento. É essa a ação penalmente relevante. Enfrentou muitas críticas por não conseguir abarcar o conceito de omissão, além de que muitos fatos não produzem uma modificação no mundo físico (a ameaça, por exemplo). 25 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p. 87; CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

47 b) Conceito finalista de ação: criado por Hanz Welzel, a ação é uma conduta humana consciente e voluntária dirigida a uma finalidade. A ação relevante para o direito penal é apenas aquela que o homem dirige a uma determinada finalidade. Está atrelada a um querer. Também enfrentou críticas por não conseguir abarcar o conceito de omissão. c) Conceito social da ação: defendida por Jeschek e Wessels, a ação é considerada do ponto de vista de sua relevância social. Para o direito penal, não se quer um conceito biológico ou natural de ação, mas importa aquelas ações com relevância para a sociedade. d) Conceito funcionalista de ação: as teorias funcionalistas tiram da ação o papel central que ela desempenhava nas outras teorias, sendo o tipo o conceito mais importante. Para Roxin, ação é a exteriorização da personalidade (teoria personalista da ação); para Jakobs, ação é visto numa perspectiva negativa, como a não evitação de um resultado evitável pelo sujeito (teoria da evitabilidade individual) CONCEITO, CARACTERÍSTICAS E ELEMENTOS DA CONDUTA PENALMENTE RELEVANTE A teoria finalista é a mais aceita no Brasil, de forma que a conduta penalmente relevante é compreendida como toda ação ou omissão humana, consciente e voluntária, voltada a uma finalidade. Desta forma, são elementos necessários à conduta: a) Comportamento humano. Por isso animais não podem cometer crimes. b) Repercussão externa da vontade do agente. Por isso não constituem conduta: o simples pensamento, a cogitação, o planejamento intelectual. c) Ato voluntário e consciente: o ato é voluntário quando existe uma decisão por parte do agente, quando não é um simples resultado mecânico. Por isso não há conduta em hipótese de: (i) caso fortuito ou força maior; (ii) atos reflexos, causados por estímulo externo ao sistema nervoso; (iii) coação física (vis absoluta); (iv) movimentos praticados durante o sonho, em estado de sonambulismo, hipnose ou inconsciência. Importante: apenas a coação física (vis absoluta) exclui a conduta. A coação moral (vis compulsiva), não exclui a conduta, mas afastará a culpabilidade, como se verá oportunamente AÇÃO E OMISSÃO a) Ação ou conduta comissiva: é o comportamento positivo, a movimentação corpórea, o fazer. A maioria dos núcleos dos tipos se consubstancia em modos positivos de agir, como matar, subtrair, apropriar-se, destruir etc. b) Omissão ou conduta omissiva: é o comportamento negativo, o não fazer quando o agente se exige que o agente faça algo. Por haver uma exigência de ação, deve-se analisar em que situações a omissão é penalmente relevante. 47

48 RELEVÂNCIA PENAL DA OMISSÃO Existem duas teorias a respeito da omissão: a) Teoria naturalística da omissão: a omissão é considerada análoga ao fazer, é perceptível no mundo natural como algo que muda o estado das coisas, ou seja, quem se omite dá causa ao resultado. b) Teoria normativa da omissão: quem se omite não faz nada e o nada não causa coisa alguma, não tem relevância causal em sentido físico. O que ocorre, entretanto, é que a lei impõe um dever jurídico de agir em determinadas circunstanciais. Por isso é chamada teoria normativa, pois, para que a omissão tenha relevância causal (por presunção legal), há necessidade de uma norma impondo, na hipótese concreta, o dever jurídico de agir. É a teoria adotada pelo art. 13, 2º, do Código Penal OMISSÃO PRÓPRIA E OMISSÃO IMPRÓPRIA a) Crime omissivo próprio ou puro: a conduta negativa é descrita no tipo penal. Nesse caso, o omitente responderá pela simples conduta e não pelo resultado (exemplo: artigo 135 do Código Penal omissão de socorro). Portanto, a simples omissão é suficiente para a consumação, independente de qualquer resultado. b) Crime omissivo impróprio, espúrio, impuro, promíscuo ou comissivo por omissão: é a ampliação mediata de um tipo penal que descreve conduta positiva (exemplo: homicídio, lesão corporal, furto), com a imposição de um dever jurídico de agir para evitar o resultado. O agente que tem dever de agir diante da situação, não age, e assim não faz o que deveria (e poderia) ter feito. Como consequência, o omitente não responde só pela omissão como simples conduta, mas pelo resultado produzido, salvo se esse resultado não lhe puder ser atribuído por dolo ou culpa. O artigo 13, 2º, do Código Penal as hipóteses em que o agente tem dever jurídico de agir ou dever de garantia: Dever legal: tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância (exemplo: responderá por homicídio o policial militar que assistir a um jovem sendo morto e, podendo evitar o resultado, nada faz). Dever contratual: hipótese do agente que, por lei, não tem nenhuma obrigação de cuidado, proteção ou vigilância, no entanto assume essa obrigação por meio de um contrato expresso ou tácito (exemplo: uma babá contratada para tomar conta de uma criança responderá pelo resultado caso aconteça algo com ela). O garantidor também pode advir da liberalidade, ou seja, alguém que assume livremente a obrigação, independentemente de contrato. Ingerência dentro da norma: quando com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado (exemplo: se alguém, por imprudência, joga uma pessoa que não sabe nadar em uma piscina, responderá pelo resultado caso aconteça algo com ela)

49 Importante: os crimes omissivos impróprios admitem a tentativa, ao passo que os omissivos próprios não; os crimes omissivos impróprios podem ser dolosos ou culposos, os omissivos próprios são sempre dolosos SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO DA AÇÃO a) Sujeito ativo: é quem pratica a conduta descrita na norma penal incriminadora. Em geral qualquer pessoa pode ser sujeito ativo dos crimes, mas por vezes os tipos penais exigem características ou qualidades especiais do sujeito, como é o caso do funcionário público no crime de peculato (art. 312 do CP). Animais e coisas não podem ser sujeitos ativos de crimes, nem autores de ações, pois lhe falta o elemento vontade. b) Sujeito passivo: é o titular do bem jurídico ofendido no crime. Divide-se em sujeito passivo formal ou constante (Estado - titular do interesse jurídico de punir), e sujeito passivo material ou eventual (titular do bem jurídico diretamente lesado). Por vezes o Estado pode ser também o sujeito passivo material, como no caso dos crimes contra a Administração Pública e contra a ordem tributária. Em geral qualquer pessoa pode ser sujeito passivo dos crimes, mas por vezes os tipos penais exigem características ou qualidades especiais do sujeito, como é o caso do estupro de vulnerável, que exige que a vítima seja menor de 14 anos (art. 217-A do CP). Não podem ser sujeitos passivos: animais, coisas e mortos. Importante: o objeto material pode coincidir com o sujeito passivo (vítima), como ocorre no homicídio, no qual a pessoa morta é simultaneamente sujeito passivo e objeto material do crime. No furto, o sujeito passivo é a pessoa que foi furtada, diferenciando-se do objeto material (uma bolsa, um carro, um celular) A PESSOA JURÍDICA COMO SUJEITO ATIVO DE CRIME De forma geral, considera-se que somente a pessoa física pode praticar crime, visto que a conduta pressupõe vontade e consciência e somente os seres humanos as possuem. Entretanto, existe exceção: a Lei n /98, que dispõe sobre atividades lesivas ao meio ambiente, prevê que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada criminalmente. No art. 3º consta que As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente. Os arts. 21 a 24 dispõem sobre as sanções aplicáveis: multa, restrição de direitos e prestação de serviços à comunidade. Teoria da dupla imputação: até recentemente o STJ considerava impossível a responsabilização penal da pessoa jurídica dissociada da pessoa física, o que configurava a chamada Teoria da dupla imputação. Entretanto, recentemente o STF decidiu que a responsabilização da pessoa jurídica independe da condenação da pessoa física responsável. O art. 225, 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação (RE , Primeira Turma, DJe 29/10/2014). O STJ, em seguida, também mudou seu entendimento, admitindo a condenação isolada da pessoa jurídica. Portanto, atualmente há uniformidade da jurisprudência dos tribunais superiores quanto à não aplicação da teoria da dupla imputação. 49

50 RESULTADO Resultado é a consequência de uma conduta humana penalmente relevante. É o efeito de dano ou perigo produzido pela ação humana e prevista na norma que define o crime RESULTADO NATURAL E RESULTADO JURÍDICO a) Resultado jurídico: é a consequência jurídica do crime enquanto lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido. Sob o aspecto jurídico, não há crime sem resultado, pois todo crime fere ou expõe a perigo um bem jurídico. Exemplo: no homicídio o resultado jurídico é a lesão ao bem jurídico vida. b) Resultado natural ou naturalístico: é a modificação que a conduta provoca no mundo exterior, no mundo concreto, de forma apreensível aos sentidos. Exemplo: no homicídio o resultado natural é a morte da pessoa CLASSIFICAÇÃO DO CRIME EM RELAÇÃO AO RESULTADO NATURAL a) Crimes materiais: são crimes que somente se consumam com a produção do resultado naturalístico, ou seja, o resultado naturalístico integra o próprio tipo penal (exemplos: homicídio, furto, sequestro etc.). b) Crimes formais de resultado cortado ou de consumação antecipada: são crimes em que a ocorrência do resultado naturalístico, apesar de admitida, não é relevante, pois se consumam antes e independentemente de sua produção. Nesses crimes, a produção do resultado naturalístico é considerada mero exaurimento, o que influenciará a fixação da pena (artigo 59). (Exemplo de crime formal: extorsão mediante sequestro: nesse crime, o resultado naturalístico visado é a obtenção da vantagem econômica e consequente diminuição do patrimônio da vítima; no entanto, o crime se consuma no momento em que a vítima é sequestrada, independentemente do recebimento ou não do resgate. Outros exemplos. extorsão, a ameaça e a injúria verbal). c) Crimes de mera conduta: o tipo não prevê a ocorrência de resultado naturalístico (exemplos: crime de desobediência, violação de domicílio). Importante: essa classificação diz respeito apenas ao resultado natural. O resultado jurídico é exigido em todos eles CAUSALIDADE, RELAÇÃO DE CAUSALIDADE OU NEXO CAUSAL É a relação que se estabelece entre a conduta (ação ou omissão) e o resultado, de forma que este é atribuído (imputado) ao comportamento do agente. O art. 13 do CP define causa da seguinte forma: Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido

51 Quando se fala de causalidade, normalmente se refere à causalidade física ou natural, isto é, a um movimento corpóreo que modifica o mundo natural gerando certas consequências (exemplo: desferir um soco em alguém é uma conduta que causa física ou naturalmente um resultado de lesão corporal). Entretanto, pode-se falar de causalidade psicológica (prevista no art. 18 do CP), quando há uma vinculação psicológica do agente com o resultado que produz: ele o quer ou assume o risco de produzí-lo (crime doloso) ou lhe dá causa por imprudência, negligência ou imperícia (crime culposo). Pode-se ainda falar de causalidade jurídica ou normativa, quando se atribui ao agente uma lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico, independentemente da causalidade natural. É o que ocorre, por exemplo, nos crimes omissivos impróprios, nos quais o agente tem dever de impedir a ofensa ao bem jurídico da vítima e, caso não haja para tanto, é responsabilizado como causador da ofensa. Importante notar que quando se fala apenas em causalidade, relação de causalidade ou nexo causal, normalmente se está referindo à causalidade física ou natural. As outras formas são expressamente referidas. Não há que falar em causalidade (natural) quando não se tratar de crime material. Com efeito, se o crime é formal ou de consumação antecipada, a investigação da causalidade física é desnecessária porque em tais casos o resultado é apenas jurídico ou normativo. Assim também na chamada tentativa branca de homicídio, quando a vítima não chega sequer a ser lesionada, havendo mera exposição a perigo do bem jurídico protegido. Teoria da equivalência das condições ou equivalência dos antecedentes (conditio sine qua non). Causa superveniente. Teoria da imputação objetiva. Omissão como causa do resultado TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DAS CONDIÇÕES OU EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES (CONDITIO SINE QUA NON) O art. 13 do Código Penal, quando refere que causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido, adota expressamente a teoria da equivalência das condições. Para essa teoria, tudo que tenha de qualquer modo contribuído para o resultado é considerado sua causa. A lei atribui relevância causal a todos os antecedentes do resultado, de forma que nenhum elemento de que depende a sua produção pode ser excluído da linha de desdobramento causal. Tudo que, retirado da cadeia de causa e efeito, provocar a exclusão do resultado, considera-se sua causa. Eliminação hipotética: para se estabelecer se uma conduta é ou não causa do resultado, basta aplicar o critério da eliminação hipotética, segundo a qual se a eliminação da conduta fizer com que desapareça o resultado, é porque o causou. Se o resultado permanecer apesar da exclusão hipotética da conduta, então ela não é causa. 51

52 CAUSAS DEPENDENTES E CAUSAS INDEPENDENTES a) Causas dependentes: são aquelas que se encontram dentro da linha normal de desdobramento causal da conduta. São causas que produzem o resultado de forma logicamente previsível e esperada. Não rompem o nexo causal (exemplo: disparo de arma de fogo, ferimento, rompimento de artérias, hemorragia interna e morte). b) Causas independentes: são aquelas que se encontram fora da linha normal de desdobramento causal da conduta. Seu surgimento não é uma decorrência esperada, lógica, natural do fato anterior, mas, ao contrário, um fenômeno totalmente inusitado, imprevisível, produzindo o resultado de forma inesperada. A causa independente se destaca da conduta, ou seja, não se sabia que, ao praticar a conduta, haveria aquela causa. Exemplo: não é uma consequência normal de um simples susto a morte por parada cardíaca. As causas independentes podem ser absolutamente ou relativamente independentes. b.1.) Causas absolutamente independentes: tem uma origem completamente diversa da conduta, ou seja, ocorreria ainda que a conduta nunca tivesse sido praticada (exemplo: o agente planeja a morte da vítima; quando ela está passando, antes de o agente atirar, a vítima sofre um ataque cardíaco e vem a falecer; independentemente da conduta, o resultado aconteceria). Portanto, produz sozinha o resultado. Subdivide-se em: i) Preexistentes: ocorre antes da conduta de referência. Exemplo: o genro, com intenção de envenenar a sogra, ministra arsênico no jantar da vítima (conduta de referência). Ao terminar o jantar, a vítima morre. Constata-se, então, que a causa da morte da vítima foi o envenenamento produzido pela nora no café da manhã (conduta anterior). Observe-se que a morte não foi causada pela conduta do genro, pois o arsênico leva 16 horas para fazer efeito. Não há, portanto, nexo causal. Nesse caso, o genro responderá por tentativa de homicídio. ii) Concomitantes: atuam simultaneamente à conduta de referência. Exemplo: alguém está espancando outra pessoa para matá-la (conduta de referência), quando um terceiro aparece e desfere um tipo na vítima (conduta concomitante). Não há nexo causal entre o espancamento e a morte, mas o agente poderá responder por tentativa de homicídio. iii) Supervenientes: atuam posteriormente à conduta de referência. Exemplo: após ser envenenada (conduta de referência), mas ainda viva, desprende-se o lustre sobre a cabeça da vítima (causa superveniente), matando-a. Não há nexo causal, mas o agente poderá responder por tentativa de homicídio. Importante: nos exemplos citados, as causas rompem totalmente o nexo causal com o resultado morte, mas o agente responderá pelos atos que praticou

53 b.2.) Causa relativamente independente: produz por si só o resultado, mas não existiria sem a conduta do agente, ou seja, a causa apareceu por conta da conduta e, inesperadamente, produziu o resultado. Podem ser: a) Preexistentes: atuam antes da conduta de referência. Exemplo: o agente corta o braço da vítima (conduta de referência), que é hemofílica (causa anterior), e esta morre em decorrência da hemorragia. A hemofilia é causa preexistente ao resultado. Há nexo causal, mas o autor deverá responder por lesão corporal, diante da ausência de dolo de matar (se o agente não sabia que a vítima era hemofílica). b) Concomitantes: atuam simultaneamente à conduta de referência. Exemplo: o ladrão anuncia o assalto apontando um estilete para a vítima (conduta de referência), que desmaia e morre de infarto (causa concomitante). Há nexo causal, mas não houve dolo nem culpa em matar. Nesse caso o agente responderia por tentativa de roubo. c) Supervenientes: atuam posteriormente à conduta de referência. Exemplo: uma pessoa é baleada no peito (conduta de referência) e está sendo levada ao hospital quando a ambulância que a transporta capota, fazendo com que a vítima morra em decorrência de ter sua cabeça esmagada (causa superveniente). O art. 13, 1º, do CP oferece a solução de forma expressa: A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. Importante: as causas relativamente independentes não têm o condão de romper o nexo causal. No caso das causas preexistentes e concomitantes, como existe nexo causal, o agente responderá pelo resultado, a menos que tenha concorrido para o mesmo sem dolo ou culpa. Afinal, dizer que existe nexo causal não dispensa a presença do elemento subjetivo psicológico (dolo) ou normativo (culpa) da conduta, sem os quais o fato será atípico. No entanto, na hipótese de causas supervenientes, embora exista nexo causal físico-naturalístico, o Código Penal, por expressa disposição do artigo 13, 1., excepcionando a regra geral, manda desconsiderá-lo, não respondendo o agente pelo resultado, mas somente por tentativa TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA A teoria da imputação objetiva foi criada por Claus Roxin e busca estabelecer critérios objetivos para a atribuição (imputação) de um resultado à conduta de alguém. Esses critérios, entretanto, não são físicos ou naturais, mas jurídicos ou normativos. De acordo com esta teoria, sendo o direito uma criação humana, o fundamental para a atribuição de um resultado a uma conduta não é tanto a causalidade natural ou física, mas as finalidades da norma penal. É importante frisar, entretanto, que a teoria da imputação objetiva não exclui a necessidade de averiguação da causalidade natural, mas soma-se a ela, adicionando novos critérios. São critérios para a imputação objetiva do resultado à conduta: a) Criação de um risco não permitido ou proibido: para que haja imputação do resultado à conduta, ela deve criar um risco não permitido ao bem jurídico. Riscos são inerentes a todas as atividades humanas. Dirigir em rodovias, por exemplo, é um constante risco à vida; entretanto, trata-se de um risco permitido ou irrelevante (risco geral da vida). Mas alguns riscos são proibidos pelo direito, como o de dirigir após consumo de bebida 53

54 alcoólica, de forma que o agente que causa a morte de alguém dirigindo após consumo de álcool viola uma norma e, portanto, cria um risco não permitido, de forma que o resultado morte pode lhe ser imputado objetivamente (se por culpa ou dolo não é uma discussão de imputação objetiva, mas de imputação subjetiva). Desta forma, não podem ser imputados resultados a não ser que a conduta do agente crie um risco não permitido, independentemente de ele agir com dolo. Exemplo clássico é o do sobrinho que, querendo a morte do tio, lhe dá uma passagem de avião, esperando que o avião caia. Andar de avião, em situações normais, é um risco geral da vida, de forma que o sobrinho não criou um risco proibido e, por isso, não pode ser responsabilizado por uma eventual morte do tio. Atua conforme a o risco permitido: o profissional que segue as normas que regulamentam a profissão (lex artis). b) Princípio da confiança: baseia-se na expectativa de que as outras pessoas ajam de forma lícita, de forma que a realização de uma conduta na confiança de que o comportamento do outro agente ocorrerá de acordo com o direito não pode ser considerado criação de um risco proibido e, portanto, não pode ser imputado objetivamente ao agente. O motorista que, conduzindo seu veículo pela preferencial, passa por um cruzamento, confia que o outro automóvel, que se encontra na via secundária, aguardará sua passagem. Havendo acidente, ao primeiro não poderá sem imputado o resultado, uma vez que sua conduta estava abarcada pelo princípio da confiança. c) Realização do risco no resultado: se, embora criado um risco não permitido, ele não se realiza no resultado, este não pode ser imputado objetivamente ao agente. Por exemplo, um motorista dirige embriagado e atropela um pedestre, causando-lhe lesões corporais. O hospital em que o pedestre é tratado pega fogo e ele morre. O motorista não responderá por homicídio, uma vez que o resultado morte não é resultado do risco não permitido criado por ele (dirigir embriagado), mas de um risco imprevisível. Importante, em alguns casos, esse critério pode ser usado para resolver os problemas que também são resolvidos pela análise das causas independentes e dependentes. d) Resultado está abarcado pela norma: se criado um risco não permitido que se realiza no resultado, ainda será possível excluir a imputação objetiva da conduta ao agente no caso de o resultado não estar abarcado pelo tipo penal. Por exemplo, um motorista anda em velocidade acima da permitida, quando um pedestre atravessa a faixa, freia bruscamente, parando a centímetros. O susto faz com que o pedestre tenha um infarto e morra. O motorista não responderá por homicídio, uma vez que a lei que regula o limite de velocidade está prevendo o resultado morte por atropelamento, mas não por susto. e) Autocolocação em perigo, heterocoloação consentida em perigo ou capacidade/competência da vítima: se a vítima quer o risco, o resultado não pode ser imputado a outrem. Por exemplo, se alguém coloca-se consciente e voluntariamente (sem coação) em situação de risco, o resultado não pode ser imputado a outra pessoa. Se alguém consente (consciente e voluntariamente) com a criação de um risco para si por outra pessoa, o resultado não pode ser imputado a esta. f) Âmbito de responsabilidade de terceiros: se, após a criação de um risco não permitido por alguém, terceiro intervém na situação e ocasiona um resultado mais grave do que aquele que decorreria do risco inicial, o resultado mais grave é imputado ao terceiro; o primeiro agente responde apenas pelos resultados que derivam do risco por ele criado. g) Proibição de regresso: a um comportamento lícito, que de alguma forma com comportamento ilícitos de terceiros, não pode ser imputado o resultado, embora tenha colaborado para causá-lo

55 8.4. ELEMENTOS SUBJETIVOS DO FATO TÍPICO (OU TIPICIDADE SUBJETIVA) DOLO TEORIAS SOBRE O DOLO a) Teoria da vontade: o dolo seria somente a vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal. O agente deseja o resultado. b) Teoria do assentimento ou consentimento: atua com dolo quem, mesmo prevendo o resultado lesivo e não o querendo de forma direta, assume o risco de produzi-lo. O agente não precisa querer o resultado diretamente, basta que o preveja como possível e que aceita a possibilidade de sua ocorrência. O agente não se importa com o resultado. c) Teoria da representação ou previsão do resultado: basta o agente agir após ter previsto o resultado como possível para se configurar o dolo, independentemente da aceitação dele. d) Teoria da probabilidade: há dolo quando o sujeito age sabendo que seu comportamento tem grande probabilidade de gerar um resultado penalmente ilícito, embora não tenha certeza DOLO NO CÓDIGO PENAL Conforme o art. 18, I, do Código Penal, o crime é doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo. As teorias adotadas, portanto, foram a da vontade ( quis o resultado ) e a do assentimento ( assumiu o risco de produzi-lo ). Em regra, todos os crimes são dolosos, sendo a culpa exceção, conforme o único do art. 18: Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente CONCEITOS E ELEMENTOS DO DOLO Dolo é a vontade da conduta orientada para a realização do tipo penal (Welzel). Em outras palavras, é a vontade do agente e realizar o comportamento previsto em um tipo penal. Importante frisar que ele não precisa querer cometer um crime ou saber que o fato que comete é crime para que haja dolo, basta querer a realização de um comportamento e que este comportamento esteja previsto em um tipo penal. Tem dois elementos: a) cognitivo ou intelectual: é a consciência ou representação do fato, o conhecimento da conexão causal entre a conduta e o resultado dela. b) volitivo: é a vontade de realização do fato, o querer realizar o resultado a partir da conduta. 55

56 ESPÉCIES DE DOLO: DOLO DIRETO E INDIRETO a) Dolo direto ou imediato: é aquele em que o agente quer praticar a conduta descrita no tipo penal, dirigindo-se finalisticamente para o resultado. Possui duas subespécies: a.1) Dolo direto de 1.º grau: é aquele dirigido imediatamente a produzir o resultado, e de acordo com os meios executórios, não existe possibilidade de ocorrência de qualquer efeito colateral ou concomitante; e a.2) Dolo direto de 2.º grau: também conhecido como dolo de consequências necessárias, que acontece quando resultados lesivos concorrentes são previstos e tidos como certos, o que faz dessa modalidade um dolo direto, mas de 2.º grau, uma vez que a finalidade primeira é um determinado e específico resultado lesivo, e as consequências necessárias surgem em virtude do meio de execução selecionado. b) Dolo indireto ou mediato: é aquele que existe quando o agente não quer produzir resultado certo e determinado. Pode ser: b.1) Eventual: quando o agente não quer produzir o resultado, mas aceita o risco de produzi-lo (exemplo: o motorista que, em desabalada corrida, para chegar em seu destino, aceita o resultado de atropelar uma pessoa). Nélson Hungria lembra a fórmula de Frank para explicar o dolo eventual: Seja como for, dê no que der, em qualquer caso não deixo de agir. Também pode ocorrer dolo eventual pela dúvida sobre elementos do tipo. TJSP: Ignorância, dúvida ou incerteza do réu quanto à idade da vítima de crime contra os costumes não o favorece, por subsistir o dolo Eventual, apto, por si, a testificar a violência ficta.(rt 536/307) b.2) Alternativo: quando o agente quer produzir um ou outro resultado (exemplo: o agente atira para ferir ou para matar; nesse caso, responde pelo resultado mais grave, aplicando-se o princípio da consunção) DOLO DE DANO E DE PERIGO a) Dolo de dano ou de lesão: é a vontade de produzir uma efetiva lesão ao bem jurídico. Quase todos os crimes são de dano (exemplos: furto, homicídio etc.). b) Dolo de perigo: é a vontade de expor o bem jurídico a uma situação de perigo de dano. Exemplo é o art. 130 do CP: Expor alguém, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, a contágio de moléstia venérea, de que sabe ou deve saber que está contaminado. Se o agente sabe que está contaminado e ainda assim tem relações sexuais desprotegidas, tem dolo de perigo, pois expõe a integridade física alheia à perigo de lesão

57 TIPO SUBJETIVO E ELEMENTOS SUBJETIVOS DO TIPO (OU DOLO GENÉRICO E ESPECÍFICO) a) Tipo subjetivo ou dolo genérico ou geral: é a vontade de realizar o fato previsto em tipo penal sem qualquer finalidade especial. É necessário para a realização dolosa de qualquer crime previsto no Código Penal ou em legislação especial. b) Elementos subjetivos específicos ou dolo específico ou especial: é uma intenção especial exigida pelo tipo penal para que haja sua realização. Existirá um elemento de ordem subjetiva sempre que houver no tipo as expressões com a finalidade de, para o fim de etc. (exemplo: rapto com fim libidinoso). O elemento subjetivo será sempre a finalidade especial que a lei exige CULPA CONCEITO DE CULPA Culpa é a violação de um dever objetivo de cuidado imposto pelo Direito Penal. Há casos em que o legislador não exige a intenção de ofender o bem jurídico, exigindo que em determinadas situações o agente tenha um cuidado especial. Caso esse cuidado não seja observado e haja um resultado, o agente responderá pelo crime na modalidade culposa CULPA NO CÓDIGO PENAL E A EXCEPCIONALIDADE DO CRIME CULPOSO Conforme o art. 18, II, do Código Penal, o crime é culposo quando quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Como já apontado, em regra todos os crimes são dolosos. A punição da modalidade culposa exceção e exige que haja expressa previsão legal, conforme o único do art. 18: Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente MODALIDADES DE CULPA a) Imprudência: consiste na prática de um ato perigoso, sem observância de regras (legais ou de experiência) de precaução e segurança previsíveis e necessárias para a situação e que tenha como consequência resultado ofensivo à bem jurídico. b) Negligência: consiste na omissão de uma precaução ou simplesmente da indiferença em relação ao ato praticado, que tem como consequência resultado ofensivo à bem jurídico. c) Imperícia: resulta da falta de aptidão, habilidade ou destreza para o exercício da atividade, por despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos, tendo como consequência resultado ofensivo à bem jurídico. 57

58 ESPÉCIES DE CULPA CULPA CONSCIENTE, INCONSCIENTE E IMPRÓPRIA a) Culpa consciente: o agente prevê o resultado, mas acredita sinceramente que ele não ocorrerá ou que poderá evitá-lo. b) Culpa inconsciente: o agente não prevê o que era previsível e que a lei exigia que fosse previsto. c) Culpa imprópria: também é chamada culpa por extensão, por assimilação ou por equiparação. O resultado é conhecido e querido pelo agente, que age em erro de tipo inescusável ou vencível ou em excesso nas causas de justificação 27. Exemplo: A está em casa assistindo televisão quando seu primo entra na casa pelas portas dos fundos; pensando tratar-se de um ladrão, A efetua disparos de arma de fogo contra seu azarado parente. Nesse caso, A acredita estar agindo em legítima defesa. Como A agiu em erro de tipo inescusável ou vencível (se fosse mais atento e diligente perceberia que era seu primo), responde por homicídio culposo nos termos do artigo 20, 1.º, do Código Penal. Observe-se que a culpa imprópria, na verdade, diz respeito a um crime doloso, mas que o legislador aplica pena de crime culposo em razão de um erro que vicia a representação ou vontade do sujeito ativo CULPA CONSCIENTE X DOLO EVENTUAL Os institutos da culpa consciente e do dolo eventual não raramente são confundidos, por sua similaridade, no entanto possui características específicas que os diferenciam. Na culpa consciente, o agente prevê o resultado e pratica a conduta acreditando sinceramente que ele não ocorrerá ou poderá ser evitado. No dolo eventual, o agente prevê o resultado e pratica a conduta sem se importar com a ocorrência do resultado. Enquanto na culpa consciente há excesso de confiança, no dolo eventual há mera indiferença ELEMENTOS DO CRIME CULPOSO a) Conduta: nos crimes culposos a finalidade da conduta é normalmente lícita, de forma que a vontade do agente é irrelevante. O relevante, portanto, é o modo ou forma imprópria como atua. Importante: a conduta deve ser voluntária. b) Inobservância do dever objetivo de cuidado: é a não observância de deveres impostos a todos, causando, assim, danos a bens jurídicos de terceiros (por exemplo, regras de trânsito ou regras de segurança hospitalar pelo médico). A inobservância de um dever objetivo de cuidado é o que converte a conduta em negligente, imprudente ou imperita. c) Resultado: apesar da inobservância ao dever objetivo de cuidado, o agente apenas poderá ser penalmente responsabilizado se efetivamente causar dano a bens jurídicos penalmente tutelados (por exemplo, o motorista que dirige desrespeitando as regras de trânsito só responde por homicídio culposo se houver morte). 27 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

59 d) Nexo de causalidade: requisito essencial do fato típico, para que o resultado seja imputado ao agente é sua conduta que lhe deve ter dado causa. e) Previsibilidade: deve ser possível a uma pessoa dotada de prudência mediana prever o resultado nas circunstâncias em que ocorreu. f) Tipicidade: apenas se pode considerar qualquer conduta como crime culposo se houver previsão legal expressa. Como já referido anteriormente, o dolo é a regra, a culpa é exceção ERRO NO DIREITO PENAL Erro é a falsa percepção da realidade. No direito penal, o erro divide-se basicamente em erro de tipo (art. 20 e parágrafos do CP) e erro de proibição (ou sobre a ilicitude ou antijuridicidade) (art. 21 do CP). O erro de tipo produz efeitos sobre o dolo e a culpa, de forma que será analisado na sequência; o erro de proibição produz efeitos sobre a categoria da culpabilidade, afastando-a ou reduzindo a pena, de forma que será analisado quando da análise desta categoria do cime ERRO DE TIPO OU ERRO SOBRE ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO TIPO Ocorre quando o agente tem falsa percepção sobre os elementos descritos no tipo penal. Ex.: o caçador de ursos A mata B, que está fantasiado de urso por ocasião de uma festa, pensando se tratar de um animal ERRO DE TIPO ESSENCIAL OU FUNDAMENTAL Recai sobre os elementos (elementares ou circunstâncias) do tipo penal sem os quais o crime não existe. Sempre exclui o dolo. Subdivide-se em: a) Incriminador (art. 20, caput, CP): O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. É quando o agente erra sobre elemento de um tipo incriminador: mata alguém pensando ser um animal. b) Permissivo (art. 20, 1º, CP): É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.. É quando o agente imagina situação fática que estaria abarcada uma causa de exclusão da ilicitude (estado de necessidade, legítima defesa etc.). Por exemplo, alguém que imagina estar sendo assaltado e desfere um soco, mas na verdade se tratava de uma brincadeira de um amigo. Ademais, quanto à intensidade pode ser: 59

60 a) Invencível, inevitável ou escusável: é aquele que qualquer pessoa, na situação em que se encontrava o agente, cometeria. Exclui não só o dolo, mas também culpa. b) Vencível, evitável ou inescusável: é aquele que não teria sido cometido se o agente agisse com mais cautela e prudência. Exclui somente o dolo, respondendo o sujeito pela culpa, se houver previsão de crime culposo para o fato ERRO DE TIPO ACIDENTAL OU CONTINGENTE Recai sobre circunstâncias secundárias, acessórias, do crime (pessoa, objeto, nexo causal, execução do crime, circunstâncias qualificadoras) e por isso não exclui dolo e nem culpa, devendo o agente responder pelo crime. Subdivide-se nas seguintes espécies: a) Erro quanto à pessoa (erro in persona): segundo o art. 20, 3º, do Código Penal, O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Assim, se uma mãe, sob influência do estado puerperal, decide matar o próprio filho logo após o parto, mas, por engano, termina matando a outra criança, responderá, mesmo assim, pelo crime de infanticídio (art. 123, CP), porque é como se tivesse matado o próprio filho. b) Erro sobre o objeto da ação (error in objecto): é quando o agente se engana acerca do objeto material de sua conduta, mas esse erro não é essencial, de forma que não influencia a responsabilização do sujeito. Por exemplo, um ladrão quer furtar um celular do bolso de um casaco, mas por engano pega a carteira. Responderá, de qualquer modo, por furto. Importante: não confundi com o crime impossível, quando o objeto é absolutamente impróprio (art. 17 do CP), como por exemplo quando o ladrão quer furtar um celular alheio, mas subtrai o seu próprio celular. Nesse caso não há crime, porque não há possibilidade de o crime se consumar. c) Erro sobre o nexo causal: o resultado pretendido pelo agente se produz, mas de maneira diferente da planejada. Ex.: A atira em B pretendendo matá-lo. Para se esquivar do tiro, B se atira pela janela e morre em decorrência da queda. Para justificar a responsabilização criminal de A adota-se a teoria da conditio sine qua non (art. 13, CP), pois, se suprimida a sua conduta, a queda não teria ocorrido. d) Erro na execução (aberratio ictus): conforme o art. 73 do CP: Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código. Ou seja, se o agente atingir apenas a pessoa errada, responderá como se tivesse praticado crime contra a pessoa que pretendia atingir (aplica-se a regra do erro sobre a pessoa); se o agente atingir a pessoa que desejava atingir e também outra que não desejava, aplica-se a regra do concurso formal (art. 70 do CP), que será analisado oportunamente e) Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis): conforme o art. 74 do CP: Fora dos casos do artigo anterior [erro na execução], quando, por acidente ou erro na

61 execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código. Exemplo.: A quer destruir o carro do vizinho e arremessa uma pedra, mas esta atinge B e o fere. Caso atinja apenas B, responderá por lesão corporal na modalidade culposa; se atingir B e também o carro, responderá pelo crime de lesão corporal e pelo crime de dano, aplicando-se a regra do concurso formal (art. 70, CP) ERRO DE TIPO ESPONTÂNEO E PROVOCADO a) Espontâneo: quando o agente erra sozinho, independentemente da conduta de qualquer outra pessoa. b) Provocado: quando o erro decorre da provocação de um terceiro, na hipótese do art. 20, 2º, do Código Penal que versa responde pelo crime o terceiro que determina o erro. Se o erro for invencível (escusável, portanto), o agente provocado não responde pelo fato, pois ficam excluídos dolo e culpa, tratando-se de solução dada ao caso de autoria mediata. Se o erro for vencível (inescusável, portanto), responde pelo crime na modalidade culposa, se houver previsão legal. O agente provocador responderá a título de dolo ou culpa, dependendo de sua conduta CONCEITO Ilicitude é a contradição entre a conduta e o ordenamento jurídico, consistindo na prática de uma ação ou omissão que, além de preencher todos os requisitos de tipicidade (formal e material, objetiva e subjetiva), não está permitida pelo ordenamento jurídico ANTIJURIDICIDADE FORMAL, MATERIAL E UNITÁRIA a) Formal: contradição entre o fato e o tipo penal somado à ausência de causas de exclusão da ilicitude. b) Material: é quando o fato causa uma lesão ou um perigo de lesão ao bem jurídico. A conduta não somente está contrária à lei, mas também contraria o sentimento de justiça da sociedade (é injusta). 61

62 c) Unitária: é quando o fato contraria o ordenamento jurídico, causando lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado por uma norma penal. É a superação da dicotomia formal/material, de forma que a ilicitude depende tanto da contrariedade entre o fato e o tipo penal somado à ausência de causas de exclusão da ilicitude como da ofensa ao bem jurídico tutelado ANTIJURIDICIDADE E TIPICIDADE A teoria mais aceita acerca da relação ente tipicidade e ilicitude é a de Max Ernest Mayer, que considera a tipicidade como ratio cognoscendi da ilicitude. O fato típico indicia a ilicitude, cria uma presunção de ilicitude (função indiciária da tipicidade). Se não estiver presente nenhuma causa de exclusão da antijuridicidade, considera-se o fato também ilícito, confirmando-se a presunção. A presunção pode ser quebrada pelas causas de exclusão de ilicitude, de forma que o fato é típico, mas não é ilícito. Tipicidade e ilicitude são, portanto, categorias distintas. A essa teoria opõe-se a teoria da ratio essendi, de Edmund Mezger, que sustenta que a ilicitude pertence à tipicidade, que ambas estão fundidas (teoria dos elementos negativos do tipo) ANTIJURIDICIDADE E CULPABILIDADE A antijuridicidade diz respeito ao fato considerado de forma objetiva, no aspecto de sua contrariedade ao ordenamento jurídico. A culpabilidade, por sua vez, é uma consideração subjetiva do fato, em relação ao sujeito passivo, avaliando se sua conduta subjetiva é reprovável nas circunstâncias em que ocorreu. Portanto, existem causas que excluem a ilicitude do fato objetivamente considerado (art. 23 do CP). Entretanto, o erro do agente sobre tais causas justificantes pode fazer com que, apesar da ilicitude do fato, seja afastada sua culpabilidade (art. 20, 1º, do CP). É o que ocorre na legítima defesa e no estado de necessidade putativos, que serão vistos abaixo CAUSAS LEGAIS E SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA ANTIJURIDICIDADE a) Causas legais: são aquelas previstas expressamente em lei (art. 23 do CP: estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito). b) Causas supralegais: são aquelas não previstas expressamente em lei, mas que derivam de uma compreensão conjunta do ordenamento jurídico ESTADO DE NECESSIDADE DEFINIÇÃO Consiste em uma conduta típica praticada para afastar uma situação de perigo atual a inevitável para bem jurídico do agente. A situação de perigo pode ser, por exemplo, um fenômeno da natureza, um ataque de animal irracional, um ataque humano justificado (se for injusto, será legítima defesa). No estado de necessidade, um bem jurídico é sacrificado para salvar outro 62 62

63 ameaçado por situação de perigo (exemplo: naufrágio em que dois homens lutam por uma boia e um mata o outro). Conforme o art. 24 do CP: Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. 1º. Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. 2º. Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito quando ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços REQUISITOS a) Perigo atual: a lei só fala em perigo atual, mas a doutrina considera que o agente não precisa aguardar o perigo surgir para só então agir. Assim, o perigo deve estar acontecendo naquele momento ou prestes a acontecer. Quando, portanto, o perigo for remoto ou futuro, não há o estado de necessidade. A atualidade que se exige é a do perigo e não do dano. Mas se o dano já se iniciou, com maior razão ainda o agente poderá invocar o estado de necessidade. No entanto, se o dano já se realizou totalmente ou se o perigo já cessou, não mais cabe o estado de necessidade. b) Ameaça a direito próprio ou alheio: necessário o bem sob perigo atual esteja protegido pelo ordenamento jurídico (exemplo: o condenado à morte não pode alegar estado de necessidade contra o carrasco). c) Perigo não causado voluntariamente pelo agente: o perigo não pode ter sido provocado por vontade do agente. Quem dá causa a uma situação de perigo não pode invocar o estado de necessidade para afastá-la. Aquele que provocou o perigo com dolo não age em estado de necessidade porque tem o dever jurídico de impedir o resultado. Mas, se o perigo foi provocado culposamente, o agente pode se valer do estado de necessidade. Observação: há, entretanto, quem defenda que, mesmo se o perigo foi provocado culposamente, o agente não pode se valer do estado de necessidade. d) Inexistência de dever legal de enfrentar o perigo: de acordo com o 1º do art. 24 do CP, não pode invocar o estado de necessidade quem tem dever legar de afastar a situação de perigo (exemplo: bombeiro). Entram aqui, entre outros, aqueles portadores do dever de agir previsto no art. 13, 2, do CP. e) Inevitabilidade do comportamento lesivo: se não havia nas circunstâncias outra forma disponível para enfrentar o perigo. f) Proporcionalidade do sacrifício: trata-se da razoabilidade do sacrifício, deve-se sacrificar um bem de menor importância ou igual valor do que o sacrificado. Se houver desproporcionalidade o fato será ilícito, afasta-se o estado de necessidade, mas o réu terá direito à redução da pena de 1/3 a 2/3 (artigo 24, 2.º, do Código Penal). g) Elemento subjetivo: o agente deve atuar ciente do perigo e com conhecimento e vontade de salvar bem jurídico. Caso aja querendo cometer um crime, não haverá estado de necessidade, embora a situação atenda aos requisitos objetivos (citados acima de a a f), 63

64 ESPÉCIES DE ESTADO DE NECESSIDADE a) Próprio ou de terceiro: é próprio quando há o sacrifício de um bem jurídico para salvar outro que é do próprio agente. É de terceiro quando o sacrifício visa a salvar bem jurídico de terceiro. b) Defensivo ou agressivo: é defensivo quando há o sacrifício de bem jurídico da própria pessoa que criou a situação de perigo. É agressivo quando há o sacrifício de bem jurídico de terceira pessoa inocente. No último caso, cabe indenização pelo dano causado, com a respectiva ação de regresso contra o causador da situação de perigo EXCESSO NO ESTADO DE NECESSIDADE Se presentes todos os requisitos para o estado de necessidade, o agente exagera na intensidade de sua conduta, há excesso no estado de necessidade. Conforme o art. 23, único, do CP, o agente responderá pelo excesso doloso ou culposo de qualquer das causas de justificação. Assim, se o agente se excede consciente e voluntariamente, responderá pela modalidade dolosa do crime que praticar; se o agente se excede por negligência, imprudência ou imperícia, responderá pela modalidade culposa, se prevista, do crime que praticar ESTADO DE NECESSIDADE REAL E PUTATIVO a) Real: quando os requisitos do estado de necessidade de fato existem. b) Putativo: quando o agente imagina que está em situação de estado de necessidade, mas na verdade não está. Afasta a culpabilidade quando plenamente justificado pelas circunstâncias, conforme dispõe o art. 20, 1º, do Código Penal: É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima LEGÍTIMA DEFESA CONCEITO Consiste na possibilidade de reação direta do agredido em defesa de um interesse, tendo em vista a impossibilidade da intervenção tempestiva do Estado. Prevista no art. 25 do CP: Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem BENS PASSÍVEIS DE PROTEÇÃO A princípio, aceita-se que qualquer bem jurídico seja protegido pela legítima defesa (vida, integridade física, patrimônio, honra etc.). É necessário, entretanto, atentar para a proporcionalidade entre o bem jurídico defendido e o sacrificado. Caso clássico é o de legítima defesa da honra, quando o marido, ao flagrar a mulher com o amante, o mata. Nesse caso, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que não cabe legítima defesa em razão da desproporcionalidade entre o bem sacrificado e o protegido

65 REQUISITOS a) Agressão injusta: ataque humano ilícito. No caso de ataque de animal irracional, não há legítima defesa e sim estado de necessidade. Observação: se uma pessoa açula um animal para atacar outra, há legítima defesa, pois nesse caso o animal é instrumento do crime. Também não é necessário que a agressão configure um fato típico, como, por exemplo, no caso de furto insignificante. A doutrina majoritariamente considera a agressão de inimputável como situação de legítima defesa. A maioria da doutrina considera possível a legítima defesa contra conduta culposa, pois o conceito de agressão não é restrito à violência dolosa. Também é majoritário o entendimento que admite a legítima defesa contra ato omissivo. Exemplo: o carcereiro que não põe em liberdade o apenado que já cumpriu a pena. Ademais, a agressão deve ser ilícita, de forma que não se admite legítima defesa contra agressão abarcada por causa de exclusão da ilicitude (estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal etc.), pois nessas hipóteses não há agressão injusta. b) Atual ou iminente: atual é a agressão que está acontecendo e iminente é a que está prestes a acontecer. Não cabe legítima defesa contra agressão passada ou futura, nem quando há promessa de agressão. No caso dos crimes permanentes a agressão é sempre atual. c) Defesa de direito próprio ou de terceiro: há legítima defesa própria quando o sujeito está se defendendo e legítima defesa alheia quando defende terceiro. Pode-se alegar legítima defesa alheia mesmo agredindo o próprio terceiro (exemplo: em caso de suicídio, pode-se agredir o terceiro para o salvá-lo). d) Meio necessário: é o meio menos lesivo colocado à disposição do agente no momento da agressão. A doutrina majoritária anota que não atua sob o pálio da legítima defesa aquele que, ainda que utilize o único meio de defesa disponível, o faz para defender um bem em manifesta desproporcionalidade com a lesão causada pela defesa. Assim, no exemplo do velho paralítico, preso a uma cadeira de rodas, que vê um ladrão entrar no seu quintal e subtrair frutas do pomar, dispondo de apenas uma espingarda para a legítima defesa de seu patrimônio, não poderá utilizá-la, ante à manifesta desproporção de valor entre um punhado de frutas e a vida do agressor. e) Moderação: é o emprego do meio menos lesivo dentro dos limites necessários para conter a agressão. A moderação diz com a intensidade empregada pelo agente no uso dos meios necessários. Somente quando ficar evidente a intenção de agredir e não a de se defender, caracterizar-se-á o excesso EXCESSO NA LEGÍTIMA DEFESA Se presentes todos os requisitos da legítima defesa e o agente exagera na intensidade de sua conduta, configura-se o excesso. Conforme o art. 23, único, do CP, o agente responderá pelo excesso doloso ou culposo de qualquer das causas de justificação. Assim, se o agente se excede consciente e voluntariamente, responderá pela modalidade dolosa do crime que praticar; se o agente se excede por negligência, imprudência ou imperícia, responderá pela modalidade culposa, se prevista, do crime que praticar. Se o excesso, entretanto, derivar do medo e for inevitável nas circunstâncias, haverá o chamado excesso exculpante, restando excluída a culpabilidade. 65

66 ERRO NA EXECUÇÃO (ABERRATIO ICTUS) DA DEFESA Ocorre quando o agente erra na execução de sua defesa, atingindo bem de pessoa que não o está agredindo. Aplica-se o disposto nos art. 73 e 74 do CP. Por exemplo, A está sendo agredido por B, e desfere tiros que acabam acertando C. A terá agido assim mesmo em legítima defesa, uma vez que conforme dispõe o art. 73 do CP, ele responderá pelo fato como se tivesse atingido B LEGÍTIMA DEFESA RECÍPROCA E SUCESSIVA a) Legítima defesa recíproca: é a legítima defesa contra legítima defesa 29. Não é admissível porque não há agressão ilícita. É admissível se a legítima defesa da qual se defende é putativa. b) Legítima defesa sucessiva: é quando defende-se de excesso na legítima defesa. È admitido, uma vez que o excesso torna ilícita a legítima defesa da qual se defende LEGÍTIMA DEFESA REAL E PUTATIVA a) Real: quando os requisitos da legítima defesa de fato existem. b) Putativa: quando o agente imagina que está em situação de legítima defesa, mas na verdade não está. Afasta a culpabilidade quando plenamente justificado pelas circunstâncias, conforme dispõe o art. 20, 1º, do Código Penal: É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima PROVOCAÇÃO E DESAFIO a) Provocação: a admissão da legítima defesa dependerá da intensidade da provocação. Tratando-se de uma mera brincadeira de mau gosto, não caberá a legítima defesa. Se for uma injúria de alguma gravidade, admitirá a legítima defesa, desde que forma moderada. Por exemplo, não se admite uma agressão física àquele que apenas provocou verbalmente. b) Desafio: se alguém aceita desafio para luta ou briga, não age em legítima defesa, respondendo pelos ilícitos praticados CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor E. Rios. Direito Penal Esquematizado. 4. ed. São Paulo: Saraiva, p CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

67 LEGÍTIMA DEFESA X ESTADO DE NECESSIDADE Legítima defesa Estado de necessidade Fundamento Repulsa à agressão injusta a bem jurídico próprio ou de terceiro Conflito entre dois bens jurídicos expostos a perigo Bem jurídico protegido Próprio ou alheio Próprio ou alheio Origem Conduta humana Não é necessário que seja uma conduta humana Pode-se agir contra Somente o agressor Qualquer pessoa (inclusive terceiro inocente) 9.4. ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL É quando o agente comete um ato típico cumprindo seu dever. Tal conduta não é considerada antijurídica. Deve, no entanto, ser um dever legalmente imposto e que deve ser cumprido dentro dos exatos termos impostos pela lei, não podendo em nada ultrapassá-los. Os casos mais típicos desse instituto são aqueles referentes a servidores públicos, como policias e oficiais de justiça, ou referentes a atos de pais que visam educar seus filhos REQUISITOS a) Dever legal: obrigação direta ou indiretamente derivada da lei. b) Conduta dentro dos estritos limites do dever c) Elemento subjetivo: consciência e vontade de agir conforme o dever legal; do contrário, há um ilícito EXCESSO Se houver abuso no cumprimento do dever, o agente reponde pelo excesso culposo ou doloso (art. 23, único, do CP). O cumprimento deve ser estrito, limitado aos termos legais ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL PUTATIVO Admite-se o estrito cumprimento do dever legal putativo, ou seja, o sujeito pensa que está agindo no estrito cumprimento do dever legal, mas não está. Afasta a culpabilidade quando plenamente justificado pelas circunstâncias, conforme dispõe o art. 20, 1º, do Código Penal: É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. 67

68 9.5. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO É a prática de uma conduta típica autorizada pelo ordenamento jurídico, o que o torna lícito. Por exemplo, os atos praticados por pai ou tutor com o fim de correção dos filhos ou pupilos, desde que dentro de limites regulares, não configuram nem maus tratos e nem cárcere privado, uma vez que são exercício do direito de educação dos filhos (art. 384, I, do antigo CC) SITUAÇÕES QUE CONFIGURAM EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO a) Ofendículos: são aparelhos visíveis, utilizados para defender a propriedade e qualquer outro bem jurídico, funcionando como uma advertência para impedir ou dificultar o acesso de eventuais invasores, como as cercas elétricas. b) Violência esportiva: lesões corporais praticadas em práticas esportivas não são ilícitas quando respeitadas as regras do esporte praticado. Caso haja infração às normas esportivas, deve o agente responder pelo excesso (a menos que incida outra excludente de ilicitude). Exemplo é a luta de boxe ou MMA. c) Intervenções médicas e cirúrgicas: conforme disposto no artigo 1461, 3.º, inciso I, do CP, o médico poderá intervir no tratamento de alguém, inclusive com cirurgias, quando não possível o consentimento do paciente ou de seus representantes legais. Se a intervenção for realizada em caso de emergência por alguém que não é médico, será caso de estado de necessidade. d) Utilização de cadáver para fins de exploração científico-didática: apesar de ser considerado bem jurídico penalmente tutelado pelo respeito à memória dos mortos, punindo-se a destruição ou o vilipêndio ao cadáver, nos caso de sua utilização por Faculdades de Medicina, para exploração científico-didática, não configura ilícito penal, conforme previsão na Lei n.º 8.501/92. e) Aborto: quando a gravidez resulta de estupro ou atentado violento ao pudor, o aborto provocado com o consentimento da gestante é autorizado por lei, configurando assim exercício regular de direito EXCESSO EXERCÍCIO DO DIREITO Se houver abuso no exercício de direito, o agente reponde pelo excesso culposo ou doloso (art. 23, único, do CP) CONSENTIMENTO DO OFENDIDO É o consentimento, consciente e voluntário, da vítima com a ofensa de seu bem jurídico

69 EFEITOS NA TIPICIDADE E NA ANTIJURIDICIDADE a) Excludente de tipicidade: quando há previsão expressa no tipo penal. Exemplo: art. 150 do CP: Art Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências. Se o dono da casa consentir com a entrada, não há violação de domicílio. b) Excludente supralegal de ilicitude: quando não houver previsão expressa no tipo penal, atuará excluindo a ilicitude REQUISITOS a) Bem jurídico disponível a quem consente: o bem jurídico deve ser disponível (patrimônio, liberdade, honra etc.) e quem consente deve ser o titular do bem. Não é possível consentir com a ofensa de bem indisponível (a vida, por exemplo). b) Consentimento consciente e voluntário: não pode haver fraude, coação ou outro vício. c) Capacidade jurídica e mental de quem consente: no momento do fato aquele que consente deve estar em condições de compreender o fato e suas consequências. d) Correspondência entre o fato consentido e o cometido: se o fato cometido não for igual àquele com o qual se consentiu, não há consentimento EXCESSO Se o agente extrapolar os limites do fato consentido, responderá pelo excesso culposo ou doloso (art. 23, único, do CP) CONCEITO A culpabilidade é o juízo de reprovação realizado sobre uma pessoa que pratica um fato típico e ilícito. Compõe-se de três elementos: imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa. Na ausência de algum desses elementos, exclui-se a culpabilidade. 69

70 TEORIAS DA CULPABILIDADE a) Teoria psicológica: a culpabilidade é uma ligação psicológica entre o sujeito e o fato, de forma que dolo e culpa são considerados formas de culpabilidade. b) Teoria psicológico-normativa: considera-se que dolo e culpa não são suficientes para caracterizar a culpabilidade, pois é necessário um elemento normativo (valorativo) de censura sobre a conduta. Assim, considera-se a culpabilidade uma soma de dolo/culpa e reprovabilidade da conduta. c) Teoria normativa pura: considera-se que a culpabilidade é apenas a reprovabilidade da conduta do agente, sendo o dolo e a culpa realocados na tipicidade. A justificativa é que a realização do tipo penal já exige uma conduta dolosa ou culposa, de forma que a análise destes elementos não poderia ficar separada do juízo de tipicidade. É a teoria adotada no Brasil, de forma que dolo e culpa são analisados na tipicidade e a culpabilidade diz respeito à reprovabilidade da conduta CULPABILIDADE E APLICAÇÃO DA PENA A culpabilidade é averiguada em dois momentos pelo julgador: a) Análise do crime (conceito analítico): na análise do conceito analítico de crime, verificase se há culpabilidade na conduta do agente (se ele é imputável, se tinha potencial consciência da ilicitude e se lhe era exigível conduta diversa). Caso incida causa de exclusão da culpabilidade, o agente é absolvido. b) Aplicação da pena: se o sujeito é condenado pela prática de um crime, já verificou-se que ele agiu com culpabilidade, mas ainda será necessário averiguar a quantidade (o grau) de culpabilidade. Influencia a dosimetria da pena, constando no art. 59 do Código Penal CAUSAS LEGAIS E SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE As causas legais de exclusão da culpabilidade são: a) A inimputabilidade: regulada nos arts. 26 a 28 do CP b) Erro de proibição: previsto no art. 21 do CP c) Coação irresistível e obediência hierárquica: previsto no art. 22 do CP Discute-se também a admissibilidade de causas extralegais de exclusão da culpabilidade. A doutrina atualmente inclina-se para a aceitação, uma vez que considera-se que o legislador não é capaz de prever todas as hipóteses em que uma conduta, no caso concreto, pode não ser reprovável, devendo-se abrir espaço para o julgador fazer essa análise. O fundamento das causas 70 70

71 supralegais apontadas pela doutrina é a inexigibilidade de conduta diversa, de forma que se poderia excluir a culpabilidade quando a conduta era inevitável. 31 São comumente citadas como causas supralegais de exclusão da culpabilidade: a) cláusula de consciência b) desobediência civil Essas causas legais e supralegais serão abordadas abaixo, relacionando-se-as com o elemento da culpabilidade que excluem especificamente IMPUTABILIDADE O primeiro requisito da culpabilidade é a imputabilidade, que é a capacidade de compreender o caráter criminoso do fato e de se orientar de acordo com esse entendimento. A imputabilidade possui dois elementos: intelectivo (capacidade de entender) e volitivo (capacidade de querer). Faltando um desses elementos, o agente não será imputável REQUISITOS DA INIMPUTABILIDADE a) Causal: a inimputabilidade deve ser causada por doença mental, desenvolvimento mental incompleto, desenvolvimento mental retardado, dependência química ou embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior. Somente essas causas podem tirar a capacidade de entender ou de querer do agente. b) Cronológico: as causas que levam à inimputabilidade devem existir ao tempo da infração penal. c) Consequencial: perda completa da capacidade de entender ou da capacidade de querer praticar o delito SISTEMAS DE INIMPUTABILIDADE a) Sistema biológico: exige apenas o requisito causal para que o agente seja declarado inimputável, não sendo necessário que perca efetivamente a capacidade de entender e querer, em consequência dessa causa. É adotado no sistema jurídico brasileiro como exceção nos casos de menores de 18 anos (artigo 27 do Código Penal). b) Sistema psicológico: verifica se no momento do crime a pessoa tinha ou não capacidade de entender o que estava fazendo, não se ocupando com a existência das causas de inimputabilidade. Não foi adotado pelo sistema jurídico brasileiro. 31 SANCHES CUNHA, Rogério. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). 3 ed. São Paulo: Jus Podvim, p

72 c) Sistema biopsicológico: exige a presença de três requisitos para apuração da inimputabilidade causal, cronológico e consequencial. Foi o sistema adotado pelo Código Penal no artigo CAUSAS QUE EXCLUEM A IMPUTABILIDADE a) Menoridade: os menores de dezoito anos (CP, art. 271) ficam sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial (ECA). Adotou-se, neste caso, o critério biológico, que presume, de forma absoluta, ser o menor de 18 anos inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de se determinar. b) Doença mental: é a perturbação mental de qualquer ordem (exemplos: psicose alcoólica, esquizofrenia, paranoia, epilepsia etc.). A dependência patológica de substância psicotrópica1 configura doença mental. c) Desenvolvimento mental incompleto: é o desenvolvimento que ainda não se concluiu. É o caso do silvícola inadaptado à sociedade. d) Desenvolvimento mental retardado: é o caso dos oligofrênicos (fronteiriços), que se classificam em débeis mentais, imbecis e idiotas, dotados de reduzidíssima capacidade mental, e dos surdos-mudos que, em consequência da anomalia, não têm qualquer capacidade de entendimento e de autodeterminação CAUSAS QUE NÃO EXCLUEM A IMPUTABILIDADE a) Embriaguez: intoxicação aguda e transitória provocada pelo álcool ou substância de efeitos análogos, cujas consequências variam desde uma ligeira excitação até o estado de paralisia e coma. A embriaguez pode ser de dois tipos: a.1.) Não-acidental (art. 28, II, CP): decorre da própria conduta (dolosa ou culposa) do agente e pode ser completa (perda total da capacidade de entendimento e autodeterminação) ou incompleta (perda parcial da capacidade de entendimento e autodeterminação). A embriaguez não-acidental não exclui a imputabilidade. Actio libera in causa (ação livre na origem): como a agente tinha plena liberdade para decidir sobre a ingestão ou não da substância, se em razão de sua ação perdeu a capacidade de avaliação, responderá pelas consequências. Considera-se, assim, o momento da ingestão da substância e não o momento da conduta culpável. a.2.) Acidental: é a que deriva de caso fortuito ou força maior (sem dolo ou culpa, portanto). Pode ser completa ou incompleta. Não se aplica a teoria actio libera in causa porque o agente não tinha a intenção de ingerir a substância. A embriaguez acidental completa exclui a imputabilidade (isenta de pena), art. 28, 1º, e a incompleta reduz a pena de 1/3 a 2/3 (art. 28, 2º)

73 a.3.) Preordenada: o agente se embriaga para cometer o crime. A embriaguez preordenada, além de não excluir a imputabilidade, é considerada agravante genérica (artigo 61, inciso II, alínea l, do Código Penal). a.4.) Patológica (art. 26 do CP): é a embriaguez do alcoólatra, do dependente de substância química. O agente, para fins penais, é equiparado ao doente mental (exclui a imputabilidade). desde que comprovado, concretamente, o efeito sobre a sua capacidade de entendimento ou determinação em relação ao crime em julgamento (STF, HC 85721/RJ, Joaquim Barbosa, 2ª. T., u., ) CAUSAS DE SEMI-IMPUTABILIDADE OU RESPONSABILIDADE DIMINUÍDA Conforme o art. 26, único, do CP: A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento Difere da inimputabilidade apenas no requisito consequencial. Enquanto na inimputabilidade a perda da capacidade de entender ou querer é total, na semi-imputabilidade, é parcial, de forma que o agente é imputável, mas para alcançar o grau de conhecimento e de autodeterminação lhe é necessário maior esforço. Se sucumbe ao estímulo criminal deve ter-se em conta que sua menor capacidade de resistência diante dos impulsos passionais e disso decorre uma diminuição da reprovabilidade e, portanto, do grau de culpabilidade. A semi-imputabilidade não exclui a culpabilidade, mas permite a redução da pena (redução de 1/3 a 2/3) POTENCIAL CONHECIMENTO DA ILICITUDE Consciência da ilicitude é o conhecimento profano do injusto, não sendo necessário saber que configura crime. Basta ter a consciência de que se faz algo possivelmente contrário à justiça ou ética social. Não se exige a consciência da ilicitude não como requisito da culpabilidade, o que se investiga é se o agente tinha ou não condições de saber o que era errado e possibilidade de evitar o erro. Assim, o que constitui requisito da culpabilidade é a potencial consciência da ilicitude. Deve-se sair do aspecto subjetivo e perscrutar aspectos objetivos do caso concreto para averiguar se o agente possuía condições de saber e evitar o erro ERRO DE PROIBIÇÃO É o completo desconhecimento de que o fato praticado é contrário à justiça ou ética social; é a crença de que o fato é permitido. Portanto, não se trata do mero desconhecimento da lei: o desconhecimento da lei é inescusável (artigo 21, primeira parte, do Código Penal). Ademais, a ninguém é dado descumprir a lei alegando que a desconhece (artigo 3.º da LINDB). É preciso, repete-se, um desconhecimento acerca da ilicitude do fato: O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço (artigo 21, segunda parte, do Código Penal) 73

74 Podem ser de dois tipos: a) Inevitável: exclui a culpabilidade. b) Evitável: reduz a pena de 1/6 a 1/ ERRO DE PROIBIÇÃO DIRETO, INDIRETO E MANDAMENTAL a) erro de proibição direto: trata-se do erro sobre o conteúdo da uma norma penal incriminadora. A agente acredita que sua conduta não configura crime. b) erro de proibição indireto ou erro de permissão: trata-se da suposição errônea de uma causa de justificação, se o autor erra sobre a existência ou os limites da proposição permissiva. c) erro mandamental: trata-se daquele erro sobre o mandamento contido nos crimes omissivos, sejam eles próprios ou impróprios. É o erro sobre a norma que manda o agente fazer algo (norma mandamental) ERRO DE TIPO X ERRO DE PROIBIÇÃO É comum a confusão entre erro de tipo e erro de proibição. a) Erro de tipo é um erro de representação sobre os elementos fáticos que constituem elementares de um tipo penal incriminador (erro de tipo incriminador) ou imaginação de uma situação fática que constitui elementar de uma causa de exclusão da ilicitude (erro de tipo permissivo). Portanto, o agente faz algo diferente do que acreditava estar fazendo, o que exclui o dolo e/ou culpa. (Veja-se explicação em tópico acima.) b) Erro de proibição é um erro sobre a ilicitude do fato. Ou seja, o sujeito sabe exatamente o que está fazendo, não há deficiência na representação da situação fática, mas ele acredita que este fato é permitido. Exclui a culpabilidade ou reduz a pena, conforme seja inevitável ou evitável. c) Erro de tipo permissivo x erro de permissão: o erro de tipo permissivo é quando o agente erra sobre elementar de uma norma permissiva (causa de justificação). Por exemplo, acredita que existe perigo atual e iminente apto a justifica estado de necessidade. Erro de permissão é quando o agente imagina que há uma causa de justificação que se aplica ao caso ou erra sobre os limites de sua aplicação. Por exemplo, acredita que o direito de legítima defesa justifica amarrar o ladrão e mantê-lo em cárcere privado por um dia, como castigo. d) Descriminantes putativas (art. 20, 1º, do CP): os casos analisados de descriminantes putativas (legítima defesa putativa, estado de necessidade putativo etc.) são hipóteses de erro de tipo permissivo

75 10.4. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA É a expectativa social de que o agente tenha outro comportamento e não aquele que se efetivou. A exigibilidade de conduta diversa, como causa de exclusão da culpabilidade, funda-se no princípio de que só podem ser punidas as condutas que poderiam ser evitadas. No caso, a inevitabilidade não tem a força de excluir a vontade, que subsiste como força propulsora da conduta, mas certamente a vicia, de modo a tornar incabível qualquer censura ao agente. São causas que excluem a exigibilidade de conduta diversa a coação irresistível e obediência hierárquica, conforme art. 22 do CP: Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem. Importante, a inexigibilidade de conduta diversa também é comumente considerada uma causa genérica de exclusão da culpabilidade, isto é, mesmo em hipóteses não previstas expressamente em lei (coação moral irresistível e obediência de ordem superior), pode-se afastar a culpabilidade se ficar demonstrado que, nas circunstâncias concretas do fato, a conduta do agente era inevitável. Entretanto, há divergência a respeito do tema, de forma que parte da doutrina sustenta que apenas pode ser afastada a culpabilidade nas hipóteses de inexigibilidade previstas expressamente em lei COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL (VIS COMPULSIVA) A coação moral irresistível é a grave ameaça contra a qual o homem médio não consegue resistir. A coação moral irresistível não exclui o crime, pois resta um resquício de vontade, mas exclui a culpabilidade. Ocorre o que a doutrina chama de inexigibilidade de conduta diversa. A coação moral pode ser resistível. No caso da coação moral resistível, a pessoa atua sob influência de ameaça contra a qual podia resistir. Essa forma de coação não elimina o fato típico, a ilicitude, nem a culpabilidade. Trata-se de uma circunstância atenuante (artigo 65, inciso III, alínea c, primeira parte, do Código Penal). Importante: diferencia-se da coação física (vis absoluta) na qual o agente coagido não realiza uma verdadeira ação ou omissão, apresentando-se como simples instrumento de violência, pelo que só se considera autor do crime o agente da coação. Nesse caso, como visto, exclui-se a conduta, não havendo tipicidade OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA A obediência hierárquica que a lei refere é aquela decorrente de relações de direito público, ou seja, de um funcionário público a uma ordem proferida por outro funcionário que, na hierarquia administrativa, lhe é superior. Quando a ordem é ilegal, podem ocorrer duas situações: a) ordem manifestamente ilegal: ambos responderão pelo crime. b) ordem não manifestamente ilegal: exclui a culpabilidade do subordinado, respondendo pelo crime apenas o superior hierárquico (art. 22 do CP). No caso da ordem ser determinada por lei, não existe crime, por estar o agente no estrito cumprimento de dever legal (como já visto anteriormente). Ademais, a exclusão da culpabilidade só existe quando o subordinado observa estrita obediência à ordem emanada do superior, ou seja, 75

76 caso a ordem fosse, originalmente, legal e o subordinado se excede, vindo a cometer um crime, apenas ele pratica o delito EMOÇÃO E PAIXÃO A emoção é um sentimento súbito, repentino, passageiro e intenso. A paixão é duradoura, perene. Nem a emoção nem a paixão excluem a imputabilidade (art. 28, I) Somente a emoção pode funcionar como redutor de pena. A emoção pode ser causa de diminuição de pena em alguns crimes, dependendo das circunstâncias (artigos 121, 1.º, e 129, 4.º, do Código Penal), ou pode constituir atenuante genérica (artigo 65, inciso III, alínea c, do Código Penal) CAUSAS SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE: CLÁUSULA DE CONSCIÊNCIA E DESOBEDIÊNCIA CIVIL O fundamento de ambas estaria na inexigibilidade de conduta diversa. a) Cláusula de consciência: exclui a culpabilidade daquele que, por motivo de consciência, pratica fato previsto como crime, desde com isso não viole direitos fundamentais individuais. O fundamento estaria no art. 5º, VI, é inviolável a liberdade de consciência e de crença. Exemplo é o pai, cuja religião é Testemunhas de Jeová, e que em razão de sua crença não permite a transfusão de sangue do filho. 32 Caso o filho sobreviva, não haverá crime algum do pai. Mas se o filho morrer, debate-se se responderia por homicídio em razão de o bem jurídico vida ter maior valor (a doutrina entende majoritariamente que o pai responde por homicídio nesse caso.) b) Desobediência civil: é o ato de insubordinação que têm por finalidade transformar a ordem estabelecida, demonstrando a sua injustiça e necessidade de mudança. Exige-se para o reconhecimento desta dirimente: (A) que a desobediência esteja fundada na proteção de direitos fundamentais; (B) que o dano causado não seja relevante. Exemplo: ocupações de prédios públicos; invasões do MST CONCEITOS Conforme definição legal no art. 14 do Código Penal, o crime é: 32 SANCHES CUNHA, Rogério. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). 3 ed. São Paulo: Jus Podvim, p SANCHES CUNHA, Rogério. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). 3 ed. São Paulo: Jus Podvim, p

77 a) Consumado (inc. I): quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal. É quando a conduta realizou todas as elementares do tipo penal. Acerca do momento da consumação, observar acima a classificação dos crimes em materiais, formais e de mera conduta. O primeiro depende do resultado para que haja consumação, os demais consumam-se com a realização da conduta. b) Tentado: quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. É quando falta à conduta algum elemento do tipo penal, há uma realização incompleta do tipo penal ITER CRIMINIS O iter criminis é o caminho do crime, isto é, as etapas ou fazes sequencias pelas quais o crime passa. a) Cogitação: é fase interna, o pensar sobre o crime ou planejá-lo apenas na mente, sem agir de qualquer forma para iniciar a preparação. Não é punida, mesmo se externada a terceiros. b) Preparação ou atos preparatórios: é quando passa do pensar ao agir externo, mas ainda sem iniciar a realização do tipo penal. É, por exemplo, quando alguém compra a arma com a qual quer cometer um homicídio. Em geral não é punida, mas existem hipótese nas quais o legislador converte em crime um ato preparatório. Exemplo é o art. 291 do Código Penal: Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. c) Execução ou atos de execução: segundo a teoria mais aceita no Brasil (teoria objetivoformal), é quando o autor inicia a realização do verbo núcleo do tipo ( matar, subtrair etc.). Conforme a teoria material, é quando a conduta passa a colocar em risco o bem jurídico tutelado pela norma penal. É punível como tentativa. d) Consumação: é quando a conduta realizou todos os elementos constitutivos do tipo penal. Importante: nos crimes materiais, a consumação ocorre apenas no momento resultado naturalístico; nos crimes formais e de mera conduta, a consumação se dá quando realizada a conduta. e) Exaurimento: é o resultado que ocorre posteriormente à consumação (nos crimes formais e de mera conduta). Não é punível NATUREZA E TIPICIDADE DA TENTATIVA A punição da tentativa ocorre por adequação típica mediata (quando uma norma estende o conteúdo dos tipos penais incriminadores), de acordo com a norma de extensão temporal 34 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

78 prevista no art. 14, II, do CP e do único, segundo o qual: Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços. Importante: o art. 4º da Lei das Contravenções dispõe que não é punível a tentativa de contravenção. Ademais, não se admite a tentativa em crimes: culposos, preterdolosos, unissubsistentes, omissivos próprios. Nos crimes omissivos impróprios, como consuma-se com o resultado, admite-se a tentativa, cuja execução inicia com a omissão da conduta ELEMENTOS Constituem elementos da tentativa 35 : a) o início da execução b) a não consumação c) interferência de circunstâncias alheias à vontade do agente FORMAS a) Perfeita ou acabada: o agente realiza todos os atos de execução, mas o crime não se consuma por circunstância alheia à sua vontade. Exemplo: alguém dispara três tiros em outra pessoa, que é socorrida por terceiros e sobrevive. b) Imperfeita: o agente não consegue realizar a totalidade dos atos de execução por circunstância alheia à sua vontade. Exemplo: o agente aperta o gatilho da arma, mas ela falha em disparar. c) Branca ou incruenta: é quando a vítima não é afetada pela tentativa (perfeita ou imperfeita). d) Cruenta: quando a vítima é afetada pela tentativa (perfeita ou imperfeita) DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ Art. 15 do CP: O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados. A desistência voluntária e o arrependimento eficaz são chamados por alguns autores de tentativa abandonada ou qualificada. a) Desistência voluntária: o sujeito desiste ou abandona voluntariamente a conclusão do delito, quando poderia terminá-lo. Para que ocorra a desistência voluntária, é necessária a interrupção definitiva da execução do crime (requisito objetivo) e a voluntariedade da desistência (requisito subjetivo). Não se aplica se a execução do crime já foi concluída, ainda que ainda não tenha sido produzido o resultado. b) Arrependimento eficaz: o crime já foi executado, mas o sujeito age para evitar seus efeitos. Neste caso, o delito é cometido pelo agente, que procura impedir o resultado. Os requisitos para a verificação de arrependimento eficaz são dois: impedimento eficaz do resultado (objetivo) e voluntariedade no arrependimento (subjetivo). 35 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

79 Em ambos os casos, a isenção total de pena só ocorrerá quando o delito não tiver produzido resultado. Caso contrário, responderá pelos atos praticados ARREPENDIMENTO POSTERIOR O arrependimento posterior é causa de diminuição de pena prevista no direito penal brasileiro, no art. 16 do Código Penal. Para que ocorra a diminuição da pena, que pode variar de um a dois terços, devem estar presentes os dois requisitos abaixo: a) o crime não pode ter sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; b) o agente deve reparar o dano suportado pela vítima ou restituir a coisa por ato voluntário, antes do recebimento da denúncia ou da queixa. Quando a reparação do dano ou restituição do bem à vítima ocorrer após o recebimento da denúncia ou queixa, não se aplica esta causa de diminuição de pena, incidindo a atenuante do art. 65, III, b, do Código Penal CRIME IMPOSSÍVEL, PUTATIVO E PROVOCADO a) Crime impossível ou tentativa inidônea ou impossível: previsto no art. 17 do CP: Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. b) Crime putativo ou imaginário: o agente considera erroneamente que sua conduta constitui crime. Trata-se, na verdade, de fato atípico. São espécies de delito putativo: b.1) delito putativo por erro de proibição: quando o agente supõe violar uma norma penal que não existe; b.2) delito putativo por erro de tipo: o agente crê que está violando uma norma penal, mas na sua conduta faltam elementares de tipo. c) Crime provocado ou crime putativo por obra de agente provocador: é quando há flagrante preparado. Quando alguém, de forma capciosa, suscita o agente à prática de um crime, ao mesmo tempo que toma providências para que o mesmo não se consuma CONCEITO Concurso de pessoas é a cooperação desenvolvida por vários agentes para o cometimento de uma infração penal. 79

80 CONCURSO NECESSÁRIO E EVENTUAL a) concurso necessário: nas hipóteses de crimes plurissubjetivos, os quais exigem a presença de duas ou mais pessoas para sua configuração. Exemplos: quadrilha ou bando, rixa, bigamia, associação criminosa etc. b) concurso eventual: nos delitos unissubjetivos ou monossubjetivos, os quais são passíveis de execução por um só agente. Exemplos: homicídio, roubo etc TEORIAS SOBRE DO CONCURSO DE PESSOAS a) Teoria pluralista: a cada participante corresponde uma conduta própria. A pluralidade de agentes implica, portanto, a pluralidade de crimes. b) Teoria dualista: consagra dois planos de condutas, um principal, de quem executa a ação típica (a dos autores e coautores), e um secundário ou acessório, de quem instiga ou auxilia (partícipes). c) Teoria monista ou unitária: existe um crime único para autores e partícipes, ou seja, todos aqueles que tomam parte na infração penal cometem idêntico delito. Há unidade jurídica à custa da convergência objetiva e subjetiva das ações dos agentes TEORIA ADOTADA PELO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO O Código Penal brasileiro consagra no art. 29 do CP a teoria monista, ou seja, todos que concorrem para o fato cometem o mesmo crime: Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. Entretanto, os parágrafos do art. 29 determinam aplicação diferenciada das penas aos concorrentes do crime: 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. Importante: existem exceções na Parte Especial do Código Penal à teoria monista, quando se adota a teoria pluralista, prevendo-se crimes distintos para pessoas distintas que concorrem para um mesmo fato. Exemplo: corrupção ativa (art. 333 do CP) e corrupção passiva (art. 317 do CP); consentimento da gestante no aborto (art. 124 do CP) e a prática do aborto por terceiro (art. 126 do CP) REQUISITOS São requisitos do concurso de pessoas 36 : 36 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p. 471; MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

81 a) Pluralidade de agentes e de condutas: necessária é a concorrência de duas ou mais pessoas à prática do crime para constituir concurso de pessoas. b) Relevância causal de cada conduta: as condutas individualmente analisadas devem ter, cada uma, relevância para o cometimento da infração penal. c) Liame subjetivo entre os agentes: necessário também que haja ciência do partícipe de estar colaborando para o resultado criminoso visado pelo outro. É, no entanto, desnecessário o prévio ajuste entre as partes, bastando à unidade de desígnios. d)identidade de infração penal: devem todos os agentes, unidos pelo liame subjetivo, responder pelo mesmo crime (excetuando-se as citadas exceções da Parte Especial) DIFERENÇA ENTRE AUTORIA E PARTICIPAÇÃO Há diversas teoria acerca da distinção entre a autoria e a participação. Acerca delas não há consenso na doutrina. As principais são: a) Teoria objetiva ou restritiva: autor é aquele que realiza a conduta principal do crime, todos os demais que colaboram são partícipes. Restringe o conceito de autor. Subdivide-se em: a.1) Teoria objetivo formal: é autor aquele cujo comportamento se amolda à lei, realizando o verbo nuclear do tipo, e é partícipe aquele que produz qualquer outra contribuição. a.2) Teoria objetivo material: é autor aquele que dá a contribuição de maior importância para o crime, partícipes são aqueles que dão colaboração de menor importância. b) Teoria extensiva ou subjetiva: não há qualquer distinção objetiva entre autoria e participação, a diferença está no elemento subjetivo: é autor aquele que age com vontade de autor, pretendendo o resultado como próprio, e é partícipe aquele que atua com vontade de partícipe, pretendendo o resultado como de outrem. c) Teoria do domínio do fato ou objetivo-subjetiva (Welzel): tem a pretensão de sintetizar os aspectos objetivos e subjetivos, de forma que o autor não é apenas aquele que executa o verbo do tipo, mas igualmente aquele que possui o domínio final da ação, determinando o seu modo de consumação, execução e interrupção. O âmbito de aplicação dessa teoria restringe-se aos delitos dolosos. A doutrina diverge acerca da adoção, pelo Código Penal brasileiro, do conceito restritivo de autor ou da teoria do domínio do fato, mas a mais aceita parece ser a teoria restritiva 37. É consenso que a teoria extensiva não foi adotada. 37 Seguem a teoria restritiva: MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p. 217; CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte 81

82 FORMAS DE AUTORIA COAUTORIA É quando há realização conjunta, por duas ou mais pessoas, de uma infração penal, diz-se que há coautoria: ambos são autores. A concepção restritiva exige que os agentes pratiquem executem o verbo do tipo; a teoria do domínio do fato requer que ambos tenham o domínio sobre a conduta. Não é preciso que haja acordo prévio, bastando que haja no momento do fato consciência, a qual constitui o liame psicológico que une a ação de todos. Também pode haver divisão de tarefas, de forma que não é preciso que ambos realizem as mesmas ações (exemplo: no roubo, um dos autores render a vítima com uma arma e o outro subtrair o bem) AUTORIA IMEDIATA Para a teoria restritiva, é autor imediato aquele que pratica a conduta descrita no verbo tipo penal, é o seu executor; para a teoria do domínio do fato, é aquele que tem o domínio direto sobre a realização do tipo penal AUTORIA MEDIATA Autor mediato é aquele que realiza a conduta típica por meio de outrem, que é mero instrumento (não tem discernimento ou age em erro). As hipóteses mais comuns decorrem do erro, da coação irresistível e do uso de inimputáveis para a realização do crime. Exemplo: o médico que utiliza a enfermeira para ministrar substância letal em alguém; a enfermeira é autora imediata, mas se atuar sob erro invencível não responde pelo delito. Importante: o autor mediato deve reunir todos os elementos que o tipo exige com relação ao autor, de forma que não é possível a ocorrência de autoria mediata em crimes de mão própria, que exige execução pessoalmente pelo agente; mas é admita a participação. Não há concurso de pessoas entre autor mediato e imediato, autor é apenas o primeiro AUTORIA COLATERAL Quando duas ou mais pessoas, ignorando uma a contribuição da outra, realizam condutas convergentes à execução de uma infração. Não há, portanto, vínculo psicológico entre os agentes. Exemplo: dois sujeitos, sem saber um do outro, desferem tiros ao mesmo tempo na vítima e provocam sua morte. Importante: como não há vínculo subjetivo, cada um responde pelo crime que cometeu: a) se um foi o causador do homicídio e o outro não, pune-se o primeiro pela forma consumada e o segundo pela forma tentada. b) se a morte é resultado da soma dos ferimentos dos dois, punem-se os dois pela forma consumada. geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p. 365; NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p Adota a teoria do domínio do fato: GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p

83 c) se a pessoa já estava morta em decorrência dos disparos de um, o outro não é punido, uma vez que há crime impossível. d) se apenas um tiro acertou a vítima e não é possível determinar qual dos agentes o desferiu, há autoria incerta, sendo os dois punidos por tentativa FORMAS DE PARTICIPAÇÃO Participação é a colaboração em um fato alheio e pressupõe, por isso, um autor principal. O partícipe não pratica a conduta descrita no tipo penal, mas realiza uma atividade secundária que contribui, estimula ou favorece a execução da conduta INSTIGAÇÃO, INDUZIMENTO E AUXÍLIO São as três principais espécies de participação. As primeiras são participações morais; a última é participação material. a) Induzimento: o partícipe age sobre a vontade do autor, sugerindo o cometimento de um crime. b) Instigação: o partícipe age sobre a vontade do autor, reforçando uma ideia que este já tinha de cometer um delito. c) Auxílio: o partícipe exterioriza a sua contribuição através de uma conduta que colabora na execução do crime PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA Dispõe o art. 29, 1, do Código Penal que se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço.. Refere-se o dispositivo exclusivamente ao partícipe, e não ao coautor, ainda que a contribuição deste tenha sido pequena. Com relação à diminuição de pena prevista, divergem a doutrina e jurisprudência em considerá-la facultativa ou obrigatória. O certo é que quanto maior a contribuição, tanto menor será a redução PARTICIPAÇÃO EM CRIME MENOS GRAVE OU DOLOSAMENTE DISTINTA Dispõe o art. 29, 2, do Código Penal que se um dos concorrentes quis participar de delito menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste, a qual será aumentada até a metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. O dispositivo trata do erro na participação, que ocorre quando a ação executada difere daquela idealizada a que aderira o partícipe. Exemplo: quatro pessoas, sendo que uma delas fica aguardando no carro, pretendem, ao ingressarem em uma residência, praticar um furto. No interior da casa, deparam-se com uma inesperada moradora. Os três, que estavam no interior da residência acabam estuprando, matando e roubando objetos do local. Os três que ingressaram na casa responderão por estupro e latrocínio; já o motorista do 83

84 veículo responderá por furto. Tal dispositivo, no entanto, não se aplica aos crimes preterdolosos, pois, nestes casos, o partícipe, embora não queira o crime mais grave, anui com os meios utilizados, sendo punido, desta forma, pelo crime mais grave PARTICIPAÇÃO POR AUXÍLIO X FAVORECIMENTO REAL A diferença entre a participação por auxílio e o crime de favorecimento real (art. 349 do CP) reside no momento da prestação do auxílio material. Neste, o auxílio é prestado depois da conduta delituosa; naquela, antes ASPECTOS IMPORTANTES DO CONCURSO DE PESSOAS CONCURSO DE PESSOAS EM CRIME CULPOSO Nos crimes culposos, a doutrina aceita a coautoria, entendendo que os agentes cooperam na causa, na falta de dever de cuidado. Exemplo: duas pessoas jogam uma mesa pela janela e, assim, lesionam uma terceira pessoa. Não se admite, contudo, a participação. Importante: não se confunde com a concorrência de culpas, quando dois sujeitos atuam culposamente, mas não colaboram um com o outro. Exemplo: colisão de veículos entre duas pessoas que desrespeitam as regras de trânsito. No caso, os dois são punidos pela modalidade culposa CONCURSO DE PESSOAS EM CRIME OMISSIVO a) Coautoria em omissão própria: a posição majoritária é de que não se admite coautoria nos crimes omissivos próprios. Basta que uma pessoa se omita em parte para que já esteja consumado o crime. Exemplo: dois sujeitos, de comum acordo, deixam de prestar socorro à pessoa gravemente ferida. Ambos são isoladamente autores e respondem pela omissão de socorro. b) Coautoria em omissão imprópria: é tranquila a posição que aceita a coautoria e a participação, ambos os agentes têm dever agir. Exemplo: os pais, em acordo, deixam de alimentar a criança, causando sua morte. c) Participação: admite-se a participação tanto na omissão própria como na imprópria. Exemplo de omissão própria: paciente instiga médico a não comunicar a existência de uma enfermidade contagiosa à autoridade sanitária. Exemplo de omissão imprópria: sujeito instiga salva-vidas a não prestar socorro a pessoas que se afogam CIRCUNSTÂNCIAS COMUNICÁVEIS O art. 30 do Código Penal dispõe que Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Assim, a confissão feita (circunstância) e a menoridade (condição) não se transmitem como atenuantes aos coautores. As regras são as seguintes:

85 a) As circunstancias de caráter pessoal jamais se comunicam no concurso de pessoas. Ex: menoridade, motivo torpe. b) As circunstancias objetivas e as elementares do tipo podem se comunicar no concurso de pessoas, desde que ingresse na esfera de conhecimento do coautor ou partícipe. Ex: coautoria em crime que exige cometimento por funcionário público PARTICIPAÇÃO IMPUNÍVEL a) Conivência: quando alguém que não tem dever de agir se omite em relação ao fato. Ex: um pedestre que observa um furto na rua a nada faz. b) Tentativa de participação: conforme o art. 31 do Código Penal: O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado. c) Participação inócua: a ação do partícipe em nada colabora com a execução do crime. Exemplo: o partícipe fornece uma arma para outrem, mas este mata a vítima com uma arma CONCEITO O jus puniendi é o poder exclusivo e indelegável do Estado de cominar a pena, aplicá-la e executá-la. Somente com a prática de um crime que esse direito concretiza-se, tornando-se uma pretensão: o Estado passa a ter interesse em submeter o agente ao seu direito de punir. A punibilidade é a possibilidade de punir o agente que comete o crime. Ela não é elemento do delito (embora haja doutrina minoritária que afirme o contrário), mas se configura em razão dele e é, em síntese, condição indispensável para a imposição da pena CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE A extinção da punibilidade é o desaparecimento da pretensão punitiva ou executória do Estado em razão de causas previstas em lei. Nessas hipóteses, embora já praticado o delito (fato típico, ilícito e culpável), resta inviabilizada a aplicação ou a execução da sanção penal. Não há, portanto, a extinção do crime, mas extinção da possibilidade de do Estado exercer o poder de punir. Por isso, embora obstada a imposição da pena, podem permanecer os demais efeitos civis e criminais da condenação. 85

86 O art. 107 do Código Penal enumera algumas dessas causas; outras delas são encontradas esparsas na legislação penal, como, por exemplo, o ressarcimento do dano no peculato culposo (art. 312, 3, do CP) e a homologação da composição de danos civis nos crimes de menor potencial ofensivo (art. 74, par. único, da Lei 9.099/95) MORTE DO AGENTE A morte do agente, comprovada por certidão de óbito, é causa pessoal de extinção da punibilidade, porque o art. 5, XLV, da Constituição Federal consagra o princípio da pessoalidade da pena: nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. O princípio aplica-se apenas às sanções criminais, sejam elas pecuniárias ou não, não tendo aplicabilidade às consequências civis de um delito. Pena de multa: A pena de multa, ainda que considerada dívida de valor, deve ser extinta com a morte do agente, não se transmitindo aos herdeiros a obrigação de quitá-la. Certidão de óbito falsa: mesmo que a extinção da punibilidade do agente tenha sido declarada com base em certidão de óbito falsa, a maioria da doutrina entende ser impossível a revisão criminal, por ser vedada a revisão pro societate. Não se pode, portanto, reabrir o processo contra o acusado, sendo o caso de, no máximo, puni-lo pela falsidade ANISTIA, GRAÇA E INDULTO a) Anistia: é o esquecimento jurídico do ilícito e tem por objeto fatos (e não pessoas) definidos como crimes, de regra, políticos, militares ou eleitorais. Não há, contudo, qualquer óbice à sua concessão para os delitos comuns. Ela pode ocorrer antes da condenação definitiva ou depois do trânsito em julgado, sendo denominada, respectivamente, de anistia própria ou imprópria. Pode, ainda, ser condicionada ou incondicionada, ou seja, pode estabelecer ou não condições a serem aceitas pelos beneficiários. Por fim, pode ser geral ou parcial. A primeira beneficia todos os que praticaram determinado crime, enquanto que a segunda, somente alguns. A anistia só é concedida por meio de lei do Congresso Nacional e possui efeito ex tunc (apaga o crime e todos os efeitos da sentença), embora não atinja os efeitos civis. Não pode ser revogada, uma vez que se trataria de hipótese de lei posterior com tratamento prejudicial aos réus. b) Graça: também denominada de indulto individual, tem por objeto crimes comuns e dirige-se a um sujeito determinado, condenado irrecorrivelmente. Trata-se de um perdão concedido de forma discricionária pelo Presidente da República, o qual pode ser parcial ou total, conforme alcance a totalidade ou apenas alguns aspectos da condenação do agente c) Indulto coletivo: é a clemência destinada a um grupo indeterminado de condenados, tendo em vista a natureza do delito e a quantidade de pena aplicada, podendo exigir requisitos objetivos e subjetivos. Alguns doutrinadores chamam de indulto parcial a comutação da pena, a qual não extingue a punibilidade, mas tão-somente diminui a sanção a cumprir. Assim como a graça, a competência para a concessão de indulto coletivo é do chefe do Poder Executivo, conforme previsão do art. 84, XII, da Constituição Federal. É de praxe que ao final de todos os anos, publique-se um decreto de indulto, chamado de indulto natalino.

87 Delitos insuscetíveis de graça e anistia: conforme o art. 5º, XLIII, da CF, a lei considerará inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou de anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes hediondos. O art. 2º, I, da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), todavia, estendeu a vedação em relação a esses crimes também quanto ao indulto ABOLITIO CRIMINIS Abolitio criminis é o fenômeno pelo qual uma lei nova deixa de considerar crime um determinado fato. Como já visto, lei posterior mais benéfica retroage, abrangendo os processos em qualquer fase que estejam. Assim, nenhum efeito penal subsiste, mas apenas as consequências civis DECADÊNCIA E PEREMPÇÃO a) Decadência: é a perda do direito de ação privada ou de representação por não ter sido exercido no prazo legal. A regra é o art. 103 do Código Penal: Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia. Este dispositivo prevê a regra geral, mas há exceções na legislação, tal qual o prazo decadencial de três meses estabelecido na Lei de Imprensa. A contagem do prazo ocorre na forma do art. 10 do CP, incluindo-se o dia inicial e não havendo prorrogação caso termine em sábado, domingo ou feriado (para mais detalhes, ver abaixo tópico sobre contagem de prazo da prescrição.) Vítima é menor de 18 anos: o prazo decadencial corre somente para o seu representante legal e diverge a doutrina se, ao atingir a maioridade, terá ela tão-somente o período remanescente ou os seis meses integrais para exercer seu direito. b) Perempção: é uma sanção aplicada ao particular por sua inércia na ação penal privada e consiste na perda do direito de prosseguir no processo. As hipóteses em que se considera a ação perempta estão elencadas no art. 60 do Código de Processo Penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36; III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas a- legações finais; IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. 87

88 RENÚNCIA E PERDÃO DO OFENDIDO Renúncia é a manifestação de desinteresse de exercer o direito de queixa. O perdão, por sua vez, é a desistência de prosseguimento na ação penal privada que iniciou. São institutos semelhantes, mas há diferenças importantes, e a principal delas é que a renúncia ocorre antes do ajuizamento da ação, e o perdão, depois. Mais, a renúncia é ato unilateral, não dependendo da aceitação da outra parte, enquanto o perdão é ato bilateral, necessitando ser aceito pelo querelado para que produza efeitos. Tanto a renúncia quanto o perdão podem ser expressos ou tácitos. São expressos quando ocorrem mediante declaração escrita e assinada; são tácitos quando o querelante pratica atos incompatíveis com a vontade de processar o agente. Indenização e Renúncia: prevê art. 104, parágrafo único, do Código Penal que o pagamento de indenização pelos danos não implica renúncia ao direito de queixa. Nos Juizados Especiais Criminais, contudo, tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação, por determinação do art. 74, parágrafo único, da Lei 9.099/95. Indivisibilidade da ação penal: a renúncia em relação a um ou alguns dos autores do delito estende-se a todos os outros, conforme previsão do art. 49 do Código de Processo Penal. O mesmo ocorre com relação ao perdão, consoante o art. 106, I, do Código Penal. Saliente-se, contudo, que, quando há mais de um querelante, o perdão concedido por um deles não afetará o direito dos demais ofendidos de prosseguir na ação RETRATAÇÃO DO AGENTE Retratação é o ato de desdizer-se em relação à calúnia e difamação, conforme previsão do art. 143 do Código Penal. Acrescenta o único: Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. Também é causa extintiva da punibilidade nos delitos de falso testemunho e falsa perícia, de acordo com o art. 342, 2º, do mesmo estatuto legal PERDÃO JUDICIAL Perdão judicial é o instituto mediante o qual a lei possibilita ao juiz deixar de aplicar a pena em face de justificadas circunstâncias do crime, que causam grande sofrimento ao autor, de forma que, não obstante esteja comprovada a prática da infração penal, resta desnecessária a aplicação da pena. Exemplos: homicídio culposo (art. 121, 5º, do CP), lesão culposa (art. 129, 8º, do CP), subtração de incapazes (art. 249, 2º, do CP). O magistrado só pode conceder o perdão depois de declarar que o acusado é responsável pelo delito, pois, do contrário, a solução é a absolvição. Diverge a doutrina e a jurisprudência acerca da natureza jurídica da sentença concessiva de perdão. Alguns autores consideram-na uma decisão condenatória, a qual livra o réu da pena e da reincidência, mas permite a subsistência de todos os efeitos secundários da condenação, tais quais os maus antecedentes e a possibilidade de reparar o dano. Nesse sentido: Mirabete e Damásio. Outros referem ser uma decisão declaratória de extinção da punibilidade, que nenhuma consequência gera ao acusado. Nesse sentido: Celso Delmanto e Aníbal Bruno. A Súmula nº 18 do STJ preceitua que: A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.

89 PRESCRIÇÃO Será analisada em tópico apartado abaixo, em razão das suas especificidades COMUNICABILIDADE DAS CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE Guilherme de Souza Nucci refere que algumas causas de extinção da punibilidade comunicam-se com os coautores e partícipes do crime, quais sejam, o perdão para quem o aceitar, a abolitio criminis, a decadência, a perempção, a renúncia ao direito de queixa e a retratação no delito de falso testemunho. Outras, no entanto, não se comunicam. São elas a morte de um dos coautores, o perdão judicial, a graça, o indulto, a anistia (a qual pode incluir ou excluir coautores), a retratação do querelado na calúnia e na difamação e a prescrição ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS Assim, as escusas absolutórias são causas pessoais de exclusão ou isenção de pena. Suas hipóteses são taxativas e expressas na lei, em geral, na parte especial do Código Penal. Em razão delas, embora configurado o crime praticado pelo agente, a ele não se impõe a pena cominada em abstrato. Por exemplo, nos crimes patrimoniais, cometidos sem violência ou grave ameaça, os cônjuges, entre si, os ascendentes e os descendentes, entre si, ainda quem cometam infração penal, não recebem punição, por previsão expressa do art. 181, I e II, do Código Penal. Escusas absolutórias x causas de extinção da punibilidade: a) Causas de extinção da punibilidade: excluem a pretensão punitiva ou executória estatal que inicialmente existia. b) Escusas absolutórias: não permitem o surgimento da pretensão punitiva CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE As condições objetivas de punibilidade são hipóteses criadas pelo legislador por razões de política criminal com objetivo de condicionar o exercício da pretensão punitiva estatal sob a perspectiva de sua necessidade. A condição de punibilidade não está contida na noção de tipicidade, antijuridicidade ou culpabilidade, mas é parte integrante do fato punível são elementos adicionais presentes apenas em alguns crimes. Assim, quando prevista para um crime condição de punibilidade, não basta que o fato seja típico, antijurídico e culpável; é imprescindível que a condição se realize para que nasça o direito de punir do Estado. A condição objetiva de punibilidade costuma vir referida no preceito ou na sanção, podendo, no entanto, resultar de uma norma geral. Exemplos: a) a sentença declaratória da falência 38 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial. 4. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, p

90 (Decreto-lei n , de 21/06/45, art.186 c/c o parágrafo único do art. 199); b) a existência do prejuízo quanto ao crime de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (CP, art. 164); c) a ocorrência do perigo (concreto) à vida, à integridade física ou ao patrimônio de outrem, quanto ao incêndio e outros crimes de perigo comum (CP, art. 250 e seguintes). Condições objetivas de punibilidade x condições de procedibilidade: as condições objetivas de punibilidade são elementos do crime, sem os quais não há crime. As condições de procedibilidade não afetam o crime, que já existe, mas impedem o nascimento do processo. São condições de procedibilidade, por exemplo, a representação no caso de ação penal pública condicionada e requisição do Ministro da Justiça no caso de crimes contra a honra da Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro CONCEITO É a extinção jus puniendi do Estado em razão da passagem do tempo sem punir ou executar a pena de um crime. Embora haja alguma discussão acerca da natureza jurídica da prescrição, se instituto de direito penal ou processual penal, a doutrina considera majoritariamente se tratar de instituto de direito material. 39 Tem como fundamentos a inconveniência de se aplicar uma pena muito tempo após a ocorrência da infração penal, pelo esquecimento do delito e pela perda da função da sanção criminal, mormente quando o autor não reincide e se adapta à vida social. Além disso, serve como estímulo à eficiência do Estado, que deve exercer a pretensão punitiva dentro de determinados prazos ESPÉCIES E ORDEM DA AVALIAÇÃO A prescrição pode ser da pretensão punitiva ou da pretensão executória. A primeira subdivide-se em outras três formas. A avaliação da prescrição segue a seguinte ordem: a) Prescrição da pretensão punitiva: ocorre antes do trânsito em julgado da sentença e extingue a possibilidade do Estado de obter uma decisão a respeito do fato tido como delituoso. Divide-se em: 39 GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p. 805; CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p. 622; BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral ed. São Paulo: Saraiva, 2011., p

91 a.1.) Prescrição da pretensão punitiva em abstrato a.2.) Prescrição da pretensão punitiva em concreto retroativa a.3.) Prescrição da pretensão punitiva em concreto intercorrente b) Prescrição da pretensão executória: ocorre depois do trânsito em julgado e extingue o direito do Estado de executar a pena aplicada. Analisaremos detalhadamente cada uma dessas espécies na sequência EFEITOS DA PRESCRIÇÃO a) Prescrição da pretensão punitiva: apagam-se todos os efeitos do crime (pena principal e efeitos secundários penais e extrapenais). b) Prescrição da pretensão executória: não haverá o cumprimento da pena principal, mas persistem os demais efeitos da condenação (penais e extrapenais), incluindo a de eventual futura reincidência CRIMES IMPRESCRITÍVEIS A Constituição Federal, em seu art. 5.º, declarou imprescritíveis a prática de racismo (XLII) e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (XLIV). São as únicas duas hipóteses previstas no direito brasileiro FORMA DE CONTAGEM DO PRAZO Tratando-se de instituto de direito material, a contagem do prazo se dá na forma do art. 10 do CP, incluindo-se o dia do começo e excluindo-se o último, não havendo prorrogação para o primeiro dia útil seguinte no caso de término em sábado, domingo ou feriado. A contagem é feita contando-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. Importante: não confundir com a contagem do prazo processual, no qual não se inclui o primeiro dia e inclui-se o último, e ainda há prorrogação para o primeiro dia útil seguinte no caso de o término cair em sábado domingo ou feriado CONCURSO FORMAL E CRIME CONTINUADO NA PRESCRIÇÃO Na análise de todas as hipóteses de prescrição não se consideram as majorações em virtude de concurso formal e de crime continuado, por determinação do art. 119 do Código Penal, o qual prevê que, no concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá, isoladamente, sobre a pena de cada um dos crimes. No mesmo sentindo é a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal, referindo que, quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação. Portanto, considera-se sempre a pena aplicada isoladamente a cada um dos crimes. 91

92 14.2. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM ABSTRATO A prescrição da pretensão punitiva abstrata é aquela que ocorre quando ainda não existe sentença condenatória com individualização da pena, de modo que seu lapso prescricional regulase pela pena máxima cominada, em abstrato, ao crime TERMO INICIAL DE CONTAGEM O art. 111 do Código Penal, em seus incisos, fixa os termos iniciais de contagem da pretensão punitiva: a) Consumação: a regra geral, prevista no inciso I do art. 111 do CP, é a de que a contagem da prescrição inicia-se no dia em que o crime se consumou. Deve-se observar as regras sobre a consumação em relação aos crimes materiais, formais e de mera conduta. Nos crimes materiais, a prescrição começa a correr no dia em que o resultado se produziu, já nos formais e de mera conduta, no dia da atividade. Nos delitos omissivos próprios, iniciase na data do comportamento negativo, enquanto nos impróprios, o início é a data em que o resultado se produziu. b) Tentativa: o inciso II determina que, no caso de tentativa, a contagem tem início no dia em que cessar a atividade criminosa. c) Crimes permanentes: o inciso III determina que, nas infrações penais permanentes, o prazo prescricional começa na data em que cessar a permanência. O mesmo entendimento é aplicável aos crimes habituais, tendo, assim, início a prescrição no dia em que acabar a habitualidade. d) Bigamia, falsificação ou alteração de assentamento do registro civil: o inciso IV determina que, nestes crimes, a prescrição inicia-se na data em que o fato se tornou conhecido. Interpreta-se que o conhecimento é relativo à autoridade pública. e) Crimes contra a dignidade sexual contra vulnerável: o inciso V determina que o prazo prescricional é contado a partir do dia em que a vítima completar dezoito anos, salvo se a ação penal já tiver se iniciado antes. Trata-se de causa impeditiva do início da contagem da prescrição. E é norma mais gravosa ao réu, pois posterga o início da contagem do prazo e, portanto, aplica-se apenas aos casos posteriores à sua vigência CÁLCULO DO PRAZO DA PRESCRIÇÃO EM ABSTRATO Os prazos da prescrição em abstrato estão previstas no art. 109 do CP e variam de acordo com a pena máxima cominada ao crime: PENA MÁXIMA Inferior a 1 ano De 1 a 2 anos De 2 a 4 anos De 4 a 8 anos De 8 a 12 anos Superior a 12 anos PRAZO PRESCRICIONAL 3 anos 4 anos 8 anos 12 anos 16 anos 20 anos 92 92

93 Causas que modificam o prazo: majorantes, minorantes e a idade do agente. Conforme o art. 115 do Código Penal, são reduzidos da metade os prazos de prescrição previstos no art. 109 quando o criminoso era, à época do crime, menor de vinte e um anos, ou, na data da sentença, maior de setenta. Para aumento, só podem ser considerados os aumentos e reduções decorrentes de majorantes ou minorantes, aplicando-se a proporção prevista sobre a pena máxima prevista em abstrato ao crime. As circunstâncias judiciais e as agravantes e atenuantes não influenciam no cálculo do prazo. A reincidência também não interfere no prazo de prescrição da pretensão punitiva (Súmula 220 do STJ). Importante: como a prescrição é matéria em que se deve priorizar o interesse público, entende-se que, em se tratando de majorante, deve-se considerar o fator que mais aumente, e, em se tratando de minorante, o fator que menos reduza a pena. Com a incidência das causas de aumento e de diminuição de pena sobre o máximo cominado ao tipo, encontra-se, no art. 109 do Código Penal, o novo prazo prescricional que poderá ser reduzido em virtude da idade do agente. Por fim, basta verificar se fluiu esse tempo entre os marcos de contagem previstos no art. 117 do Código Penal para determinar-se a ocorrência ou não de prescrição CAUSAS SUSPENSIVAS OU IMPEDITIVAS As causas de suspensão estão previstas no art. 116 do Código Penal e paralisam o prazo prescricional, o qual volta a correr tão logo a causa que fundamentou a suspensão termine. Exemplo: ocorreu crime cujo prazo de prescrição é de 8 anos, sobrevindo causa de suspensão após 2 anos. O prazo é suspenso enquanto durar a causa. Extinta a causa, o prazo volta a correr, restando então 6 anos. a) Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime (inciso I do art. 116 do CP): o prazo prescricional não corre enquanto não decidida questão prejudicial, que são aquelas previstas nos artigos 92 e 93 do Código de Processo Penal. A data inicial do impedimento é a do despacho do juiz determinando a suspensão do processo; a data final, a do despacho que ordena o prosseguimento ou, em questão de estado civil, a data do trânsito em julgado da decisão que a solucionar. Exemplo: se alguém responde pelo delito de bigamia, e, no foro cível, esteja tramitando ação de anulação de um dos casamentos, deve o juiz suspender o feito criminal até a resolução de tal questão prejudicial. b) Enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro (inciso II do art. 116 do CP): justifica-se por não ser possível obter-se a extradição do sujeito nesse período. c) Outras causas impeditivas: fora do art. 116 do Código Penal existem outras causas impeditivas da prescrição. O art. 89, 6.º, da Lei 9.099/95, por exemplo, prevê que não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão de processo. O art. 366 do Código de Processo Penal determina que ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional quando o acusado, citado por edital, não comparecer e nem constituir advogado. Já o art. 368 do CPP estabelece que, estando o acusado no estrangeiro, em 93

94 lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento. Por fim, encontra-se no art. 53, 5.º, da Constituição Federal a previsão de que, havendo a sustação do processo do congressista, suspensa estará também a prescrição CAUSAS INTERRUPTIVAS As causas interruptivas são elencadas taxativamente no art. 117 do Código. Faz com que a contagem do prazo prescricional recomece por inteiro, inutilizando o tempo anteriormente decorrido. a) Recebimento da denúncia ou queixa (inciso I): é o recebimento que interrompe; o mero oferecimento não tem força para interromper a prescrição. Quando o recebimento da exordial dá-se por ordem do Tribunal, deve-se observar se foi o próprio acórdão que a recebeu ou se ele ordenou que o juiz recebesse. Na primeira situação, a interrupção é na data do julgamento, enquanto que, na segunda, no dia em que o juiz efetivamente recebeu. Ademais, deve-se atentar para a Súmula nº 709 do STF: Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela. b) Pronúncia (inciso II): a interrupção ocorre na data da publicação da sentença de pronúncia. Não há interrupção se o magistrado impronuncia ou absolve sumariamente o réu, bem como se desclassifica o crime para infração de outra competência. Mas se a desclassificação for para outro delito que deve ser também julgado pelo Júri, há interrupção. Exemplo: desclassificação de homicídio para infanticídio. Deve-se atentar para a Súmula 191 do STJ: a pronúncia é causa interruptiva da prescrição, ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime. Ou seja, a pronúncia interrompe o prazo prescricional, mesmo se o Conselho de Sentença desclassificar o crime posteriormente. d) Decisão confirmatória da pronúncia (inciso III): se o réu pronunciado recorre e o Tribunal decide confirmando a pronúncia, há nova interrupção do prazo prescricional. e) Publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis (inciso IV): a interrupção dá-se a partir da publicação nas mãos do escrivão, consoante o art. 389 do Código de Processo Penal e entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal. A sentença absolutória e a que concede perdão judicial não têm força interruptiva (a sentença que concede o perdão judicial é declaratória e não condenatória, veja-se Súmula 18 do STJ). Se houver recurso do Ministério Público quanto à absolvição e o Tribunal reformar, condenando, há interrupção. Portanto, a prescrição em abstrato pode ocorrer entre: A data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa O recebimento da denúncia ou queixa e a pronúncia A pronúncia e a decisão confirmatória da pronúncia A pronúncia e a sentença condenatória 94 94

95 O recebimento da denúncia ou queixa e a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Importante: após o trânsito em julgado da sentença condenatória não se fala mais de prescrição da pretensão punitiva, uma vez que com ele nasce a pretensão executória PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM CONCRETO RETROATIVA Ocorre entre a sentença condenatória e algum fato anterior a ela (por isso retroativa). Como já há sentença condenatória individualizando a pena, a prescrição é calculada com base na pena aplicada ao caso concreto, desde que haja trânsito em julgado para a acusação ou o improvimento de seu recurso. Não há prescrição entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa (art. 110, 1º, do CP). Tem como pressupostos: a inocorrência da prescrição abstrata, a existência de sentença penal condenatória e o trânsito em julgado para a acusação ou o improvimento de seu recurso. O trânsito em julgado ou improvimento do recurso da acusação é pressuposto porque a partir deles não se pode mais alterar para pior a pena aplicada na sentença CONTAGEM DO PRAZO a.1. Deve-se tomar a pena concretizada na sentença condenatória, excluindo-se apenas as majorações decorrentes do concurso formal e do crime continuado. a.2. Verifica-se, com base na pena fixada em concreto, o prazo prescricional correspondente no art. 109 do Código Penal (por exemplo, se a pena aplicada foi de 3 anos, a prescrição ocorre em 8 anos veja-se tabela acima). a.3. Analisa-se se o réu era menor de 21 anos na data do fato ou se tem mais de 70 anos, para, em caso positivo, reduzir o prazo encontrado pela metade. a.4. Se o prazo encontrado fluiu entre os marcos de contagem previstos no art. 117 do CP, o delito estará prescrito. Portanto, a prescrição em concreto retroativa pode ocorrer entre: O recebimento da denúncia ou queixa e a pronúncia A pronúncia e a decisão confirmatória da pronúncia A pronúncia e a sentença condenatória O recebimento da denúncia ou queixa e a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis 95

96 Importante: se o crime é anterior à entrada em vigência da Lei /10, que alterou o prazo mínimo da prescrição de 2 para 3 anos (quando a pena é inferior a um ano) e excluiu a possibilidade de prescrição retroativa entre a data do fato e o recebimento da denúncia, aplicar-seá a regulação anterior, uma vez que mais benéfica ao réu PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM CONCRETO INTERCORRENTE, SUPERVENIENTE OU SUBSEQUENTE A prescrição intercorrente, assim como a retroativa, leva em consideração a pena aplicada na sentença condenatória. A diferença entre ambas reside no fato de que a retroativa se volta para o passado, ou seja, para períodos anteriores ao da sentença, enquanto a intercorrente dirige-se ao futuro, isto é, para períodos posteriores à sentença condenatória recorrível. De forma específica: ocorre entre a publicação da sentença ou acórdão condenatório recorrível e o trânsito em julgado da condenação. São seus pressupostos: a existência de sentença condenatória e o trânsito em julgado para a acusação e o improvimento de seu recurso CÁLCULO DO PRAZO Deve-se tomar a pena concretizada na sentença condenatória, excluindo-se apenas as majorações decorrentes do concurso formal e do crime continuado. a.5. Verifica-se, com base na pena fixada em concreto, o prazo prescricional correspondente no art. 109 do Código Penal (por exemplo, se a pena aplicada foi de 3 anos, a prescrição ocorre em 8 anos veja-se tabela acima). a.6. Analisa-se se o réu era menor de 21 anos na data do fato ou se tem mais de 70 anos, para, em caso positivo, reduzir o prazo encontrado pela metade. a.7. Se o prazo encontrado fluiu entre a publicação da sentença ou acórdão condenatório e o trânsito em julgado, o crime está prescrito IMPOSSIBILIDADE DE PRESCRIÇÃO PENAL ANTECIPADA, PROJETADA, VIRTUAL OU ANTEVISTA Discutia-se sobre a possibilidade de se reconhecer prescrição em situações em que o julgador percebesse que eventual condenação do réu resultaria, mesmo na pior das hipóteses, em prescrição. Considerar-se-ia, para isso, o lapso temporal entre o fato e o momento do recebimento da denúncia ou da queixa, bem como a projeção da pena que seria aplicada, já com as qualificadoras, causas de aumento, agravantes e circunstâncias judiciais. A Súmula 438 do STJ determinou que essa modalidade de prescrição não é admitido: É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal. Ademais, a Lei n.º /10 acabou com a possibilidade de prescrição pela pena em concreto entre a data do fato e a data do recebimento da denúncia e da queixa (art. 110, 1º, do CP), de forma que reafirmou a impossibilidade da prescrição projetada.

97 14.6. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA A prescrição da pretensão executória ocorre depois do trânsito em julgado da decisão condenatória, regulando-se pela pena fixada na sentença, consoante previsão do art. 110, e verificando-se nos mesmos prazos fixados no art. 109 (vide tabela supra), ambos do Código Penal. São pressupostos da prescrição executória: a inocorrência da prescrição da pretensão punitiva (abstrata, retroativa ou intercorrente), a existência de sentença condenatória irrecorrível (com trânsito em julgado para acusação e defesa) e a não satisfação da pretensão executória por parte do Estado (não corre se o Estado está executando a pena imposta) TERMO INICIAL DE CONTAGEM O termo inicial de contagem da prescrição da pretensão executória está previsto no art. 112 do Código Penal: a) No dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação (inciso I): o dispositivo é criticado pela doutrina, uma vez que o trânsito em julgado para o órgão acusador não permite a execução da pena pelo Estado, entretanto determina o início do prazo para a prescrição executória. Com a decisão do STF de permitir a execução provisória da pena após o julgamento em segunda instância que mantém a condenação (STF, HC , j ), o dispositivo ganha algum sentido. b) Na data em que transita em julgado a decisão que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional (inciso I): em ambas as hipóteses não se considera a decisão que concede o benefício, é preciso que o agente já esteja no seu gozo e que sobrevenha, então, decisão revogatória (obrigatória ou facultativa). No caso de revogação do livramento condicional, o tempo de prescrição será regulado pelo tempo restante da pena a ser cumprida se a revogação ocorreu em razão de infração anterior à concessão do benefício; será regulado pelo total da pena aplicada se a revogação ocorrer em razão de infração cometida durante o gozo do benefício. Na revogação da suspensão condicional da pena, o prazo da prescrição é regulado sempre pelo total da pena. c) Na data em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo deva ser computado na pena (inciso II): ocorre em situações em que o condenado deixa de cumprir a sanção que lhe foi imposta, seja por fugir do presídio, por abandonar o regime aberto ou por não respeitar as restrições que lhe foram impostas. Excepcionalmente, porém, a interrupção é legítima e o tempo é computado como pena cumprida. Exemplo: sujeito adoece mentalmente e é transferido para hospital de custódia e tratamento, conforme previsão do art. 41 do Código Penal. Nesse caso, não se inicia a contagem do prazo prescricional, porque o tempo será computado na pena. O Estado, neste caso, está satisfazendo a pretensão executória CÁLCULO DO PRAZO Deve-se tomar a pena concretizada na sentença condenatória, excluindo-se apenas as majorações decorrentes do concurso formal e do crime continuado. (Importante: nas hipóteses de fuga ou de revogação de livramento condicional, tomar-se-á apenas o restante de pena a cumprir, e não a pena fixada, por previsão do art. 113 do Código Penal.) 97

98 Verifica-se, com base na pena fixada em concreto, o prazo prescricional correspondente no art. 109 do Código Penal (veja-se tabela acima) Analisa-se a existência de causas modificadoras do lapso prescricional: a) art. 115 do CP: reduz-se pela metade o prazo prescricional se o réu era menor de 21 anos na data do fato ou se tem mais de 70 anos na data da sentença condenatória; b) art. 110 do CP: a reincidência, a qual eleva em um terço o prazo. Se entre o termo inicial e as interrupções houver transcorrido o prazo encontrado, deve-se declarar a prescrição executória CAUSA SUSPENSIVA Prevê o art. 116, único, do Código Penal que a prescrição da pretensão executória não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo. Qualquer prisão, inclusive a de natureza civil, suspende o curso da prescrição executória. Se quando houver trânsito em julgado da decisão, o réu já estiver preso, não começa a correr a prescrição executória CAUSAS INTERRUPTIVAS a) Início ou continuação do cumprimento da pena (art. 117, V, do CP): o início ou a continuação do cumprimento da pena interrompe a contagem do prazo. Se o réu foge após iniciar o cumprimento, inicia a contagem do prazo da prescrição executória. Se o apenado é capturado, o prazo é interrompido. b) Reincidência (art. 117, VI, do CP): o cometimento de novo crime interrompe a prazo da prescrição executória PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA A regra geral, prevista no art. 118 do CP, estabelece que as penas mais leves prescrevem com as mais graves. Em relação à pena de multa, as prescrições ocorrem da seguinte forma: a) Prescrição da pretensão punitiva abstrata: quando a pena de multa for a única cominada ao delito ou a única aplicada, a prescrição da pretensão punitiva abstrata ocorrerá em dois anos, consoante o art. 114, I, do Código Penal. Entretanto, quando a pena for alternativa ou cumulativamente cominada, a prescrição dar-se-á no mesmo prazo estabelecido para a pena privativa de liberdade, conforme previsão dos artigos 114, II, e 118 do mesmo estatuto legal. b) Prescrição da pretensão punitiva retroativa: quando a pena de multa for a única aplicada, não haverá prescrição retroativa, pois o prazo e os marcos são os mesmos da abstrata, prevalecendo esta. Contudo, quando fixada conjuntamente com privativa de liberdade, o prazo da prescrição retroativa da multa será igual ao desta c) Prescrição da pretensão punitiva intercorrente: tal quais as outras espécies de prescrição punitiva, a prescrição intercorrente ocorre em dois anos, quando a pena de multa for a única aplicada, e seguirá a sorte da pena privativa de liberdade, quando fixada juntamente com esta.

99 d) Prescrição da pretensão executória: o art. 51 do CP dispõe que transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição. Por isso, a prescrição executória da pena de multa ocorre em cinco anos, em virtude do art. 173 do Código Tributário Nacional PRESCRIÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Dispõe o art. 109, parágrafo único, do Código Penal que se aplicam às penas restritivas de direito os mesmos prazos prescricionais previstos para as penas privativas de liberdade CONCEITO É ocorrência de dois ou mais crimes através da prática de uma ou mais condutas. 40 O concurso de crimes ou de infrações penais é também é chamado de concurso legal puro, em oposição ao concurso aparente de normas penais, que seria o concurso legal impuro. Importante: No concurso de crimes há mais de um fato criminoso; no concurso aparente de normas há um fato criminoso e mais de uma norma que (aparentemente) se aplica a ele. Pode haver concurso de crimes entre crimes dolosos, culposos, consumados, tentados, comissivos, omissivos, e mesmo entre um crime e uma contravenção penal. De outra parte, não é caso de concurso o crime complexo, ou seja, aquele que se forma da união de dois outros tipos penais e que, por isso, ofende, a um só tempo, mais de um bem jurídico. Nesse caso, há um só crime. Exemplo: roubo (união entre os tipos de furto e ameaça). Também não é caso de concurso quando ocorre a consunção, ou seja, quando, no conflito aparente de normas, um tipo penal descarta o outro porque consome ou exaure seu conteúdo proibitivo. Exemplos: lesões leves resultantes da violência no crime de roubo, dano das roupas da vítima de homicídio, entre outros ESPÉCIES DE CONCURSO DE CRIMES CONCURSO MATERIAL OU REAL (ART. 69 DO CP) Conforme o art. 69 do CP: Art Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas 40 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

100 privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. É quando o agente pratica dois ou mais crimes, mediante mais de uma conduta, produzindo dois ou mais resultados, idênticos ou não. Não importa se os fatos ocorreram na mesma ocasião ou em dias diferentes: há vínculo em razão da identidade do agente. Exemplo: pessoa que pratica um furto hoje, um roubo na semana seguinte, mais tarde outro furto e um estupro ESPÉCIES DE CONCURSO MATERIAL a) Concurso material homogêneo: as infrações são substancialmente idênticas, da mesma espécie. Exemplo: dois furtos. b) Concurso material heterogêneo: as infrações são de espécies diferentes. Exemplo: um estupro e um atentado ao pudor APLICAÇÃO DA PENA As penas são individualizadas separadamente e depois somadas, para o fim de determinar o regime de execução. Se as penas aplicadas forem de diferentes hierarquias, por exemplo, de reclusão e de detenção, a mais grave (reclusão) será executada primeiro. Se forem impostas penas de multa, elas serão aplicadas distinta e integralmente, não obedecendo ao regramento do concurso de crimes (sistema da exasperação), consoante dispõe o art. 72 do CP. Os parágrafos do art. 69 do CP estabelecem específicas para alguns casos quanto ao cumprimento da pena em caso de concurso material. O 1º determina que, sendo aplicada pena privativa de liberdade em relação a um dos crimes e não havendo suspensão condicional da pena, não será cabível a substituição da pena dos demais crimes por restritivas de direitos (art. 44 do CP). O 2º dispõe que, quando aplicadas duas penas restritivas de direitos em substituição à pena privativa de liberdade, deverão ser elas cumpridas simultaneamente se compatíveis entre si e sucessivamente caso incompatíveis EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE/PRESCRIÇÃO A extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um dos crimes, separadamente (art. 119, CP). Portanto, antes da soma das penas, o juiz deve calcular a pena de cada infração por meio do método trifásico e então verificar eventual ocorrência de prescrição pela pena concretizada na sentença CONCURSO FORMAL OU IDEAL (ART. 70 DO CP) É quando o agente pratica dois ou mais crimes, da mesma natureza ou não, mediante uma só conduta. Com uma só ação, o agente causa dois ou mais resultados, ou seja, atinge mais de um bem penalmente tutelado. Exemplos: sujeito atira num indivíduo e, concomitantemente, acerta o projétil neste e num outro houve a prática de uma só ação, mas dois foram os crimes cometidos; motorista conduz seu veículo de modo imprudente, vindo a matar várias pessoas desenvolvendo um único comportamento, praticou ele vários crimes.

101 ESPÉCIES DE CONCURSO FORMAL O concurso formal subdivide-se em próprio e impróprio, classificação que gera efeitos importantes no tocante à aplicação da pena: a) Concurso formal próprio ou perfeito: previsto na primeira parte do art. 70, caput, do CP: Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. O agente, por meio de uma mesma vontade ou intenção, pratica dois ou mais crimes, dando causa a dois ou mais resultados. Exemplo: o agente dirige um carro em alta velocidade e acaba por atropelar e matar três pessoas. Aplicação da pena: adotou-se o sistema da exasperação da pena, devendo-se atentar para a seguinte classificação, de acordo com a identidade ou não dos crimes praticados: a.1.) Concurso formal homogêneo: todos os crimes são iguais (ocorrem resultados idênticos). Como a pena cominada aos crimes é igual, aplica-se a pena de qualquer um deles, aumentada de 1/6 a 1/2. Exemplo: lesões corporais causadas em várias vítimas em decorrência de acidente de veículo automotor. a.2.) Concurso formal heterogêneo: ha crimes diferentes (ocorrem resultados diversos). Mediante uma mesma conduta, o agente realiza tipos penais distintos. Aplica-se a mais grave das penas cabíveis, exasperada de 1/6 até 1/2. Exemplo: em acidente de veículo, o motorista fere um indivíduo e mata outro ocorreu um homicídio culposo e uma lesão corporal culposa. Ante a ausência de critério explícito na lei, os Tribunais mensuram o aumento de pena de acordo com o número de bens ofendidos. Prescrição: se houver concurso heterogêneo, deverá ser calculada a pena de cada um dos crimes, a fim de verificar: a) eventual prescrição pela pena concretizada na sentença (CP, art. 119); b) a possibilidade de aplicação da regra do concurso material mais benéfico (CP, art. 70, parágrafo único). b) Concurso formal impróprio ou imperfeito: previsto na segunda parte do caput do art. 70: As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos. Aplica-se apenas aos crimes dolosos, nos quais há intenção. Há uma só ação, mas o agente tem vontade ou intenção de causar todos os resultados ou aceita o risco de produzi-los (dolo direto e eventual, respectivamente). Há unidade de ação e pluralidade de vontades. Exemplo: o agente incendeia uma residência com a intenção de matar todos os moradores. Aplicação da pena: confere-se tratamento mais grave, tendo o Código Penal adotado o sistema de cúmulo material, segundo o qual se somam as penas cominadas a cada um dos crimes, da mesma forma que ocorre no caso de concurso material (art. 69 do CP). Quanto à prescrição, também aplica-se a mesma regra do concurso material. 101

102 CONCURSO MATERIAL BENÉFICO Trata-se da aplicação, por razão de proporcionalidade, das regras de concurso material (soma das penas) para o caso da aplicação das regras do concurso formal resultar em pena mais alta. A prática voluntária de dois crimes é mais grave do que a prática de dois crimes quando se desejava apenas um deles, por isso a regra do concurso material é pensada para ser mais gravosa do que a do concurso formal. Portanto, quando essa diferença na gravidade das penas não se realiza na prática, de forma que o agente que comete crimes em concurso formal receberá pena mais alta do que a que receberia no caso de concurso material, o art. 69, único, do CP manda que seja aplicada a regra do concurso material, uma vez que mais benéfica ao réu. Assim, para evitar um cúmulo de penas desproporcional aos crimes cometidos, limita-se a pena do concurso formal ao máximo que seria cabível pela regra do concurso material. Impede-se, assim, que, por exemplo, numa hipótese de concurso formal heterogêneo entre homicídio doloso mais lesões culposas aplique-se ao agente pena mais severa, em razão do concurso formal, do que a aplicável pelo concurso material CRIME CONTINUADO Consoante a previsão do art. 71 do CP, diz-se que há crime continuado quando o agente, mediante mais de uma conduta, comete mais de um crime da mesma espécie, com algum liame no que diz respeito ao tempo, ao lugar, à maneira de execução e a outras características que façam presumir um nexo de continuidade entre os fatos. Havendo tais similitudes, um crime subsequente será visto como a continuação do que lhe antecedeu. O instituto do crime continuado (CP, art. 71) tem por objetivo mitigar o rigor do apenamento que seria alcançado caso aplicadas as regras de concurso material TEORIAS SOBRE A UNIDADE DOS CRIMES Há três teorias distintas que fundamentam o reconhecimento do crime continuado: a) subjetiva: o reconhecimento do crime continuado dependeria apenas de aspectos subjetivos, como a existência de um plano pré-determinado. b) objetivo-subjetiva: além da semelhança objetiva entre os delitos, o reconhecimento do crime continuado dependeria também de aspectos subjetivos. c) objetiva: o reconhecimento da continuidade delitiva depende apenas de características objetivas. Conforme doutrina majoritária, a teoria objetiva é adota pelo CP, como se nota pela leitura do art. 71 do CP, o que também foi consignado expressamente no item 59 da Exposição de Motivos. Os tribunais superiores, no entanto, tem adotado a teoria objetivo-subjetiva, entendendo inadmissível o crime continuado sem a vontade de praticar os delitos em continuação, pois, do contrário, estar-se-ia equiparando o instituto à habitualidade no crime e, com isso, beneficiando o criminoso contumaz. Afasta-se, assim, a aplicação do crime continuado à habitualidade delitiva. (Vide STF, HC /RS, 2ª T., Dje 2010; STJ, HC /SP, 5ª T., Dje 2004.) 102

103 TEORIAS SOBRE A NATUREZA JURÍDICA São três as teorias sobre a natureza jurídica do crime continuado 41 : a) Unidade real: os vários fatos, na verdade, constituem um único delito. b) Ficção jurídica: existem vários crimes que, por uma ficção baseada no objetivo de não se aplicar pena demasiadamente rigorosa, a lei considera um único delito. É a teoria adotada pelo Código Penal. c) Mista: os fatos não são um só crime, pois cada um deles configura por si um crime; mas o crime continuado constitui um terceiro delito que é composto por uma pluralidade de fatos REQUISITOS PARA O RECONHECIMENTO DO CRIME CONTINUADOS a) Diversidade de condutas: requer uma pluralidade de condutas. Difere, portanto, do concurso formal, em que há apenas uma conduta. Exemplo: no delito de roubo, com pluralidade de vítimas, aplica-se a regra do concurso formal, e não a continuidade delitiva. b) Crimes da mesma espécie: as condutas-partes que compõem o crime continuado devem caracterizar crimes da mesma espécie. A definição do que seja crime da mesma espécie, entretanto, não é pacífica. b.1.) Parte da doutrina entende que são da mesma espécie os crimes previstos no mesmo tipo legal, isto é, aqueles que possuem os mesmos elementos descritivos, abrangendo as formas simples, privilegiadas e qualificadas, tentadas ou consumadas. 42 Assim, segundo esse entendimento, não são crimes da mesma espécie, por exemplo, roubo e extorsão, roubo e furto, estupro e atentado violento ao pudor, embora possam ser eles do mesmo gênero (contra o patrimônio, contra a liberdade sexual). A jurisprudência tem-se inclinado nesse sentido. b.2.) Outro segmento da doutrina, de modo diverso, entende que crimes da mesma espécie não são somente aqueles previstos no mesmo tipo, mas sim os que possuem características fundamentais comuns. Assim, ainda que não idênticos, ao atentarem contra um mesmo bem jurídico, serão eles tidos como da mesma espécie. 43 Com efeito, ao determinar a aplicação da pena mais grave, sinaliza a lei no sentido da possibilidade de serem os crimes diferentes, contanto que sejam da mesma espécie. Consoante essa posição, seria possível reconhecer-se a continuação entre furto e roubo, roubo e extorsão, estelionato e qualquer outra fraude, entre muitos. 41 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p Nessa linha, Damásio E. de Jesus e José Frederico Marques. 43 Assim entendem Heleno Cláudio Fragoso Júlio Fabbrini Mirabete e Guilherme de Souza Nucci. 103

104 c) Nexo adverbial da continuidade delitiva: tempo, lugar, modo de execução e outras semelhantes. Não basta a similitude entre as espécies de crimes; é preciso, ainda, outras semelhanças entre eles para que seja reconhecida a continuidade delitiva, a saber: c.1.) Nexo temporal: um longo lapso temporal separando a reiteração dos fatos pode, com base na razoabilidade, afastar a continuidade delitiva, mas não há critério preciso de aferição do espaço de tempo em que são cometidas as ações em continuidade. A jurisprudência, de modo geral, tem aceitado o prazo de até trinta dias entre as infrações penais, mas o nexo de tempo deve ser analisado em conjunto com as outras circunstâncias exigíveis para a configuração do instituto. Sendo longo o tempo que separa uma ação e outra, a continuação só existirá se as demais condições objetivas assim indicarem. c.2.) Nexo espacial: é preciso haver uma espécie de conexão espacial a unir os crimes componentes, mas, a exemplo dos demais requisitos, a similitude de espaço não pode ser encarada com excessivo rigor. Em regra, tem-se reconhecido a continuidade delitiva mesmo em casos de prática do mesmo delito seguidamente em locais diversos, como, por exemplo, bairros da mesma cidade e até cidades próximas. c.3.) Modo de execução: as condutas-partes devem guardar, entre si, similitude no que diz respeito ao modus operandi, ou seja, o agente deve ter laborado com técnicas parecidas na prática do delito. Ex.: enfermeiro que, de forma continuada, aplica injeção letal em seus pacientes. No caso concreto, a ausência de homogeneidade quanto ao modo de execução dos crimes pode inviabilizar a configuração do crime continuado. c.4.) Outras condições semelhantes: a fim de flexibilizar a aplicação do instituto e de abranger quaisquer outras circunstâncias que possam indicar a continuidade delitiva, o Código Penal incluiu, dentre os requisitos do crime continuado, a expressão genérica outras condições semelhantes. Aqui, pode-se incluir, por exemplo, condições semelhantes de oportunidade ensejadoras do delito. Em síntese, é o conjunto de todos os requisitos, no caso concreto, que convencerá o julgador acerca da existência ou não do crime continuado. Isoladamente, nenhuma delas é decisiva APLICAÇÃO DA PENA Adotou-se a regra da exasperação, de modo que se aplica a pena do crime mais grave, ou de um deles, se idênticas as penas, aumentada na forma do art. 71, caput ou único: a) Crime continuado comum ou simples (caput do art. 71): cometido sem violência ou grave ameaça contra a pessoa. Aplica-se a pena do crime mais grave, aumentada de 1/6 a 2/3. Exemplo: prática continuada de sonegação fiscal. Não há parâmetro para o aumento de 1/6 até 2/3; contudo, a jurisprudência tem-se valido, para isso, do número de infrações penais cometidas. 104 b) Crime continuado específico ou qualificado ( único do art. 71): exige para sua configuração, além dos requisitos objetivos da continuidade, outros três: crime doloso (afastam-se, pois, os crimes culposos); praticado contra vítimas diferentes (se a vítima for a mesma, a hipótese será do caput do mesmo artigo); e cometido com violência ou grave ameaça à pessoa (não pode a violência ter sido empregada contra a coisa tampouco não

105 ter havido violência ou grave ameaça). Preenchidos os requisitos legais, o julgador, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, poderá, se entender cabível, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo. Houve omissão da lei quanto ao quantum mínimo da majoração, por isso alguns autores sustentam que se deve utilizar o mínimo previsto no caput do artigo 71, ou seja, 1/6, enquanto outros entendem que fica a critério do juiz demarcar o mínimo da exasperação. Multa: há divergência doutrinária e jurisprudencial sobre a forma de aplicação da pena de multa. Um primeiro entendimento é de que nos casos de crime continuado a pena de multa será aplicada distinta e integralmente. Outro entendimento é no sentido de que, sendo o crime continuado um só para efeito de aplicação da pena, deve-se aplicar o sistema de exasperação também à pena de multa, não incidindo, portanto, a regra do art. 72 do CP. (Conforme a segunda posição já decidiu o STJ, REsp /PR, 6ª T. Dje 2010) CONCURSO MATERIAL BENÉFICO Assim como no concurso formal, se da aplicação da regra do crime continuado, a exasperação implicar desproporcional aumento da pena, resultando ela superior à soma das penas individualmente aplicadas a cada crime, aplica-se a regra do concurso material, somando-as SUPERVENIÊNCIA DE LEI MAIS GRAVOSA Súmula 711 do STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. Portanto, se há sucessão de leis penais no tempo, sendo substituída uma menos grave por uma mais gravosa e o crime continuado segue sendo praticado, aplica-se a ele a pena da lei posterior. Não há ofensa ao princípio da irretroatividade de lei penal mais gravosa PRESCRIÇÃO E CRIME CONTINUADO Súmula 497 do STF: Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação. Portanto, para verificação do prazo prescricional, se considera a pena aplicada a cada fato individual e não a pena aplicada em razão do aumento derivado do crime continuado. No mesmo sentido: art. 119 do Código Penal. 105

106 16.1. CONCEITO Pena é a consequência jurídica da prática de um crime, imposta pelo Estado. Consiste na restrição de bens jurídicos do autor do crime em resposta à sua ofensa a um bem jurídico de grande valor social. O sistema de penas em vigor no Brasil tem por base os incisos XLVI e XLVII do art. 5.º da Constituição Federal, que elencam, respectivamente, as penas permitidas e proibidas no país. São proibidas as penas de morte, salvo em caso de guerra declarada (art. 84, XIX), as de caráter perpétuo, as de trabalhos forçados, a de banimento e as penas cruéis, ou seja, aquelas cuja imposição e execução trazem requintes de desumanidade. Ademais, as penas impostas não podem agredir a dignidade da pessoa humana (art. 1.º, III, CF). São permitidas, no direito penal brasileiro, as penas de privação ou restrição de liberdade, a perda de bens, a multa, a prestação social alternativa e a suspensão ou interdição de direitos. Embora não esteja explícita, há uma hierarquia entre elas, tendo em vista a importância do bem jurídico protegido (reclusão, detenção, prisão simples, restritivas de direitos e multa). Em alguns casos, a sanção aplicável a quem praticou fato típico e ilícito não será uma pena, mas uma medida de segurança, de acordo com o sistema vicariante trazido pela Reforma Penal de 1984, conforme se verá abaixo TEORIAS DA PENA OU TEORIAS SOBRE OS FINS DA PENA A questão dos fins da pena, do que se pretende com a aplicação da pena, está indissociavelmente ligada aos fins do próprio direito penal e de premissas valorativas e políticas sobre os próprios fins do Estado TEORIAS ABSOLUTAS OU RETRIBUTIVAS A pena não tem uma finalidade distinta da punição do criminoso. Trata-se de uma retribuição, expiação, reparação ou compensação, por questão de justiça, do mal que é o crime por meio da aplicação da sanção penal. Ao mal do crime, que é a negação do direito, corresponde o mal da pena, que deve ser proporcional à culpabilidade do agente, sendo este seu principal mérito, ao estabelecer um limite para a pena, até então ilimitada. A teoria absoluta da pena foi defendida, entre outros, por Kant e Hegel. Contra tais teorias pesa a crítica de que a pena não pode ser vista como um fim em si mesma, pois trata-se de um meio para alcançar uma finalidade maior. Além disso, contrariam o princípio da subsidiariedade do Direito Penal e estarem vinculadas a uma ordem absoluta de valores incompatível com sociedades plurais e democráticas. 106

107 TEORIAS RELATIVAS OU PREVENTIVAS Para as teorias relativas, a pena não é uma mera retribuição do mal do crime pelo mal da pena, sendo a sanção penal um meio que serve de instrumento para uma finalidade: a prevenção de crimes. Existem, entretanto, teorias diversas acerca da prevenção: a) Prevenção geral: as teorias da prevenção geral entendem que a finalidade da pena pena é produzir efeitos sobre a totalidade da população. Divide-se em: a.1) Prevenção geral negativa: o fim da pena é intimidar ou ameaçar a totalidade da população para que as pessoas, sabendo que o crime tem como consequência a pena, não o cometam por medo. Serve, assim, como um contramotivo psicológico para o criminoso. É criticada em razão da ausência de comprovação de sua eficácia, além de de que o condenado é visto como um meio para servir de exemplo aos demais. Defendida, entre outros, por Bentham e Feuerbach. a.2) Prevenção geral positiva ou integradora: o fim da pena é aumentar a confiança da população no direito penal, de forma que as pessoas saibam que as normas penais são válidas como regras de comportamento social e que todo aquele que contrariar tais regras, cometendo um crime, será punido. Assim, as pessoas não cometerão crimes por confiar na validade do ordenamento jurídico. A prevenção geral positiva é criticada por aproximar-se das antigas teorias retributivas, bem como por não ser passível de verificação empírica. Defendida, entre outros, por Hassemer, Jakobs e Figueiredo Dias. b) Prevenção especial: as teorias da prevenção especial entendem que a finalidade da pena pena é produzir efeitos sobre o criminoso a qual ela é imposta. Divide-se em: b.1) Prevenção especial negativa: a pena tem como finalidade neutralizar o criminoso, afastando-o do convívio social. Assim ele não coloca em risco a segurança da sociedade. É criticada por ter levado historicamente à consequências consideradas desumanas, como utilização da pena de morte, a prisão perpétua e a utilização de medicamentos e métodos científicos experimentais. b.2) Prevenção especial positiva: a pena tem como finalidade ressocializar ou reintegrar o criminoso, de forma que ele não volte a cometer crimes e possa ter uma vida social normal. É critica porque não seria admitido ao Estado impor que o criminoso se ressocialize, no máximo poderia oferecer oportunidades e o criminoso aceitaria se quisesse. Todas as teorias preventivas (gerais e especiais) recebem crítica quanto à instrumentalização do homem, o que ofenderia a dignidade da pessoa humana, pois o criminoso é sempre visto como um meio para uma outra finalidade e não como um fim em si mesmo TEORIAS MISTAS, ECLÉTICAS OU UNIFICADORAS As teorias mistas afirmam que a pena tem diversas funções, como, por exemplo, punir o criminoso, prevenir a prática de crimes pela intimidação da população e ressocializar o criminoso. 107

108 16.3. ESPÉCIES DE PENA A Constituição Federal, no inciso XLVI de seu art. 5º, enumera as penas admitidas, deixando aberta, expressamente, a possibilidade de criação de novas modalidades de pena pelo legislador. Não pode o julgador, entretanto, criar novas modalidades de pena, sem previsão legal, como, por exemplo, obrigação de doar sangue ou de frequentar cursos, fora dos casos expressamente previstos (CP, art. 48, parágrafo único e LEP, arts. 115 e 152; Lei 11343/06, art. 28, III). Mesmo o legislador encontra limites na criação de penas, uma vez que o inciso XLVII do mesmo art. 5 veda a aplicação de penas de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento, cruéis e de morte, salvo, quanto à última, em caso de guerra declarada (CF, art. 84, XIX). São vedadas, também, penas que atentem contra a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1, III), ou contra direitos fundamentais como a proibição da tortura e tratamento desumano ou degradante (CF, art. 5, III), a liberdade de crença e o livre exercício do culto religioso (CF, art. 5, VI). É vedada, nessa linha, por exemplo, a imposição da obrigação de frequência à igreja como pena, uma vez que o direito fundamental em questão, em sua dimensão negativa, implica o direito de não ter crença e de não frequentar o culto. As penas previstas na legislação brasileira são classificadas, pelo art. 32 do CP, em: privativas de liberdade, restritivas de direito e de multa. O art. 21 da Lei 9.605/98, que dispõe sobre crimes ambientais, inova trazendo penas aplicáveis à pessoa jurídica: multa, penas restritivas de direitos e penas de prestação de serviços à comunidade PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Principal resposta penal desde o século XIX, a prisão é atualmente a mais difundida das penas. Apesar das inúmeras críticas quanto à sua eficácia, a pena privativa de liberdade ainda é tida como uma necessidade social, devendo, porém, ser reduzida aos casos mais graves e substituída, tanto quanto possível, por alternativas mais humanas e eficientes. A pena de prisão ou privativa de liberdade é o gênero de que são espécies a reclusão, a detenção e a prisão simples: a) Reclusão: apenas a reclusão: a.1) pode ser iniciada em regime fechado (CP, art. 33); a.2) enseja perda do pátrio poder, tutela ou curatela (CP, art. 92); a.3) não permitiria tratamento ambulatorial ao inimputável (CP, art. 97), o que veio, porém, a ser relativizado pela jurisprudência, como veremos ao tratar das medidas de segurança. Além disso, a concessão de fiança é mais restrita nos crimes apenados com reclusão (CPP, art. 323, I) e a possibilidade de decretação de prisão preventiva mais ampla (CPP, art. 313, I).

109 Também a interceptação telefônica somente é admissível para a investigação de crimes apenados com reclusão (Lei 9296/96, art. 2º, III). b) Detenção: não pode iniciar em regime fechado, mas apenas aberto e semiaberto. Entretanto, em caso de regressão de regime, o apenas pode ir para regime fechado. c) Prisão simples: a lei de contravenções penais prevê a pena de prisão simples, aplicável às contravenções (art. 5º da LCP). Conforme o art. 6º da LCP: A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semiaberto ou aberto. Conforme o 1º: O condenado a pena de prisão simples fica sempre separado dos condenados a pena de reclusão ou de detenção. Os regimes da pena privativa de liberdade serão vistos adiante em item próprio PENA DE MULTA A pena de multa consiste em condenação do criminoso à pagamento e quantia em dinheiro. Não se confunde com as penas restritivas de direito de prestação pecuniária e de perda de valores, embora estas também consistam em pagamento de quantia em dinheiro. Ela pode ser aplicada (a) isoladamente, como única pena, quando assim estiver cominada no tipo penal ou quando este permitir sua escolha pelo magistrado; e (b) cumulativamente com a reclusão, a detenção e a prisão simples, quando o preceito secundário do tipo prever sua aplicação juntamente com a privação de liberdade; e (c) em substituição à pena privativa de liberdade, cumulada ou não com penas restritivas de direitos. Nas hipóteses (a) e (c) a multa consiste em instrumento destinado a evitar o encarceramento por prazo de curta duração dos autores de ilícitos penais que não apresentem maior gravidade. Sua aplicação, pelo sistema dos dias-multa, será analisado adiante em item próprio. Importante: quando prevista em legislação especial aplicação cumulativa de pena privativa de liberdade e pena de multa, não se admite a substituição da primeira pela segunda (Súmula 171 do STJ). Multa não paga: a pena de multa não paga não pode ser convertida em pena privativa de liberdade, uma vez que, salvo as exceções previstas na Constituição Federal, não há prisão por dívidas no ordenamento jurídico brasileiro. O art. 51 do CP dispõe que Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição. Legitimidade para a execução da multa não paga: A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública (Súmula 521 do STJ). 109

110 PENA RESTRITIVA DE DIREITOS São sanções aplicadas como resposta ao cometimento de um crime e que restringem outros direitos, distintos da liberdade. Com a função de substituir as penas privativas de liberdade, as penas restritivas de direitos, como sistema, apareceram no ordenamento jurídico brasileiro tardiamente, com a Reforma Penal de Previstas no art. 43 do CP, elas são uma alternativa à imposição da pena privativa de liberdade no caso concreto, desde que presentes seus requisitos autorizadores. O art. 43 do CP prevê as seguintes modalidades de penas restritivas de direitos: I - prestação pecuniária; II - perda de bens e valores, IV - prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas; V - interdição temporária de direitos; VI - limitação de fim-de-semana. Capez subdivide-as em penas restritivas de direitos em sentido estrito, quando se tratar de restrição qualquer ao exercício de uma prerrogativa ou direito (inc. IV, V e VI), e penas restritivas de direitos pecuniárias, quando implicarem diminuição do patrimônio do agente ou prestação inominada em favor da vítima ou seus herdeiros (inc. I e II) 45. Outrossim, pode-se subdividir as penas restritivas de direitos em genéricas, que são aquelas que substituem as penas privativas de liberdade em qualquer crime, desde que satisfeitos os requisitos legais, e específicas, ou seja, aquelas que só substituem as penas privativas de liberdade impostas pela prática de determinados crimes (interdição temporária de direitos, salvo a pena de proibição de frequentar determinados lugares). Os requisitos necessários à substituição da pena privativa de liberdade serão analisados quando do estudo da aplicação da pena PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA Prevista no art. 45, 1.º, do CP, ela consiste no pagamento de determinado valor em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou à entidade pública ou privada com destinação social, à vista ou em parcelas. Sua finalidade é, pois, reparar o dano causado pelo crime, tanto que, se coincidentes os beneficiários, esse valor deverá ser deduzido da indenização cível. Noutros termos, trata-se de uma multa reparatória. Por isso, o valor só será destinado a uma entidade se não houver dano a reparar ou se não houver vítima imediata. A sanção, fixada pelo juiz, deve estar de acordo com o que for suficiente para a reprovação do delito, levando-se em conta a capacidade econômica do condenado e a extensão do prejuízo causado, bem como a reprovabilidade obtida após a análise do art. 59 do Código Penal. Outrossim, ela não pode ser inferior a um nem superior a 360 saláriosmínimos. Admite-se que o pagamento seja feito em ouro, joias, títulos mobiliários e imóveis, em vez de moeda corrente. Prestação inominada: tem natureza consensual. Consoante o art. 45, 2.º, do CP, a prestação pecuniária poderá consistir em prestação de outra natureza, como, por exemplo, entrega de cestas básicas a carentes, desde que haja aceitação pelo beneficiário. 44 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. v ed. São Paulo: Saraiva, pp CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

111 PERDA DE BENS E VALORES Prevista no art. 43, 3.º, do CP, consiste no confisco generalizado do patrimônio lícito do condenado, imposto como pena principal substitutiva da privativa de liberdade. Trata-se, pois, da decretação de perda de bens móveis, imóveis ou de valores, tais como títulos de crédito, ações, entre outros. Ao permitir a constrição dos bens do infrator sem o ônus de demonstrar sua origem ilícita, diferencia-se do confisco de bens previsto no art. 91 do CP, o qual constitui efeito secundário extrapenal da condenação e atinge bens e valores de natureza e origem ilícitas. Em regra, a perda é em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e o seu valor terá como teto o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou terceiro, em consequência da prática do crime. Por fim, não é possível que a perda dos bens e a prestação pecuniária estendam-se aos herdeiros até os limites da herança, ante o caráter personalíssimo da pena PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU A ENTIDADES PÚBLICAS É a atribuição de tarefas gratuitas ao condenado (art. 46, 1º, CP) junto a entidades assistenciais, hospitais, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, ou em benefício de entidades públicas (art. 46, 2.º, CP). Uma vez imposta, tem o condenado o dever de prestar determinada quantidade de horas de trabalho não remunerado e útil para a comunidade durante o tempo livre, em prol de pessoas necessitadas ou para fins comunitários, restando afastadas, desde logo, entidades privadas, a fim de se evitar seu locupletamento. As atividades atribuídas ao condenado devem guardar estreita correspondência com suas aptidões pessoais e não coincidir com a jornada normal de trabalho, de forma a não alterar sua rotina diária (art. 46, 3.º, CP). Objetiva-se, com isso, preservar o vínculo empregatício e as relações de trabalho e família do condenado. A carga horária é de uma hora por dia de condenação; mas, embora guarde relação com o tempo de duração da pena privativa de liberdade (art. 55, CP), nada impede que, sendo superior a um ano, a prestação seja cumprida em prazo menor, nunca inferior à metade do prazo da pena privativa de liberdade (art. 46, 4.º, CP). Essa espécie de restritiva não pode, porém, ser aplicada a penas inferiores a seis meses, o que é alvo de constantes críticas da doutrina. O início da execução da prestação de serviços dá-se com a intimação e comparecimento do condenado no dia, hora e local indicados, a fim de cumprir as tarefas. As entidades, a seu turno, devem remeter mensalmente ao juízo de execução relatórios circunstanciados das atividades desenvolvidas pelo condenado, ausências, ou outras (art. 150, LEP) INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS Gênero de pena restritiva de direitos por excelência, trata-se, em verdade, da única modalidade de pena restritiva que se traduz numa limitação da capacidade jurídica do condenado, destituindo-o de um ou mais direitos. Segundo art. 47, I a IV, do CP, as interdições temporárias podem ser as seguintes: a) Proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo: trata-se de pena específica, porque só pode ser aplicada ao crime cometido no exercício do 111

112 cargo efetivo ou função, com violação de deveres a ele inerentes (art. 56, CP), e desde que preenchidos os requisitos legais da substituição. b) Proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, autorização ou licença do Poder Público: também se trata de restritiva específica, pois só se aplica aos crimes cometidos no exercício da profissão ou atividade e se houver violação de deveres a elas relacionados, como, por exemplo, a profissão de médico, dentista, engenheiro, entre muitas. c) Suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo: para parte da doutrina, tal espécie encontra-se, atualmente, revogada pelo Código de Trânsito Brasileiro; porque, de acordo com seu art. 292, a suspensão ou proibição de se obter a habilitação pode ser imposta como penalidade principal, isolada ou cumulativamente com outra pena, devendo ter a duração de dois meses a cinco anos, e alcançando não apenas os delitos culposos de trânsito, mas também a direção em estado de embriaguez, a violação de suspensão ou proibição impostas e a participação em disputa não autorizada (racha). Alguns doutrinadores, porém, entendem que tal modalidade de pena restritiva subsiste quando a pena privativa de liberdade for aplicada por crime de trânsito excluído da incidência do CTB. d) Proibição de frequentar certos lugares: o inc. IV do art. 47 prevê a proibição de frequentar certos lugares, restrição cujo intuito é o de afastar o condenado de determinados locais que, tendo alguma relação com o fato praticado, possam dar ensejo à reincidência. e) Proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos: principalmente nos crimes previstos no art. 311-A do CP, que criou este inciso V do art. 47 do CP, durante o prazo de duração da pena privativa de liberdade substituída LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA Trata-se de uma prisão descontínua, com a intenção de evitar o afastamento do apenado de sua vida diária. Consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado (art. 93 da LEP) ou outro estabelecimento adequado. Durante esse período, poderão ser ministrados cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas (art. 48, par. único, do CP e art. 152 da LEP) OUTRAS RESTRIÇÕES DE DIREITOS A Lei 9.605/98, que dispõe sobre os crimes ambientais, trouxe, em seu art. 22, três novas figuras de penas restritivas de direitos aplicáveis às pessoas jurídicas: I - suspensão parcial ou total de atividades; II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade; III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 78, traz as seguintes penas: I - a interdição temporária de direitos; II - a publicação em órgãos de comunicação de grande circulação ou audiência, às expensas do condenado, de notícia sobre os fatos e a condenação; III - a prestação de serviços à comunidade.

113 A nova Lei de Drogas, a seu turno, inova ao prever, como penas previstas para o usuário, além da prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (Lei /06, art. 28) MEDIDAS DE SEGURANÇA As medidas de segurança são, ao lado da pena, espécie de sanção penal. A distinção fundamental entre pena e medida de segurança é que as penas são aplicadas aos imputáveis, enquanto as medidas de segurança são aplicáveis aos inimputáveis e, se necessário, aos semiimputáveis. Outrossim, ao contrário das penas, que têm caráter retributivo e/ou preventivo, com base na culpabilidade (juízo para o passado), as medidas de segurança têm natureza preventiva, fundamentando-se no pressuposto da periculosidade (juízo para o futuro), ou seja, buscam evitar que um sujeito que praticou um crime venha a cometer novas infrações penais. Estão previstas no art. 96 do CP: As medidas de segurança são: I - Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado; II - sujeição a tratamento ambulatorial. Se o agente é inimputável, há sentença absolutória imprópria: o juiz absolve e, em razão da periculosidade, aplica a medida de segurança; o semi-imputável, diferentemente, recebe sentença condenatória, mas o art. 98 do CP dispõe que necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação. Importante: O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado (Súmula 527 do STJ) SISTEMAS DE APLICAÇÃO a) Duplo binário: previsto no Código Penal de 1940, permite aplicação cumulativa de pena e a medida de segurança b) Vicariante: adotado pela Reforma Penal de 1984, vigente atualmente, não permite aplicação cumulativa de pena e medida de segurança. Aos imputáveis aplica-se a pena; aos inimputáveis, a medida de segurança; e aos semi-imputáveis, opta-se ou pela aplicação da pena reduzida, ou pela medida de segurança PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO a) Prática de fato previsto como crime: as medidas de segurança, tanto quanto as penas, somente podem ser impostas quando, respeitado o devido processo legal, com todas as garantias que lhe são inerentes, restar comprovado que o agente praticou um fato típico e ilícito. Assim, está vedada sua aplicação quando não houver provas de que o réu cometeu a infração penal ou quando estiver extinta a punibilidade, ainda que reconhecida a inimputabilidade por doença mental. b) Periculosidade do agente: é indispensável que se comprove a periculosidade do agente. Trata-se de um juízo de probabilidade, tendo por base a conduta antissocial e a anomalia 113

114 psíquica do agente, de que este voltará a delinquir. Há dois tipos de periculosidade previstos no Código Penal: a presumida, em se tratando de inimputável (art. 26, caput) e a real, reconhecida pelo juiz no caso de semi-imputável que necessita de especial tratamento curativo (art. 26, único). c) Ausência de imputabilidade plena: o agente imputável não pode, sob hipótese alguma, sofrer medida de segurança. O semi-imputável, a seu turno, só excepcionalmente estará sujeito à medida de segurança; porque, em regra, a ele deverá ser aplicada a pena privativa de liberdade, reduzida de 1/3 a 2/3, a qual só será substituída por medida de segurança caso reste comprovada a necessidade de internação ou de tratamento ambulatorial. Quando sobrevier doença mental ao condenado, porém, poderá ocorrer a substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança (art. 41, CP) ESPÉCIES DE MEDIDAS DE SEGURANÇA a) Medida detentiva (art. 96, I, do CP): consiste em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ou, na falta deste, em outro estabelecimento adequado, não se podendo entender como tal a penitenciária. A medida detentiva é aplicável tanto aos inimputáveis quanto aos semi-imputáveis que necessitam de especial tratamento curativo (art. 97, caput, e 98, CP). É obrigatória quando a pena prevista ao crime for de reclusão. 46 b) Medida restritiva (art. 96, II, do CP): consiste em sujeição a tratamento ambulatorial, no qual se darão ao agente cuidados médicos, sem que seja necessária sua internação. Para que seja aplicada, no entanto, o fato previsto como crime deve ser punido com detenção (art. 97 do CP) e, além disso, as circunstâncias fáticas e pessoais devem apontar para sua conveniência no caso concreto. Não obstante, a submissão ao tratamento ambulatorial não é imutável; pois, consoante o art. 97, 4.º, CP, mostrando-se necessária, sua conversão em internação pode ser determinada para fins curativos (art. 97, 4.º). Importante: não é a inimputabilidade ou a semi-imputabilidade que determina a aplicação de uma ou outra espécie, mas a natureza da pena privativa de liberdade (reclusão ou detenção) prevista para o delito cometido e as condições pessoais do agente PRAZOS DA MEDIDA DE SEGURANÇA As duas espécies de medidas de segurança têm duração indeterminada. Sua execução inicia-se com o trânsito em julgado da sentença, perdurando enquanto não for constatada, por perícia médica, a cessação da periculosidade. O prazo mínimo é previsto no art. 97, 1.º do CP: de um a três anos. Conforme o 2º: A perícia médica realizar-se-á ao termo do prazo mínimo fixado e deverá ser repetida de ano em ano, ou a qualquer tempo, se o determinar o juiz da execução. Há decisão no Supremo Tribunal Federal determinando que o prazo máximo da medida de segurança aplicada ao inimputável é de trinta anos, por analogia ao art. 75 do Código Penal (HC /RS, 1ª T., Dje 2009). De acordo com o STJ, O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado (Súm. 527). Extinção da punibilidade: o art. 96 do CP dispõe que as medidas de segurança não subsistem se extinta a punibilidade, de forma que todas as causas extintivas do art. 107 do CP são 46 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

115 aplicáveis, inclusive a prescrição. A questão que se impõe, nesse tocante, diz com a ausência de pena concretizada no caso de inimputável, havendo posições divergentes sobre se deve ser considerada a pena mínima ou máxima prevista abstratamente ao delito. Em se tratando de semiimputável, há uma sentença condenatória, na qual o juiz fixa a pena em concreto (que pode ser reduzida de um a dois terços, conforme art. 26, único, do CP). No entanto, se, em razão da sua condição, o condenado demonstrar necessitar de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela medida de segurança (art. 98 do CP). Como há uma pena fixada em concreto, será ela o marco para limitar o prazo prescricional. Por isso, é sempre imprescindível que se individualize a pena privativa do semi-imputável antes da aplicação da medida de segurança REVOGAÇÃO E EXTINÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA Comprovada por perícia médica a cessação da periculosidade, revoga-se a medida de segurança, determinando-se a desinternação, no caso de medida detentiva, ou a liberação, em caso de medida restritiva; aplicando-se, então, as condições próprias do livramento condicional (art. 178, LEP). Essa revogação, porém, é provisória, perdurando por um ano. Findo esse período sem que tenha havido qualquer fato indicativo da persistência da periculosidade, não necessariamente um crime, a medida de segurança será definitivamente extinta (art. 97, 4.º, CP) OUTRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS MEDIDAS DE SEGURANÇA a) Não se aplica ao menor de 18 anos, ao qual incide medida socioeducativa (nos termos do ECA). b) Súmula 525 do STF: A medida de segurança não será aplicada em segunda instância, quando só o réu tenha recorrido. Impossibilidade de reformatio in pejus COMINAÇÃO DA PENA Abstratamente, as penas podem ser cominadas de forma: a) isolada, prevendo a lei uma só pena; b) cumulativa, prevendo a lei a aplicação de pena privativa de liberdade e multa ou; c) alternativa, quando é deixada ao julgador a opção de aplicar pena privativa de liberdade ou multa. Quando as penas são cominadas alternativamente, a primeira operação a ser realizada é a escolha da pena aplicável, dentre as cominadas (CP, art. 59, I), o que deve ser fundamentado, sob pena de nulidade (STF, HC /MG, Ilmar Galvão, DJ ). Exemplifica-se com a ameaça (CP, art. 147) e 115

116 os crimes contra a ordem econômica previstos nos arts. 4º e 5º da Lei nº 8.137/90, aos quais são cominadas, de forma alternativa, detenção ou multa, caso em que a opção por aquela deverá ser fundamentada. Já na nova Lei de Drogas todas as penas podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa (Lei 11343/06, art. 27), o que confere bastante liberdade ao julgador, em caso de delitos cometidos para consumo pessoal. Os limites das penas privativas de liberdade são estabelecidos em cada tipo penal, no preceito secundário da norma incriminadora (CP, art. 53). As penas restritivas de direitos não são cominadas em cada tipo penal, mas genericamente, tendo natureza substitutiva (CP, art. 44), isto é, primeiro aplica-se a pena privativa de liberdade, depois, atendidos certos requisitos, substitui-se por restritiva de direitos. A sua duração, nos casos de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana é a mesma da pena privativa de liberdade, substituída, ressalvada e a possibilidade de cumprimento em período menor, nunca inferior à metade do tempo da pena privativa de liberdade (CP, art. 46, 4º). A pena de multa pode ser cominada originariamente (CP, art. 58, caput) ou ter natureza substitutiva (CP, art. 58, parágrafo único). Seus limites, em ambos os casos, são definidos no art. 49 do CP, salvo previsão em lei especial, como será visto no item dedicado à aplicação da pena de multa APLICAÇÃO OU FIXAÇÃO DA PENA Verificada a existência do crime ação típica, antijurídica e culpável e não excluída a punibilidade, deve o juiz aplicar a sanção penal prevista. Para tanto, deverá ele estabelecer, dentre as cominadas, a pena aplicável; a seguir, graduar a pena escolhida dentro dos limites legais, determinando também seu regime de cumprimento; e, por fim, perquirir sobre a possibilidade de substituição da pena ou de concessão da sua suspensão condicional (sursis). A individualização judicial da pena consiste na aplicação da pena prevista em abstrato pelo legislador no caso concreto, levando em conta as especificidades do fato criminoso. A aplicação da pena em sentença submete-se ao dever de fundamentação das decisões, sob pena de nulidade (art. 5º, IX, da CF) ELEMENTARES E CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO Como visto anteriormente, fatores que integram a descrição da conduta típica são chamados elementares do tipo, isto é, são os elementos essenciais à própria constituição da tipicidade se um deles não é verificado, não há crime. Existem, porém, fatores que não são essenciais à configuração do crime, mas interessam na aplicação da pena. São as chamadas circunstâncias do crime, que podem ser: circunstâncias judiciais, circunstâncias legais e causas de aumento e diminuição da pena, estas também denominadas majorantes e minorantes. Qualificadoras: as qualificadoras são elementos de um tipo derivado, ou seja, são circunstâncias do crime que se inserem no tipo base e geram um tipo penal independente. O tipo qualificado altera a própria pena em abstrato. Exemplo: o homicídio simples (tipo base: art. 121 do CP) tem pena de reclusão de 6 a 20 anos; o homicídio qualificado (tipo derivado: art. 121, 2º, do CP), tem pena de reclusão de 12 a 30 anos 116

117 Non bis in idem: qualquer característica do fato que conste como elementar ou qualificadora do crime não pode ser utilizada na medição da pena (circunstâncias judiciais, circunstâncias legais e causas de aumento e diminuição da pena), porque já houve sua valoração pelo legislador, ao estabelecer a figura típica (simples ou qualificada). Da mesma forma, considerada uma circunstância em uma das fases da aplicação da pena, esgota-se sua função, não se podendo utilizá-la novamente em qualquer outro momento. Trata-se do princípio ne bis in idem, ou seja, proibe-se a dupla valoração de um mesmo aspecto. Ademais, um fator que deveria ser considerado na segunda ou na terceira fase não pode integrar o cálculo da primeira fase, porque esta é preterida àquelas. 47 Na hipótese de haver, no caso concreto, duas qualificadoras, uma delas alterará os patamares da pena em abstrato e a outra será utilizada ou como agravante, se prevista na lei, ou como circunstância judicial APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE O Código Penal, em seu art. 68, consagrou o critério trifásico de fixação da pena: A penabase será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. A desobediência ao método trifásico, que garante a forma de individualização da pena ao réu, gera nulidade absoluta PRIMEIRA FASE: FIXAÇÃO DA PENA-BASE A PARTIR DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS (ART. 59 DO CP) Na primeira fase de aplicação da sanção penal, deve o juiz valorar as circunstâncias judiciais, previstas no art. 59 do CP, a fim de fixar, dentro do mínimo e do máximo de sanção previsto no preceito secundário dos tipos penais, a pena-base. Ela é o ponto de partida a partir do qual serão aplicadas as circunstâncias legais (agravantes ou atenuantes) e as causas de aumento e diminuição da pena (majorantes ou minorantes). Tendo em vista que elas são normalmente são fixadas por frações de aumento ou diminuição, é necessário um parâmetro inicial sobre o qual incidam esse parâmetro inicial é a pena-base CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS As circunstâncias judiciais são as oito previstas no art. 59 do Código Penal: O juiz, atendendo (1) à culpabilidade, (2) aos antecedentes, (3) à conduta social, (4) à personalidade do agente, (5) aos motivos, (6) às circunstâncias e (7) consequências do crime, bem como (8) ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crimes (sem numeração no original). Sua valoração é feita pelo julgador, de acordo com o caso concreto. São de duas ordens: subjetiva, que engloba a culpabilidade, os antecedentes, a conduta, a personalidade e os motivos, e objetiva, que são as circunstâncias e as consequências do fato e o comportamento da vítima. A lei não define quais devem ser consideradas favoráveis ou desfavoráveis ao réu, mas elas fornecem um 47 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado. Aplicação da Pena. 4. ed. Porto Alegre: Ajuris, p

118 roteiro para a identificação do homem concreto e de seu histórico, para que a censura pela prática do fato possa ser graduada segundo a culpabilidade de seu autor. Por isso, sua análise deve ocorrer sempre em relação a cada um dos acusados, separadamente, mesmo em caso de coautoria ou participação. a) Culpabilidade: a pena deve ser adequada ao grau de culpabilidade do agente. Cumpre ao juiz, portanto, avaliar o grau de reprovabilidade da conduta, de acordo com as condições pessoais do agente e as características do crime. Isso não significa que se deva levar em conta a gravidade da infração em si, porque esta já foi considerada para a escolha da natureza e dos limites da pena pelo legislador (Por exemplo: não se pode aumentar a pena-base de um homicídio com fundamento de que se trata de crime grave, que ofende ao bem jurídico vida; essa consideração já foi feita pelo legislador na cominação da pena em abstrato). Importa, na sua valoração, o conjunto de circunstâncias que tornam mais ou menos censurável a conduta do agente no caso concreto. Admite-se que se leve em conta, neste momento, a exigibilidade de conduta diversa, pois seria o único elemento da culpabilidade passível de ser mensurado. Também o grau de dolo e culpa podem ser considerados. b) Antecedentes: são todos os fatos penais pretéritos ao crime, praticados pelo réu. Não há consenso sobre o que pode configurar maus antecedentes. Parte da doutrina e da jurisprudência defende um conceito amplo, que inclui registros policiais e processuais ainda em curso, inquéritos arquivados e sentenças absolutórias por insuficiência de provas 48 ; outra parte da doutrina e da jurisprudência defende um conceito estrito, pelo qual são maus antecedentes tão somente na hipótese de crime ou contravenção cuja autoria já tenha sido reconhecida em sentença condenatória irrecorrível 49. O STJ adotou a segunda posição, conforme a Súmula 444: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. Maus antecedentes x reincidência: a reincidência é causa legal de aumento da pena (agravante) que, existindo no caso concreto, deve incidir na segunda fase de aplicação da pena, que veremos abaixo. A reincidência não pode ser considerada também mau antecedente, por imposição do princípio ne bis in idem. Mas se alguns fatos pretéritos da vida do réu se enquadrarem em maus antecedentes e outros em reincidência, podem ser considerados na primeira e segunda fase de aplicação da pena, respectivamente. Ademais, ao contrário da reincidência, que deixa de gerar efeitos cinco anos do término do cumprimento ou da extinção da pena, os efeitos negativos dos antecedentes não têm limite temporal em lei. Após os cinco anos, a reincidência passa a ser considerada mau antecedente. c) Conduta social: é o aspecto que reflete o indivíduo enquanto membro da sociedade. Sua valoração é sempre em relação à sociedade, na qual o acusado está integrado, consoante o modo pelo qual ele exerceu os papéis que lhe foram reservados (profissão, relacionamento familiar e social, entre outros). Por isso, sua prova, em geral, é oral, sob forma de testemunhas abonatórias. d) Personalidade: trata-se do perfil psicológico e moral do agente 50. Embora seja complexa a avaliação, pois o conceito pertence mais à ciências como a psicologia e psiquiatria, considera-se em sua valoração os dados sobre o nível de irritabilidade e violência do agente, a brutalidade incomum etc. 48 Por exemplo, Júlio Fabrini Mirabete. 49 Assim, Fenando Capez, Guilherme de Souza Nucci, Cezar Roberto Bitencourt. 50 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

119 e) Motivos do crime: são os fatores que animaram o agente a praticar o delito, ou seja, são os precedentes psicológicos do crime. Eles podem ser valorados como positivos, negativos, nobres ou vis. Quem age por sentimento altruísta deve receber reprimenda mais branda do que aquele que o faz por vingança, por exemplo. A motivação, porém, pode integrar a própria definição típica, assim como pode, ainda, ser uma qualificadora, majorante, minorante, agravante ou atenuante. Em todas essas hipóteses, os motivos não serão avaliados como circunstância judicial, porque não pode haver dupla valoração da mesma circunstância. f) Circunstâncias do crime: são as particularidades do fato, ou seja, todas as suas singularidades, todos os demais elementos, de ordem externa e interna, que cercaram o fato. Dizem respeito, portanto, à forma como ocorreu o crime. No crime de tráfico de entorpecentes, por exemplo, a qualidade e a quantidade da droga apreendida influem nessa circunstância. Em outras hipóteses, podem aqui influir o tempo, o local, os meios, a arma utilizada, entre outras. Há que atentar, porém, para a hipótese de alguma das circunstâncias (o uso de certos meios, por exemplo) do crime ser valorada na segunda ou terceira etapas do método trifásico, quando, então, sua análise deve ocorrer posteriormente. g) Consequências do crime: são as consequências que se projetam para além do fato típico. No homicídio, por exemplo, não se pode valorar negativamente as consequências em razão da morte da vítima, porque esse resultado é necessário para a própria configuração do crime. h) Comportamento da vítima: analisa o comportamento e a influência da vítima no crime, de forma a aumenta ou reduzir a resposta penal ao autor do fato punível, em razão de ter havido um especial estímulo ou desestímulo à prática delitiva. Para tanto, porém, há de ser demonstrado que o comportamento anterior da vítima estimulou ou influenciou de alguma forma o agente. Importante: a valoração de cada uma das circunstâncias judiciais exige fundamentação minuciosa; a simples menção aos critérios enumerados no art. 59 do CP não é suficiente CÁLCULO DA PENA-BASE O juiz não pode ultrapassar os marcos penais previstos em abstrato para a infração penal (no tipo simples ou qualificado, se for o caso). Ainda assim, com as circunstâncias judiciais abre-se um amplo espaço discricionário ao juiz para estabelecer a pena-base, a qual deve partir da pena mínima cominada ao tipo e ser a necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime (art. 59 do CP). A lei não define os critérios para sua fixação, mas a jurisprudência tem apontado os seguintes parâmetros: quando todas as circunstâncias judiciais forem valoradas em favor do réu a pena-base deve ficar no mínimo legal; caso todas as circunstâncias sejam desfavoráveis, a penabase deve aproximar-se do termo médio (razão da soma entre a pena mínima e máxima prevista em lei). Nos demais casos, a variação do números de circunstâncias, assim como a intensidade, deve colocar a pena mais próxima do mínimo ou do termo médio. As circunstâncias do art. 59 do CP são importantes não apenas para fixar a pena-base, elas são consideradas para a escolha da pena aplicável dentre as cominadas, para fixar o regime inicial 119

120 de cumprimento e, ainda, para avaliar a possibilidade de substituição da pena por outra espécie, nas hipóteses legais. Ademais, os artigos 77, inciso II, do CP e 89 da Lei 9.099/05 estabelecem que o sursis e a suspensão condicional do processo só serão aplicados se assim indicarem essas circunstâncias SEGUNDA FASE: FIXAÇÃO DA PENA PROVISÓRIA A PARTIR DAS CIRCUNSTÂNCIAS LEGAIS Na segunda fase do cálculo, são consideradas as atenuantes e as agravantes genéricas, previstas nos artigos 61 a 66 do CP, a fim de determinar a pena provisória. São genéricas porque estão todas previstas na parte geral do Código, sendo aplicáveis a todo delito. São, ainda, obrigatórias e, no caso das agravantes, o rol é taxativo CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES: Estão previstas nos arts. 61 e 62 do CP. Agravam a pena sempre que não constituem elementar ou qualificadora do crime. São as seguintes: a) Reincidência: prevista no art. 61, I, CP e conceituada no art. 63 do CP, verifica-se quando o agente que comete novo crime depois de transitar em julgado a sentença que, no país ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. Também considera-se reincidente quem pratica uma contravenção depois do trânsito em julgado de sentença condenatória por qualquer crime anterior, no Brasil ou no exterior, ou, ainda, nos termos do art. 7º da Lei de Contravenções Penais, quem pratica, no Brasil, uma contravenção depois do trânsito em julgado de uma sentença condenatória por outra contravenção penal. Havendo seu reconhecimento como agravante, a Súmula 241 do STJ determina que ela não poderá ela servir, simultaneamente, como circunstância judicial. Importante: a reincidência aplica-se aos crimes culposos. Duração de 5 anos. O art. 64 do CP estabelece que a condenação anterior não prevalece para fins de reincidência depois de cinco anos da data do cumprimento da pena, computando-se, nesse prazo, o período de prova do sursis ou do livramento condicional, se não tiver havido revogação do benefício. Ademais, a reincidência só se prova por certidão judicial da sentença condenatória transitada em julgado. Para fins de reincidência, não se consideram os crimes políticos e os crimes militares próprios, ou seja, aqueles previstos no Código Penal Militar sem descrição semelhante na legislação comum (deserção, insubordinação, ou outro). Casos em que não há reincidência. Não é reincidente aquele que nunca foi condenado anteriormente; o que já foi condenado por outro crime ou contravenção, quando o segundo fato não foi posterior à sentença com trânsito em julgado ou quando o fato anterior era uma contravenção e o posterior, um crime; e o réu que retornou à primariedade depois de transcorrido o lapso temporal de cinco anos. A sentença que concede o perdão judicial não induz à reincidência, mas a condenação somente à pena de multa, sim. Outros efeitos da reincidência: impede a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (em se tratando de reincidência de crime da mesma espécie art. 44, 3º, do

121 CP) ou multa e a concessão de sursis, se for por crime doloso; aumenta o prazo de cumprimento da pena para obtenção do livramento condicional e impede sua concessão quando for reincidência em crime da mesma espécie nos crimes hediondos; é causa obrigatória ou facultativa de revogação do sursis, dependendo da hipótese legal; é causa obrigatória de revogação do livramento condicional, se o agente é condenado à pena privativa de liberdade por crime cometido durante o período de prova; interrompe a prescrição da pretensão executória e aumenta seu prazo em 1/3; revoga a reabilitação quando a condenação posterior não for só de multa; impede o reconhecimento do privilégio nos crimes que o preveem; obriga o condenado a iniciar o cumprimento de pena em regime mais gravoso; impossibilita a transação penal nas infrações de menor potencial ofensivo; e impede a suspensão condicional do processo. b) Agravantes aplicáveis apenas aos crimes dolosos: São aquelas do art. 61, II, CP: a) por motivo fútil ou torpe: fútil é o motivo desproporcional, insignificante; torpe é o motivo que gera repugnância, como a vingança e a promessa de recompensa; b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou a vantagem de outro crime: pressupõem uma relação de conexidade com outro crime anterior, concomitante ou posterior; c) à traição, emboscada, dissimulação ou qualquer outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido: são hipóteses em que o agente quebra o dever de lealdade e colhe a vítima repentinamente, deixando-a sem condições de defender-se. Autoriza-se a interpretação extensiva para a identificação de outros meios equiparáveis àqueles enumerados exemplificativamente na lei. No homicídio, essas circunstâncias estão previstas como qualificadoras, de forma que não se aplicam como agravantes; d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum: meio insidioso é aquele potencialmente capaz de ocultar a danosidade da conduta do agente; cruel é o meio impiedoso, que causa intenso sofrimento à vítima. O legislador, aqui, adotou a mesma técnica da alínea anterior, permitindo sua interpretação extensiva; e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge: a maior reprovação da conduta decorre da quebra dos deveres de auxílio mútuo, fraternidade e respeito decorrentes dos laços de parentesco. A agravante, porém, não inclui a união estável, porque não se pode proceder a uma interpretação extensiva em desfavor do réu; f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou hospitalidade: aqui, a agravante fundamenta-se no fato de que o agente, diante de uma relação privada, quebra uma expectativa de fraternidade e assistência; g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão: nesses casos, há um desvio por parte de quem está obrigado a um respeito maior à lei, violando-a, a despeito disso, quando do exercício de determinada função; h) contra criança, maior de sessenta anos, enfermo ou mulher grávida: a agravação da pena decorre da menor capacidade de resistência da vítima em relação ao agente; i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade: agrava-se a pena, nessa hipótese, a fim de tutelar a integridade do indivíduo agredido e o respeito à autoridade pública; j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública ou de desgraça particular do ofendido: quem se aproveita da tragédia alheia para praticar crimes merece reprimenda penal mais intensa; l) em estado de embriaguez preordenada: aqui, diferentemente da embriaguez decorrente de caso fortuito ou de força maior, que isenta de pena, o agente resolve, deliberada e conscientemente, beber para criar a coragem necessária para praticar o crime. c) Agravantes em concurso de pessoas: previstas no art. 62 do CP, também tem a pena agravada quem: I - promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos 121

122 demais agentes (autoria intelectual); II - coage ou induz outrem à execução material do crime (coação e induzimento); III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade, ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal (instigação e determinação); IV - executa o crime, ou dele participa, mediante paga ou promessa de recompensa (motivo torpe). Importante: se previstas como qualificadoras ou se são elementares do tipo penal, as circunstâncias previstas nos arts. 61 e 61 do CP não incidem na segunda fase de aplicação da pena CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES Estão previstas nos arts. 65 e 66 do CP. As atenuantes genéricas necessariamente abrandam o rigor da pena. As hipóteses da lei não são taxativas, porque o art. 66 do CP permite ao juiz a atenuação da pena em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei. As atenuantes genéricas são: a) Réu menor de vinte e um anos, na data do fato, ou maior de setenta anos, na data da sentença: a menoridade é um aspecto da personalidade e, consoante a jurisprudência, é a circunstância legal genérica que prepondera sobre todas as outras. A prova da menoridade necessita de documento hábil (Súmula 74 do STJ). Normalmente é a certidão de nascimento. b) Desconhecimento da lei: o desconhecimento da lei, ao contrário do erro de proibição inevitável, com o qual não se confunde, não isenta o agente de pena (art. 21 do CP), mas permite nesta fase uma diminuição. c) Motivo de relevante valor social ou moral: o motivo social é o que se relaciona ao interesse coletivo; o moral, ao interesse particular. Ambos, por razões éticas, são fatores de abrandamento da pena. d) Evitação das consequências e reparação do dano: o agente que, por sua espontânea vontade e com eficiência, procura, após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou repara o dano antes da sentença de primeiro grau, tem sua pena atenuada, porque demonstrado seu arrependimento. Essas circunstâncias são distintas da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, porque ocorrem após consumação delitiva (o resultado já se produziu). e) Coação resistível, cumprimento de ordem de autoridade superior, ou influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima: são casos em que o agente podia ter resistido à coação, em que a ordem era manifestamente ilegal ou em que houve influência, mas não domínio, de violenta emoção. Em todos os casos, a conduta é típica, mas o nível de censura do agente é mais brando. f) Confissão espontânea: o réu não é obrigado a fazer prova contra si, daí decorrendo seu direito ao silêncio, sem que isso implique prejuízo à sua defesa. Valora-se positivamente, porém, a conduta daquele que confessa a autoria do crime perante a autoridade. Espontânea é a confissão produzida sem que tenha sido provocada, embora alguns

123 julgados tenham decidido pelo reconhecimento da atenuante independentemente de outros requisitos. A retratação, em juízo, da anterior confissão na fase de investigação, obsta a aplicação da atenuante da confissão espontânea, a não ser que a confissão retratada venha a ser considerada na fundamentação da sentença. Atenção: Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal (Súmula 545 do STJ). g) Influência de multidão em tumulto, se não o provocou: trata-se da influência das massas humanas sobre o comportamento do indivíduo, afetando sua boa compreensão da realidade. h) Atenuantes inominadas: o art. 66 do CP prevê, ainda, a possibilidade de ser atenuada a pena em razão de circunstâncias relevantes, anteriores ou posteriores ao crime, ainda que não previstas na lei. Assim, pode-se pensar em crimes praticados em estado de miserabilidade social, moléstia grave na família, confissões não abrangidas pela alínea f do art. 65 do CP etc CÁLCULO DA PENA PROVISÓRIA Para a fixação da pena provisória, o exame das agravantes deve preceder ao das atenuantes, para que se evite o risco de se fazer incidir uma atenuante caso a pena já esteja fixada no mínimo legal. Ao contrário das causas de aumento ou de diminuição de pena (majorantes e minorantes), as agravantes e atenuantes não têm prefixados seus quantitativos de influência na fixação da pena, de modo que o montante de aumento ou diminuição em razão delas fica à prudente discricionariedade do juiz. Na prática, o critério mais usual é o da compensação entre agravantes e atenuantes, sempre respeitado o limite quantitativo, quando for o caso, de 1/6 para cada uma dessas circunstâncias, porque é este o limite mínimo fixado para as majorantes e minorantes, cujos efeitos sobre a pena devem ser maiores. 51 Respeito ao limite mínimo e máximo da cominação legal: alteração da pena por influência das agravantes e atenuantes só pode ocorrer dentro dos limites mínimo e máximo cominados pelo preceito secundário dos tipos penais. Neste sentido, determina a Súmula 231 do STJ: A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. Por isso, se a pena-base já estava no mínimo legal, a presença de uma atenuante não ocasiona nenhuma modificação, pois ela não teria força para trazer a pena provisória abaixo do limite cominado CONCURSO ENTRE ATENUANTES E AGRAVANTES (CIRCUNSTÂNCIAS PREPONDERANTES) No caso de concurso entre atenuantes e agravantes, o art. 67 do CP determina que devem preponderar as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência (circunstâncias de caráter subjetivo), aproximando a pena do limite máximo. Ademais, a jurisprudência tem entendido que, apesar de não haver menção expressa, a menoridade prepondera sobre as demais. 51 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. v.1. 9.ed. São Paulo: Saraiva, p

124 TERCEIRA FASE: FIXAÇÃO DA PENA DEFINITIVA A PARTIR DAS CAUSAS DE AUMENTO E DE DIMINUIÇÃO A terceira e última fase do cálculo analisa as causas de aumento ou de diminuição (também chamadas de majorantes e minorantes), genéricas ou especiais, a fim de determinar a pena definitiva. A pena definitiva é aquela determinada a partir da incidência das majorantes e minorantes sobre a pena provisória. É a medida final da pena, cuja quantidade não será mais modificada. Mas ela poderá ser substituída por pena de outra espécie (art. 44 do CP) ou ter suspensa sua execução, mediante condições (art. 77 do CP) CAUSAS DE AUMENTO (MAJORANTES) E DE DIMINUIÇÃO (MINORANTES) Compõem o quadro de considerações finais do método trifásico. Ao contrário das agravantes e atenuantes, elas estão previstas tanto na parte geral como na parte especial do Código Penal. Identifica-se uma causa de aumento quando a lei prevê uma proporção de aumento ou diminuição da pena (1/2, 2/3, 1/6 etc. que podem aparecer ainda sob os termos dobro, metade etc.). Elas podem elevar a pena para além do máximo ou reduzi-la para aquém do mínimo previsto no preceito secundário. Causas de aumento genéricas: previstas na parte geral e aplicáveis a todos os crimes. Exemplos: o concurso formal (art. 70, CP); a continuidade delitiva (art. 71, CP). Causas de aumento específicas: previstas na parte especial e aplicáveis apenas aos crimes as quais estão vinculadas. Exemplos: o fato de ser a vítima de homicídio doloso menor de catorze ou maior de sessenta anos (art. 121, 4º, CP); a condição de funcionário público nos crimes contra a honra, se eles se deram em razão de suas funções (art. 141, II, CP); o período de repouso noturno no furto (art. 155, 1º, CP) e o emprego de arma e o concurso de pessoas no roubo (art. 157, 2º, CP); de diminuição, a tentativa (art. 14, II, CP); o arrependimento posterior (art. 16, CP); a participação de menor importância (art. 29, 1º, CP); o motivo de relevante valor social ou moral no homicídio (art. 121, 1º, CP); o privilégio no crime de furto (art. 155, 2º, CP); e a delação eficaz na extorsão mediante sequestro (art. 159, 4º, CP). Causas de diminuição genéricas: previstas na parte geral e aplicáveis a todos os crimes. Exemplos: tentativa (art. 14 do CP), erro de proibição evitável (art. 21, segunda parte, do CP). Causas de diminuição específicas: previstas na parte especial e aplicáveis apenas aos crimes as quais estão vinculadas. Exemplo: cometimento de homicídio por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima (art. 121, 1º, do CP) CÁLCULO DA PENA DEFINITIVA No cálculo da pena definitiva, aplicam-se as causas de aumento e as de diminuição, no sistema de cascata, que leva em conta sempre a última pena encontrada. Isso significa que o cálculo da primeira modificação é feito sobre a pena provisória, mas, havendo uma segunda causa de aumento ou de diminuição, sua incidência se dá sobre a última pena já alterada por influência da anterior causa de aumento ou de diminuição. Em decorrência, as majorantes não podem ser compensadas pelas minorantes e vice-versa.

125 Quando a causa de aumento ou diminuição permitir margem de opção, terá o juiz relativa discricionariedade para fixar o quantum da sua incidência. Com relação a algumas dessas causas, porém, a jurisprudência tem fixado critérios objetivos. Na tentativa, por exemplo, tem-se usado a redução de um a dois terços de acordo com a maior ou menor proximidade da consumação do delito. Por fim, dispõe o parágrafo único do art. 68 do CP que no concurso, entre si, de várias causas de aumento ou várias causas de diminuição previstas na parte especial, deve o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou mais diminua. Se há duas majorantes ou minorantes, uma prevista na parte geral e outra na parte especial, todas elas devem ser aplicadas (no sistema de cascata) FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE A fixação da pena definitiva determina o quantum de pena, mas não exaure o processo de individualização judicial da sanção penal. Deve-se ainda determinar o regime de execução da pena de prisão, que pode ser fechado, semiaberto ou aberto, conforme dispõe o art. 33 do CP. Os fatores fundamentais para a determinação do regime inicial são a espécie e a quantidade de pena aplicada e a reincidência, os quais se somarão à análise das circunstâncias judiciais. Com efeito, existem hipóteses em que a quantidade de pena ou a lei especial impõem, obrigatoriamente, a fixação de determinado regime, como ocorre nos crimes de tortura ou decorrentes de organização criminosa. O regime inicial das penas privativas de liberdade deve sempre integrar a sentença (art. 59, III, do CP), mesmo que a pena venha a ser substituída ou suspensa, porque poderá haver a conversão ou revogação da medida alternativa (art. 45 do CP). Por isso, sua ausência acarreta nulidade parcial da decisão. Importante ressaltar que, por se tratar de um sistema progressivo, o regime inicial imposto é sempre provisório, porque sujeito à progressão e à regressão de regime, matérias de execução penal RECLUSÃO, DETENÇÃO E PRISÃO SIMPLES A pena de reclusão pode ser iniciada em qualquer dos três regimes; a detenção não pode iniciar em regime fechado, mas apenas semiaberto ou aberto (art. 33, caput, do CP), mas o agente pode vir a cumprir a pena em regime fechado em caso de regressão. Já a pena de prisão simples, prevista na Lei de Contravenções Penais, deve ser executada sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semiaberto ou aberto (art. 6º da LCP), não se admitindo o regime fechado nem mesmo em caso de regressão REGRAS PARA FIXAÇÃO DO REGIME As regras gerais para aplicação do regime inicial estão previstas no 2º do art. 33 do CP: a) Regime inicial fechado (alínea a): pena de reclusão superior a 8 anos. 125

126 b) Regime inicial semiaberto (alínea b): pena de reclusão superior a 4, mas inferior a 8 anos, ou pena de detenção superior a 4 anos. c) Regime inicial aberto (alínea c): pena de reclusão ou de detenção igual ou inferior a 4 anos. Reincidência. Em se tratando de reincidente, diz a lei que o regime inicial fechado é obrigatório. No entanto, a Súmula 269 do STJ estabelece que, mesmo nesses casos, o juiz poderá fixar o regime inicial semiaberto quando a pena privativa de liberdade imposta não exceder a quatro anos e as circunstâncias judiciais forem favoráveis. Observe-se que a Súmula exige que a pena seja inferior a 4 anos, o que para réus não reincidentes é o critério temporal para aplicação do regime aberto. Em síntese, entende-se que ao reincidente poderá ser aplicado o regime de cumprimento imediatamente mais grave que aquele permitido em razão do critério temporal. O julgador pode impor regime mais grave a partir da análise das circunstâncias do art. 59 do CP, mas quando impuser regime de cumprimento mais severo do que aquele indicado pelo critério temporal, deverá motivar a decisão de maneira idônea, não se considerando como tal sua opinião pessoal sobre a gravidade em abstrato do delito (Súmulas 718 e 719 do STF e 440 do STJ). Importante destacar que, com a Lei n.º /12, o juiz da sentença é quem deve aplicar a detração para fins de fixação do regime inicial de fixação da pena, como está o art. 387, 2º, do CPP. Importante: o Supremo Tribunal Federal, no HC n.º /ES, julgado em 2012, declarou inconstitucionalidade da necessidade de regime inicial fechado para os crimes hediondos, mesmo após o advento da Lei n.º /07. Assim, deve-se seguir os critérios gerais para fixação do regime SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Fixada a pena privativa de liberdade e seu regime de execução, deve a sentença, a seguir, enfrentar a possibilidade de sua substituição por penas restritivas de direitos ou por multa. Conforme o art. 44 do CP a substituição está condicionada à determinados pressupostos objetivos e subjetivos, os quais devem estar presentes simultaneamente no caso concreto REQUISITOS OBJETIVOS (ART. 44, I, DO CP): a) Natureza do crime: se o crime é culposo, qualquer que seja o tempo de pena aplicada, é sempre possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos;se o crime é doloso, torna-se necessário analisar a presença dos demais requisitos. b) Quantidade da pena privativa de liberdade aplicada: como dito, nos crimes culposos não importa a quantidade de pena aplicada, sempre é possível a substituição. Nos crimes dolosos a pena privativa de liberdade não pode ser superior a quatro anos, seja ela de reclusão ou de detenção. O máximo de quatro anos refere-se à pena concretizada, em definitivo, na sentença, e não à pena prevista em abstrato no tipo penal. Na hipótese de concurso de crimes, discute-se se, para fins de substituição, as penas privativas de liberdade deverão ser somadas para o fim de preencher o requisito do limite de pena ou se deverão ser consideradas de forma isolada. A posição mais aceita, entretanto, é de que a substituição somente será possível se, do somatório resultante do concurso de crimes, a pena total não ultrapassar quatro anos. 126

127 c) Ausência de violência ou grave ameaça à pessoa: nos crimes dolosos, além da pena definitiva não superior a quatro anos, o crime tem de ser cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa. Há exceções: os crimes como o de lesões corporais leves, constrangimento ilegal e ameaça, embora sejam cometidos com violência ou grave ameaça, autorizam a substituição da pena, porque são delitos de menor potencial ofensivo. Com efeito, se admitem a transação penal e a suspensão condicional do processo, medidas penais alternativas impostas antes mesmo da instauração do processo, não haveria razão para impedir sua substituição na sentença final. Ademais, a violência contra a coisa, presente, por exemplo, no crime de furto qualificado com rompimento de obstáculo, não se enquadra nessa restrição, a qual exige violência contra a pessoa. Frisa-se que, sendo o crime culposo, admite-se a substituição ainda que tenha havido emprego de violência ou grave ameaça, como é o caso do homicídio culposo e das lesões corporais culposas REQUISITOS SUBJETIVOS (ART. 44, II E III, DO CP) a) Réu não reincidente em crime doloso (art. 44, II, do CP): aquele que, depois de ter sido definitivamente condenado pela prática de crime doloso, comete novo crime doloso, fica impedido de beneficiar-se da substituição. Contudo, preceitua o 3º do mesmo artigo que, mesmo na hipótese de ser o condenado reincidente, pode o magistrado aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não tenha se operado em virtude do mesmo delito. Portanto, somente a reincidência específica (no mesmo crime) constitui impedimento absoluto para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Nos demais casos de reincidência, substituição é possível, desde que satisfeitos os demais requisitos legais e que a medida seja é socialmente recomendável no caso concreto. b) Suficiência da substituição (art. 44, III, CP): os critérios para a avaliação da suficiência da substituição são culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do condenado, motivos e circunstâncias do fato. Trata-se das circunstâncias judiciais subjetivas do art. 59 do CP. As de natureza objetiva, ou seja, as consequências do crime e o comportamento da vítima, não foram consideradas parâmetros para o juízo de suficiência da pena alternativa REGRAS DE SUBSTITUIÇÃO Por seu caráter substitutivo, a pena restritiva de liberdade terá a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída, à exceção do 4º do art. 46 do CP. Além disso, de acordo com o 2º do art. 44 do CP, a quantidade de pena privativa de liberdade influirá na determinação da pena substitutiva a ser imposta. Na condenação à pena igual ou inferior a um ano, a substituição poderá ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; não podendo haver, porém, cumulação de ambas. Se for inferior a seis meses, dentre as penas substitutivas não se poderá aplicar a de prestação de serviços à comunidade (art. 46, CP). Caso a pena privativa de liberdade aplicada seja superior a um ano, poderá ela então ser substituída por uma pena restritiva de direitos cumulada com multa (calculada em dias-multa) ou por duas restritivas de direitos. 127

128 CONVERSÃO EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Diferentemente da pena de multa, as penas restritivas de direitos, inclusive as de natureza pecuniária, admitem conversão em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta, conforme dispõe o art. 44, 4º, CP. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar, será deduzido o tempo cumprido da restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão. Por fim, sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade por outro crime, caberá ao juiz da execução penal decidir pela subsistência da pena restritiva, o que será possível sempre que seu cumprimento for compatível com a nova sanção (art. 44, 5º, CP) SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE (SURSIS) Fixada a pena privativa de liberdade na sentença e não cabível, ou não indicada a substituição por restritivas de direitos, poderá ainda ser aplicado o sursis (art. 77 e ss. do CP). A pena privativa de liberdade é suspensa por determinado tempo, chamado período de prova, durante o qual o condenado deve sujeitar-se a algumas condições previstas em lei. Finalizado o prazo sem que tenha sobrevindo causa de revogação do benefício, a pena é extinta. A análise do cabimento da suspensão condicional da pena privativa de liberdade tem caráter residual, sendo precedida pela avaliação sobre a substituição por restritiva de direitos, que é, em tese, mais benigna ao condenado (art. 77, III, CP, c/c art. 44, CP). Conforme o art. 80 do CP, as penas restritivas de direitos e a pena de multa não podem ser suspensas. Preenchidos todos os requisitos legais, o sursis constitui direito público subjetivo do réu, não sendo possível ao juiz negar-lhe sua concessão. 52 O réu pode não concordar com as condições impostas e optar pelo cumprimento da pena privativa de liberdade. A revelia do réu, porém, não impede a suspensão. Ademais, deve o juiz obrigatoriamente se manifestar sobre ele, sob pena de nulidade parcial, sempre que a pena aplicada for inferior a dois anos REQUISITOS Estão previstos no art. 77 do CP: a) Quantidade da pena privativa de liberdade aplicada:: a pena fixada na sentença não pode ser superior a dois anos. A suspensão é possível mesmo no caso de concurso de crimes, mas a jurisprudência tem entendido que, para efeito de consideração do limite quantitativo da pena, não se despreza o acréscimo pelo concurso formal, material etc. Considera-se a pena definitiva. O 2º do art. 77 prevê que, caso seja o condenado maior de setenta anos à data da sentença concessiva ou tenha problemas de saúde que justifiquem a suspensão, ela pode ser concedida se a pena for inferior a quatro ano. Na hipótese de crime contra o meio ambiente, admite-se o benefício desde que a pena privativa de liberdade não exceda a três anos (Lei n /98, art. 16). 52 MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

129 b) Não reincidência em crime doloso: de acordo com o inciso I do art. 77, o réu não pode ser reincidente em crime doloso. Logo, se um dos crimes foi culposo ou se o crime anterior foi contravenção penal, não há óbice à concessão da suspensão condicional, assim como a condenação anterior a pena só de multa, ainda que por crime doloso, também não a impede, a teor do art. 77, 1º, CP e da Súmula 499 do STF. c) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos e as circunstâncias do crime devem ser favoráveis, autorizando, assim, a concessão do benefício. Como se vê, o inciso II do art. 77 do CP trata das circunstâncias judiciais do art. 59, à exceção das consequências do crime e do comportamento da vítima. d) Impossibilidade da substituição da pena por restritivas de direitos: o inciso III do art. 77 aponta para o caráter residual do sursis, que só pode ser concedido caso não tenha sido possível a anterior substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos ESPÉCIES a) Sursis simples ou comum: é aquele que, preenchidos os requisitos do art. 77 e seus incisos, suspende o processo pelo prazo de dois a quatro anos, impondo-se ao réu condições que devem ser cumpridas. Determina o 1º do art. 78 do CP que, no primeiro ano do prazo, o condenado deverá, obrigatoriamente, prestar serviços à comunidade ou submeter-se à limitação de fim de semana. As demais condições devem ser fixadas pelo juiz de forma adequada ao fato e à situação pessoal do condenado (art. 79 do CP), não podendo ser vexatórias nem ociosas. b) Sursis especial: é a hipótese excepcional prevista no art. 78, 2º, do CP. Permite substituir a exigência do 1º: aplicação da prestação de serviços à comunidade ou limitação de fim de semana. Para que haja a substituição, entretanto o réu deve ter preenchido todos os requisitos gerais exigidos para o sursis simples e, ainda, reparado o dano, salvo impossibilidade de fazê-lo. Além disso, todas as circunstâncias do art. 59 devem militar em seu favor. Satisfeitos esses pressupostos, o magistrado pode substituir as exigências do sursis simples, impondo ao condenado, de forma cumulativa: a proibição de frequentar determinados lugares e de ausentar-se da comarca onde reside sem autorização do juiz e a obrigação de comparecer pessoal e mensalmente ao juízo para informar e justificar suas atividades. c) Sursis etário: concedido ao réu maior de setenta anos à data da sentença concessiva, desde que a pena privativa de liberdade não seja superior a 4 anos. O período de prova também é maior, de quatro a seis anos. Previsto no 2º do art. 77. d) Sursis humanitário: concedido ao réu que tem problemas de saúde que justifiquem a suspensão, independentemente da idade. A pena aplicada deve ser inferior a 4 anos. O período de prova também é maior, de quatro a seis anos. Previsto no 2º do art

130 PERÍODO DE PROVA Período de prova é o tempo pelo qual o processo fica suspenso com exigência de que o réu cumpra as condições estabelecidas. Findo este prazo sem revogação, extingue-se a pena privativa de liberdade (art. 82 do CP). O período de prova é: a) Sursis normal e especial: de 2 a 4 anos b) Sursis etário e humanitário: de 4 a 6 anos c) Sursis em contravenção: de 1 a 3 anos (art. 11 da LCP) A determinação no caso concreto deve atentar para a natureza do crime, a personalidade do agente e a intensidade da pena. O prazo começa a correr depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, a contar da audiência admonitória prevista no art. 160 da LEP. Trata-se de formalidade em que o réu será cientificado das condições a serem observadas e advertido das consequências do seu descumprimento REVOGAÇÃO E PRORROGAÇÃO DO SURSIS a) Revogação obrigatória: as hipóteses estão previstas nos incisos I, II e III do art. 81 do CP e são quando o beneficiário do sursis: é condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso; frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem motivo justificado, a reparação do dano; descumpre a condição de prestar serviços à comunidade ou submeter-se à limitação de fim de semana no primeiro ano do período de prova (prevista no 1º do art. 78 do CP). b) Revogação facultativa: as hipóteses estão previstas no 1º do art. 81 do CP: se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é irrecorrivelmente condenado, por crime culposo ou por contravenção, a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos. A revogação fica a critério do juiz, que, em vez de decretá-la, pode optar por prorrogar o período de prova. A decisão que opta por revogar deve ser fundamentada. c) Prorrogação do período de prova: as hipóteses estão previstas nos 2º e 3º do art. 81 do CP: 2º - Se o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção, considera-se prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo. Não basta a existência de inquérito, porque o processo penal só surge com o recebimento da denúncia ou queixacrime. A revogação é obrigatória e automática, decorrente da lei, e se estende até o julgamento definitivo do novo processo, mas com ela não subsiste a obrigação de cumprir as condições impostas º - Quando facultativa a revogação, o juiz pode, ao invés de decretá-la, prorrogar o período de prova até o máximo, se este não foi o fixado. No segundo caso, é uma alternativa à revogação facultativa, e só existe quando o período de prova não tiver sido fixado no seu limite máximo. Nela, todas as condições impostas na sentença, à exceção daquelas específicas do primeiro ano de prova, continuam vigentes.

131 A revogação do sursis deve ocorrer por meio de procedimento judicial, na vara de execuções, em que se garanta o devido processo legal, com contraditório e ampla defesa, ao réu. O Ministério Público deve ser ouvido previamente acerca da extinção do sursis, sob pena de nulidade. 53 O STF e o STJ tem entendimento de que, por ser automática a suspensão obrigatória, considera-se revogado no momento da condenação por crime doloso, ainda que o juiz da execução tome conhecimento apenas após expirado o período de prova. Efeito da revogação: com a revogação, ao contrário do que ocorre com a conversão das penas restritivas de direitos, obriga-se o sentenciado a cumprir integralmente a pena suspensa, independentemente do tempo de prova já decorrido APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA O Código Penal adota o sistema de dias-multa na cominação da pena de multa, o qual se compõe de duas fases distintas. Primeiramente se determina o número de dias-multa aplicável; em seguida se determina o valor pecuniário de cada dia-multa. Multiplicando-se o número de diasmulta pela importância em dinheiro que representa o valor diário, obtém-se a multa a ser paga pelo condenado. O sistema busca individualizar a pena tendo em vista a gravidade do delito e, principalmente, a capacidade socioeconômica do condenado (art. 60 do CP) PRIMEIRA FASE: FIXAÇÃO DO NÚMERO DE DIAS-MULTA A multa é calculada em dias-multa. Os limites estão previstos no art. 49 do CP: mínimo de 10 (dez) e máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. A incidência desse dispositivo é genérica, ou seja, aplica-se a todos os crimes previstos na parte especial sancionados com multa e, também, a todos aqueles previstos em lei especial, desde que não haja sistema próprio de mensuração. A fixação deve levar em consideração principalmente a condição socioeconômica do condenado, mas também a gravidade do crime praticado SEGUNDA FASE: VALOR DO DIA-MULTA O julgador arbitrará a cada dia-multa determinado valor pecuniário, dentro dos limites mínimo e máximo previstos pelo legislador no art. 49, 1º, CP: o valor mínimo do dia-multa é de 1/30 do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo dos fatos; o valor máximo do dia-multa é a cinco vezes o maior salário mínimo mensal vigente ao tempo dos fatos. O montante de cada diamulta serve exclusivamente para ajustar a pena à respectiva capacidade socioeconômica do condenado. Assim, a duas pessoas acusadas pelo mesmo fato, com idêntico grau de culpabilidade, será aplicada a mesma quantidade de pena, ou seja, o mesmo número de dias-multa, mas o valor unitário a que corresponderá o dia-multa poderá ser diferente para cada um. Nessa linha, se o juiz considerar, em virtude da situação econômica do réu, que a multa, embora aplicada no máximo, ainda lhe é ineficaz, poderá ser ela elevada até o triplo, conforme art. 60, 1º, do CP. 53 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p

132 Multa substitutiva. O art. 60, 2º, dispõe que A pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 (seis) meses, pode ser substituída pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44 deste Código. O critérios são a não reincidência em crime doloso e que as circunstâncias do art. 59 do CP indiquem que a substituição é suficiente. Dívida de valor. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se a ela as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública e não se podendo convertê-la em pena privativa de liberdade (art. 51, CP), embora se possa suspendê-la se sobrevém ao condenado doença mental (art. 52, CP) PAGAMENTO DA MULTA O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária (art. 49, 2º, do CP). Ademais, conforme art. 50 do CP: A multa deve ser paga dentro de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença. A requerimento do condenado e conforme as circunstâncias, o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais. O 1º dispõe que: A cobrança da multa pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou salário do condenado quando: a) aplicada isoladamente; b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos; c) concedida a suspensão condicional da pena. O desconto, entretanto, não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família ( 2º) CONCEITO Condenação é o ato do juiz que considera existente um crime e atribui sua prática a um determinado sujeito. A condenação tem efeitos principais e secundários. a) Principal: é a imposição de pena (privativa de liberdade, restritiva de direitos ou multa) ou de medida de segurança. b) Efeitos secundários ou acessórios: são outros efeitos gerados pela condenação, além da imposição da pena ou medida de segurança. Podem ser de natureza penal ou extrapenal. 132 b.1.) Efeitos secundários penais: repercutem na própria esfera penal. Assim, a condenação induz a reincidência; em regra, impede ou dá causa à revogação do

133 sursis; é causa de revogação do livramento condicional; aumenta o prazo da prescrição da pretensão executória e a interrompe quando caracterizar a reincidência; causa a revogação da reabilitação e leva à inscrição do nome do condenado no rol de culpados (após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória). 55 b.2) Efeitos secundários extrapenais: são aqueles que afetam o condenado em outras esferas do direito. Quando se fala de efeitos da condenação, comumente é a estes efeitos que se está referindo. Portanto, são eles que analisaremos na sequência (os efeitos principal e secundários de natureza penal já foram analisados acima) EFEITOS SECUNDÁRIOS EXTRAPENAIS Como referido anteriormente, são aqueles que repercutem em outra esfera, que não a penal (cível, administrativa, trabalhista, entre outras). Estão previstos nos arts. 91 e 92 do CP e dividem-se em genéricos e específicos EFEITOS EXTRAPENAIS GENÉRICOS (ART. 91 DO CP) São efeitos automáticos de qualquer condenação criminal, não necessitando de expressa declaração na sentença TORNAR CERTA A OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO CAUSADO PELO CRIME (REPARAÇÃO EX DELICTO) A sentença penal condenatória irrecorrível faz coisa julgada no juízo cível, valendo como título executivo para a reparação do prejuízo. Não será necessário, portanto, rediscutir a culpa do agente causador do dano. Não sendo a obrigação de reparar o dano uma pena, mas simples efeito da condenação, ela se transmite aos herdeiros até os limites da herança. O art. 387, IV, do CPP dispõe que, na sentença condenatória, o juiz fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Entretanto, a vítima ou seus sucessores não são obrigados a aguardar o fim da ação penal, podendo buscar o ressarcimento desde logo, mediante a competente ação cível ex delicto. A sentença absolutória também não impede a propositura da ação indenizatória em juízo cível, a menos que o fundamento da absolvição seja a inexistência material do fato ou o reconhecimento de que o réu não foi seu autor (art. 935 do CC). Da mesma forma, a extinção da punibilidade depois do trânsito em julgado da sentença não afasta a obrigação de indenizar CONFISCO, PELA UNIÃO, DOS INSTRUMENTOS E PRODUTOS DO CRIME Trata-se da perda ou privação de bens do particular em favor do Estado, em razão da prática de um crime; não abrangendo, portanto, as contravenções penais. O confisco pode recair 55 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

134 sobre os instrumentos do crime, ou seja, objetos, coisas materiais empregadas para a prática do delito, ou sobre seus produtos, que são vantagens, bens e valores que representem proveito, direto ou indireto, auferido pelo agente com a prática criminosa. O confisco só pode ocorrer em relação aos instrumentos do crime quando o fabrico, uso, alienação, porte ou detenção do bem constitua fato ilícito (art. 91, II, a, CP). Ademais, não pode que pertençam a quem dela participou, porque o terceiro de boa-fé e o lesado não podem ser prejudicados. A possibilidade de confisco prescreve com a condenação, mas não se suspende com a concessão do sursis. A Lei n.º /12 acrescentou dois parágrafos ao art. 91 do CP, que agora permite ao juiz decretar a perda de bens e valores lícitos do réu equivalentes ao produto do crime, durante o processo ou ao seu final, desde que não encontrados ou que estejam no exterior o produto ou proveito do crime SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS, ENQUANTO DURAR A EXECUÇÃO DA PENA Esse efeito da condenação está previsto no art. 15, III, da CF e dele trata a Súmula 9 do TSE: A suspensão de direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos. Em síntese, enquanto durar a pena, o condenado é privado de seus direitos políticos, não podendo exercer nem mesmo seu direito de voto. A extinção da pena faz cessar esse efeito EFEITOS EXTRAPENAIS ESPECÍFICOS (ART. 91 DO CP) Decorrem da condenação penal pela prática de determinados crimes, em hipóteses específicas. Devem ser devidamente fundamentados na sentença condenatória e não se confundem com a interdição temporária de direitos, modalidade de pena restritiva de direitos. Os efeitos específicos não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença ( único) PERDA DE CARGO, FUNÇÃO PÚBLICA OU MANDATO ELETIVO Há duas hipóteses para a perda: A primeira (art. 92, I, alínea a) delas é a condenação à pena privativa de liberdade igual ou superior a um ano, sendo necessário, nesse caso, que o agente tenha de alguma forma abusado de seu poder ou violado dever para com a Administração Pública inerente ao cargo, função ou mandato. A perda do cargo, função pública ou mandato eletivo incide não apenas nos crimes funcionais (art. 312 a 326 do CP) e em outros crimes cometidos por funcionários públicos, mas também em outros desde que praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública, mas não se o agente agiu como particular MIRABETE, Julio Fabbrini; MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do CP. 26 ed. São Paulo: Atlas, p. 338; GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, p

135 A segunda hipótese (art. 92, I, alínea b) é a de condenação à pena privativa de liberdade superior a quatro anos, por qualquer crime. Nesse caso, houve a prática de crime comum, e condenação a pena maior do que quatro anos pode ensejar, se fundamentada em sentença, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo. Como se nota, apenas são efeitos em caso de condenação a pena privativa de liberdade, de forma que a aplicação apenas de pena de multa não permite produção deste efeito. Em qualquer dos casos, nada impede que, reabilitado, haja uma ulterior investidura em outro cargo, função ou mandato INCAPACIDADE PARA O EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR, TUTELA OU CURATELA Exige três requisitos: crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado. Assim, crimes como o de exposição ou abandono de recém-nascido, porque punidos com detenção, não ensejam tal efeito. Ademais, a incapacidade não decorre automaticamente da condenação, devendo ser declarada, com motivação, na sentença. Exige-se, assim, o exame do caso concreto, reservando-se tal efeito aos crimes de maior gravidade, dos quais resulte a incompatibilidade com o exercício do poder familiar. A perda do poder familiar é permanente com relação ao filho, tutelado ou curatelado ofendido pelo crime, ainda que haja reabilitação. Mas em relação aos demais filhos, tutelados ou curatelados poderá ser excluída pela reabilitação INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO Tem dois requisitos: crime doloso e veículo utilizado como meio para o crime. A perda de habilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso, constitui efeito administrativo, embora também de natureza civil, da condenação. Não se confunde com a pena de suspensão de permissão, autorização ou habilitação para dirigir prevista em crimes culposos no trânsito (arts. 302 e 303 do CTB). Aqui é preciso que o veículo tenha sido usado para fins ilícitos, como meio para realizar crime doloso. O objetivo desse efeito é, portanto, o de afastar o agente do meio que lhe permite a prática delituosa OUTROS EFEITOS EXTRAPENAIS a) Rescisão do contrato de trabalho por justa causa: dispõe o art. 482 da CLT que Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador: ( ) d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena b) Novos exames de habilitação para dirigir veículo quando da prática de crimes trânsito: o art. 160 do CTB dispõe que o condutor condenado por delito de trânsito deverá ser submetido a novos exames para que possa voltar a dirigir, de acordo com as normas estabelecidas pelo CONTRAN, independentemente do reconhecimento da prescrição, em face da pena concretizada na sentença. 135

136 c) Impedimento de cargo de gestão, administração e gestão de empresa nos crimes falimentares (art. 181 da Lei de Falências). d) Impedimento matrimonial: a condenação por tentativa de crime doloso contra a vida impede o casamento com o sobrevivente (art , VII, do CC) REABILITAÇÃO Prevista no art. 93 do CP, trata-se de medida político-criminal que tem por finalidade restaurar a situação anterior à condenação, impondo sigilo sobre as anotações de seu boletim de antecedentes e suspendendo alguns efeitos secundários decorrentes da sentença condenatória, no intuito de restaurar sua dignidade pessoal e facilitar sua reintegração social. É um direito do condenado. A reabilitação só é cabível em existindo sentença condenatória com trânsito em julgado, cuja pena tenha sido executada ou já esteja extinta. Logo, não se pode falar em reabilitação quando há sentença absolutória, prescrição da pretensão punitiva, tampouco para o cancelamento das anotações de inquérito arquivado. É cabível, no entanto, nas hipóteses de prescrição da pretensão executória. 57 A competência para sua declaração é do juízo criminal em que tramitou o processo de conhecimento, e não do juízo da execução REQUISITOS Previstos no art. 94 do CP e seus incisos: a) Existência de uma condenação penal irrecorrível, não importando a pena que foi imposta. b) Decurso do prazo de dois anos do dia da extinção, de qualquer modo, ou do cumprimento da pena. Conta-se o prazo, portanto, a partir da extinção da pena, e não da declaração dessa extinção, ou, ainda, da audiência admonitória que marca o início do período de prova em caso de sursis ou livramento condicional que não tenham sido revogados. Se o período de prova for superior a dois anos, não poderá ser concedida a reabilitação antes do término do prazo. Outrossim, o prazo é sempre o mesmo, independentemente de ser o condenado reincidente. c) Domicílio no país durante os dois anos. d) Bom comportamento público e privado durante os dois anos, demonstrados de modo efetivo e constante. d) Reparação do dano, salvo absoluta impossibilidade de fazê-lo ou renúncia comprovada pela vítima. 57 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). v ed. São Paulo: Saraiva, p

137 CONSEQUÊNCIAS a) Garantia do sigilo dos antecedentes (processo, condenação e registros criminais). b) Suspensão condicional dos efeitos secundários específicos da condenação (previstos no art. 92 do CP. É vedada, entretanto, a recondução ao cargo, função ou mandato e a recuperação do pátrio poder em relação ao ofendido INDEFERIMENTO Se o juiz indeferir a reabilitação em razão da ausência de um dos seus requisitos, o pedido poderá ser renovado a qualquer tempo, desde que sejam apresentadas novas provas (art. 94, único, do CP). Contudo, a reabilitação só pode ser requerida pelo próprio condenado REVOGAÇÃO Como não é causa extintiva de punibilidade, a reabilitação pode ser revogada, restabelecendo-se os efeitos da condenação antes suspensos. A revogação pode ser decretada de ofício ou a requerimento do Ministério Público e apenas se o reabilitado for condenado, como reincidente, por sentença transitada em julgado, exceto se houver imposição somente de pena de multa (art. 95, CP). A suspensão condicional do processo e a transação penal são institutos previstos na Lei 9.099/90 e que buscam abreviar o processo em crimes menos graves TRANSAÇÃO PENAL (ART. 76 DA LEI 9.099/90) É a possibilidade de aplicação, com a concordância do acusado, de pena restritiva de direitos ou multa antes mesmo do início do processo. Aplica-se às infrações de menor potencial ofensivo, assim consideradas as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa (art. 61). 137

138 O art. 76 determina que havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. Sendo a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade ( 1º). Não poderá ser proposta a transação penal se houver comprovação de que o autor da infração já foi condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; de que já foi beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, com transação penal; ou se os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, não indicarem ser necessária e suficiente a adoção da medida. Após a proposta do MP, ela deverá ser aceita pelo autor da infração e seu defensor, sendo então submetida à apreciação do magistrado ( 3º). Se este acolher a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, deverá aplicara pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos ( 4º). A imposição da sanção não constará de certidão de antecedentes criminais e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível ( 6º). Súmula Vinculante 35 do STF: A homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial. A sentença que homologa a transação penal não vale como condenação e não pode ser considerada para fins de reincidência ou mau antecedente (RE , j. 28/05/2015) SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI 9.099/90) É a possibilidade de o Ministério Público, ao oferecer denúncia, propor a suspensão do processo penal, por dois a quatro anos, mediante a imposição de condições ao réu. O réu deve aceitar a proposta, caso contrário o processo ocorrerá normalmente ( 7º). Requisitos (art. 89): crimes com pena mínima cominada igual ou inferior a um ano; o acusado não estar sendo processado e não ter sido condenado por outro crime; presença dos demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena, art. art. 77 do CP (o condenado não seja reincidente em crime doloso; a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício). Condições obrigatórias ( 1º): I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; II - proibição de frequentar determinados lugares; III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz; IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades. Condições facultativas ( 2º): o juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado. 138

139 Revogação obrigatória ( 3º): se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano. Revogação facultativa ( 4º): poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta. Extinção da punibilidade ( 5º): expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade. Suspensão do prazo prescricional ( 6º): não corre a prescrição durante o prazo de suspensão do processo. Súmula 723 do STF: Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano. Súmula 696 do STF: Reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o Promotor de Justiça a propô-la, o Juiz, dissentindo, remeterá a questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo Penal. O magistrado não pode, portanto, oferecer a suspensão condicional NATUREZA JURÍDICA DA EXECUÇÃO PENAL A natureza jurídica da execução penal é ponto de divergência da doutrina, de forma que se discute se é atividade prevalentemente administrativa, com jurisdicionalidade eventual, ou se tem natureza jurisdicional. a) Natureza administrativa: trata-se de atividade administrativa voltada à execução do comando da sentença condenatória irrecorrível que se desenvolve por via autoritária, mediante a sujeição do condenado ao julgado. Portanto, a atividade é primordialmente administrativa, havendo apenas momentos de atividade jurisdicional no processo executivo penal nos incidentes de execução. b) Natureza jurisdicional: significa que a execução penal também ocorre por meio de um procedimento jurisdicional, em que há um julgador que visa à tutela dos direitos fundamentais do sentenciado, além de possibilidade de atuação da defesa e do Ministério Público. Com isso, o processo penal é dividido em duas partes, ambas consideradas exercício da jurisdição: o processo de conhecimento, que termina com o trânsito em julgado da sentença condenatória ou absolutória; e o processo de execução, que inicia 139

140 após a condenação. Conforme doutrina majoritária, é posição consagrada pelo ordenamento jurídico brasileiro. Alguns dispositivos da Lei de Execução Penal apontam para a natureza jurisdicional da execução: o art. 2º prevê que a jurisdição será exercida no processo de execução pelos juízes e tribunais da justiça ordinária; o art. 65 estabelece que a execução penal é de competência do juiz da sentença, e não da autoridade administrativa; o art. 194 consagra o procedimento judicial, o qual se desenvolverá perante o juízo da execução, entre outros PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO PENAL LEGALIDADE Dispõe o art. 5º, II, da Constituição Federal que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão sem virtude de lei. Assim, havendo um princípio da legalidade das penas, ele também se estende à execução, não se admitindo que o condenado seja submetido a restrições não previstas na lei e tendo ele direito aos benefícios legalmente previstos, sempre que preencher os requisitos. O art. 2º, caput, da LEP consagra expressamente o princípio ao referir que a jurisdição penal no processo de execução será exercida na conformidade desta lei e do Código de Processo Penal. Como corolário desse princípio, a lei assegura ao condenado os direitos não atingidos pela sentença (art. 3º), dispõe sobre os deveres e direitos do sentenciado (arts. 38 a 43), cuida da definição das faltas graves, remetendo à lei local a especificação das leves e médias (arts. 49 a 52), prevê as sanções e as recompensas, a forma de aplicação das sanções, bem como o procedimento disciplinar (arts. 53 a 60) e outros IGUALDADE Conforme o art. 5º, caput, da CF, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. A LEP consagra esse princípio no art. 3º, par. único: Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política. Ademais, o art. 41, XII, prevê como direito do apenado: igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena JURISDICIONALIDADE Conforme referido quando da análise da natureza da execução penal, a LEP consagra o procedimento jurisdicional. Em decorrência do caráter jurisdicional, aplicam-se ao processo de execução as garantias processuais previstas na Constituição Federal, como o contraditório, a ampla defesa, a fundamentação das decisões etc CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA Os princípios do contraditório e da ampla defesa são, na verdade, decorrência da natureza jurisdicional da execução penal. O art. 5º, LV, da Constituição Federal assegura o direito ao contraditório e à ampla defesa em todo o processo judicial. Pelo contraditório, as partes tem o direito de obter informações e de participar do processo de execução, em igualdade de tratamento e oportunidades, manifestando-se antes das decisões judiciais. Pela ampla defesa, o apenado tem

141 direito de utilizar todos os meios legítimos que dispuser para alcançar o seu direito, podendo manifestar-se pessoalmente (por exemplo, mandando cartas e bilhetes ao juiz da execução pedindo concessão de benefício) e não podendo ser obrigado a participar de acareações, fornecer material para realização de exames periciais etc., sem que isso possa ser considerado delito ou falta disciplinar. O apenado também tem direito à defesa técnica durante os atos processuais da execução. A possibilidade de defesa pessoal é assegurada pelo art. 41, XIV da LEP, que prevê como direito do preso: representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito. Existem diversas previsões expressas na LEP a respeito do direito ao contraditório e à ampla defesa, como os arts. 54, 2º, e 126, 8º, que exigem que seja ouvido o Ministério Público e a defesa antes da decisão sobre a inclusão do preso em regime disciplinar e sobre a remição, respectivamente. Ademais, o art. 59 assegura o direito de defesa no procedimento para apuração da falta disciplinar e o art. 81-A dispõe que a Defensoria Pública velará pela regular execução da pena e da medida de segurança, oficiando, no processo executivo e nos incidentes da execução, para a defesa dos necessitados em todos os graus e instâncias, de forma individual e coletiva FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES Trata-se, igualmente, de decorrência da natureza jurisdicional da Execução Penal. A fundamentação das decisões é uma garantia prevista no art. 93, IX, da CF. Sua principal função é o controle da racionalidade da decisão judicial. Além dessa norma geral, na LEP existem diversas disposições expressas acerca da necessidade de motivação da decisão judicial: para a alteração de regimes (art. 112, 1º), para a saída temporária (art. 123), para alteração da forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana (art. 148) INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA O princípio da individualização da pena determina que a espécie e a medida da pena devem ser adequadas à culpabilidade do agente e às suas condutas. Está previsto no art. 5º, XLVI, da CF e o art. 5º da LEP faz referência expressa a ele em relação à execução: Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal. Assim, na aplicação de benefícios, levar-se-á em conta a vida pregressa do condenado, o crime por ele cometido, com suas circunstâncias, e seu comportamento durante a execução. A classificação a que se refere o art. 5º da LEP será feita por comissão técnica interdisciplinar (art. 7º) e o condenado a regime fechado será submetido a exame criminológico para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à individualização da execução (art. 8º), podendo também o condenado a regime semiaberto ser submetido a exame criminológico (par. único do art. 8º) PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA COM RELAÇÃO A FATOS SUPERVENIENTES O apenado continua merecendo tratamento de inocente no que se refere a novos delitos e faltas disciplinares. Aplica-se a ele, portanto, o princípio constitucional da presunção da inocência, previsto no art. 5º, LVII, da CF. 141

142 20.3. INSTITUTOS DA EXECUÇÃO PENAL Por institutos da execução penal se refere principalmente a direitos do apenado durante o processo de execução, por isso são eles chamados por vezes de benefícios, termo que não é adequado, uma vez que, preenchidos os requisitos legais, o réu tem direito subjetivo a eles. A exceção é a regressão de regime, que não beneficia o réu. Alguns institutos já foram abordados nos capítulos sobre punibilidade e aplicação da pena (anistia, graça e indultos, penas restritivas de direito, suspensão condicional da pena, multa), de forma que, embora sejam também matéria de execução penal, não serão novamente analisados DETRAÇÃO Previsto no art. 42 do CP, determina que se computem, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em hospital de custódia e tratamento. Assim, o tempo cumprido antes da condenação será descontado da pena a cumprir. Por exemplo, alguém é preso provisoriamente e fica detido por um ano até a condenação transitar em julgado, sendo condenado a 6 anos de reclusão, cumprirá apenas mais 5. Detração por pena cumprida em processo distinto: embora haja alguma divergência quanto à necessidade de prisão provisória ser no mesmo processo da condenação definitiva ou relativo ao mesmo fato para que o tempo seja descontado, a jurisprudência do STJ é no sentido de que não é necessário que se refira ao mesmo fato nem ao mesmo processo (ex.: HC RS, dj. 13/11/2012). Importante: inadmissível a incidência da detração quando o fato criminoso pelo qual houve condenação tenha sido praticado posteriormente ao delito que gerou a prisão provisória e a absolvição (ex.: HC /RS, j. 28/02/12). Exemplo: o sujeito pratica um roubo, pelo qual é preso provisoriamente por 6 meses, mas é absolvido; posteriormente, comete um furto e é condenado. Os seis meses não podem ser descontados da condenação por furto. Detração e pena restritiva de direito: existem posições divergentes na doutrina quanto à possibilidade de detração nas penas restritivas de direitos. A primeira não a considera possível, já que o art. 42 do Código Penal se refere, tão somente, à pena privativa de liberdade. A segunda sustenta que, se a detração é aplicável às privativas de liberdade, com maior razão deve ser estendida às restritivas de direito, menos graves. Detração e pena de multa: quando se admitia a conversão da pena de multa em privativa de liberdade, a jurisprudência entendia como possível a detração em sede de pena privativa de liberdade decorrente da não paga. Com a vedação de conversão da pena de multa em privativa de liberdade, passou-se a entender já não ser cogitável a detração. Importante: o art. 42 do CP se refere apenas à possibilidade de detração na pena privativa de liberdade, de forma que a interpretação mais literal do instituto é de que não é admitida a detração da pena de multa ou restritiva de direitos. 142

143 AUTORIZAÇÕES PARA SAÍDAS As autorizações para saídas estão previstas entre os arts. 120 e 125 da LEP e são situações nas quais o apenado poderá obter permissão para deixar temporariamente a prisão. Subdivide-se em permissão para saída e a saída temporária PERMISSÃO PARA SAÍDA Conforme o art. 120 da LEP, os condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto e os presos provisórios poderão obter permissão para sair do estabelecimento, mediante escolta, quando: (i) houver falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão ou (ii) houver necessidade de tratamento médico. Duração: o art. 121 dispõe que a permanência fora do estabelecimento terá duração necessária à finalidade da saída. Não estabelece, portanto, o prazo determinado para a permissão. Autorização: é de cunho administrativo e de caráter urgente, de forma que será concedida pelo diretor do estabelecimento onde se encontra o preso (art. 120, par. único, da LEP) SAÍDA TEMPORÁRIA Conforme o art. 122 da LEP, os condenados que cumprem pena em regime semiaberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, para (i) visitar a família, (ii) frequentar cursos profissionalizantes, de ensino médio ou superior e (iii) participar de atividades que concorram para o retorno ao convívio social. Pode o juiz da execução determinar utilização de monitoração eletrônica pelo condenado ( único). Embora a literalidade do dispositivo restrinja o direito aos apenados em regime semiaberto, estende-se o direito também àqueles em regime aberto. Requisitos (art. 123 da LEP): bom comportamento, cumprimento mínimo de um sexto da pena (se o condenado for primário) ou de um quarto (se for reincidente) e compatibilidade do benefício com os objetivos da sanção. Tais elementos devem ser analisados pelo juiz da execução, após prévia manifestação do Ministério Público e da administração penitenciária. Duração (art. 124 da LEP): a autorização será concedida por prazo não superior a sete dias, podendo ser renovada por mais quatro vezes durante o ano. O 1º estabelece condições deverão ser impostas pelo juiz ao condenado: fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício; recolhimento à residência visitada, no período noturno; proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres. O juiz ainda poderá impor outras condições compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado. Importante: tratando-se de curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será compatível com a duração do curso ( 2º). Autorização: a autorização para saída temporária tem cunho jurisdicional, devendo ser decidida pelo juiz da execução, conforme previsão do art. 123 e do art. 66, IV, da LEP. 143

144 Revogação (art. 125 da LEP): o benefício será automaticamente revogado quando o condenado praticar fato definido como crime doloso, for punido por falta grave, desatender às condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso. O parágrafo único prevê que a recuperação do direito dependerá da absolvição no processo penal, do cancelamento da punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado. Saídas automatizadas: diverge a jurisprudência sobre a possibilidade jurídica das saídas temporárias automatizadas, que consistem na programação antecipada das saídas, sem novas manifestações do Ministério Público e do juiz da execução. Atenção: O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional (Súm. 520 do STJ) REMIÇÃO Prevista nos arts. 126 a 130 da LEP, a remição é o direito do condenado de reduzir, pelo trabalho ou pelo estudo, o tempo de duração da pena privativa de liberdade cumprida em regime fechado ou semiaberto. Contagem: art. 126, 1, incisos I e II, da LEP: a) trabalho: um dia de pena é remido (reduzido) a cada três dias de trabalho. b) estudo: um dia de pena é remido (reduzido) a cada 12 horas de estudo (atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional) divididas, no mínimo, em três dias (ou seja, se o apenado estudar 12 horas divididas em dois dias, ainda precisará de mais um dia de estudo para ter remição de um dia de pena). Acidente: o preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição (art. 126, 4º). Tempo de remição vale como pena cumprida: de acordo com o art. 128 da LEP, o tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos, de forma que serão considerado, por exemplo, para a progressão de regime. 7º) Prisão cautelar: a remição aplica-se também às hipóteses de prisão cautelar (art. 126, Remição por estudo: existem algumas previsões específicas para a remição por estudo: a) conclusão de curso: o tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena (art. 126, 5º). 144 b) regime aberto e livramento condicional: a remição por estudo é possível também aos condenados que cumprem pena nos regimes semiaberto, aberto e para quem está em livramento condicional (art. 126, 6º).

145 Ausência de oportunidade para trabalho: discute-se a consequência para quando a Administração não proporciona oportunidades de trabalho ao condenado. Parte da doutrina entende que, quando o apenado tem direito à remição mesmo sem trabalhar quando o Estado não oferece oportunidades para tanto (remição ficta), entretanto a posição majoritária é de que o apenado não tem direito à remição quando não trabalha, ainda que não sejam oferecidas oportunidades. Perda dos dias remidos: conforme o art. 127 da LEP, o condenado que for punido por falta grave poderá ter revogado até 1/3 do tempo remido, levando-se em conta o art. 57 da LEP. Portanto, o preso não pede a totalidade dos dias remidos. Importante: É possível a remição de parte do tempo de execução da pena quando o condenado, em regime fechado ou semiaberto, desempenha atividade laborativa, ainda que extramuros (Súm. 562 do STJ) UNIFICAÇÃO DAS PENAS EM TRINTA ANOS O limite de cumprimento de penas privativas de liberdade é de 30 anos, conforme dispõe o art. 75 do Código Penal. O 1º determina que, quando o agente for condenado a sanções cuja soma seja superior a esse valor, devem elas ser unificadas para atender tal limite. A posição majoritária é de que a unificação serve apenas para o cumprimento da pena privativa de liberdade, de forma que não é considerada para a concessão de outros benefícios. Essa posição foi consolidada pela Súmula 715 do STF: A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução. A prisão simples, por sua vez, tem limite de cinco anos, previsto no art. 10 da Lei das Contravenções Penais PROGRESSÃO E REGRESSÃO DE REGIME O regime inicial de cumprimento da pena é estabelecido na sentença (art. 110 da LEP). Os regimes, conforme previstos no art. 33 do CP, podem ser (a) fechado, quando a execução da pena ocorre em estabelecimento de segurança máxima ou média; (b) semiaberto quando a execução da pena ocorre em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; e (c) aberto quando a execução da pena ocorre em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Mas o regime inicial pode se modificado ao longo da execução da pena quando se verificar certas hipóteses previstas em lei. Trata-se do que se chama de sistema progressivo de cumprimento de pena, que é dinâmico e oferece a possibilidade de o preso melhorar (ou piorar) sua condição em razão do seu comportamento durante a execução. Por isso, pode o apenado progredir de regime em regime, em regra do mais severo ao mais brando, desde que demonstre condições de adaptação. Em caso de provada incompatibilidade de cumprimento da pena no regime mais liberal, pode regredir para um regime mais rigoroso. 145

146 PROGRESSÃO DE REGIME Conforme o art. 112, caput, da LEP: A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. a) Requisito objetivo: cumprimento de 1/6 da pena (com exceção dos crimes hediondos e equiparados) Encontram-se divergências sobre a quantidade de tempo necessária quando se trata de promover a segunda progressão. Discute-se se é exigido que se cumpra mais de um sexto do total da pena ou se é suficiente o cumprimento de um sexto do que restou da pena após a primeira progressão. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que a fração deve recair sobre o total da pena: HC RJ, 1ª Turma, Relator Moreira Alves, j Boa parte da doutrina entende, entretanto, que a fração deve incidir sobre o restante da pena. b) Requisito subjetivo: bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento. O 1º do art. 112 afirma que a decisão será motivada e precedida de manifestação do MP e da defesa. A redação anterior, alterado em 2013, dispunha que a decisão seria precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário. Com a nova redação, sugiram dúvidas acerca da possibilidade de realização de avaliações pela Comissão e de exame criminológico. A esse respeito, Súmula 439 do STJ dispõe que: Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada. Ademais, o STF decidiu recentemente que o exame criminológico pode ser solicitado, mas a solicitação deve ter por base a análise do caso concreto (RCL , decisão monocrática, j. 08/04/2015). c) Progressão por saltos: a progressão por saltos é a passagem diretamente do regime fechado para o aberto. Não é admitida pelos tribunais superiores. Dispõe a Súmula 491 do STJ: É inadmissível a chamada progressão per saltum de regime prisional. Porém o STJ e o STF entendem que no caso de não existir vaga no regime semiaberto o condenado deve aguardar em regime aberto. d) Crimes hediondos: em caso de condenação por crimes hediondos e equiparados, para ter direito à progressão deve o sentenciado cumprir 2/5 da pena se for primário ou 3/5 se for reincidente. Descabe o regime inicial fechado, conforme HC n.º , julgado pelo STF. Para os fatos anteriores vigência da Lei /2007, exige-se cumprimento de 1/6 da pena (RE , dj. 18/10/2013) REGRESSÃO DE REGIME Conforme o art. 118 da LEP, a execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência do apenado para qualquer dos regimes mais graves, quando ocorrer algum dos fatos previstos em seus incisos: 146

147 a) crime doloso ou falta grave (inc. I): para o condenado à pena privativa de liberdade, são consideradas faltas graves as condutas arroladas no art. 50 da LEP (incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina; fugir; possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem; provocar acidente de trabalho; descumprir, no regime aberto, as condições impostas; tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo). Para que haja regressão, o apenado deve ser previamente ouvido ( 2º do art. 118). Importante: O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato (Súm. 526 do STJ). b) pena que torne incabível o regime (inc. II): regredirá quando houver condenação por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime. Ainda, conforme o 1º do art. 118, o apenado será transferido do regime aberto se, além das situações supramencionadas, frustrar os fins da execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta. O art. 1º da LEP dispõe que a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. O dispositivo prevê também que será determinada a regressão na hipótese de o condenado não pagar a multa cumulativamente imposta. Discutia-se a vigência dessa disposição com o advento da Lei 9.268/96, segundo a qual o inadimplemento da multa não pode ser convertido em prisão. Sobre o tema, decidiu recentemente o STF, com base nessa disposição do 1º art. 118, que o não pagamento de multa impede a progressão de regime. Regime disciplinar diferenciado (RDD): conforme o art. 52 da LEP, a prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado. Não se trata de um novo regime de execução de pena (equivalente ao fechado, aberto e o semiaberto), mas de um conjunto de medidas suscetíveis de imposição aos condenados e presos provisórios. Sendo determinado o RDD, o apenado é recolhido em cela individual, com direito à saída por apenas 2h diárias para banho de sol e a visitas semanais de somente duas pessoas, sem contar as crianças. O RDD pode prolongar-se por até 360 dias, sem prejuízo de sanção por nova falta grave da mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada. Parte da doutrina entende que a alteração legislativa violou a CF, que dispõe, em cláusulas pétreas, que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III) e que não haverá penas cruéis (art. 5º, XLII, e ) LIVRAMENTO CONDICIONAL Livramento condicional é uma antecipação provisória da liberdade concedida ao sentenciado que está cumprindo pena privativa de liberdade, desde que atendidos certos requisitos legais. O instituto é regulado pelo Código Penal, a partir do art. 83, e pela LEP, a partir do art

148 REQUISITOS a) Requisitos objetivos: art. 83, I, II, IV e V, do CP. a.1) Condenação à pena privativa de liberdade igual ou superior a dois anos. Por disposição do art. 84 do Código Penal, devem ser somadas, obrigatoriamente, as penas que correspondem a infrações penais diversas, impostas em um ou em vários processos. Em vista disso, ainda que uma pena isolada não alcance o mínimo de dois anos, existindo outra ou outras penas, pode-se, pela soma de todas, atingir o limite mínimo exigido. a.2) Ter o agente cumprido parte da pena ou das penas que lhe foram impostas. Quando o apenado não for reincidente em crime doloso, deve ter cumprido mais de 1/3 da pena; sendo reincidente em crime doloso, mais da metade. Em se tratando de condenado por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo, demanda-se o cumprimento de mais de 2/3 da pena, bem como que o réu não seja reincidente específico em crimes dessa natureza. a.3) Ter reparado o dano causado pela infração penal, salvo impossibilidade de fazêlo. Reconhece-se tal impossibilidade em virtude da situação econômica do preso, do paradeiro desconhecido da vítima, da prescrição ou novação da dívida, entre outros. b) Requisitos subjetivos: art. 83, II e III, do CP. b.1) Bons antecedentes: só poderá obter o livramento condicional no prazo menor aquele que não foi anteriormente condenado. b.2) Comprovação de comportamento satisfatório durante a execução da pena. Conforme citado quando da análise da progressão de regime, o art. 112 da LEP exige para tal comprovação atestado de conduta carcerária fornecido pelo diretor do estabelecimento carcerário. Entretanto, conforme a Súmula 439 do STJ: Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada. b.3) Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído. b.4) Aptidão para prover a subsistência própria mediante trabalho honesto. Entendese que basta a aptidão, não sendo necessário que haja promessa de emprego. Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa: há um requisito adicional, ficando a concessão do livramento subordinada, além dos requisitos anteriores, à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir (par. único do art. 83 do CP) CONDIÇÕES a) Condições obrigatórias (art. 132, 1º, da LEP): a) obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho; b) comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação; 148

149 b) não mudar do território da comarca do Juízo da execução, sem prévia autorização deste. c) Condições facultativas (art. 132, 2º, da LEP): pode ainda o juiz, facultativamente, impor outras condições ao sentenciado. O dispositivo traz um rol exemplificativo, podendo outras condições serem importas: a) não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; b) recolher-se à habitação em hora fixada; c) não freqüentar determinados lugares. d) Condições legais indiretas: é a não realização pelo beneficiado das causas de revogação obrigatória e facultativa, previstas nos arts. 86 e 87 do CP, que serão vistas abaixo REVOGAÇÃO a) Revogação obrigatória (art. 86 do CP): a.1) Condenação irrecorrível à pena privativa de liberdade por crime praticado durante o livramento condicional. Sendo a pena substituída por multa ou por restritiva de direito, entende-se que a revogação passa a ser facultativa, cabendo ao juiz da execução analisar, com prudente arbítrio, se a revogação se afigura como recomendável no caso específico. É possível que termine o prazo do livramento condicional e o réu esteja sendo processado por fato ocorrido durante o livramento condicional, assim dispõe o art. 89 do Código Penal que o juiz não poderá declarar extinta a pena, enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado, por crime cometido na vigência do livramento. a.2) Condenação irrecorrível à pena privativa de liberdade por crime anterior à concessão do benefício. Deve-se observar o art. 84 do CP, segundo o qual as penas que correspondem a infrações diversas devem ser somadas para fins do livramento, de forma que, se após soma das sanções o sujeito ainda preencher os requisitos do instituto, ele poderá ser mantido. b) Revogação facultativa (art. 87 do CP): b.1) deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença b.2) for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade CONTAGEM DO PRAZO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL a) Infração anterior ao livramento (art. 141 da LEP): se houver revogação motivada por infração penal cometida anteriormente à vigência do livramento, se computará como tempo de cumprimento de pena o período de prova, sendo permitida, para a concessão do novo livramento, a soma do tempo das duas penas. 149

150 b) Infração posterior ao livramento (art. 142 da LEP): se houver revogação por prática infração penal cometida na vigência do benefício ou descumprimento das condições impostas na sentença, não se computará na pena o tempo em que esteve solto o liberado, e tampouco se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento. c) Falta grave. A Súmula 441 do STJ dispõe que a falta grave não interrompe o prazo para a obtenção de livramento condicional EXECUÇÃO PROVISÓRIA Existem situações em que a execução da pena inicia antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, como nas chamadas prisões processuais e, com a decisão tomada pelo STF no julgamento do HC , em 17/02/06, a condenação em segunda instância, ainda que pendente o julgamento de Recurso Especial ou Extraordinário. Nessas situações de execução provisória da pena, tem direito o preso a todos os direitos acima referidos, como a progressão de regime, o livramento condicional, a detração etc. Sobre isso, art. 2º, par. único, da LEP determina que a lei se aplica igualmente ao preso provisório CRIMES CONTRA A VIDA O bem jurídico, protegido nos crimes previstos neste Capítulo, é a vida humana, intra e extrauterina, direito indisponível de assento constitucional (artigo 5º, caput, da CF). Por isso, a ação penal é pública incondicionada e, se dolosos, tais delitos são de competência do Tribunal do Júri, por força do art. 5º, inc. XXXVIII, letra d, da Constituição Federal. Homicídio Simples (art. 121, caput) É a eliminação da vida humana extrauterina provocada por outra pessoa. Trata-se de delito comum que pode ser praticado por qualquer pessoa, exigindo-se para sua configuração o dolo de matar (animus necandi) e o resultado morte, que ocorre quando há cessação da atividade cerebral e se atesta por meio de exame de corpo de delito. Admite-se a tentativa. Pode ser vítima qualquer ser humano nascido com vida; no entanto, sendo ela Presidente da República, membro do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal, o crime será contra a Segurança Nacional, e, sendo menor de quatorze ou maior de sessenta anos, a pena será majorada em 1/3. Não é crime, porém, matar a si próprio: o suicídio é um indiferente penal. Na mesma linha, quem supõe matar um cadáver não pratica homicídio, porque incorre em crime impossível. A conduta é de forma livre: admite-se qualquer modo de atuar do agente, comissivo ou omissivo. Por exclusão, o homicídio será simples quando o fato não se adequar a qualquer das hipóteses de homicídio privilegiado ou qualificado. 150

151 Homicídio Privilegiado (art. 121, 1º) Se o homicídio é praticado por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima, a pena é reduzida de 1/6 a 1/3. Trata-se de tipo derivado de natureza subjetiva ou pessoal, relacionado à menor reprovabilidade da conduta do agente. Os motivos são incomunicáveis aos coautores e partícipes. No tocante à violenta emoção, exige-se que a conduta delituosa configure reação imediata, instantânea à provocação da vítima; se houver apenas influência de tal sentimento, embora não incida o privilégio, poderá haver a atenuação da pena (art. 65, III, c, CP). Homicídio Qualificado (art. 121, 2º) O tipo derivado qualificado tem incidência quando ocorre alguma das circunstâncias previstas no 2º, as quais revelam maior perversidade do agente. Algumas delas são subjetivas e se referem aos motivos e à finalidade do crime praticado; outras, de natureza objetiva, dizem com o modo de ação ou natureza dos meios empregados. Em síntese, é qualificado o homicídio: se cometido mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro motivo torpe; por motivo fútil; com emprego de veneno, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; à traição, de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; ou para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime. Saliente-se que, em caso de latrocínio, extorsão com morte e extorsão mediante sequestro com morte, o agente não responde por homicídio, pois os tipos já o preveem. Em todo caso, o homicídio qualificado, tentado ou consumado, é crime hediondo, por expressa previsão do art. 1º, I, da Lei n /90. Feminicídio (art. 121, 2ª, VI, e 2-A) a Lei nº , de 2015, adicionou a qualificadora do homicídio quando praticado contra a mulher por razões da condição de gênero. Exige, portanto, elemento subjetivo específico. A lei ainda prevê que A se considera que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição de mulher. O conceito de violência doméstica é encontrado no art. 5º da Lei nº /2006 (Lei Maria da Penha). O 7º do art. 121 prevê causas de aumentos específicas para o feminicídio quando praticado: durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto, contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência, na presença de descendente ou de ascendente da vítima. O feminicídio é crime hediondo. Homicídio contra agente de segurança pública (art. 121, 2º, VII) a Lei nº , de 2015, adicionou a qualificadora do homicídio quando praticado contra agente de segurança pública (membros da Marinha, Exército, Aeronáutica, polícias federal, rodoviária e ferroviária federal, polícias civis, polícias militares, bombeiros; integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública). Assim, o homicídio é qualificado se praticado contra uma dessas pessoas no exercício da profissão ou em decorrência dela, ou ainda contra cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo, em razão da profissão. Há elemento subjetivo específico, pois o crime deve ocorrer em razão da profissão exercida. Trata-se também de crime hediondo. Homicídio Qualificado-Privilegiado Quanto à compatibilidade entre a privilegiadora e a qualificadora do homicídio, há duas correntes doutrinárias. A primeira, entende inviável a coexistência de ambas. A segunda, amplamente majoritária, admite-a, desde que a qualificadora seja de natureza objetiva. Será qualificado-privilegiado, por exemplo, o homicídio praticado em razão de relevante motivo moral, mas por meio cruel. Nessas hipóteses, a jurisprudência tem entendido que o delito não é hediondo. Homicídio Culposo (art. 121, 3º) Se o homicídio for praticado em razão de imprudência, negligência ou imperícia, a pena é de detenção, de um a três anos. No entanto, se o delito for 151

152 praticado na direção de veículo automotor, incide a regra do art. 302 do CTB. O homicídio culposo pode ainda ter a pena aumentada de 1/3 se resultar de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato ou foge para evitar a prisão em flagrante (art. 121, 4º). Não obstante, na hipótese de as consequências do homicídio culposo atingirem o réu de forma tão grave que a sanção prevista se torne despicienda, a ele pode ser concedido o perdão judicial (art. 121, 5º). Houve a introdução do parágrafo sexto, em que a pena será aumentada de um terço até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio (Lei nº , de 2012). Parte-se da premissa de que a primeira não configurará crime hediondo, mas a segunda sim. Induzimento, Instigação ou Auxílio a Suicídio (art. 122) Trata-se de crime de ação múltipla ou variada, porque pode ser praticado mediante mais de uma ação: induzindo (inspirando, incutindo a ideia), instigando (estimulando) e prestando auxílio (dando apoio material). É preciso, porém, que o fato recaia sobre vítima determinada, não constituindo fato típico, por exemplo, a instigação genérica. Na mesma linha, sendo um crime material, exige-se que tenha havido a morte da vítima ou que da tentativa de suicídio resulte lesões corporais graves. Se as lesões forem leves, por exemplo, não haverá crime. Saliente-se, porém, que, se o suicida não tem capacidade de discernimento, será caso de homicídio praticado em autoria mediata. A pena pode ser duplicada se o crime for praticado por motivo egoístico ou se a vítima é menor de idade ou tem diminuída sua capacidade de resistência (art. 122, parágrafo único). Infanticídio (art. 123) O infanticídio é, em verdade, o homicídio praticado por influência do estado puerperal, durante ou logo depois do parto. Trata-se de crime próprio, que só pode ser praticado pela mãe do nascente ou recém-nascido; sendo este, pois, a vítima. O estado puerperal é um conjunto de perturbações psicológicas e físicas sofridas pela mulher em razão do parto. Sua comprovação não exige perícia; sua influência para a prática do crime, sim. Por ser elementar do crime, tal circunstância se comunica a coautores e partícipes, desde que a conheça, conforme regra expressa do art. 30 do Código Penal. Autoaborto e Aborto Consentido (art. 124) Aborto é a interrupção da gravidez antes do tempo normal, com a morte do feto. É preciso, portanto, que haja gravidez em curso e que a morte do feto tenha se dado em razão da intervenção abortiva. No art. 124, pune-se a gestante que provocou em si mesma ou consentiu que lhe provocassem o aborto. O crime é de mão própria, só podendo ser praticado pela gestante e não admitindo coautoria. É que, se o abortamento foi praticado por outrem com a anuência da mulher grávida, será ele o autor do crime previsto no art. 126, CP. Aborto Provocado por Terceiro (art. 125 e 126) Distingue-se, aqui, se houve ou não consentimento da gestante. Se ela não concordou com o aborto, incorre o agente que o provocou nas penas do art Nesse caso, protege-se a vida do feto e a integridade física da gestante. Se houve consentimento da gestante, porém, o delito é aquele tipificado no art. 126, CP. Trata-se de uma exceção à teoria monista, segundo a qual todos os autores e partícipes respondem pelo mesmo crime quando contribuírem para o mesmo resultado típico. Com efeito, aqui a pessoa que provoca o aborto é punida de forma mais severa que a gestante que consente com sua conduta, porque ela responderá pelo crime tipificado no art Outrossim, se o consentimento não for válido, quer porque a gestante era menor de 14 (quatorze) anos, alienada ou débil mental, quer porque fora obtido à força, por fraude, grave ameaça ou violência, não será ele considerado, e o crime praticado será o de aborto provocado sem o consentimento da gestante (art. 126, parágrafo único). Ademais, se em razão do aborto ou dos meios empregados para tanto sobrevier a morte da gestante, a pena será duplicada; se resultarem lesões corporais graves, será aumentada em 1/3 (art. 127, CP). 152

153 Aborto Legal (art. 128) Não será punido o médico que praticar aborto terapêutico ou necessário, quando este é o único meio de salvar a vida da gestante (inc. I); ou sentimental, humanitário ou piedoso, quando a gravidez resulta de estupro, desde que haja, nesse caso, consentimento da vítima ou de seu representante legal (inc. II). Não se exige sentença condenatória pelo estupro, tampouco autorização judicial, bastando ao médico prova da ocorrência do delito (por exemplo, boletim de ocorrência policial). Por analogia in bonam partem, parte da doutrina estende tal excludente às hipóteses de gravidez proveniente de atentado violento ao pudor. O STF declarou inconstitucionalidade da interpretação de que o aborto em casos de fetos anencéfalos é abarcada pelos arts. 124 e 126 do CP, de forma que a conduta da gestante não configura crime, assim como a do médico que realiza o procedimento (ADPF 54, dj ) LESÕES CORPORAIS Nos crimes de lesões corporais, protege-se a integridade física e psíquica e a saúde do ser humano. O verbo-núcleo do tipo é ofender, ou seja, fazer mal a alguém. A autolesão, portanto, não é punível, salvo quando caracterizar o crime de fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro (art. 171, 2º, V, CP). Tratando-se de delitos de resultado, este deve ser comprovado por meio de exame de corpo de delito, direto ou indireto. Admite-se, em regra, a tentativa. No caso das lesões corporais dolosas, se o crime for cometido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima, a pena pode ser reduzida de 1/6 a 1/3 (lesão corporal privilegiada, art. 129, 4º). De outra parte, se praticado contra menor de quatorze ou maior de sessenta anos, a pena é aumentada em 1/3 (art. 129, 7º). Lesão Corporal Leve (art. 129, caput) É aquela que não perfaz nenhum dos resultados indicados nos parágrafos subsequentes, mas que, ao mesmo tempo, não é insignificante, o que levaria à atipicidade da conduta. As lesões leves não se confundem com a contravenção de vias de fato, porque esta se caracteriza pela ofensa não ultrajante sem dano à integridade corporal e sem o animus laedendi. Também se diferenciam da injúria real porque, nesta, há o dolo de injuriar. Consoante o 5º, no caso de lesão leve privilegiada ou em sendo as lesões leves recíprocas, a pena de detenção pode ser substituída pela de multa. Ademais, a lesão leve é crime de ação penal pública condicionada à representação do ofendido e cujo processo e julgamento é de competência dos Juizados Especiais, tendo em vista seu menor potencial ofensivo (art. 88, Lei 9.099/95). Lesão Corporal Grave e Gravíssima (art. 129, 1º e 2º) Grave é a lesão de que resulta incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias; perigo de vida; debilidade permanente de membro, sentido ou função e aceleração de parto. Gravíssima, a seu turno, é a lesão que enseja como consequência a incapacidade permanente para o trabalho; a enfermidade incurável; a perda ou inutilização de membro, sentido ou função; a deformidade permanente ou o aborto. Lesão Corporal seguida de Morte (art. 129, 3º) É a lesão corporal dolosa qualificada pelo resultado morte. O agente quer a lesão, mas da ofensa à integridade física advém o resultado morte, mas as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo. Há dolo no antecedente e culpa no consequente. Diferencia-se do homicídio, portanto, ante a ausência do animus necandi (intenção de matar). 153

154 Lesão Corporal Culposa (art. 129, 6º) Não há gradação entre leve, grave ou gravíssima: sempre que decorrer de imprudência, negligência ou imperícia, a lesão será culposa. No entanto, se das lesões culposas resultar a morte da vítima, responderá o agente por homicídio culposo. A pena será aumentada em 1/3 se ocorrer qualquer das majorantes previstas para o homicídio culposo (art. 129, 7º). Na mesma linha, poderá ser concedido o perdão judicial se as consequências da infração atingirem o agente de forma tão grave que a pena se torne desnecessária (art. 129, 8º). As lesões culposas também são de competência dos Juizados Especiais e a ação é pública condicionada à representação. Por fim, se elas forem praticadas na direção de veículo automotor, incorrerá seu autor no crime previsto no art. 303, CTB, por aplicação do princípio da especialidade no concurso aparente de normas. Violência Doméstica (art. 129, 9º) Este parágrafo foi recentemente alterado pela Lei nº /06. Determina ele que, se as lesões corporais leves forem cometidas contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou prevalecendo-se das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, a pena é de detenção de três meses a três anos, aumentada de 1/3 se a vítima é portadora de deficiência física ( 11). Outrossim, presentes essas circunstâncias nas lesões graves, gravíssimas ou com resultado morte, a pena é a do parágrafo correspondente aumentada em 1/3 ( 10). Contra agente de segurança pública (art. 129, 12) a Lei nº , de 2015, adicionou causa de aumento de pena, de 1/3 a 2/3 para quando a lesão é praticada contra agente de segurança pública (membros da Marinha, Exército, Aeronáutica, polícias federal, rodoviária e ferroviária federal, polícias civis, polícias militares, bombeiros; integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública). Hediondez. De acordo com o art. 1º, I-A, da Lei 8.072/90, incluído pela Lei nº /15, são hediondas (a) a lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, 2º) e (b) a lesão corporal seguida de morte (art. 129, 3º), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE Perigo de Contágio Venéreo (art. 130), Perigo de Contágio de Moléstia Grave (art. 131) e Perigo para a Vida ou Saúde de Outrem (art. 132) O art. 130 tipifica o perigo de contaminação de doença venérea. Para a consumação, é preciso que tenha havido relação sexual ou ato libidinoso e que a doença seja venérea, a efetiva contaminação é mero exaurimento do crime. A ação penal, no caso, condiciona-se à representação. Na hipótese do art. 131, por sua vez, não importa a natureza da moléstia, bastando ser ela grave e contagiosa, e o meio utilizado pode ser o mais variado, desde que idôneo para a contaminação da vítima. A ação penal é pública incondicionada. Finalmente, o art. 132 contém uma fórmula genérica e é, em síntese, um crime subsidiário que só se tipifica caso o fato não constitua crime mais grave. A ação penal também é pública incondicionada e se a exposição a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais, a pena é aumentada de 1/6 a 1/3 (art. 132, parágrafo único). 154

155 Dependendo da intenção do agente, a transmissão da AIDS poderá tipificar tanto crime de perigo de contágio de moléstia grave como lesão corporal seguida de morte ou até mesmo homicídio, mas nunca o crime de perigo de contágio venéreo. 58 Abandono de Incapaz (art. 133) e Exposição ou Abandono de Recém-Nascido (art. 134) Trata-se de crimes próprios cuja conduta tipificada é abandonar, no caso do incapaz, ou expor a risco ou abandonar, no caso do recém-nascido, desde que dela resulte perigo concreto para a vida ou saúde do abandonado. Em se tratando do art. 133, o sujeito ativo é um garante, ou seja, quem tem especial relação de assistência e proteção com a vítima. Esta, por sua vez, deve ser faticamente incapaz de defender-se dos riscos do abandono. Aqui, a pena é majorada em 1/3 se o abandono ocorre em lugar ermo, se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima ou, ainda, se o abandonado é maior de sessenta anos ( 3º). Na hipótese do art. 134, o sujeito ativo é a mãe que objetiva ocultar desonra própria, e a vítima, alguém nascido há poucos dias mas cujo nascimento ainda não veio a conhecimento público. Em ambos os tipos penais estão previstas as figuras qualificadas pelo resultado lesões corporais graves ( 1º) ou morte ( º2). Alguns autores, porém, entendem que tais figuras preterdolosas teriam sido revogadas pelo art. 13, 2º, do CP, o qual prevê os casos em que o agente, tendo o dever de agir, responde pelo resultado da sua omissão. 59 Omissão de Socorro (art. 135) É o crime omissivo próprio por excelência. Pode ser praticado por qualquer pessoa, desde que a conduta exigida não ponha em risco sua segurança. A vítima, porém, só pode ser uma daquelas previstas no dispositivo: criança abandonada ou extraviada, pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em perigo. No parágrafo único, previu o legislador a figura preterdolosa, punindo mais severamente o agente se da omissão resultar lesão corporal grave ou morte. Em se tratando de omissão de socorro em delito de trânsito, porém, incidirá o art. 304 do CTB. Não obstante, se o agente ocupa a posição de garante (art. 13, 2º, CP), não responde por omissão de socorro; mas, dependendo do caso concreto, por abandono de incapaz, lesão corporal ou homicídio comissivos por omissão (ou seja, pelo crime correspondente ao resultado, na forma omissiva imprópria). Condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial (art. 135-A) Pune quem exige cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial. Trata-se de crime de mera conduta, consumando-se com o ato de exigir. Pode ser cometido por qualquer pessoa, desde que esta tenha poder para condicionar o atendimento. A pena é majorada pelo resultado até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.trata-se de infração de menor potencial ofensivo, de competência do JECRIM. Maus-tratos (art. 136) É crime próprio que requer a existência de relação de subordinação entre os sujeitos ativo e passivo para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia. Sem tal condição de autoridade, guarda ou vigilância, não há crime, razão pela qual um cônjuge, em circunstâncias normais, não pode ser vítima de maus-tratos praticados pelo outro. As condutas tipificadas são várias: privar de alimentação ou de cuidados indispensáveis; sujeitar a trabalho excessivo ou inadequado, e abusar de meios corretivos ou disciplinares. Em todos os BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. v ed. São Paulo: Saraiva, p BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. v ed. São Paulo: Saraiva, p

156 casos, é desnecessária a efetiva ocorrência de dano à vítima, bastando o perigo concreto. A consciência do abuso, entretanto, é indispensável para que se configure o dolo. Na forma simples do delito, a pena é alternativa de detenção ou multa, mas os 1º e 2º preveem figuras qualificadas pelo resultado. Por fim, o 3º, acrescido pelo Estatuto do Adolescente, determina a majoração da pena em 1/3 se a vítima é menor de quatorze anos RIXA Rixa (art. 137) A rixa é um tipo aberto. Trata-se de crime de perigo abstrato e de concurso necessário (pelo menos três pessoas), com restrita aplicação. Participar é tomar parte; rixa é a guerra de todos contra todos, ou seja, uma generalizada troca de agressões. Nela, todos são agentes e vítimas a um só tempo e todos são punidos. Se da rixa decorre morte ou lesão corporal de natureza grave, todos respondem pela forma qualificada do delito cuja pena é de seis meses a dois anos (art. 137, parágrafo único), ainda que se identifique seu autor, o qual, a seu turno, responderá pelo homicídio ou pelas lesões em concurso material com a rixa. Se todos os autores forem individualizados, não haverá rixa, e sim concurso de crimes e, eventualmente, de pessoas (por exemplo, brigas de gangues rivais). A ação penal é pública incondicionada CRIMES CONTRA A HONRA Calúnia (art. 138) A conduta típica consiste na imputação falsa a alguém de fato definido como crime. O bem jurídico protegido é a honra objetiva do sujeito, ou seja, a sua reputação, o conceito que os demais membros da sociedade têm a seu respeito. Consuma-se, por isso, quando a imputação chega a conhecimento de um terceiro, o que cria a condição necessária para lesar a fama do indivíduo. Para a configuração da calúnia, a doutrina exige, em regra, três requisitos. Reclama-se, primeiramente, a existência de um fato determinado, ou seja, deve haver a individualização de suas circunstâncias. Exige-se, também, a falsidade da imputação, a qual pode recair sobre o fato ou sobre a autoria. Naquela hipótese, o fato é inexistente; nesta, a existência ou ocorrência do fato é verdadeira; falsa é a imputação da autoria. Por fim, demanda-se o animus caluniandi que é constituído pela vontade consciente de caluniar a vítima. Não há, portanto, crime quando presente qualquer elemento subjetivo diverso, como o animus defendendi,o narrandi ou o jocandi. Prevê o 1º que incorre na mesma pena aquele que, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. O 2º determina que é punível a calúnia contra mortos. O 3º, a seu turno, trata da exceção da verdade, a qual consiste na possibilidade de o agente provar a veracidade do fato que imputou. O instituto é, contudo, vedado em três situações: nos crimes de ação privada, quando o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; nos fatos imputados contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro; se o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. Difamação (art. 139) A difamação consiste em atribuir fato ofensivo à reputação de alguém. O fato, ao contrário da calúnia, não precisa ser falso e nem ser definido como crime, mas deve ser determinado e individualizado. O bem jurídico tutelado é, novamente, a honra objetiva do sujeito e, por isso, também se consuma quando terceiro toma conhecimento da atribuição. Com relação ao elemento subjetivo do tipo, exige-se o animus diffamandi. Quanto ao instituto da exceção da verdade, só é aplicável quando o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

157 Injúria (art. 140) - A injúria consiste na ofensa à dignidade ou ao decoro de alguém. O objeto de proteção deste crime é a honra subjetiva que é um julgamento que o indivíduo faz de si mesmo, ou seja, é um sentimento de autoestima, de autoimagem. Consuma-se, por isso, quando a ofensa irrogada chega ao conhecimento do próprio ofendido. Com relação ao elemento subjetivo do tipo, exige-se o animus injuriandi. O instituto da exceção da verdade não é aplicável, pois não se pode pretender provar um insulto ou uma afronta; a autenticidade dos juízos depreciativos que maculam a honra é irrelevante para a caracterização da injúria. O 1º prevê a possibilidade de perdão judicial, o qual pode ser concedido quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria ou, ainda, no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. Saliente-se a existência de posição doutrinária no sentido de que o perdão judicial não é mero benefício ao réu, e sim direito subjetivo público de liberdade e, por isso, deve, necessariamente, ser concedido quando houver o preenchimento dos requisitos legais. 60 Injúria Real (art. 140, 2º) É aquela praticada mediante violência ou vias de fato que, por sua natureza ou meios empregados, se consideram aviltantes. Injúria Preconceituosa (art. 140, 3º) - Consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência física. Formas Majoradas (art. 141) As penas cominadas aos delitos contra a honra se aumentam em 1/3 se cometidos contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro; contra funcionário público, em razão de suas funções; na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria; contra maior de sessenta anos ou portador de deficiência, exceto no caso de injúria. O parágrafo único do art. 141 determina que se aplica a pena em dobro se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa. Causas Especiais de Exclusão do Crime (art. 142) Não constituem injúria ou difamação punível a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador; a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar; o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever de ofício. Determina o parágrafo único que, na primeira e na última situação, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade. Saliente-se que essas causas de exclusão do crime não se aplicam à calúnia. Retratação (art. 143) O querelado que, antes da sentença, retrata-se cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena. O art. 143 ganhou um parágrafo único pela Lei nº /15, nos seguintes termos: Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. Interpelação Judicial (art. 144) Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Quem se recusa a BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, p. 545 e DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6.ed. Rio de Janeiro: Renovar, p

158 dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatoriamente responde pela ofensa. Destaque-se que a oração responde pela ofensa significa tão somente que o sujeito pode ser criminalmente processado. Não se condena ninguém no pedido de explicações. Ela previne a jurisdição e é facultativa. Ação Penal A ação penal é, em regra, privada nos delitos de calúnia, difamação e injúria, salvo quando, no caso do art. 140, 2º, da violência resulta lesão corporal. Nesta situação, se a lesão for grave ou gravíssima, será a ação pública incondicionada; se for leve, diverge a doutrina se é incondicionada ou condicionada à representação, em virtude do art. 88 da Lei 9.099/95. Procedese, ainda, mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso de crime cometido contra o Presidente da República ou contra chefe de governo estrangeiro, ou mediante requisição do ofendido, no caso de delito contra funcionário público em razão de suas funções. Saliente-se que o STF entende que, neste caso, o funcionário tem legitimidade concorrente para propor, mediante queixa, ação penal (v. Súmula 714 do STF) CRIMES CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL Os crimes deste capítulo protegem a liberdade individual do indivíduo, o que engloba sua liberdade pessoal e a inviolabilidade de seu domicílio, de sua correspondência e de seus segredos CRIMES CONTRA A LIBERDADE PESSOAL Constrangimento Ilegal (art. 146) A conduta típica consiste em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite ou a fazer aquilo que ela não ordena. É delito subsidiário em relação a todos os crimes em que o constrangimento é meio ou elemento, como no roubo (art. 157), na extorsão (art. 158) e no estupro (art. 213). Saliente-se também que a pretensão do agente, ao obrigar o ofendido a não fazer o que a lei permite ou a fazer o que ela não manda, deve ser ilegítima; pois, se for legítima, o crime será o de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345). O 1º determina que as penas se aplicam cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas ou há emprego de armas. O 2º, por sua vez, prevê que, além as penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência. Por fim, o 3º elenca duas causas de exclusão da tipicidade, quais sejam, a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida e a coação exercida para evitar o suicídio. Ameaça (art. 147) O tipo penal consiste em intimidar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave. Assim, se o mal for justo ou não for grave, não haverá o crime. A doutrina, em regra, exige a idoneidade da ameaça, devendo ser ela capaz de impingir medo à vítima. 61 Saliente-se que o fato de o crime ser formal não afasta a imprescindibilidade de o destinatário sentir-se, realmente, temeroso, pois o resultado Assim: BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, p. 585; DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6.ed. Rio de Janeiro: Renovar, p. 316; e NUCCI, Guilherme. Código Penal Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, p

159 naturalístico que pode ocorrer é o mal injusto e grave, o que constitui mero exaurimento do delito. Por disposição do parágrafo único, a ação penal é pública condicionada à representação. Sequestro e Cárcere Privado (art. 148) A conduta típica consiste em privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado, que são formas muito semelhantes de privação do direito de ir e vir, destacando-se este por um sentido de maior restrição de liberdade. É crime permanente, pois a ofensa ao bem jurídico prolonga-se no tempo: enquanto a vítima estiver privada de sua liberdade, a execução estará se consumando. O 1º, recentemente alterado pela Lei n /05, qualifica o crime em razão do desvalor da ação quando a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de sessenta anos; quando o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital; quando a privação da liberdade dura mais de quinze dias; quando o crime é praticado contra menor de dezoito anos; ou se ele é praticado com fins libidinosos. O 2º, por sua vez, qualifica o delito em virtude do desvalor do resultado, quando, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, a vítima sofre grave sofrimento físico ou moral. Redução à Condição Análoga à de Escravo (art. 149) O dispositivo, alterado pela Lei n /2003, prevê um crime de forma vinculada que exige, para sua configuração, a existência de relação trabalhista entre sujeito ativo e passivo. Assim, ainda que se trate da supressão do direito individual de liberdade de alguém, a vítima somente pode ser o trabalhador lato sensu. A conduta tipificada consiste na submissão a trabalhos forçados ou jornada exaustiva, a condições degradantes de trabalho ou, ainda, na restrição da locomoção do trabalhador em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. Não obstante, o 1º prevê três outras condutas assimiladas, as quais, ao contrário do caput, demandam o especial fim de reter as vítimas no local de trabalho. A sanção penal é de reclusão e multa, ressalvada aquela correspondente à violência e aumentada de metade se o crime é praticado contra criança ou adolescente ou em razão de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem ( 2º). Importante: conforme decidido pelo Pleno do STF (RE , j. 26/11/2015), a competência para processar e julgar o crime previsto no art. 149 do CP é da Justiça Federal CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DO DOMICÍLIO Violação de Domicílio (art. 150) O crime consiste em entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou, ainda, em suas dependências. A expressão casa compreende qualquer compartimento habitado, o aposento ocupado de habitação coletiva e o compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão ou atividade ( 4º). Não envolve, contudo, hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva (à exceção do aposento ocupado), nem taverna, casa de jogo e outras do gênero ( 5º). O 1º relaciona as qualificadoras do crime, quais sejam, que o crime seja cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou arma, ou por duas ou mais pessoas. O 2º, por sua vez, prevê uma majorante especial para quando o delito for cometido por funcionário público, fora dos casos legais, ou com inobservância das formalidades estabelecidas em lei, ou com abuso de poder. 159

160 Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar prisão ou outra diligência, bem como, a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de sê-lo ( 3º). O art. 5º, XI, da Constituição Federal ainda excetua as hipóteses de desastre e a prestação de socorro. Importante: o Plenário do STF, julgando o RE , com repercussão geral reconhecida, firmou a tese de que a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DE CORRESPONDÊNCIA Violação de Correspondência (art. 151, caput), Sonegação ou Destruição de Correspondência (art. 151, 1º, I) e Violação da Comunicação Telegráfica, Radioelétrica ou Telefônica (art. 151, 1º, II, III e IV) Objetivam, em síntese, proteger a inviolabilidade da correspondência e das comunicações telegráficas e telefônicas, garantias constitucionalmente asseguradas (art. 5º, XII, CF). Com efeito, apenas o sigilo das comunicações telefônicas, por expressa previsão constitucional, pode ser quebrado, desde que nas hipóteses legais (previstas na Lei n /96), mediante ordem judicial e para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Os crimes aqui previstos são subsidiários, porque só se configuram quando não são meio ou elemento de crime mais grave. Outrossim, a pena é majorada em metade, se houver dano a alguém (art. 151, 2º), e o delito é qualificado se a conduta é praticada com abuso de função em serviço postal, telegráfico, radioelétrico ou telefônico (art. 151, 3º). Na forma qualificada e com relação ao inc. IV do 1º, a ação penal é pública incondicionada; nos demais casos, somente se procede mediante representação. Violação de Correspondência Comercial (art. 152) É crime próprio que só pode ser praticado pelo sócio ou empregado do estabelecimento comercial ou industrial e desde que incorra ele em abuso dessa condição para desviar, sonegar, suprimir ou revelar a estranho o conteúdo da correspondência. A ação penal é pública condicionada à representação CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DOS SEGREDOS Divulgação de Segredo (art. 153) e Violação de Segredo Profissional (art. 154 e 154-A) Protege-se, aqui, a inviolabilidade do segredo, aspecto da liberdade individual. No primeiro caso, a ação típica é divulgar conteúdo de documento ou correspondência confidencial (art. 153, caput) ou informações sigilosas ou reservadas assim definidas em lei (art. 153, 1º-A). Na segunda hipótese, trata-se de revelar segredo relativo ao exercício das atividades da vida privada como a profissão ou a função (art. 154). O verbo-núcleo revelar tem abrangência mais estrita do que divulgar, porque este pressupõe um número indeterminado de pessoas. Em regra, procede-se somente mediante representação, mas se a divulgação de segredo trouxer prejuízo à Administração, a ação penal será incondicionada (art. 153, 2º). O art. 154-A visa a punir os crime praticados pela internet, tipificando a conduta de invadir dispositivo informático alheio mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular

161 do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. Nota-se que o crime exige elemento subjetivo específico, que o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. Trata-se de crime formal, de forma se consuma com a invasão voltadas aos referidos fins, independentemente de serem eles atingidos. Ademais, deve ser cometido mediante violação de mecanismo de segurança. O 1º prevê conduta equiparada relacionada à difusão ou venda de dispositivo voltado à prática do crime previsto no caput, sujeita às mesmas penas. Se do crime resulta prejuízo econômico, a pena é majorada de 1/6 a 1/3 ( 2º). O crime é qualificado pelo resultado de obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido ( 3º). Ademais, a pena é aumentada de 1/3 a 1/2 se praticada contra autoridades como Presidente da República, governadores e prefeitos; Presidente do Supremo Tribunal Federal; Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal etc. ( 5º) A ação penal é pública condicionada, salvo se o crime é cometido contra a administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios ou contra empresas concessionárias de serviços públicos, quando será pública incondicionada. Os crimes contidos neste título protegem a posse e a propriedade, direitos garantidos constitucionalmente (art. 5º, XXII) e, por vezes, a mera detenção de bens. As disposições gerais vêm previstas a partir do art. 181, o qual determina ser isento de pena quem pratica qualquer dos delitos patrimoniais em prejuízo do cônjuge, na constância da sociedade conjugal, do ascendente ou do descendente. O art. 182, a seu turno, dispõe que a ação penal é pública condicionada à representação se o crime for cometido contra cônjuge desquitado ou judicialmente separado, irmão, tio ou sobrinho com quem coabite o agente. Por fim, o art. 183 determina que os dispositivos anteriores não se aplicam aos crimes de roubo, extorsão ou nos quais tenha havido emprego de violência ou grave ameaça; ao estranho que participa do crime, e ao delito cuja vítima é pessoa de sessenta anos ou mais FURTO Furto Simples (art. 155) Trata-se de crime comum que, à exceção do dono da coisa, pode ser praticado por qualquer pessoa. Furtar é subtrair coisa alheia móvel para si ou para outrem. Por coisa alheia móvel, elemento normativo do tipo, entende-se objetos e bens que tenham utilidade ou valor econômico, que pertençam a alguém e que sejam passíveis de deslocamento de um lugar para outro no sentido real, e não jurídico, razão pela qual bens considerados imóveis pelo direito civil podem ser objeto de furto. Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico ( 3º). Não importa se a posse ou propriedade da coisa furtada é legítima, mas não configura o crime a subtração de coisas sem dono, de ínfimo valor, perdidas, abandonadas, tampouco seres vivos (art. 148 ou 249, CP) ou cadáveres (art. 211, CP). 161

162 Além do dolo, exige-se a presença do especial fim de agir: o animus furandi, a intenção de assenhorar-se de forma definitiva para si ou para terceiro de algo que não lhe pertence. Em decorrência, o furto de uso é fato atípico, desde que a posse tenha sido momentânea e que tenha havido a devolução integral da coisa. Outrossim, o furto deve prescindir de todo e qualquer tipo de violência contra a pessoa, embora a violência exercida contra a coisa não o descaracterize (por exemplo, arrebatamento de objeto das mãos da vítima). Sendo crime material, admite-se a tentativa. Consumação. Delimitada a seguinte tese no STJ: Consuma-se o crime de furto com a posse de fato da res furtiva, ainda que por breve espaço de tempo e seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada (STJ, REsp , j. 14/10/2015). Adota-se, portanto, a teoria da apprehensio ou amotio. Monitoramento eletrônico: Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto (Súmula 567 do STJ). Furto Noturno (art. 155, 1º) Se o furto é praticado durante o repouso noturno, em razão do maior desvalor da conduta, a pena é aumentada em 1/3. Trata-se do período em que as pessoas estão repousando, havendo menor vigilância sobre a res. Há dissídio jurisprudencial quanto à necessidade ou não de o local ser habitado e de que nele haja pessoa repousando para a incidência da majorante. De todo modo, o aumento não se aplica às formas qualificadas do delito, embora se trate, nesses casos, de circunstância do crime, a ser avaliada na primeira fase de dosimetria da pena. Furto Privilegiado (art. 155, 2º) Se a coisa furtada é de valor reduzido e o agente é primário, tem ele direito ao reconhecimento do privilégio, podendo o juiz substituir a pena de reclusão por detenção, diminuí-la de 1/3 a 2/3 ou aplicar somente a pena de multa. A jurisprudência entende que o privilégio é aplicável tanto ao furto simples quanto na sua modalidade qualificada. Saliente-se que o furto privilegiado não se confunde com o famélico, ou seja, quando alguém subtrai gêneros alimentícios para saciar sua fome, sendo este seu único recurso ante o estado de necessidade em que se encontrava. Nessa hipótese, atua o agente amparado por uma excludente de ilicitude e, por isso, não há crime. Furto Qualificado (art. 155, 4º) O furto é qualificado se cometido: com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa (inc. I); com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza (inc. II); com emprego de chave falsa (inc. III); e mediante concurso de duas ou mais pessoas (inc. IV). À exceção da circunstância do abuso de confiança, as demais, de natureza objetiva, comunicam-se aos coautores e partícipes. Não obstante, o 5º do art. 155 traz outro tipo derivado do furto, o qual ocorre quando a subtração é de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Semovente domesticável de produção (art. 155, 6º - incluído Lei nº , de 2016) A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração. Furto qualificado-privilegiado: É possível o reconhecimento do privilégio previsto no 2º do art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva (Súmula 511 do STJ). 162

163 Furto de Coisa Comum (art. 156) Modalidade especial do crime de furto e distingue-se deste porque o objeto da subtração deve ser coisa comum, ou seja, pertencente, a um só tempo, aos sujeitos ativo e passivo. Ademais, tratando-se de crime próprio, só pode ser praticado por condômino, coerdeiro ou sócio da coisa comum ROUBO E EXTORSÃO Roubo Próprio (art. 157) A figura típica do roubo tem como bens jurídicos protegidos, a um só tempo, o patrimônio e a integridade física e a liberdade da pessoa. Trata-se de crime complexo, consistente no furto associado ao emprego de violência ou grave ameaça. Esta, uma intimidação grave e séria; aquela, um constrangimento físico (vias de fato ou lesões corporais leves, porque, se graves, é caso de roubo qualificado). A subtração de coisa alheia móvel realizada mediante qualquer outro meio que impeça a resistência do ofendido à perda dos seus bens também configura o delito. Em síntese, no roubo próprio, a violência, a grave ameaça ou qualquer outro meio similar são praticados para a retirada dos bens da vítima, antes ou durante a subtração. Qualquer indivíduo pode ser sujeito ativo ou passivo e, em se tratando de crime material, a tentativa é plenamente admissível. O momento da consumação delitiva, porém, é objeto da mesma discussão doutrinária relativa ao crime de furto. Sobre o assunto, entende-se que o crime só se consuma quando o agente retira a coisa da esfera de disponibilidade da vítima, invertendo a posse. Roubo Impróprio (art. 157, 1º) O roubo impróprio ocorre quando a violência ou grave ameaça é praticada logo depois da subtração, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. Aqui, os meios para elidir a resistência da vítima são utilizados quando o agente já efetuou a subtração; diferenciando-se, pois, do roubo próprio. Discute-se, por isso, se a tentativa é possível, havendo dissenso na doutrina. Roubo Majorado (art. 157, 2º) A pena do crime de roubo é aumentada de 1/3 até a metade: se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma, o que não inclui o uso de arma de brinquedo, estando cancelada a Súmula 174 do STJ. É imprescindível a apreensão da arma e a perícia para que incida a majorante. Ainda, se há concurso de duas ou mais pessoas; se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância; se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior, e se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. Por isso, embora se fale em roubo qualificado, em verdade o dispositivo prevê causas de aumento de pena decorrentes da maior reprovabilidade da conduta. Roubo Qualificado pelas Lesões Corporais Graves (art. 157, 3º, 1ª parte) Se da violência empregada decorrem lesões corporais graves, a hipótese é de roubo qualificado e a pena é agravada em razão do maior desvalor do resultado. Não importa se essas lesões advieram de dolo ou de culpa, mas é imprescindível que tenham sido causadas pela violência física empregada contra a vítima ou, ainda, contra terceira pessoa, e não pela grave ameaça ou por qualquer outro meio utilizado pelo agente para proceder à subtração. Latrocínio (art. 157, 3º, 2ª parte) O latrocínio é um crime complexo, ou seja, uma unidade jurídica composta pelos delitos de roubo e homicídio (da vítima ou de terceiro). Trata-se, pois, do roubo qualificado pelo resultado morte. Sua configuração exige o dolo na conduta antecedente, mas não importa se houve dolo ou culpa na subsequente, porque o agravamento da 163

164 pena decorre do maior desvalor do resultado. Outrossim, apesar de atingir o bem jurídico vida, no latrocínio, a morte é um meio para o crime-fim que é contra o patrimônio da vítima, o que afasta a competência do Tribunal do Júri para seu julgamento. No latrocínio, a questão da consumação e da tentativa é tormentosa, sendo possíveis as seguintes hipóteses: roubo consumado + homicídio tentado = tentativa de latrocínio; roubo consumado + homicídio consumado = latrocínio consumado; roubo tentado + homicídio tentado = tentativa de latrocínio; e roubo tentado + homicídio consumado = latrocínio consumado (Súmula 610, STF). Por fim, resta lembrar que, consoante art. 1º da Lei 8.072/90, o latrocínio é crime hediondo. Extorsão (art. 158) A extorsão é crime complexo que atinge a pessoa e o seu patrimônio. A figura típica consiste em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a fazer, tolerar que se faça ou se deixe de fazer alguma coisa, a fim de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica. Embora semelhantes, a extorsão diferencia-se do roubo porque, aqui, o agente não toma a coisa alheia pessoalmente: é a vítima quem lhe entrega ou coloca à sua disposição a vantagem indevida. Para sua configuração é preciso, portanto, que haja coação do sujeito passivo, por meio de violência ou grave ameaça, e que esteja presente o elemento subjetivo especial do tipo consistente na intenção de obter indevida vantagem econômica para si ou para outrem. Essa vantagem, a seu turno, não se restringe às coisas móveis alheias: a elementar normativa inclui qualquer interesse ou direito patrimonial da vítima. Sua efetiva obtenção, no entanto, é mero exaurimento da extorsão, que se consuma com a vítima sendo constrangida a fazer, omitir ou tolerar que se faça algo. É que, embora a extorsão seja crime formal (Súm. 96 do STJ), o mero constrangimento, sem a posterior atuação da vítima, constitui apenas tentativa. Se o crime for cometido por duas ou mais pessoas ou com emprego de arma, a pena é aumentada de 1/3 até a metade (art. 158, 1º). Outrossim, se da extorsão decorrem lesões corporais de natureza grave ou morte, o delito é qualificado pelo resultado, à semelhança do que ocorre no crime de roubo (art. 158, 3º). Finalmente, por força do art. 1º, III, da Lei n /90, a extorsão qualificada pela morte é considerada crime hediondo. Extorsão mediante Sequestro (art. 159) Trata-se de modalidade especial e mais grave do crime de extorsão, tendo em vista haver a supressão da liberdade da vítima. A conduta típica é sequestrar alguém contra a sua vontade, privando-a de sua liberdade, com a finalidade de obter qualquer vantagem como condição ou preço do resgate, ou seja, em contrapartida à liberação do sequestrado. É, pois, crime permanente que se consuma no exato momento em que a vítima é sequestrada, mesmo antes do pedido do resgate. O Código Penal fala em qualquer vantagem, não especificando a necessidade de ser ela indevida ou econômica, o que gera controvérsia na doutrina. Também não se exige que ela seja efetivamente alcançada: seu recebimento é mero exaurimento do delito. No entanto, é a finalidade específica de obtê-la para si ou para outrem que distingue o tipo em apreço do crime de sequestro. Trata-se do especial fim de agir, o qual pode surgir mesmo depois de já ter o agente sequestrado a vítima, bastando, para isso, que passe ele a exigir determinada condição ou preço para a libertação do refém. O crime é qualificado se a duração da privação da liberdade for superior a vinte e quatro horas e se a vítima for menor de dezoito anos, tendo em vista que tais circunstâncias ampliam o desvalor da ação e do resultado, justificando a maior penalização. Não obstante, a prática de crime por quadrilha ou bando também qualifica o delito; mas, para tanto, não basta o mero concurso de pessoas: é preciso, nos moldes do art. 288 do CP, a reunião de mais de três pessoas para a prática de crimes indeterminados (art. 159, 2º). Se da extorsão mediante sequestro decorrerem lesões corporais graves ou morte, a pena também é exasperada em razão do resultado (art. 159, 2º e 164

165 3º). De outra parte, no caso de crime praticado em concurso de pessoas, o 4º prevê uma causa de diminuição de pena como prêmio ao participante delator que, com sua denúncia às autoridades, facilite a libertação do sequestrado. A extorsão mediante sequestro é crime hediondo tanto na forma simples quanto nas qualificadas. Extorsão Indireta (art. 160) Este tipo penal objetiva proteger a regularidade das relações entre credor e devedor. A ação típica é exigir ou receber documento que possa dar causa a procedimento criminal, contra a vítima ou contra terceiro, em razão de garantia de dívida e com abuso da situação de alguém. Ilícito, portanto. Não é o crédito em si, mas a garantia exigida, e o que se quer coibir é a coação e a prática de chantagem por parte de agiotas contra o devedor necessitado USURPAÇÃO Pelo termo usurpação entende-se, em síntese, a conduta de quem adquire alguma coisa com fraude ou indevidamente. Neste capítulo, o bem jurídico protegido são os bens imóveis que não podem ser objeto de furto. Alteração de Limites, Usurpação de Águas e Esbulho Possessório (art. 161) São três figuras similares de infrações contra a posse e a propriedade imóvel. No primeiro caso, suprime-se ou desloca-se algum sinal indicativo de limite para se apropriar da coisa imóvel alheia e, no segundo, desvia-se ou se represa água alheia. Em ambos, exige-se o especial fim de obter proveito para si ou para outrem. Na terceira hipótese, está-se diante de crime complexo, que ocorre quando alguém invade, com violência ou grave ameaça, ou em concurso de pessoas, terreno ou edifício alheio, com o especial fim de esbulhar. A ação penal, para todas as figuras, é pública incondicionada, e, se empregada violência, o agente responde também pelo crime correspondente ( 2º). Contudo, sendo a propriedade particular e não havendo violência à pessoa, somente se procede mediante queixa ( 3º). Supressão ou Alteração de Marca em Animais (art. 162) Aqui, protege-se a posse e a propriedade dos semoventes. As condutas tipificadas são suprimir e alterar marca ou sinal indicativo de propriedade. Tal ação deve ser não autorizada, incidente sobre animais alheios já marcados e há de estar presente, ainda, o escopo de se apoderar dos semoventes. A ação penal é pública incondicionada DANO Dano (art. 163) Dano é o prejuízo causado a alguém com a destruição, inutilização ou deterioração de seu patrimônio. Na modalidade simples do delito, basta o ato de estragar ou destruir coisa corpórea móvel ou imóvel da vítima. Nessa linha, quem desaparece com coisa alheia não pratica crime algum. Na forma qualificada (art. 163, parágrafo único), o dano deve ter sido praticado com violência ou grave ameaça (inc. I); com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constituir crime mais grave (inc. II); contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista (inc. III); ou por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima (inc. IV). Na última hipótese e em caso de dano simples, somente se procede mediante queixa (art. 167). 165

166 Introdução ou Abandono de Animais em Propriedade Alheia (art. 164) O tipo penal pune a introdução ou o abandono de animais em propriedade de outrem, sem que haja consentimento para tanto e desde que ocorra efetivo prejuízo. O prejuízo, ou seja, o dano economicamente apreciável, deve ser a consequência, e não o escopo da conduta. Havendo consentimento do ofendido, o fato é atípico. A ação é exclusivamente privada. Dano em Coisa de Valor Artístico, Arqueológico ou Histórico (art. 165) e Alteração de Local Especialmente Protegido (art. 166) Estes artigos foram tacitamente revogados, respectivamente, pelos arts. 62, I, e 63 da Lei n /98 (Lei dos Crimes Ambientais), que regulam completamente a mesma matéria APROPRIAÇÃO INDÉBITA Apropriação Indébita (art. 168) Apropriar-se é apossar-se, tomar como sua coisa que pertence a outrem. Assim, para que ocorra o crime de apropriação indébita, o agente deve ter disponibilidade física direta ou imediata da coisa alheia, ou seja, pressupõe-se tenha ele a anterior posse ou detenção legítima do objeto da apropriação indevida. Por isso, alguns autores entendem tratar-se de crime próprio que só pode ser cometido por quem recebeu a coisa em confiança. O elemento subjetivo do crime é o dolo, constituído pela vontade livre e consciente de apropriar-se e não restituir a coisa alheia. Discute-se, outrossim, a necessidade de existência ou não do elemento subjetivo especial transformador da natureza da posse, de alheia para própria, havendo entendimento doutrinário em ambos os sentidos. De todo modo, para a caracterização da apropriação indébita o animus rem sibi habendi precisa ficar demonstrado à sociedade, de modo que, se o agente não manifesta a intenção de ficar com a res e a restitui tão-logo possível, ou se há apenas demora ou descaso em devolvê-la, o dolo da apropriação indébita não se aperfeiçoa. O momento da consumação delitiva é de difícil precisão, pois depende de uma atitude subjetiva do agente, ocorrendo quando este inverte o título da posse exercida sobre a coisa, passando a dela dispor como se proprietário fosse. A certeza de que houve tal inversão, porém, só se dá por algum ato externo, típico de quem é dono, praticado pelo agente. Por fim, se a coisa foi recebida em depósito necessário; se o agente é tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamenteiro ou depositário judicial (enumeração taxativa); ou se recebeu a coisa em razão de ofício, emprego ou profissão, a pena é aumentada em 1/3 (art. 168, 1º). Apropriação Indébita Previdenciária (art. 168-A) Nesta modalidade especial de apropriação indébita, o bem jurídico protegido são as fontes de custeio da seguridade social. A conduta típica do caput é deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes. É preciso, pois, que o sujeito ativo já tenha recebido ou recolhido tais contribuições e que delas tenha se apossado, não as restituindo ao INSS nos moldes legais. Nesse caso, o sujeito ativo é o substituto tributário que, por lei, tem o dever repassar as contribuições à previdência social. Já no parágrafo primeiro, o sujeito ativo é o contribuinte-empresário, ou seja, o titular de firma individual, sócios solidários, gerentes, diretores ou administradores que efetivamente tenham concorrido com a prática delituosa. Nesse caso, as figuras típicas consistem, em síntese, em deixar de recolher contribuições ou outra importância destinada à previdência social ou deixar de pagar benefício devido a segurado quando aquela já reembolsou os valores à empresa. Em todos os casos, trata-se de crime próprio, formal, omissivo e o sujeito passivo é sempre o Estado, BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. v. 3. São Paulo: Saraiva, pp. 220 e

167 representado pelo INSS. Outrossim, consoante o 2º, extingue-se a punibilidade se o agente declara e confessa a dívida e efetua seu pagamento antes do início da ação fiscal e, ainda, presta as informações devidas à previdência. O 3º, a seu turno, cria uma hipótese sui generis: com o pagamento total depois de iniciada a ação fiscal, pode-se conceder o perdão judicial ou aplicar somente a pena de multa. Para tanto, além do adimplemento da dívida, exige-se que o valor do débito previdenciário seja de pouca monta e o réu, primário e com bons antecedentes. Por fim, cumpre salientar que, na hipótese de a empresa deixar de repassar as contribuições previdenciárias em razão de estado de absoluta insolvência, a jurisprudência tem admitido a inexigibilidade de conduta diversa como causa de exclusão da culpabilidade. Se não encerrada a discussão na esfera administrativa, não há justa causa para a ação penal. Apropriação de Coisa Havida por Erro, Caso Fortuito ou Força da Natureza, de Tesouro ou de Coisa Achada (art. 169) Esta modalidade de apropriação indébita distingue-se daquela prevista no art. 168 no tocante à transferência da posse. Aqui, a coisa alheia passa ao poder do agente por erro, caso fortuito ou força da natureza. Saliente-se que, no caso da apropriação de coisa achada, o crime só se perfectibiliza se superados os quinze dias que o achador tem para entregar ou devolver a coisa. Apropriação Privilegiada (art. 170) Aos crimes de apropriação indébita se aplica a privilegiadora prevista para o furto (art. 155, 2º) ESTELIONATO E OUTRAS FRAUDES Estelionato (art. 171) O estelionato é um delito cuja forma de execução é bastante variada e que não ofende apenas o patrimônio individual, mas também a liberdade dos negócios e a boa-fé, ou seja, o interesse coletivo. A ação típica, aqui, é obter vantagem ilícita para si ou para outrem em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento. A conduta, portanto, é composta: trata-se de colocar ou manter a vítima em situação de engano para, com isso, conseguir um benefício ou um lucro ilícito. Com efeito, no estelionato o agente conduz a vítima à falsa percepção da realidade ou, já estando ela em erro no qual se envolveu sozinha, deixa-a nessa situação e dela se aproveita. A vítima, por sua vez, colabora com o agente sem perceber que está se despojando de seus pertences. A característica fundamental do estelionato é o emprego da fraude, que é o meio utilizado pelo agente para obter a vantagem patrimonial ilícita. Difere, porém, do furto mediante fraude porque neste a fraude é empregada para iludir a atenção ou vigilância do ofendido que nem percebe que a coisa lhe está sendo subtraída. No estelionato, ao contrário, não há subtração: a própria vítima, em erro, entrega a coisa ao agente. Nesse tocante, o legislador fala em ardil, artifício ou qualquer outro meio fraudulento, permitindo a interpretação analógica para abarcar qualquer método capaz de ludibriar a vítima. A vantagem, a seu turno, pode ser qualquer beneficio, ganho ou lucro indevido que implique perda para outra pessoa. Além do dolo, exige-se o especial fim de agir, que é a vontade de destinar a vantagem ilícita para si ou para outrem. O crime consuma-se com o locupletamento ilícito, ou seja, no momento e no lugar em que o agente obteve a vantagem buscada, com a consequente lesão do patrimônio da vítima. Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo ou passivo, à exceção, no último caso, dos incapazes, que, por não terem capacidade de discernimento, não podem ser considerados ludibriados. 167

168 Estelionato Privilegiado (art. 171, 1º) Da mesma forma que no furto e na apropriação indébita, aplica-se o privilégio previsto no art. 155, 2º ao estelionato tanto à conduta tipificada no caput quanto àquelas enumeradas no 2º. Para tanto, o réu deve ser primário e de pequena monta o prejuízo por ele causado. Disposição de Coisa Alheia como Própria (art. 171, 2º, I), Alienação ou Oneração Fraudulenta de Coisa Própria (art. 171, 2º, II), Defraudação de Penhor (art. 171, 2º, III), Fraude na Entrega de Coisa (art. 171, 2º, IV) e Fraude para Recebimento de Indenização ou Valor de Seguro (art. 171, 2º, V) São modalidades especiais de estelionato, às quais, a par das suas peculiaridades, se aplicam os elementos estruturais previstos para o tipo fundamental. Fraude no Pagamento por meio de Cheque (art. 171, 2º, VI) São duas as ações incriminadas: emitir cheque sem suficiente provisão de fundos ou frustrar seu pagamento, conquanto haja provisão para tanto. O sujeito ativo é o emitente do cheque; o passivo, seu beneficiário, ou seja, a pessoa física ou jurídica que tem seu patrimônio lesado pela fraude. Os vários elementos normativos do tipo (cheque, sacado, provisão de fundos) devem ser buscados no Direito Comercial. Não obstante haja controvérsia na doutrina, trata-se de crime material, o qual só se consuma quando da frustração da compensação no banco sacado. Nesse sentido é a Súmula 521 do STF que dispõe que o foro competente para processo e julgamento deste crime é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado. Saliente-se que o cheque, aqui, deve ter sido dado como ordem de pagamento à vista, não havendo crime se ele tem sua finalidade específica desvirtuada. É o caso do cheque sem data, pós-datado, dado como garantia de dívida ou como promessa de pagamento. Não havendo fraude, não há crime (Súmula 246, STF). Ademais, não basta o dolo: é preciso haver o propósito específico de obter vantagem econômica indevida com a prática delituosa. Finalmente, resta salientar que o STF firmou entendimento no sentido de que, pago o cheque antes do oferecimento da denúncia, descaracterizado estará o delito (Súmula 554). Estelionato contra idoso (art. 171, 4º) a pena é aplicada em dobro caso o crime seja cometido contra idoso. Conforme o art. 1º do Estatuto do Idoso (Lei /13), idosos são pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Duplicata Simulada (art. 172) Trata-se de expedir ou aceitar fatura, duplicata ou nota de serviço falsa, isto é, que não corresponda a uma efetiva compra e venda ou prestação de serviços. Por força do parágrafo único, também incorre nesse crime quem falsifica ou adultera a escrituração do livro de registro de duplicatas. Abuso de Incapazes (art. 173) Aqui, o sujeito passivo é a pessoa menor, alienada ou débil mental, e o bem jurídico protegido, seu patrimônio. A conduta típica é abusar do incapaz para induzi-lo à prática de ato suscetível de produzir efeitos jurídicos em proveito próprio ou alheio e em prejuízo do sujeito passivo ou de terceiro. Sendo crime formal, porém, a consumação independe da efetiva obtenção do proveito, bastando que tenha havido o abuso. Induzimento à Especulação (art. 174) É crime de perigo cujo sujeito passivo é a pessoa inexperiente, simples ou mentalmente inferior. A ação típica é abusar da situação da vítima para induzi-la a prática de jogo, aposta ou à especulação com títulos e mercadorias, sabendo o agente ser tal operação ruinosa e agindo ele em proveito próprio ou alheio. Fraude no Comércio (art. 175) Trata-se de enganar o consumidor ou adquirente, seja vendendo mercadoria falsificada ou deteriorada como verdadeira ou perfeita, seja entregando uma mercadoria por outra. Se a fraude se dá no comércio específico de metais ou pedras preciosas, o desvalor da conduta é maior e a pena mais grave ( 1º). Aplica-se a este crime a privilegiadora prevista para o furto ( 2º). 168

169 Outras Fraudes (art. 176) São três as condutas puníveis: tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel e utilizar-se de meio de transporte, sabendo não ter recursos para pagar as despesas efetuadas. É, pois, crime material cuja ação penal é pública condicionada à representação do ofendido e para o qual está prevista a possibilidade de perdão judicial (parágrafo único). Saliente-se que não ocorre crime quando o consumidor dispõe de numerário suficiente para o pagamento, mas se recusa a fazê-lo por qualquer razão. Fraudes e Abusos na Fundação ou Administração de Sociedade por Ações (art. 177) O caput deste artigo cuida da fraude na constituição da sociedade por ações, ao passo que o 1º se refere às fraudes praticadas no seu funcionamento. A esses crimes se aplica o princípio da subsidiariedade, de modo que eles só se configuram se o fato não constituir crime contra a economia popular (Lei n /51). Emissão Irregular de Conhecimento de Depósito ou Warrant (art. 178) Warrant é título pignoratício, ou seja, atribui ao seu portador o direito real de penhor da mercadoria nele especificada e conhecimento de depósito é o título de propriedade da mercadoria, atribuindo ao portador a disponibilidade da coisa. 63 Irregular, por sua vez, é a emissão dos referidos títulos em desacordo com o Decreto nº 1102/1903. Fraude à Execução (art. 179) Pressupõe-se, neste caso, a existência de ação de execução judicial contra o sujeito passivo. O crime consiste em inviabilizar a constrição de bens a fim de impossibilitar a satisfação da pretensão do credor. Para tanto, o agente aliena, desvia, destrói ou danifica seus bens, ou simula dívidas. Somente se procede mediante queixa, mas se o crime é cometido contra a União, Estado ou Município, a ação penal é pública incondicionada (art. 24, 2º, do CPP) RECEPTAÇÃO Receptação (art. 180, caput) A incriminação da receptação almeja inutilizar o produto do crime nas mãos do culpado pelo delito anterior, tornando mais fácil a recuperação da coisa subtraída. Nessa linha, a receptação dolosa traduz-se em um tipo misto alternativo e, ao mesmo tempo, cumulativo. É que são duas as condutas puníveis, podendo-se falar em receptação própria e imprópria. A primeira consiste em adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, tendo por objeto material coisa produto de crime. Assim, o delito é de resultado, consumando-se com a tradição da res e, na modalidade de transportar, conduzir e ocultar, o crime é permanente, de modo que sua consumação se protrai no tempo. A imprópria, por sua vez, caracteriza-se quando alguém influi para que terceiro de boa-fé adquira, receba ou oculte coisa oriunda da prática de um delito antecedente. Nesse caso, a receptação é crime de mera atividade, bastando para sua consumação a prática de qualquer ato idôneo a influir terceira pessoa a realizar alguma das condutas previstas e não sendo possível, por isso, a tentativa. Em ambos os casos, porém, é imprescindível que a coisa seja produto de um crime, mesmo que não patrimonial, necessitando haver prova da sua ocorrência, ainda que não haja processo criminal com trânsito em julgado, e não se admitindo, por conseguinte, as contravenções. Com efeito, o 4º determina que a BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. v. 3. São Paulo: Saraiva, p

170 receptação é punível mesmo que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa. O produto do crime, ademais, pode ser direto ou indireto, o que inclui objetos adquiridos com dinheiro furtado, por exemplo, mas exclui os instrumentos utilizados para a prática delituosa. A receptação da receptação também é possível. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, não se incluindo o coautor ou partícipe do crime antecedente, por se tratar, nesse caso, de pós-fato impunível. Contudo, a receptação só pode ser praticada com dolo direto, exigindo-se, ainda, a presença do elemento subjetivo especial do tipo consistente no fim de obter proveito ilícito para si ou para outrem. De fato, é esse especial fim de agir que distingue a receptação do favorecimento real, no qual não há animus lucrandi. Por fim, ressalte-se que a pena é aplicada em dobro se os bens ou instalações objeto da receptação são de patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista (art. 180, 6º). Receptação Qualificada (art. 180, 1º) A receptação dolosa é qualificada quando perpetrada no exercício de atividade comercial ou industrial, mediante as condutas de adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda ou, de qualquer forma, utilizar, em proveito próprio ou alheio, coisa que deve saber ser produto de crime. Trata-se de crime próprio e, por expressa previsão do 2º, equipara-se à atividade comercial qualquer forma de comercio irregular ou clandestino, mesmo se exercido em residência. É preciso, porém, que tais atividades revistam-se de caráter de continuidade e que esteja presente o animus lucrandi do agente. Quanto ao tipo subjetivo, há discussão na doutrina acerca da possibilidade de a receptação qualificada ser praticada com dolo direto, porque o tipo se vale do elemento normativo devia saber. Entende-se, porém, que o tipo penal abrange o dolo direto e o eventual, apenas exigindo a mera dúvida, e não a certeza do agente quanto à origem criminosa da coisa. Receptação Culposa (art. 180, 3º) O tipo culposo da receptação, alvo de constantes críticas, visa a punir o agente que adquire ou recebe coisa que devia presumir ter sido obtida por meio criminoso, tendo em vista sua natureza, a desproporção entre o valor e o preço ou a condição de quem a oferece. A conduta culposa reside na imprudência do agente que, deixando de se valer das diligências devidas, não presumiu o que era presumível. O crime é de resultado e, por ser culposo, não admite tentativa. Outrossim, se o réu é primário e considerando as circunstâncias, o juiz pode conceder-lhe o perdão judicial (art. 180, 5º, 1ª parte). Receptação Privilegiada (art. 180, 5º, 2ª parte) A todas as formas de receptação dolosa, sendo o agente primário, de pequeno valor a coisa receptada e favoráveis as circunstâncias do art. 59, CP, pode ser concedido o privilégio previsto no art. 155, 2º. A propriedade imaterial engloba a propriedade intelectual e a propriedade industrial. No entanto, os crimes relativos a esta última estão hoje previstos na Lei n /96 e o crime de 170

171 usurpação de nome ou pseudônimo alheio (art. 185) foi revogado pela Lei n /03. Restam, pois, os delitos previstos no art. 184 e seus parágrafos. Violação de Direito Autoral (art. 184) O bem jurídico protegido é o direito autoral, que surge, sem necessidade de qualquer formalidade, com a criação da obra original, assim como os direitos que lhe são conexos, ou seja, aqueles pertencentes aos artistas intérpretes ou executantes, aos produtores fonográficos e às empresas de radiodifusão. A conduta delituosa prevista no caput é a violação desses direitos sem intuito de lucro. Já os parágrafos 1º, 2º e 3º, ao acrescentarem circunstâncias especiais de transgressão de direito autoral, estabelecem figuras qualificadas para a violação havida com intuito de lucro direto ou indireto. Nesses casos, a pena é substantivamente maior, deixando claro o objetivo de combater a prática da pirataria de obras protegidas por direitos autorais, inclusive pela Internet. Finalmente, o 4º determina a exclusão da tipicidade relativamente a situações de exceção ou limitação do direito autoral previstas na Lei n /98, bem como no caso da cópia única para uso privado do copista, sem intuito de lucro. A ação penal é privada quanto ao caput, pública condicionada à representação no caso do 3º e pública incondicionada nas hipóteses dos 1º e 2º, ou quando o delito é cometido em desfavor de entidades de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público (art. 186). Súmulas do STJ: Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem (Súm. 574); Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas (Súm. 502). Os crimes previstos neste Título são onze e objetivam proteger não a liberdade individual, mas a organização do trabalho, criminalizando condutas perturbadoras da ordem jurídica no que concerne a este direito fundamental. No entanto, é rara sua aplicação, razão pela qual muitos doutrinadores os denominam crimes de moldura. A ação penal, em todos os casos, é pública incondicionada. Atentado contra a Liberdade de Trabalho (art. 197), contra a Liberdade de Contrato de Trabalho e Boicotagem Violenta (art. 198) e contra a Liberdade de Associação (art. 199) São espécies de constrangimento ilegal, dele diferindo tão somente na finalidade específica que orienta a conduta do agente. Os modos de execução dos delitos são dois: mediante violência ou grave ameaça. Nos três tipos penais, ora em análise, a pena prevista deve ser cumulada àquela correspondente à violência empregada que, de per si, constitua crime. 171

172 Paralisação de Trabalho, seguida de Violência ou Perturbação da Ordem (art. 200) e Paralisação de Trabalho de Interesse Coletivo (art. 201) Os tipos referem-se à greve (abandono do trabalho por empregados) e ao lockout (suspensão do trabalho por empregadores). No art. 200, exige-se a paralisação do trabalho e a posterior prática de atos violentos, que podem ser contra pessoa ou contra coisa. No art. 201, tipifica-se a paralisação que provoque a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo, independentemente da violência. Contudo, a greve sem violência não é crime: é direito constitucionalmente assegurado (art. 9º, 2º, CF). Por isso, grande parte da doutrina entende que, tendo em vista a Lei nº 7.783/79 e a Constituição Federal, o art. 201 encontra-se revogado. Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola. Sabotagem (art. 202) Distingue-se do crime de dano em razão do especial fim de impedir ou perturbar o curso normal do trabalho, elemento típico sem o qual o delito em exame não se configura. Frustração de Direito Assegurado por Lei Trabalhista (art. 203) e Frustração de Lei sobre a Nacionalização do Trabalho (art. 204) Trata-se de frustrar direito assegurado pela legislação do trabalho, no primeiro caso, ou obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho, na segunda hipótese. Nos incisos do 1º do art. 203 estão previstos dois tipos penais assemelhados cujas condutas típicas devem pretender impossibilitar o desligamento do trabalho e, no 2º, há uma majorante. Os meios de execução dos crimes em questão devem ser a fraude ou a violência, e a pena, cumulada com aquela correspondente à vis corporalis. Exercício de Atividade com Infração de Decisão Administrativa (art. 205) Para a configuração deste crime habitual, é mister que a decisão infringida seja administrativa, e não judicial, e que se relacione a trabalho, ofício ou profissão. Nessa linha, pratica o crime, por exemplo, quem continua advogando mesmo depois de ter tido cancelada sua inscrição junto à OAB. Aliciamento para o fim de Emigração (art. 206) e Aliciamento de Trabalhadores de um Local para Outro do Território Nacional (art. 207) Nos dois tipos penais, exigem-se, no mínimo, três trabalhadores e se objetiva punir a emigração e o êxodo aliciados, não os espontâneos. Esses crimes distinguem-se quanto à finalidade, porque, no art. 206, o deslocamento fraudulento de trabalhadores é para fora do país, ao passo que no art. 207 o aliciamento não ultrapassa as fronteiras nacionais. Finalmente, os 1º e 2º do art. 207 preveem, respectivamente, um tipo penal que contém elementos das duas infrações anteriores e uma majorante. Ultraje a Culto e Impedimento ou Perturbação de Ato a Ele Relativo (art. 208) Trata-se, em verdade, de três crimes distintos, os quais protegem o sentimento religioso, garantia constitucional (art. 5º, VI, CF). A primeira conduta delituosa consiste em escarnecer, ou seja, 172

173 zombar de alguém publicamente e por motivo de crença ou função religiosa da vítima. A segunda, impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso. A terceira, vilipendiar, ou seja, menosprezar publicamente ato ou objeto de culto religioso. A pena majora-se de um terço quando o crime for praticado com uso de violência, sem prejuízo, saliente-se, da pena a ela correspondente. Impedimento ou Perturbação de Cerimônia Funerária (art. 209) Para a configuração deste crime, a conduta impeditiva ou turbadora deve dirigir-se contra enterro ou cerimônia fúnebre. Deve haver, ainda, o especial fim de violar o sentimento de respeito ao morto, ainda que tal elemento subjetivo especial do injusto encontre resistência na jurisprudência. Havendo violência, a pena é majorada em um terço; se ela constituir crime em si mesma, haverá soma das penas. Violação de Sepultura (art. 210) O bem jurídico protegido, como no artigo anterior, é o sentimento de respeito aos mortos. A conduta tipificada consiste em violar ou profanar, isto é, abrir ou tratar com desprezo. O objeto material é a sepultura ou a urna fúnebre entendidas em sentido amplo, mas desde que nelas haja restos humanos. Quanto à violação da sepultura com a finalidade de furtar, encontram-se dois entendimentos: a) a violação resta absorvida pelo furto TJSP, RT 598/313; b) se o furto é do próprio cadáver ou de partes dele, configura-se o crime do art. 211, ou mesmo do art. 210 do CP, e não o de furto, pois é coisa fora do comércio e a ninguém pertence TJSP, RJTJSP 107/467, RT 608/305. Destruição, Subtração ou Ocultação de Cadáver (art. 211) As condutas delituosas alternativas consistem em destruir, subtrair ou esconder cadáver ou parte dele, o que pode ocorrer antes ou depois do sepultamento. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, até mesmo os familiares do morto; mas, por se tratar de crime vago, não há sujeito passivo determinado. É crime de resultado, na hipótese de ocultação, permanente. A inumação irregular não caracteriza o crime, tratando-se de mera contravenção. Vilipêndio a Cadáver (art. 212) Vilipendiar é desprezar ou aviltar o cadáver ou suas cinzas. A conduta pode ser cometida por meio de gestos ou palavras, escritas ou verbais. Além do dolo, é preciso o elemento subjetivo especial do tipo consistente na vontade de humilhar ou desonrar a memória do morto. Se as palavras vilipendiosas proferidas contiverem calúnias contra o morto, há concurso formal entre o crime de vilipêndio e o de calúnia contra os mortos. Em todos os crimes deste capítulo, a ação penal é pública incondicionada CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL Estupro (art. 213) A reforma trouxe a grande inovação de que, agora, o crime pode ter como sujeitos ativo e passivo tanto o homem como a mulher, pois não existe mais a figura do crime 173

174 de atentado violento ao pudor como autônomo, estando ambos reunidos no art. 213 do Código Penal. Tanto é assim, que se a mulher constranger o homem a com ela manter conjunção carnal, agora teremos o crime de estupro. Antes, havia um vácuo legislativo. Permanecem idênticas as figuras da violência e da grave ameaça e deixa de existir a figura da violência presumida prevista no revogado art. 224 do Código Penal. Aqui, portanto, no estupro, a violência apenas pode ser real. Relevante questão diz respeito ao término da questão relativa ao concurso de crimes entre estupro e atentado violento ao pudor. Ou seja, praticada a conjunção carnal e o ato libidinoso diverso da conjunção, dentro do mesmo contexto temporal, haverá crime único, devendo isso ser levado em conta na fixação da pena. O 1º do art. 213 do Código Penal prevê o aumento de pena se do crime resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 anos ou maior de 14. Quanto à idade, é imprescindível que o agente aja com dolo. A lesão deve decorrer da conduta do réu. No 2º do mesmo artigo há o resultado morte, que também deve decorrer da conduta do agente, sendo que houve redução da pena máxima. Saliente-se que estes resultados mais graves podem tanto decorrer de culpa como de dolo, sendo os tipos preterdolosos. Violação Sexual Mediante Fraude (art. 215) Foram unificadas as antigas figuras da posse sexual mediante fraude e do atentado ao pudor mediante fraude. O sujeito passivo pode ser tanto homem como mulher. Neste crime, no entanto, não pode ter havido violência ou grave ameaça. Neste caso, haverá o crime de estupro. Assédio Sexual (art. 216-A) É imprescindível que haja superioridade hierárquica ou ascendência funcional em relação ao sujeito passivo, pois são elementares do crime. Logo, trata-se de crime próprio. O tipo consiste em constranger alguém, com o fim de obter concessões sexuais, abusando de sua condição de superioridade ou ascendência decorrentes de emprego, cargo ou função. O sujeito ativo do delito pode ser homem ou mulher, hetero ou homossexual, desde que apresente a elementar relativa à hierarquia funcional ou ascendência. Também o sujeito passivo pode ser de qualquer sexo, mas deve se encontrar na condição subalterna exigida pelo tipo. Outrossim, trata-se de crime formal, consumando-se com a prática de atos concretos, efetivos, suficientemente idôneos para demonstrar a existência de constrangimento. Independe, portanto, da obtenção da vantagem ou favorecimento sexual. A grave ameaça é absorvida pelo assédio. Destaque-se que o assédio moral não é abarcado pela figura típica em comento. Quanto ao acréscimo do parágrafo único, haverá aumento de pena quando a vítima for menor de 18 anos. O agente deve ter conhecimento desta circunstância. Ou seja, apenas se admite o dolo nesta majorante CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL Estupro de Vulnerável (art. 217-A) Pelo princípio da taxatividade, são pessoas vulneráveis aquelas que possuam uma forma reduzida de defesa e, por esta razão, acabem tornando a conduta do agente muito mais reprovável. São elas: pessoa menor de 14 anos; pessoa que, por enfermidade mental, não tiver o necessário discernimento para a prática do ato; pessoa que, por deficiência mental, não tiver o necessário discernimento para a prática do ato e pessoa que, por qualquer outra causa, não possa oferecer resistência.

175 Não há mais as hipóteses do art. 224 do Código Penal e, como já existem em outros tipos penais, haverá qualificadoras, quando o resultado for lesão corporal de natureza grave ou morte. Os resultados aqui em comento tanto poderão ser obtidos a título de culpa como de dolo. Pessoa menor de 14 anos e consentimento: O STJ (RECURSO REPETITIVO - Tema: 918) assim decidiu: Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime (STJ, REsp /PI, 3ª Seção, j. 26/08/2015). Corrupção de Menores (art. 218) Induzir significa criar uma ideia, colocar uma ideia na cabeça de alguém, até então inexistente. Aqui tem-se a figura típica de quem induz vulnerável (menor de 14 anos) a satisfazer a lascívia de outrem. Aqui, logicamente não poderá haver qualquer participação no crime de estupro, que irá ser identificado por meio de atos que visem àquele crime. Apenas haverá este crime em comento quando se tratar de pessoa determinada. Satisfação de Lascívia Mediante Presença de Criança ou Adolescente (art. 218-A) Aqui o agente pratica qualquer espécie de ato libidinoso na presença de pessoa menor de 14 anos, a fim de satisfazer a sua lascívia. Claro que não poderá haver qualquer participação do vulnerável no ato. Neste caso, o crime será outro. Este crime é mais amplo do que o crime do art. 241-D, do Estatuto da Criança e do Adolescente, que apenas prevê a figura típica quando se trata de criança e estabelece forma específica de atração da criança. Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável (art B) Trata-se de favorecimento à prostituição de pessoa menor de 18 anos de idade ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato. São condutas que exigem a habitualidade e que se prestam a vítima determinada. Por ser um tipo mais novo e mais abrangente, acabou por revogar o art. 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, tacitamente. Se houver finalidade de obtenção de vantagem ainda será aplicada a pena de multa. Inovação importante em relação ao crime do Estatuto da Criança e do Adolescente, é que aquele que mantém conjunção carnal ou ato libidinoso com a pessoa menor de 18 e maior de 14 nesta situação, ficará sujeito às mesmas penas. O proprietário do local, o gerente ou o responsável serão da mesma forma, de acordo com as penas previstas para o caput. É efeito automático da condenação, ainda, a cassação do alvará ou licença de funcionamento do local ou estabelecimento. Atenção: trata-se de crime hediondo (art. 1º, VIII, da Lei 8.072/90). AÇÃO PENAL (art. 225) Não há mais ação penal privada nestes delitos, sendo a regra a ação penal pública condicionada à representação, ainda que sobrevenha resultado lesão grave ou morte. No entanto, será incondicionada a ação penal quando a vítima for menor de 18 anos, mentalmente enferma ou com deficiência mental (vulnerável). Vítima que está vulnerável apenas por ocasião do fato: para o STJ, a ação continuará pública condicionada à representação (STJ, 6ª T., HC , j. 11/11/2014). 175

176 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA (art. 226) Nos crimes em apreço, a pena é aumentada de quarta parte se o crime é cometido em concurso de duas ou mais pessoas (inc. I); e de metade se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou tem, por qualquer outro título, autoridade sobre ela (inc. II) LENOCÍNIO E TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL Mediação para Servir a Lascívia de Outrem (art. 227) Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo ou passivo, homem ou mulher. Mais, não podem se referir a pessoas indeterminadas. Do contrário, não haverá este crime. O crime é qualificado se praticado contra maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, ou se o agente é seu ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de educação, de tratamento ou de guarda ( 1º). Se a vítima for menor de 14, haverá o crime do art. 218 do Código Penal. Também é qualificado se cometido com emprego de violência, grave ameaça ou fraude ( 2º). Trata-se de hipótese de concurso material expresso, aplicando-se também a pena correspondente à violência. Favorecimento da Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual (art. 228) Punemse neste artigo as condutas tendentes à prostituição e à exploração sexual. As condutas são criar a ideia, angariar, seduzir, colocar à disposição e obstaculizar totalmente o abandono à prostituição por alguém. Exige-se habitualidade. Nas formas qualificadas, a pena será maior quando o crime for praticado por aquelas pessoas de quem a vítima deveria esperar proteção, cuidado e zelo. Do contrário, acaba sendo o seu algoz. No parágrafo segundo, pune-se com maior severidade a conduta que é praticada com violência, grave ameaça ou fraude, muito comum nestes casos. Havendo violência, será aplicada a regra do concurso material art. 69 do Código Penal. No parágrafo terceiro, pune-se também com a pena de multa quando o crime visa ao lucro, o que é muito em razão da natureza do delito. Casa de Prostituição (art. 229) Trata-se da conduta de manter estabelecimento em que se verifica a ocorrência de exploração sexual, independentemente da prática de qualquer ato sexual pelas pessoas que o ocupem. Dispensa-se a ocorrência de lucro no crime e o crime é habitual. Para os Tribunais Superiores não incide o princípio da adequação social: A jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido de que eventual tolerância de parte da sociedade e de algumas autoridades públicas não implica a atipicidade material da conduta de manter casa de prostituição, delito que, mesmo após as recentes alterações legislativas promovidas pela Lei n /2009, continuou a ser tipificada no artigo 229 do Código Penal (6ª T., REsp , j. 03/06/2014). No mesmo sentido: STF, 1ª T., HC , j. 08/02/2011. Rufianismo (art. 230) Rufião ou cafetão é quem explora mulheres que fazem da prostituição seu meio de vida. A conduta típica é tirar proveito, o que ocorre quando o agente tem participação direta nos lucros ou é sustentado por quem exerce a prostituição. O consentimento da vítima é irrelevante, mas a habitualidade da conduta do agente é indispensável para a configuração

177 do crime. As formas qualificadas vêm previstas nos 1º e 2º e se referem à menoridade da vítima, autoridade do agente e violência e grave ameaça. Tráfico Internacional de Pessoa para Fim de Exploração Sexual (art. 231) Trata-se da conduta do envio de pessoa para o exterior com o fim de ser explorada sexualmente. Trata-se de crime formal, ou seja, consuma-se com a prova de qualquer ato tendente ao envio ilegal de pessoa ao exterior com o fim de obter a exploração sexual. A competência será, pelo art. 109 da Constituição da República, da Justiça Federal. Figura típica equiparada 1º: Trata-se da punição da pessoa que agencia, intermedeia a remessa de pessoa ao exterior com o fim de exploração sexual e, ainda, o que compra a pessoa objeto do negócio. Majorantes A pena será aumentada de metade nos casos de a vítima ser vulnerável, de o crime ter sido cometido por sujeito que tenha vinculação com a vítima (grau de parentesco, por exemplo), ou quando houver violência ou grave ameaça. Tráfico Interno de Pessoa para Fim de Exploração Sexual (art. 231-A) Retirou-se o verbo intermediar, punindo-se agora somente o deslocamento, dentro do território nacional, da vítima, para a prostituição ou exploração sexual. Assim como no crime anterior, verifica-se a ocorrência das mesmas majorantes, elevando-se a pena em metade (idêntico patamar de aumento) ULTRAJE PÚBLICO AO PUDOR Ato Obsceno (art. 233) É crime que depende dos tempos, ou seja, do aspecto cultural de cada localidade e da aceitação social de cada sociedade em que venha a ocorrer. Por isso se fala, em muitos casos, modernamente, no princípio da Teoria da Adequação Social. O ato deve ser praticado em local público, aberto ou exposto ao público, independentemente de ter sido visto por alguém. Por esta razão, o crime é formal. Escrito ou Objeto Obsceno (art. 234) Trata-se de tipo misto alternativo, sendo que praticadas mais de uma conduta no mesmo contexto fático, haverá crime único. Se houver participação de criança ou adolescente no ato obsceno, haverá o crime do art. 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente. AUMENTO DE PENA Art. 234-A Nos crimes contra a dignidade sexual, aumenta-se a pena de metade se do crime resultar gravidez e de 1/6 até metade se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. Com sabe ou deve saber, tem-se o aumento da pena tanto se o sujeito ativo agir com dolo direto ou com dolo eventual, respectivamente. Art. 234-B Visa a preservar a intimidade das vítimas e, por esta razão, os processos seguirão em segredo de justiça. 177

178 27.1. CRIMES CONTRA O CASAMENTO Quanto a este capítulo, cumpre referir que o crime de adultério, antes previsto no art. 240, foi revogado pela Lei n /05. Bigamia (art. 235) A bigamia é crime bilateral, pois exige a intervenção de duas pessoas. A conduta típica consiste em pessoa casada contrair novo matrimônio, momento em que se dá a consumação delitiva. Aquele que contrai casamento com pessoa que sabia ser casada também é punido ( 1º), mas se anulado o casamento anterior, por qualquer motivo, ou o posterior, por razão diversa da bigamia, o crime é inexistente. Induzimento a Erro Essencial e Ocultação de Impedimento (art. 236) e Conhecimento Prévio de Impedimento (art. 237) Erros essenciais são aqueles previstos no art do CC; impedimento que não pode ser casamento anterior, sob pena de caracterizar-se o crime de bigamia e aqueles do art e do CC. No caso do art. 236, a ação penal é de iniciativa exclusiva do cônjuge enganado, que só pode intentá-la com o trânsito em julgado da sentença anulatória do casamento. Quanto ao art. 237, embora norma subsidiária em relação ao art. 236, a ação é pública incondicionada. Simulação de Autoridade para Celebração de Casamento (art. 238) e Simulação de Casamento (art. 239) No primeiro caso, trata-se de se atribuir falsamente autoridade competente para celebrar casamento; no segundo, a ação delituosa é simular casamento, enganando o outro nubente CRIMES CONTRA O ESTADO DE FILIAÇÃO Registro de Nascimento Inexistente (art. 241) Consiste em, por exemplo, registrar filho de mulher que não pariu ou filho nascido morto como se vivo estivesse. Este crime absorve a falsidade ideológica pela especialidade e pela consunção. Parto Suposto. Supressão ou Alteração de Direito Inerente ao Estado Civil de Recémnascido (art. 242) São quatro as condutas tipificadas: dar parto alheio como próprio, registrar como seu filho de outrem, ocultar o neonato ou substituí-lo, sendo que, nos dois últimos casos, exige-se o especial fim de suprimir ou alterar direito inerente ao seu estado civil. No parágrafo único, vem previsto o privilégio referente ao motivo de reconhecida nobreza. O crime aqui previsto também prevalece sobre a falsidade. Sonegação de Estado de Filiação (art. 243) O agente, neste caso, deixa o menor em asilo ou instituição similar, não lhe revelando a filiação ou lhe atribuindo filiação falsa. Para a configuração desse delito é preciso, ainda, o especial fim de prejudicar direito inerente ao estado civil da vítima. 178

179 27.3. CRIMES CONTRA A ASSISTÊNCIA FAMILIAR Abandono Material (art. 244) Sujeitos ativos são os cônjuges, genitores, ascendentes ou descendentes e sujeitos passivos, somente aqueles enumerados no dispositivo, que é numerus clausus. As figuras delituosas são deixar de prover meios necessários à subsistência do cônjuge, filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho e ascendente inválido ou maior de sessenta anos, ou deixar de socorrer ascendente ou descendente gravemente enfermo. Tais condutas devem carecer de justa causa, ou seja, não podem ser amparadas por lei. Consoante o parágrafo único, incorre na mesma pena quem, sendo solvente, deixa de pagar pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada. Entrega de Filho Menor a Pessoa Inidônea (art. 245) O núcleo do tipo é entregar e o objeto, o filho menor de dezoito anos. A entrega deve dar-se para pessoa cuja companhia traga perigo moral ou material ao menor e, se praticada com intuito de lucro, o delito é qualificado ( 1º). A qualificadora também se configura quando a entrega tem o fito de envio do menor ao exterior e, nesse caso, também se pune quem auxilia a efetivação do ato com intuito de lucro ( 2º). Se houver finalidade de lucro, aplica-se o art. 238 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Abandono Intelectual (art. 246) e Abandono Moral (art. 247) No art. 246, trata-se de deixar, sem justa causa, de dar instrução primária ao filho em idade escolar. O agente, portanto, são os pais da criança, que deve ter entre sete e quatorze anos. No art. 247, por sua vez, permite-se que menor de dezoito anos realize as condutas previstas nos incisos I a IV. O sujeito ativo, nesse caso, pode ser qualquer pessoa a quem o menor tenha sido confiado. Em ambos os crimes, a ação penal é pública incondicionada CRIMES CONTRA O PÁTRIO PODER, TUTELA OU CURATELA Induzimento a Fuga, Entrega Arbitrária ou Sonegação de Incapazes (art. 248) São três condutas típicas: induzir menor de dezoito anos ou interdito à fuga; confiar o menor a outrem de modo arbitrário, e deixar de entregar o menor, sem justa causa. Esse crime não se confunde com a subtração de incapazes, porque nesta, o menor é retirado, e não apenas persuadido a sair do lugar em que se encontrava. Subtração de Incapazes (art. 249) Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive pais, tutores ou curadores destituídos ou temporariamente privados do poder familiar, tutela ou curatela ( 1º). A conduta típica é subtrair o incapaz do poder, guarda ou vigilância de quem tem direito. Se a subtração ocorrer com finalidade de obtenção de resgate, o crime é do art. 159; se houver violência, o agente responde em concurso com ela. Finalmente, para esse crime está previsto o perdão judicial ( 2º). 179

180 28.1. CRIMES DE PERIGO COMUM Nos crimes deste Capítulo, a ação penal é pública incondicionada e, nos termos do art. 258, estão previstas formas qualificadas pelas lesões corporais ou pela morte. Incêndio (art. 250), Explosão (art. 251), Uso de Gás Tóxico ou Asfixiante (art. 252) Sem a existência de perigo para a vida, integridade física ou patrimônio de outrem, estes crimes, que pressupõem a exposição a perigo comum concreto, e não abstrato -, não se configuram. No art. 250, a conduta típica é causar incêndio, embora o dano efetivo seja mero exaurimento. No art. 251, cuida-se de explosão, arremesso ou colocação de engenho de dinamite ou substância de efeitos análogos. Por sua vez, no art. 252 a exposição a perigo dá-se por meio de uso de gás tóxico ou asfixiante. A modalidade culposa vem prevista em todos os casos e para o incêndio e para a explosão há previsão, ainda, de causas de aumento de pena. Fabrico, Fornecimento, Aquisição, Posse ou Transporte de Explosivos ou Gás Tóxico, ou Asfixiante (art. 253) Estas cinco modalidades de condutas típicas alternativas, se praticadas sem licença de autoridade, configuram o crime, cujo perigo comum causado é presumido pela lei. Se o fabrico de explosivos é meio para a prática do crime de dano qualificado, este absorve aquele. Inundação (art. 254) e Perigo de Inundação (art. 255) No art. 254, pune-se quem causa a inundação de forma dolosa ou culposa. No art. 255, a seu turno, o agente remove, destrói ou inutiliza obstáculo natural ou obra destinada a impedir inundação. Em ambos, deve haver perigo concreto à vida, à integridade física ou ao patrimônio de outrem. Saliente-se, por fim, que o crime do art. 255 é, em síntese, fase preparatória do crime de inundação, excepcionalmente tipificada. Desabamento ou Desmoronamento (art. 256) A ação típica consiste em causar desabamento ou desmoronamento total ou parcial, desde que com isso se motive o surgimento de perigo concreto para pessoas e bens. Há previsão da modalidade culposa. Subtração, Ocultação ou Inutilização de Material de Salvamento (art. 257) Este delito só tem lugar se praticado quando da ocorrência de incêndio, inundação, naufrágio ou outro desastre ou calamidade e tem por objeto os meios destinados ao serviço de combate ao perigo, de socorro ou de salvamento. Pune-se, pois, quem impede ou dificulta esses serviços, assim como quem subtrai, oculta ou inutiliza os meios para tanto. Difusão de Doença ou Praga (art. 259) Trata-se de disseminar doença ou praga que possa causar dano à floresta, à plantação ou a animais de utilidade econômica. Há previsão de modalidade culposa (parágrafo único). 180

181 28.2. CRIMES CONTRA A SEGURANÇA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E TRANSPORTE E OUTROS SERVIÇOS PÚBLICOS Perigo de Desastre Ferroviário (art. 260) e Desastre Ferroviário (art. 260, 1º) No crime de perigo, o núcleo do tipo é impedir ou perturbar serviço de estrada de ferro por meio de ato de que possa resultar desastre. Se o desastre efetivamente ocorre, a figura é qualificada ante o maior desvalor do resultado ( 1º) e se passa a punir também a forma culposa ( 2º). O 3º, a seu turno, é norma penal explicativa, haja vista fornecer o conceito de estrada de ferro para fins do artigo. Atentado contra a Segurança do Transporte Marítimo, Fluvial ou Aéreo (art. 261) e Atentado contra a Segurança de Outro Meio de Transporte (art. 262) Na hipótese do art. 261, a figura típica do caput é expor a perigo embarcação ou aeronave ou praticar ato tendente a impedir ou dificultar a navegação. No caso do art. 262, as mesmas condutas estão previstas, mas o objeto é qualquer outro meio de transporte público. Em ambos os casos, a figura é qualificada se da conduta do agente resulta sinistro ou desastre, sendo que aí se pune também a título de culpa. Finalmente, se o crime do art. 261 é praticado com fim de lucro, a pena prevista é maior (art. 261, 2º). Aos crimes do art. 260 a 262, em caso de desastre ou sinistro, aplica-se o disposto no art. 258, ou seja, as qualificadoras decorrentes do resultado lesões corporais ou morte. Arremesso de Projétil (art. 264) Trata-se de arremessar projétil contra veículo destinado ao transporte público, desde que esteja ele em movimento. Havendo lesão corporal ou morte, aplica-se pena mais grave em razão do resultado qualificador (parágrafo único). Atentado contra a Segurança de Serviço de Utilidade Pública (art. 265) Aqui, atentar é colocar em risco, por meio de atos executórios, a segurança ou o funcionamento de serviço de utilidade pública. Tratando-se de crime de atentado, não se admite a tentativa, porque a lei já pune como crime consumado o mero início de execução. Em sentido contrário: Mirabete e Delmanto. Interrupção ou Perturbação de Serviço Telegráfico ou Telefônico (art. 266) A conduta típica é interromper ou perturbar tais serviços ou, ainda, impedir ou dificultar seu restabelecimento. O 1º prevê como conduta equiparada quem interrompe serviço telemático ou de informação de utilidade pública, ou impede ou dificulta-lhe o restabelecimento. A pena é dobrada quando o crime é cometido durante estado de calamidade pública ( 2º) CRIMES CONTRA A SAÚDE PÚBLICA Conforme dispõe o art. 285, aos crimes deste capítulo aplicam-se as qualificadoras previstas no art. 258, salvo quanto ao delito de epidemia. Epidemia (art. 267) A ação tipificada consiste em causar epidemia, ou seja, doença que acomete, em curto espaço de tempo e em determinado lugar, várias pessoas. Tal conduta dá-se com a propagação, pelo agente, de germes patogênicos, e a doutrina se divide quanto à possibilidade ou não de seu cometimento na forma omissiva. A pena é aplicada em dobro se do fato resulta morte ( 1º), hipótese em que o crime é hediondo (art. 1º, VII, da Lei 8.072/90). Há também previsão de modalidade culposa ( 2º). 181

182 Infração de Medida Sanitária Preventiva (art. 268) O objeto material deste crime é a determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa, a qual é infringida pelo agente. Se o autor for funcionário da saúde pública, médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro, tendo em vista o dever que lhes é inerente, a pena é majorada em um terço ( 1º). Omissão de Notificação de Doença (art. 269) É crime próprio, porque só pode ser praticado por médico. É, ainda, de mera conduta, haja vista se configurar quando o agente deixa de denunciar à autoridade pública doença de notificação compulsória. Envenenamento de Água Potável ou de Substância Alimentícia ou Medicinal (art. 270) Este crime estava listado como hediondo até o advento da Lei nº 8.930/94, que o retirou desse rol. A conduta típica é envenenar água potável de uso comum ou particular ou, ainda, substância alimentícia ou medicinal destinada ao consumo. Sujeita-se à mesma pena quem entrega a consumo ou tem em depósito para fim de distribuição a água ou substância envenenada ( 1º). Por derradeiro, o 2º prevê a modalidade culposa do delito. Corrupção ou Poluição de Água Potável (art. 271) O agente, dolosa ou culposamente, torna a água imprópria para consumo ou nociva à saúde, na medida em que a corrompe ou polui. Falsificação, Corrupção, Adulteração ou Alteração de Substância ou Produtos Alimentícios (art. 272) Com pena notadamente desproporcional, este tipo penal pune quem falsifica, corrompe, adultera ou altera substância ou produto alimentício destinado a consumo, tornando-o, assim, nocivo à saúde ou com reduzido valor nutritivo; quem de qualquer forma distribui ou entrega a consumo tal produto, e quem pratica tais ações com relação a bebidas, com ou sem teor alcoólico. Em qualquer das formas, pode dar-se também a figura culposa. Falsificação, Corrupção, Adulteração ou Alteração de Produto Destinado a Fins Terapêuticos ou Medicinais (art. 273) Trata-se de crime hediondo por previsão do art. 1º, VII-B, da Lei nº 8.072/90. As condutas típicas são falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais. Atenção: a Corte Especial do STJ, no julgamento da AI no HC /PR, reconheceu, por maioria, a desproporcionalidade do preceito secundário do art. 273, 1º-B, do CP, declarando sua inconstitucionalidade. Emprego de Processo Proibido ou de Substância Não-Permitida (art. 274) e Invólucro ou Recipiente com Falsa Indicação (art. 275) No art. 274, o agente emprega, no fabrico de produto destinado a consumo, substâncias ou processos não expressamente permitidos pela legislação sanitária. No art. 275, o núcleo do tipo é inculcar, ou seja, apontar, citar. Em síntese, o agente refere, no invólucro ou recipiente do produto alimentício, terapêutico ou medicinal, a presença de substância que, em verdade, não se encontra ou existe em quantidade menor no seu conteúdo. Finalmente, o art. 276 prevê um tipo penal remetido, haja vista cominar pena de reclusão e multa para quem vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, entrega a consumo produto nas condições dos dois dispositivos anteriores. Substância Destinada à Falsificação (art. 277) As condutas tipificadas são vender, expor à venda, ter em depósito ou ceder substância especificamente voltada à falsificação de produtos alimentícios, terapêuticos ou medicinais. Discute-se, no caso, se a finalidade de falsificação da substância deve ser inequívoca (Delmanto) ou se pode ter ela múltipla destinação, devendo-se analisar no caso concreto a razão de agir do autor (Nucci). 182

183 Outras Substâncias Nocivas à Saúde Pública (art. 278) O agente vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou entrega a consumo substância ou coisa nociva à saúde. Exige-se a nocividade efetiva da coisa ou substância, que, se destinada à alimentação ou com fim medicinal, configurará os crimes dos art. 272 ou 273; pois se cuida, aqui, de crime subsidiário. A modalidade culposa também vem prevista, ocorrendo quando a prática da conduta decorre de negligência, imprudência ou imperícia por parte do agente. Medicamento em Desacordo com Receita Médica (art. 280) O sujeito ativo, para alguns autores, é somente o farmacêutico ou o prático. Grande parte da doutrina, entretanto, entende tratar-se de crime comum. A conduta punível consiste em fornecer, dolosa ou culposamente, substância medicinal em desacordo com receita médica. Exercício Ilegal da Medicina, Arte Dentária ou Farmacêutica (art. 282) O legislador comina pena a quem exerce, ainda que gratuitamente, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal, ou seja, sem registro do título e licença. A conduta típica engloba, ainda, aquele que excede os limites da profissão, tratando-se, nesse caso, de crime próprio. Se praticado com intuito de lucro, o delito é qualificado. Charlatanismo (art. 283) O núcleo do tipo, neste artigo, é inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível. Com efeito, o charlatão se promove à custa de métodos questionáveis e perigosos de curar pessoas, fazendo-as crer numa infalibilidade que a medicina não pode, nem pretende, garantir. Curandeirismo (art. 284) Curandeirismo é a atividade praticada pela pessoa que promove curas sem qualquer título ou habilitação, em geral, por meio de rezas ou magias. Assim, este é um delito habitual que consiste em exercer referida atividade prescrevendo, ministrando ou aplicando, com regularidade, qualquer substância, usando gestos, palavras ou qualquer outro meio ou fazendo diagnósticos. Todavia, face ao livre exercício dos cultos religiosos, garantia constitucional (art. 5º, VI), não se pode considerar curandeirismo, por exemplo, os passes do espiritismo ou práticas litúrgicas de outras religiões. Outrossim, quando praticado mediante remuneração, o crime é qualificado. Incitação ao Crime (art. 286) Trata-se de incitar, ou seja, instigar a prática de crime. A conduta, porém, só ganha relevo penal se praticada publicamente. Na mesma linha, se a incitação é de prática de contravenção penal ou apenas menção genérica, e não específica, de crime, o delito não se configura. 183

184 Apologia de Crime ou Criminoso (art. 287) Aqui, o agente faz, publicamente, apologia de crime ou de autor de crime. Exige-se, para a tipificação, que se trate de crime, e não de contravenção penal, e, no caso de apologia a autor do crime, que se trate de pessoa condenada, com trânsito em julgado, não sendo suficiente a mera acusação. Associação Criminosa (art. 288) Trata-se da associação estável e permanente de três ou mais pessoas que se reúnem com o fim específico de cometer crimes. É a estabilidade e permanência e o objetivo de praticar vários crimes que diferencia este crime do concurso de pessoas. Por previsão do parágrafo único, a pena é aplicada em dobro se a quadrilha ou bando é armada ou se há participação de criança e adolescente. Ademais, quando os agentes têm por objetivo a prática de crimes hediondos e equiparados, a pena é maior: de três a seis anos, mas se houver delação de um dos membros, levando ao desmantelamento do grupo, este terá a pena reduzida (art. 8º e parágrafo único da Lei nº 8.072/90). Constituição de milícia privada (art. 288-A) A conduta tipificada é constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos no Código Penal MOEDA FALSA Moeda Falsa (art. 289) O bem jurídico protegido aqui é a moeda em curso no país ou no estrangeiro e a conduta típica, falsificar, ou seja, reproduzir imitando ou imitar com fraude, mediante fabrico ou alteração. Por previsão do 1º, também configura o delito importar, exportar, adquirir, vender, trocar, ceder, emprestar, guardar ou introduzir em circulação a moeda falsa. A reprodução, porém, deve ser convincente; se grosseira, o crime é impossível, podendo configurar, dependendo do caso, estelionato (Súmula 73 do STJ). Já o 2º prevê a figura privilegiada para quem recebe a moeda falsa de boa-fé e depois, ciente da falsidade, a restitui à circulação. Por fim, os 3º e 4º preveem a forma qualificada do delito, tratando-se, aqui, de norma penal em branco que exige complementação no tocante à autorização para circulação da moeda. Atenção: não incide o princípio da insignificância. Crimes Assimilados aos de Moeda Falsa (art. 290) As condutas tipificadas são formar cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de verdadeiros; suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, sinal indicativo de sua inutilização, para o fim de restituí-los a circulação, e restituir à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização. Salientese que, quanto à terceira conduta, aplica-se a teoria do fato posterior não punível, quando a restituição à circulação for feita pelo próprio agente que fabricou a cédula, nota ou bilhete, ou que suprimiu sinal identificador da sua utilização. A pena máxima é aumentada, acrescendo-se multa, se o crime for cometido por funcionário público que trabalhe justamente na repartição onde o dinheiro estava guardado ou que tenha acesso facilitado ao local em razão de seu cargo. 184

185 Petrechos para Falsificação de Moeda (art. 291) Trata-se de fabricar, adquirir, fornecer, possuir ou guardar qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. Esse crime é subsidiário, porque, se constituir fase preparatória para o delito de moeda falsa, o agente responderá tão somente pela infração penal prevista no art Emissão de Título ao Portador sem Permissão Legal (art. 292) A finalidade deste tipo penal é evitar que papéis não autorizados pela lei passem a ocupar, gradativamente, o lugar da moeda. Pune-se, portanto, quem emite, sem permissão, nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou que careça de indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago. Não obstante, o recebimento ou a utilização, como dinheiro, de algum desses documentos também constitui ilícito penal (parágrafo único) FALSIFICAÇÃO DE TÍTULOS E OUTROS PAPÉIS PÚBLICOS Falsificação de Papéis Públicos (art. 293) e Petrechos de Falsificação (art. 294) No caput do art. 293, pune-se a falsificação mediante as formas fabricar e alterar os objetos, que são os vários papéis públicos descritos nos incisos. No 1º, o agente usa, guarda, importa, exporta ou pratica qualquer das inúmeras condutas previstas relativamente aos papéis falsificados a que se refere o caput. Nos 2º e 3º, as condutas tipificadas são suprimir sinal indicativo da inutilização dos papéis ou, depois de alterados, usá-los. Finalmente, o 4º prevê uma figura privilegiada, cominando pena de detenção para quem usa ou restitui à circulação os papéis falsificados ou alterados, depois de conhecer da falsidade, e o 5º é uma norma de equiparação, com a nítida intenção de alcançar os comerciantes de rua, ou seja, os camelôs. No art. 294, a seu turno, está previsto como crime autônomo ato preparatório do crime de falsificação de papéis públicos. Em ambos os casos, a pena é aumentada em 1/6 se o agente é funcionário público, desde que tenha se prevalecido do cargo para a prática delituosa (art. 295) FALSIDADE DOCUMENTAL Falsificação de Selo ou Sinal Público (art. 296) Trata-se de falsificar, mediante fabrico ou alteração, sinal público da União, Estado ou Município (inc. I) ou selo ou sinal atribuído por lei à entidade de direito público ou autoridade, ou sinal público de tabelião (inc. II). Por força do 1º, incorre nas mesmas penas quem faz uso do selo ou sinal falsificado, utiliza o verdadeiro em prejuízo de alguém ou em proveito próprio; ou altera, falsifica ou faz uso indevido de qualquer símbolo de órgão ou entidade da Administração Pública. Em todas as hipóteses, a pena é majorada em razão da condição de funcionário público do agente, desde que se valha ele do cargo para cometer o crime ( 2º). Falsificação de Documento Público (art. 297) Protege-se, aqui, a autenticidade do documento público. A conduta típica é falsificar ou alterar documento público. No primeiro caso, o documento não existe, sendo criado pelo agente, no todo ou em parte; no segundo, já existe um documento verdadeiro, o qual é, no entanto, modificado. Documento público, a seu turno, é o documento de forma escrita emanado por funcionário público, nessa qualidade e no exercício de atividade pública, com competência e observância das formalidades legais para tanto. Incluem-se, aqui, para parte da doutrina, as fotocópias autenticadas, e a eles se equiparam os documentos emanados por entidades paraestatais, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações 185

186 de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular ( 3º). Não é documento público, porém, o documento particular autenticado, tampouco a fotocópia de documento público sem autenticação. Trata-se de um delito formal e de perigo cuja consumação se dá sem a necessidade de qualquer resultado posterior. Contudo, sua configuração exige que o falso seja capaz de ludibriar e faz necessário, ainda, o exame de corpo de delito para se atestar a falsidade material. Ademais, cumpre salientar que, por vezes, a falsificação é crime-meio e resta absorvida pelo crime-fim. É o que ocorre, consoante a Súmula 17 do STJ, quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva. Quando o agente pratica a falsificação e depois a usa, o agente também responde por um único delito, mas há discussão doutrinária no tocante ao crime absorvido. Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo; sendo ele funcionário público, porém, a conduta tem maior desvalor, razão pela qual a pena é aumentada 1/6, desde que o agente tenha se valido do cargo para chegar ao resultado típico (art. 297, 1º). Finalmente, os 3º e 4º enumeram outras ações típicas às quais se aplica a mesma pena prevista no caput. Falsificação de Documento Particular (art. 298) Se a falsificação tem por objeto documento particular, ante o menor desvalor da ação, a pena cominada é inferior àquela prevista para a falsificação de documento público. O parágrafo único deste artigo equipara a falsificação de cartão de crédito ou de débito à falsificação de documento particular. Falsidade Ideológica (art. 299) A falsidade ideológica difere da material porque nela não se altera a forma de um documento que era verdadeiro. O que há é uma informação falsa reduzida a escrito em um documento que, sob o aspecto material, é de todo verdadeiro. Por isso mesmo, o exame pericial não é cabível. O crime é formal e as condutas alternativas incriminadas são omitir declaração que deveria constar em documento público ou particular ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que deveria ser escrita. A declaração deve recair sobre fato juridicamente relevante; uma mera mentira ou irregularidade ou a falsidade feita com animus jocandi não configuram o delito. Além do dolo, exige-se o elemento subjetivo do tipo consistente no fim de prejudicar direito, criar obrigações ou alterar a verdade, de modo que a falsidade que não conduza a um desses três resultados é penalmente irrelevante. A falsidade ideológica é crime comum, mas se o agente é funcionário público e se prevalece do cargo para praticá-lo, a pena é aumentada 1/6, o mesmo ocorrendo se a falsidade ou alteração é de assentamento de registro civil (art. 299, parágrafo único). Saliente-se, porém, que o registro de filho alheio como próprio e o registro de nascimento inexistente são crimes autônomos, previstos, respectivamente, nos art. 249 e 241 do CP. Falso Reconhecimento de Firma ou Letra (art. 300) O agente, no exercício da função pública, reconhece como verdadeira firma ou letra que não é. Se o documento é público, ante o maior desvalor da ação, a pena cominada é superior àquela prevista para o documento particular. Certidão ou Atestado Ideologicamente Falso (art. 301); Falsidade Material de Atestado ou Certidão (art. 301, 1º) e Falsidade de Atestado Médico (art. 302) São crimes formais. No primeiro caso, o agente, em razão da sua função pública, atesta ou certifica falsamente uma circunstância ou fato, trazendo vantagem relativa ao setor público a alguém. O documento é formalmente perfeito, mas seu conteúdo é falso. No segundo caso, a finalidade de trazer vantagem a outrem é a mesma, mas o atestado ou a certidão são materialmente falsos. Na terceira hipótese, quem produz o atestado falso é o médico, no exercício da sua profissão. Em todos os casos, se a conduta é praticada com o fim de lucro, à pena privativa de liberdade acresce-se a de multa. 186

187 Reprodução ou Adulteração de Selo ou Peça Filatélica (art. 303) Este tipo penal foi substituído pelo art. 39 e parágrafo único da Lei nº 6.538/78, sobre serviços postais. Uso de Documento Falso (art. 304) Trata-se de um tipo penal remetido que não define a natureza do documento falsificado, não comina a pena aplicável, tampouco define a espécie de falsidade anterior, estando subordinado a outras figuras criminosas. É que o uso de documento falso tem como pressuposto a definição de qual das falsidades, dentre aquelas previstas nos art. 297 a 302, foi antes praticada. A conduta incriminada é fazer uso, ou seja, utilizar qualquer dos papéis falsificados ou alterados referidos nos art. 297 a 302 do CP como se fossem autênticos. É necessário que o documento falso tenha sido efetivamente usado em sua destinação específica, não bastando a mera alusão. Em se tratando de Carteira Nacional de Habilitação, porém, o simples porte já caracteriza o uso, ainda que o documento falso somente seja exibido por solicitação da autoridade. De outra parte, se o falso não se fizer presente, se a precedente falsificação for grosseira, sem potencialidade de causar dano, ou se há o uso de documento autêntico pertencente a terceiro, impossível tipificar o crime de uso. Quando o falsário é também o usuário do documento ilícito, há crime único. Discute-se, porém, se o agente responde pela falsidade material ou pelo uso. Sobre o tema, há autores que defendem que a falsidade absorve o uso, que funciona, então, como pós-fato impunível (Damásio, Bitencourt, Luis Regis Prado), ao passo que outros entendem que a falsidade, por ser crime-meio, resta absorvida pelo uso de documento falso, crime-fim (Nucci). De todo modo, a pena aplicada será sempre a mesma cominada ao crime de alteração ou falsificação, de acordo com a natureza pública ou privada do documento. Competência: A competência para processar e julgar o crime de uso de documento falso é firmada em razão da entidade ou órgão ao qual foi apresentado o documento público, não importando a qualificação do órgão expedidor (Súmula 546 do STJ). Supressão de Documento (art. 305) A conduta tipificada consiste em destruir, suprimir ou ocultar documento verdadeiro, público ou particular, de que não podia dispor, tendo como especial fim de agir em benefício próprio ou de terceiro ou, ainda, em prejuízo alheio. O agente, em síntese, destrói o documento como meio de prova. Assim como nos crimes anteriores, protege-se, aqui, a fé pública OUTRAS FALSIDADES Falsificação do Sinal Empregado no Contraste de Metal Precioso ou na Fiscalização Alfandegária, ou para outros Fins (art. 306) O tipo refere-se apenas a marcas ou sinais de caráter oficial, não se confundindo com os de natureza industrial. O crime se consuma com a efetiva falsificação ou alteração ou com o uso. Falsa Identidade (art. 307) e Uso, como Próprio, de Documento de Identidade Alheio (art. 308) Identidade é tudo que identifica a pessoa, como o estado civil e a condição social. O crime do art. 307 é de mão própria quando o agente atribui a si mesmo falsa identidade. Pode ele também atribuir a falsa identidade a terceiro. De todo modo, a conduta deve ser idônea a enganar e deve estar presente a finalidade de obter vantagem em proveito próprio ou alheio, ou o objetivo de causar dano a outrem. A consumação se dá com a atribuição efetiva da falsa identidade, ainda que não se atinja o especial fim de agir. No art. 308, o agente usa, como próprio, documento de 187

188 identidade alheia ou o cede a outrem, para que dele se valha, documento dessa natureza, próprio ou de terceiro. Nesse caso, o agente se passa por outra pessoa, sem, contudo, atribuir-se falsa identidade, e a consumação se dá com o uso ou a entrega para uso do documento alheio. Atenção: A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa (Súmula 522 do STJ). Fraude de Lei sobre Estrangeiros (art. 309) e Simulação da Figura de Proprietário ou Possuidor em Nome de Estrangeiro (art. 310) Na hipótese do art. 309, o estrangeiro usa, para entrar ou permanecer no território nacional, nome que não é seu, ou terceiro atribui a ele falsa qualidade, a fim de que ele ingresse no país. É atípica, por ausência de previsão legal, a imputação feita para que o estrangeiro permaneça no país. No caso do art. 310, de modo diverso, pessoa de nacionalidade brasileira assume a condição de testa-de-ferro, passando-se por proprietário ou possuidor de bens e valores que pertencem a estrangeiro, nos casos em que a este é vedado por lei assumir tal condição. Adulteração de Sinal Identificador de Veículo Automotor (art. 311) As condutas tipificadas no caput são adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento. Sendo o agente funcionário público, além de estar prevista uma majorante para a hipótese do caput ( 1º), incorrerá ele nas mesmas penas caso contribua para o licenciamento ou registro do veículo adulterado ou remarcado, desde que tenha consciência de tal condição. Fraudes em Certames de Interesse Público (art. 311-A) A conduta punida é utilizar ou divulgar indevidamente conteúdo sigiloso de concurso público, avaliação ou exames públicos, vestibular etc. Só admite modalidade dolosa e requer como elemento subjetivo específico o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame. Aquele que permite ou facilita o acesso de pessoas não autorizadas às informações sigilosas são punidos com a mesma pena ( 1º). Há tipo qualificado pelo resultado quando da conduta resulta dano à administração pública ( 2º). Se cometido por funcionário público, a pena é aumentada em 1/3 ( 3º). Aqui, o bem jurídico protegido é a Administração Pública, conceito que abrange toda atividade funcional do Estado e dos demais entes públicos CRIMES PRATICADOS POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL Os crimes aqui previstos são próprios, porque o sujeito ativo é sempre funcionário público, ainda que, por força do art. 30 do CP, possa o particular, em alguns casos, ser coautor. Outrossim, tendo em vista os arts. 323, I, e 514 do CPP é cabível a defesa preliminar.

189 Funcionário Público (art. 327) Para efeitos penais, o conceito de funcionário público é diverso daquele adotado pelo Direito Administrativo. Para o Código Penal, é funcionário público quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. Exemplo: Vereador, serventuário da justiça, Prefeito Municipal e estudante atuando como estagiário na Defensoria Pública. São equiparados ao funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, bem como os que trabalham para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública ( 1º). Se qualquer dessas pessoas ocupar cargo em comissão ou função de direção e assessoramento, será mais severamente sancionada ao cometer os delitos abaixo analisados, pois sua pena será elevada em um terço ( 2º). Peculato (art. 312) O caput do art. 312 abriga duas modalidades de peculato. A primeira delas é o peculato-apropriação, que consiste na ação do funcionário público de assenhorar-se de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo. A segunda, é o peculato-desvio. Nesta situação, o funcionário público dá ao objeto material aplicação diversa da que foi determinada, em proveito próprio ou alheio. Já o 1º prevê um crime funcional impróprio, o chamado peculato-furto. No caso, o funcionário não tem a posse do objeto material, mas o subtrai, ou concorre para que seja subtraído em proveito próprio ou alheio, valendo-se da facilidade que lhe proporciona a sua qualidade. O 2º tipifica, ainda, o peculato culposo, situação na qual o funcionário, culposamente, concorre para o crime de outrem. Ele é punido por não ter zelado pelo patrimônio público. Se houver a reparação do dano antes da sentença irrecorrível, a sua punibilidade será extinta; se for depois, a pena será reduzida pela metade. Fala-se, ainda, no peculato-uso, o qual consiste na utilização de bens ou serviços públicos. Em regra, é fato atípico. Contudo, se for praticado por prefeito municipal, configurará o crime previsto no art. 1º, II, do Decreto-Lei nº 201/67. Além do dolo, em todas as modalidades de peculato é necessário o especial fim de agir em proveito próprio ou alheio. Peculato mediante Erro de Outrem (art. 313) Trata-se do peculato-estelionato, outra modalidade de crime funcional impróprio. Neste caso, o agente se apropria de dinheiro ou utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro da vítima. Discute a doutrina se o erro de quem entrega tem que ser espontâneo (Hungria) ou se pode ser ele, também, induzido pelo agente receptor (Nucci). Inserção de Dados Falsos em Sistema de Informações (art. 313-A) e Modificação ou Alteração Não Autorizada de Sistema de Informações (art. 313-B) No art. 313-A, ao inserir dados falsos ou excluir dados verdadeiros em banco de dados da Administração Pública, o agente pretende obter vantagem indevida para si ou para outrem, ou causar dano. No art. 313-B, o agente modifica ou altera sistema de informações ou software sem autorização ou solicitação. Nesse caso, o resultado danoso, que é exaurimento do crime, majora a pena. Extravio, Sonegação ou Inutilização de Livro ou Documento (art. 314) - As condutas típicas são extraviar, sonegar ou inutilizar livro oficial ou outro documento de que tem a guarda em razão do cargo. É delito subsidiário que só se aplica quando não se configurar figura típica mais grave, como, por exemplo, aquela prevista no art

190 Emprego Irregular de Verbas ou Rendas Públicas (art. 315) Trata-se de dar ao dinheiro público aplicação diversa daquela estabelecida na lei. Concussão (art. 316) A conduta típica consiste em o funcionário exigir para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida. É crime formal, e sua consumação ocorre quando da exigência da vantagem, sendo o recebimento crime exaurido. A concussão não se confunde com a corrupção passiva, haja vista que, nesta, o funcionário faz mera solicitação, enquanto que, naquela, há uma exigência. Excesso de Exação (art. 316, 1º) - Ocorre quando o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio humilhante ou gravoso, que a lei não autoriza. Se o agente desviar os valores que recebeu indevidamente em proveito próprio ou alheio, incidirá na forma qualificada prevista no 2º. Corrupção Passiva (art. 317) - Ocorre quando o funcionário público solicita ou recebe vantagem indevida ou, ainda, quando aceita promessa de tal vantagem. Trata-se de crime formal, cuja consumação se dá com a efetiva solicitação, recebimento ou aceitação. Para a configuração do tipo, não se exige a ocorrência concomitante da corrupção ativa (art. 333), o que somente se verifica nas modalidades receber e aceitar. Há a majoração da pena em um terço quando o funcionário, motivado pela vantagem indevida ou promessa de recebê-la, retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo a dever funcional ( 1º). Existe, ainda, a figura privilegiada, que ocorre quando o funcionário efetivamente transige em seu dever, mas o faz cedendo a pedido ou influência de outrem, a quem lhe interessa agradar ou adular ( 2º). Facilitação de Contrabando ou Descaminho (art. 318) Incrimina-se a facilitação, com infração de dever funcional, da prática de contrabando ou descaminho. Saliente-se que, se não houver a transgressão de um dever da função do agente, ele não responderá por este delito, e sim enquanto partícipe do art Trata-se de crime formal, e sua consumação ocorre com a mera facilitação, sendo dispensável a efetivação do contrabando ou do descaminho. Por fim, importa referir que o processo é de competência da Justiça Federal. Prevaricação (art. 319) São tipificadas as condutas de retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfação de interesse ou sentimento pessoal. As duas primeiras modalidades são omissivas e a última, comissiva. Em qualquer das situações, é indispensável o elemento subjetivo especial do tipo representado pelo especial fim de agir para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Condescendência Criminosa (art. 320) O funcionário, neste caso, deixa de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, não tendo competência para tanto, não leva o fato ao conhecimento de quem a tem. Advocacia Administrativa (art. 321) O funcionário público, valendo-se de sua qualidade, patrocina, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração Pública. Como se vê, não se trata exatamente do exercício da advocacia, e sim da promoção de defesa, do patrocínio. Sendo ilegítimo o interesse privado patrocinado, o crime será qualificado. 190

191 Violência Arbitrária (art. 322) Consoante grande parte da doutrina, o tipo penal foi revogado pela Lei nº 4.898/65, que disciplina integralmente os crimes de abuso de autoridade. Abandono de Função (art. 323) e Exercício Funcional Ilegalmente Antecipado ou Prolongado (art. 324) No art. 323, trata-se de abandonar o cargo público, fora dos casos autorizados por lei. Se houver prejuízo público ou se o fato ocorrer na faixa de fronteira, o delito é qualificado. No art. 324, ao contrário do crime anterior, o agente entra no exercício da função pública antes de satisfazer as exigências legais, ou continua a exercê-la sem autorização, sabendo que já foi exonerado, removido, substituído ou suspenso. Violação de Sigilo Funcional (art. 325) Neste tipo penal, o funcionário revela ou facilita a revelação de fato que deveria ter permanecido em segredo e cujo conhecimento decorre do seu cargo. Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita, de alguma forma, o acesso de pessoas não autorizadas ao sistema de informações da Administração, bem como quem se utiliza indevidamente do acesso restrito. Havendo dano à Administração, o delito é qualificado. Violação do Sigilo de Proposta de Concorrência (art. 326) Este dispositivo foi revogado pelo art. 94 da Lei nº 8.666/93, sobre Licitação CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL Usurpação de Função Pública (art. 328) Função pública é o conjunto de atribuições inerentes ao serviço público. Usurpar, verbo-núcleo do tipo, é alcançar sem direito ou com fraude. Se com tal conduta o agente consegue obter alguma vantagem, o crime é qualificado; por outro lado, se o fato é inofensivo à Administração, não há crime. Resistência (art. 329) A conduta típica consiste em opor-se à execução de ato legal mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem esteja lhe prestando auxílio. Não serve à tipificação deste delito a resistência passiva, a qual configura mera desobediência (art. 330). Trata-se de crime formal, cuja consumação se dá com a prática da violência ou ameaça, independentemente de ser obstada a execução do ato. Contudo, se o ato efetivamente não se executa, resta configurada a forma qualificada prevista no 1º. Ademais, as penas do crime de resistência são aplicadas sem prejuízo das correspondentes à violência ( 2º). Desobediência (art. 330) A conduta incriminada consiste em desobedecer, ou seja, descumprir ordem legal de funcionário público, agindo ou omitindo-se, o que denota uma forma passiva de resistência criminosa. É preciso que se trate de ordem, não bastando o mero pedido ou solicitação, e que esta se dirija a quem tem o dever jurídico de obedecê-la, ainda que não se exija a presença do funcionário para a configuração delitiva. No entanto, se a conduta é acompanhada de violência ou ameaça, o delito é o do art Lei Maria da Penha: O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que o descumprimento injustificado de medida protetiva imposta judicialmente, nos termos da Lei n /06, não configura o delito previsto no art. 330 do Código Penal (STJ, 6ª T., AgRg no REsp , j. 28/06/2016). 191

192 Desacato (art. 331) A ação tipificada consiste em desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Desacatar significa desrespeitar, ofender, menosprezar, humilhar. O delito pode consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos, ou outros. Com relação ao concurso de crimes, entende-se que o desacato absorve a infração cometida em sua execução, caso ela seja mais leve (vias de fato, lesão corporal leve, entre outras). Caso contrário, há concurso formal (art. 70). 64 Advogado: o STF, no julgamento da ADI 1127/DF, declarou a inconstitucionalidade da expressão e desacato contida no art. 7º, 2º, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB). Tráfico de Influência (art. 332) Trata-se de solicitar, exigir, cobrar ou obter para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário no exercício de sua função. Se o agente do crime alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário, para corrupção deste, ocorre a majoração de sua pena (parágrafo único). Corrupção Ativa (art. 333) Incrimina-se a conduta de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. É indispensável que a promessa ou a oferta tenham sido feitas espontaneamente pelo agente; se motivadas por exigência do funcionário, não há corrupção ativa, e sim concussão (art. 316) por parte deste. Note-se que não haverá crime se a vantagem for concedida depois da ação ou omissão do funcionário sem anterior promessa, pois o crime consiste em dar para que se faça ou se omita, e não em dar porque se fez ou se omitiu. Trata-se de crime formal que se consuma quando o oferecimento ou a promessa chega ao conhecimento do funcionário, mesmo que este rechace o suborno. Contudo, se ele efetivamente retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional, a pena do agente é aumentada em um terço ( 1º). Saliente-se, por fim, que o crime de corrupção ativa não é, necessariamente, bilateral, sendo possível sua ocorrência sem que haja, também, corrupção passiva (art. 317) por parte do funcionário. Descaminho (art. 334) Consiste em iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo da mercadoria. O objeto do descaminho é o pagamento de direito ou imposto, tendo como bem jurídico o Erário. Mercadoria é qualquer coisa móvel passível de comercialização. O 1º comina a mesma pena a diversas outras condutas assemelhadas, algumas delas relativas à atividade comercial. Atividade comercial, para fins deste artigo, se equipara qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive os praticados em residências, como, por exemplo, os vendedores ambulantes ( 2º). O 3º, ao seu turno, duplica a pena na hipótese de o contrabando ou o descaminho ser praticado em transporte aéreo, em virtude da maior dificuldade de controle em tais situações. Princípio da insignificância: discute-se o valor do tributo sonegado para fins de incidência do princípio. Para o STJ, será insignificante o valor que não ultrapassa R$ ,00 (STJ, 5ª T., AgRg no AREsp , j. 02/08/2016). Já o STF possui decisões aumentando o valor para R$ ,00 (STF, 1ª T., HC AgR, j. 14/04/2015). Contrabando (art. 344-A) Consiste em importar ou exportar mercadoria proibida. Diferenciam-se do descaminho, porque o objeto do contrabando é a mercadoria proibida. O 1º No mesmo sentido: DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 666 e BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, p

193 comina a mesma pena da a diversas outras condutas assemelhadas, como, por exemplo, importar ou exportar clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou autorização de órgão público competente, reinserção no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação e adquirir, receber ou ocultar no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira. Aqui também atividade comercial, se equipara a qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive os praticados em residências, como, por exemplo, os vendedores ambulantes ( 2º). O 3º duplica a pena na hipótese de o contrabando ou o descaminho ser praticado em transporte aéreo, em virtude da maior dificuldade de controle em tais situações. Atenção: não incide o princípio da insignificância no crime de contrabando. Impedimento, Perturbação ou Fraude de Concorrência (art. 335) Este dispositivo também foi revogado pela Lei nº 8.666/93. Inutilização de Edital ou de Sinal (art. 336) O núcleo do tipo é rasgar, inutilizar ou conspurcar, e violar ou inutilizar, sendo que o objeto das duas últimas condutas é o selo ou o sinal, e das demais, o edital afixado. Subtração ou Inutilização de Livro ou Documento (art. 337) É a conduta de subtrair ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado ao funcionário em razão de seu ofício, ou ao particular em serviço público. Somente se pune a conduta descrita nesse tipo penal caso não se configure crime mais grave, como o dos arts. 305 e 314, CP. Sonegação de Contribuição Previdenciária (art. 337-A) O sujeito ativo pode ser tanto o empresário individual quanto aqueles que ocupam cargos administrativos e similares em empresas, sócios-gerentes, entre outros. O sujeito passivo é o Estado, representado pelo INSS. As condutas incriminadas são três: omitir-se de lançar na folha de pagamento ou guia de informações à previdência todos os segurados a seu serviço; deixar de lançar mensalmente as quantias descontadas dos segurados ou devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços nos títulos próprios da contabilidade da empresa, e omitir-se do dever de prestar ao INSS todas as informações atinentes aos fatos geradores de contribuição previdenciária. Em todos os casos, deve estar caracterizado o especial fim de agir no sentido de suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária. O alcance da proteção legal restringe-se, portanto, tão somente às contribuições que se destinem à seguridade social (Cofins, por exemplo). A norma em exame admite a extinção da punibilidade se, antes do início da ação penal, o agente, de forma espontânea, declara e confessa os valores sonegados e presta as devidas informações à Previdência ( 1º). Se houver o parcelamento da dívida, a pretensão punitiva estatal fica suspensa. Outrossim, o juiz pode deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa, desde que o agente seja primário e ostente bons antecedentes e o valor total das contribuições devidas seja igual ou inferior àquele estabelecido administrativamente pelo INSS como o mínimo para o ajuizamento das suas execuções fiscais ( 2º). Na mesma linha, se a sonegação foi praticada por pessoa física cuja folha de pagamento mensal seja inferior a R$1.510,00, a pena é reduzida de 1/3 à metade ou se aplica somente a pena de multa ( 3º). Tal valor é reajustado nas mesmas datas e índices dos benefícios da previdência social ( 4º). 193

194 31.3. CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ESTRANGEIRA Os crimes previstos neste capítulo tutelam a boa-fé, a regularidade e a transparência das relações comerciais internacionais. Funcionário Público Estrangeiro (art. 337-D) Para fins penais, funcionário público estrangeiro é toda pessoa que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, cargo, emprego ou função pública em entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro. Corrupção Ativa em Transação Comercial Internacional (art. 337-B) É figura típica similar à da corrupção ativa. Seu traço singular, entretanto, reside no fato de a vantagem indevida dirigirse a funcionário público estrangeiro e de o ato de ofício estar relacionado à transação comercial internacional. Ademais, ao contrário do crime do art. 333, o tipo em análise prevê as formas de execução, que tanto pode ser direta como indireta, ou seja, com ou sem interposta pessoa ou dissimulação. Por força do parágrafo único, a pena é majorada em 1/3 se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário público estrangeiro retarda ou omite o ato de oficio ou o pratica com infração a dever funcional. Tráfico de Influência em Transação Comercial Internacional (art. 337-C) Este tipo penal se assemelha ao crime de tráfico de influência. Por conseguinte, a conduta típica consiste em solicitar, exigir, cobrar ou obter para si ou para outrem vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público estrangeiro no exercício de sua função, e relacionado à transação comercial internacional. Nos mesmos moldes do art. 332, se o agente do crime alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário estrangeiro, para corrupção deste, há majoração da pena CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA Reingresso de Estrangeiro Expulso (art. 338) O sujeito ativo deste crime é o estrangeiro que, já expulso, reingressa no território nacional. A pena prevista é de reclusão, sem prejuízo de nova expulsão depois de seu cumprimento. Todavia, parte da doutrina entende que a ressalva final após o cumprimento da pena, estabelecida no preceito secundário do tipo, estaria revogada; porque, consoante o art. 67 da Lei nº 6.815/80, o cumprimento de pena não pode servir de pretexto para evitar a expulsão do estrangeiro quando esta é conveniente ao interesse nacional. Denunciação Caluniosa (art. 339) Trata-se de crime complexo que, sendo formado pela calúnia e pela conduta lícita de levar ao conhecimento da autoridade a prática de um crime e sua autoria, consiste em dar causa a instauração de investigação ou processo contra alguém, sabendo ser ele inocente. Os requisitos para a configuração do tipo são, portanto, a existência de um sujeito passivo determinado, a imputação de um crime e o conhecimento da inocência do acusado. Além disso, é preciso o dolo direto, de modo que se o agente procede à denúncia por achar possível, embora sem ter certeza da imputação, o delito não se configura. Consuma-se o crime quando da instauração da investigação policial ou administrativa, processo judicial, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa. Caso o agente, para a denúncia, se valha de anonimato ou de nome suposto, a pena é aumentada em 1/6 ( 1º). De outra parte, sendo a imputação de prática de contravenção, e não de crime, a pena é diminuída de metade ( 2º). 194

195 A denunciação caluniosa absorve a calúnia e dela se distingue porque aqui a imputação falsa de um fato definido como crime é levada ao conhecimento da autoridade. A difamação e a injúria, no entanto, não são absorvidas. Comunicação Falsa de Crime ou de Contravenção (art. 340) De modo diverso que no tipo penal anterior, este crime trata da provocação inútil de ação de autoridade, bastando, para sua configuração, que o agente faça com que a autoridade aja sem nenhum motivo. A comunicação, oral ou escrita, pode ser tanto de crime quanto de contravenção que o sujeito ativo sabe não ter ocorrido. Autoacusação Falsa (art. 341) Pratica o crime o agente que, perante autoridade, imputa a si mesmo a prática de crime inexistente ou praticado por outrem. Como lembra Delmanto, porém, diversa é a situação do acusado que, na polícia ou em juízo, se autoacusa de crime inexistente ou praticado por outrem para se defender de outro delito que lhe é imputado. Nesse caso, a pessoa não comete esse crime, tendo em vista as garantias constitucionais do direito ao silêncio, de não ser obrigado a depor contra si mesmo nem a se confessar ou se declarar culpado. 65 Falso Testemunho ou Falsa Perícia (art. 342) É um crime de mão própria que só pode ser cometido por testemunha, perito, tradutor ou intérprete. As condutas puníveis são afirmar o falso, negar ou calar a verdade, desde que praticadas com dolo e intenção de prejudicar a correta aplicação da justiça. Com efeito, o direito da testemunha de mentir ou calar a verdade existe, mas para evitar comprometer-se, já que ninguém está obrigado a se autoacusar. Nessa linha, a mera opinião da testemunha sobre os fatos não configura o crime; mas a opinião do perito, porque técnica, sim. Discute a doutrina acerca da necessidade do compromisso legal para a configuração do crime de falso testemunho, havendo entendimento em ambos os sentidos. O crime se consuma com o término do depoimento, porém, se houver retratação ou declaração da verdade antes da sentença, ele deixa de ser punível ( 2º). A participação é possível, mas quem dá, oferece ou promete dinheiro ou qualquer vantagem à testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete para que pratique o falso incorre no delito do art Finalmente, o 1º prevê como causas de aumento de pena o fato de o crime ter sido praticado mediante suborno ou com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil de que for parte a Administração. Coação no Curso do Processo (art. 344) Este tipo penal consiste em usar de violência ou grave ameaça para coagir pessoa envolvida em processo judicial, policial ou administrativo ou em juízo arbitral. Não é típica, porém, a conduta do advogado que intimida a testemunha, lembrando-a das penas para o falso testemunho, pois é interesse da administração da justiça que aquela diga a verdade sobre o que sabe. Exercício Arbitrário das Próprias Razões (arts. 345 e 346) O tipo previsto no art. 345 configura a justiça com as próprias mãos. Não importa se a pretensão a ser satisfeita era legítima, porque o monopólio de distribuição da justiça é estatal, ressalvado, ao particular, o exercício regular de direito, que, por óbvio, não configura o crime em análise. Se não houver violência, somente se procede mediante queixa. O art. 346, por sua vez, prevê crime próprio cujo autor é sempre o proprietário. As condutas puníveis são tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. Rio de Janeiro: Renovar, p

196 que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção. É o caso, por exemplo, de coisa penhorada ou guardada em depósito ou de automóvel alugado em poder do locatário. Fraude Processual (art. 347) O agente produz uma modificação no estado natural de coisa, lugar ou pessoa, com a finalidade de induzir em erro juiz ou perito no curso de processo civil ou administrativo. A inovação só é típica, porém, se artificiosa, ou seja, se praticada com intuito de fraudar. Não obstante, se a conduta se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que antes do seu início, as penas se aplicam em dobro (parágrafo único). Favorecimento Pessoal (art. 348) Pune-se a conduta de quem auxilia autor de crime a escapar da ação da autoridade pública. Fica isento de pena, porém, o ascendente, descendente, cônjuge ou irmão que pratica a conduta ( 2º), assim como também não pode ser sujeito ativo o coautor ou partícipe do delito precedente. Favorecimento Real (art. 349) Trata-se de prestar auxílio a criminoso, para tornar seguro o proveito do crime, o que abrange os produtos, o resultado e o preço obtidos com o delito, mas não seus instrumentos. O favorecimento real distingue-se do pessoal porque, aqui, o que se faz é assegurar o proveito do delito antecedente, e não seu autor. Não praticam o crime o coautor ou o receptador. Exercício Arbitrário ou Abuso de Poder (art. 350) O entendimento majoritário da doutrina é o de que o dispositivo foi inteiramente revogado pela Lei nº 4.898/65 cujas figuras típicas encerram todas as possibilidades de abuso de autoridade (Delmanto, Nucci). Alguns autores, porém, entendem que apenas o caput e o inc. III do art. 350 foram revogados, permanecendo em vigor os demais (Paulo José da Costa Júnior, Damásio). Fuga de Pessoa Presa ou Submetida à Medida de Segurança (art. 351) O agente, aqui, promove ou facilita a fuga de preso ou internado. Se o delito é praticado a mão armada, por mais de uma pessoa ou com arrombamento ( 1º), ou por quem está incumbido da custódia ou guarda do preso ou internado ( 3º), o delito é qualificado. Se há violência contra a pessoa, aplica-se também a pena correspondente a ela ( 2º). O funcionário incumbido da custódia ou guarda também é punido a título de culpa, ao passo que, para o particular, a forma culposa é atípica ( 4º). Evasão mediante Violência contra a Pessoa (art. 352) É direito do ser humano buscar a própria liberdade, por isso, só é típica a fuga do preso ou do internado se houver violência contra a pessoa. Também não configura este crime a fuga violenta exercida no momento da decretação da prisão, porque aí se está a falar do crime de resistência. Por fim, resta salientar que não é preciso a efetiva evasão: o tipo penal equipara e pune igualmente a forma consumada à tentada. Arrebatamento de Preso (art. 353) Arrebatar é, em síntese, tirar com violência. Há, porém, que tratar de preso, de modo que o arrebatamento de internado não configura o delito em questão. Motim de Presos (art. 354) Trata-se de crime de concurso necessário, em que os sujeitos ativos somente podem ser os presos; não se incluindo, portanto, as pessoas sujeitas à medida de segurança detentiva. O tipo também exige que a revolta perturbe a ordem ou disciplina da prisão. Neste ponto, a doutrina se divide quanto à necessidade ou não de os presos praticarem efetivos atos comissivos, como violência contra coisas e pessoas, para a configuração do motim. 196

197 Patrocínio Infiel (art. 355) Trata-se de trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse que lhe era confiado em juízo. Não importa a existência de mandato formal, bastando a defesa aceita, assim como não se indaga se o patrocínio era remunerado ou gratuito, podendo figurar como sujeito ativo inclusive o defensor público. O abandono da causa pelo advogado, porém, não caracteriza o delito. Consoante o parágrafo único, relativo à tergiversação, incorre na mesma pena do caput o advogado que defende, na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias. Sonegação de Papel ou Objeto de Valor Probatório (art. 356) Configura crime próprio em que o sujeito ativo somente pode ser o advogado ou procurador. As condutas tipificadas são inutilizar, total ou parcialmente, ou não restituir autos, documentos ou objetos de valor probatório que tenham sido recebidos em razão da sua condição. Exploração de Prestígio (art. 357) O crime consiste em solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade a pretexto de influir juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário da justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha. Não obstante, se o agente alegar ou insinuar que o dinheiro é destinado a qualquer dessas pessoas, a pena é majorada em 1/3, haja vista o maior desvalor da ação de quem usa pessoas não envolvidas para obtenção da vantagem. Violência ou Fraude em Arrematação Judicial (art. 358) Quanto à arrematação judicial, as condutas tipificadas são impedi-la, perturbá-la ou fraudá-la. Com relação a concorrente ou licitante, a conduta incriminada é afastá-los por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem, sendo que, havendo violência, também deverá ser aplicada a pena correspondente. Desobediência à Decisão Judicial sobre Perda ou Suspensão de Direito (art. 359) - O agente, tendo sido suspenso ou privado de uma função, atividade, direito, autoridade ou encargo por decisão judicial, continua no seu exercício. Contudo, sendo delito habitual, sua configuração está adstrita aos casos em que o desempenho da função proibida ou suspensa é frequente CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS O fundamento dos tipos delituosos previstos neste novo Capítulo, inserido no Código Penal pela Lei nº /2000, encerra-se nos arts. 163 a 169 da Constituição Federal. Seu traço característico é a proteção das finanças públicas, por meio da tipificação de condutas próprias de administradores irresponsáveis no trato com o dinheiro público. Contratação de Operação de Crédito (art. 359-A) A conduta delituosa do caput consiste em ordenar, autorizar ou realizar operação de crédito, cujo conceito está na Lei Complementar nº 101/00, sem que tenha havido prévia autorização legislativa. No parágrafo único, a seu turno, as condutas são as mesmas; mas aqui, apesar de a autorização legislativa existir, a transação é feita ao arrepio das condições fixadas pela Resolução do Senado ou, ainda, em desacordo com o limite máximo, fixado em lei, para a consolidação da dívida resultante da operação. Saliente-se, por fim, que, sendo o sujeito ativo Presidente da República ou Prefeito Municipal, poderá responder ele também por crime de responsabilidade. Inscrição de Despesas não Empenhadas em Restos a Pagar (art. 359-B) Nesta hipótese, o agente ordena ou autoriza inscrição em restos a pagar de despesa que não foi previamente 197

198 empenhada ou que excedeu limite estabelecido na lei. Com efeito, o empenho da despesa, que consiste na reserva de recursos do orçamento para pagamento de determinada despesa da Administração, é obrigatório, constituindo a primeira fase da execução das despesas públicas. Nessa linha, o tipo penal objetiva evitar que o funcionário deixe para o ano seguinte, e principalmente para outro administrador, despesas que já não constem expressamente como devidas, procurando fazer com que ele gaste tão somente aquilo que pode e que está autorizado em lei. Assunção de Obrigação no Último Ano do Mandato ou Legislatura (art. 359-C) Trata-se de, no final do mandato ou legislatura, assumir obrigação que comprometa o orçamento vindouro, transmitindo a dívida ao futuro ocupante do cargo. O sujeito ativo, portanto, não é qualquer funcionário, mas somente o administrador ou parlamentar no exercício de seu mandato ou legislatura. A proibição de assunção de obrigação inicia-se no dia 1º de maio do ano final do mandato ou legislatura. Ordenação de Despesa Não-Autorizada (art. 359-D) Este tipo penal prevê punição para quem, ordenando despesa não autorizada em lei, afronta o disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00). É crime de perigo abstrato, em que o prejuízo para as finanças públicas e para a probidade administrativa é presumido. Nesse ponto, porém, discute a doutrina acerca da sua configuração ou não quando a conduta traz benefício à Administração. Prestação de Garantia Graciosa (art. 359-E) Aqui, o agente presta garantia em operação de crédito, ou seja, compromete-se a satisfazer a dívida assumida oferecendo algum tipo de caução, sem que haja uma contragarantia de valor igual ou superior àquela prestada. Não-cancelamento de Restos a Pagar (art. 359-F) A ação típica consiste em não cancelar montante de restos a pagar além do limite legal. É, em síntese, delito omissivo, mas se o agente omisso praticou o crime previsto no art. 359-B, responderá somente por ele, sendo o não cancelamento considerado, então, fato posterior não-punível. Com efeito, se o agente inscreveu o indevido, é natural que não providencie seu cancelamento. Aumento de Despesa Total com Pessoal no Último Ano de Mandato ou Legislatura (art. 359-G) O crime consiste em ordenar, autorizar ou executar ato que enseje aumento de despesa total com pessoal, nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura. A situação é diversa daquela prevista no art. 359-C, porque o aumento de despesa com pessoal é permanente, não comprometendo apenas o orçamento seguinte, mas todos os que sucederão. Também não importa que haja verba orçamentária para o proceder ao aumento, haja vista o tipo penal pretender coibir atos de nítida conotação eleitoreira. Não se tipifica o crime, porém, se o ato é de contratação de funcionários por conta da vacância de cargos. É que, nesse caso, há uma compensação, e não um efetivo aumento das despesas com pessoal. Oferta Pública ou Colocação de Títulos no Mercado (art. 359-H) Neste caso, promovemse a oferta pública ou a colocação, no mercado financeiro, de títulos da dívida pública indevidos. Procura-se, assim, evitar um descontrole das finanças do Estado. 198

199 A Lei de Falências (Lei /05) disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, tendo revogado o Decreto-Lei no 7.661/45 que regulava a matéria anteriormente (art. 200 da LF). Conforme especificado no art. 2º, não se aplica à empresa pública, sociedade de economia mista, assim como instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores. Nos arts. 168 a 178 são previstos crimes que podem ocorrer antes, durante e/ou depois da sentença que decreta a falência, concede recuperação judicial ou homologa recuperação extrajudicial DISPOSIÇÕES COMUNS Os crimes só admitem modalidade dolosa. O bem jurídico tutelado é, em geral, o patrimônio dos credores e a administração da justiça. São todos de ação penal pública incondicionada (art. 184). Admite-se ação penal privada subsidiária da pública por qualquer credor habilitado ou o administrador judicial, observado o prazo decadencial de 6 (seis) meses ( 1º do art. 184). A competência é do juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial (art. 183). É condição objetiva de punibilidade dos crimes falimentares a sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou concede a recuperação extrajudicial (art. 180). Na falência, na recuperação judicial e na recuperação extrajudicial de sociedades, são equiparados ao devedor ou falido, para todos os efeitos penais previstos na Lei de Falências, os seus sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros, de fato ou de direito, bem como o administrador judicial, respondendo na medida de sua culpabilidade (art. 179). A prescrição dos crimes falimentares regula-se pelas disposições do CP, tendo como termo inicial o dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial (art. 182). É causa interruptiva do prazo da prescrição a decretação da falência do devedor cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial ( 1º do art. 182). O art. 181 prevê efeitos específicos para a condenação pelos crimes nela previstos. Mas os efeitos não são automáticos, devendo ser fundamentados na sentença e podendo perdurar por no máximo 5 anos após a extinção da punibilidade ( 1º). Os efeitos previstos são: I a inabilitação para o exercício de atividade empresarial; II o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei; III a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio. 199

200 32.2. CRIMES EM ESPÉCIE Fraude a Credores Art Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem. Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Aumento da pena 1º A pena aumenta-se de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se o agente: I elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos; II omite, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanço verdadeiros; III destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em computador ou sistema informatizado; IV simula a composição do capital social; V destrói, oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios. Contabilidade paralela 2º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação. Concurso de pessoas 3º Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas neste artigo, na medida de sua culpabilidade. Redução ou substituição da pena 4º Tratando-se de falência de microempresa ou de empresa de pequeno porte, e não se constatando prática habitual de condutas fraudulentas por parte do falido, poderá o juiz reduzir a pena de reclusão de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) ou substituí-la pelas penas restritivas de direitos, pelas de perda de bens e valores ou pelas de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas. Violação de sigilo empresarial Art Violar, explorar ou divulgar, sem justa causa, sigilo empresarial ou dados confidenciais sobre operações ou serviços, contribuindo para a condução do devedor a estado de inviabilidade econômica ou financeira: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. 200

201 Divulgação de informações falsas Art Divulgar ou propalar, por qualquer meio, informação falsa sobre devedor em recuperação judicial, com o fim de levá-lo à falência ou de obter vantagem: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Indução a erro Art Sonegar ou omitir informações ou prestar informações falsas no processo de falência, de recuperação judicial ou de recuperação extrajudicial, com o fim de induzir a erro o juiz, o Ministério Público, os credores, a assembleia-geral de credores, o Comitê ou o administrador judicial: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Favorecimento de credores Art Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais: Pena reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre o credor que, em conluio, possa beneficiar-se de ato previsto no caput deste artigo. Desvio, ocultação ou apropriação de bens Art Apropriar-se, desviar ou ocultar bens pertencentes ao devedor sob recuperação judicial ou à massa falida, inclusive por meio da aquisição por interposta pessoa: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Aquisição, recebimento ou uso ilegal de bens Art Adquirir, receber, usar, ilicitamente, bem que sabe pertencer à massa falida ou influir para que terceiro, de boa-fé, o adquira, receba ou use: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Habilitação ilegal de crédito Art Apresentar, em falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, relação de créditos, habilitação de créditos ou reclamação falsas, ou juntar a elas título falso ou simulado: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Exercício ilegal de atividade Art Exercer atividade para a qual foi inabilitado ou incapacitado por decisão judicial, nos termos desta Lei: Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. 201

202 Violação de impedimento Art Adquirir o juiz, o representante do Ministério Público, o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, por si ou por interposta pessoa, bens de massa falida ou de devedor em recuperação judicial, ou, em relação a estes, entrar em alguma especulação de lucro, quando tenham atuado nos respectivos processos: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Omissão dos documentos contábeis obrigatórios Art Deixar de elaborar, escriturar ou autenticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, os documentos de escrituração contábil obrigatórios: Pena detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave. A Lei nº 9.296/1996 regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5 da Constituição Federal, que dispõe que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Assim, disciplina as hipóteses e o procedimento para interceptação de comunicações telefônicas, aplicando-se também à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática (art. 1º e seu único). 202 Em seu art. 10 tipifica crime relativo à matéria: Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa. Trata-se de crime de mera conduta e que admite apenas modalidade dolosa. O bem jurídico tutelado é a privacidade. Os objetivos autorizados pela lei para a interceptação telefônica são apenas investigação criminal ou instrução processual penal. Portanto, qualquer objetivo fora dessas duas hipóteses não são autorizados e, por isso, configuram crime (por exemplo, instrução de processo civil ou administrativo). Ademais, é sempre necessária autorização judicial, caso contrário haverá crime.

203 O Decreto-Lei nº 201/1967 dispõe sobre a responsabilidade dos prefeitos e vereadores. Em seu art. 1º prevê crimes de responsabilidade do prefeito. Os crimes são de ação pública incondicionada ( 1º) e a condenação definitiva tem como efeito a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular ( 2º). Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipais, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; II - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; III - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; IV - empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam; V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-las em desacordo com as normas financeiras pertinentes; VI - deixar de prestar contas anuais da administração financeira do Município a Câmara de Vereadores, ou ao órgão que a Constituição do Estado indicar, nos prazos e condições estabelecidos; VII - Deixar de prestar contas, no devido tempo, ao órgão competente, da aplicação de recursos, empréstimos subvenções ou auxílios internos ou externos, recebidos a qualquer titulo; VIII - Contrair empréstimo, emitir apólices, ou obrigar o Município por títulos de crédito, sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei; IX - Conceder empréstimo, auxílios ou subvenções sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei; X - Alienar ou onerar bens imóveis, ou rendas municipais, sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei; XI - Adquirir bens, ou realizar serviços e obras, sem concorrência ou coleta de preços, nos casos exigidos em lei; 203

204 XII - Antecipar ou inverter a ordem de pagamento a credores do Município, sem vantagem para o erário; XIII - Nomear, admitir ou designar servidor, contra expressa disposição de lei; XIV - Negar execução a lei federal, estadual ou municipal, ou deixar de cumprir ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à autoridade competente; XV - Deixar de fornecer certidões de atos ou contratos municipais, dentro do prazo estabelecido em lei. XVI deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal; XVII ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal; XVIII deixar de promover ou de ordenar, na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei; XIX deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro; XX ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente; XXI captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido; XXII ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou; XXIII realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei. 1º Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos. 2º A condenação definitiva em qualquer dos crimes definidos neste artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular. 204

205 A Lei nº /2014 define o crime de discriminação dos portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de aids. Qualquer das condutas previstas nos incisos I a VI exige dolo e ainda devem ser praticadas com elemento subjetivo específico, qual seja, em razão da condição da vítima de portador de HIV ou doente de AIDS. A ação penal é pública incondicionada. Art. 1º Constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, as seguintes condutas discriminatórias contra o portador do HIV e o doente de aids, em razão da sua condição de portador ou de doente: I - recusar, procrastinar, cancelar ou segregar a inscrição ou impedir que permaneça como aluno em creche ou estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado; II - negar emprego ou trabalho; III - exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego; IV - segregar no ambiente de trabalho ou escolar; V - divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de aids, com intuito de ofender-lhe a dignidade; VI - recusar ou retardar atendimento de saúde. A Lei nº /2006, chamada também de Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Em matéria penal, a lei altera disposições do Código Penal, adicionando referências à violência doméstica e contra a mulher. 205

206 O art. 43 modifica o artigo 61 do CP, adicionando agravante genérica que pode ser aplicada a qualquer crime quando cometido em razão da violência doméstica: Art São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (...) f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; O art. 44 modificou o art. 129 do CP, adicionando o 9º que prevê modalidade de lesão corporal qualificada no caso de violência doméstica e o 11 que prevê majorante para o caso da vítima de violência doméstica ser portadora de deficiência. A lesão corporal de que trata o 9 é a praticada com dolo. Ademais, o STF, no julgamento da ADI nº 4424, entendeu que a lesão corporal praticada contra a mulher no ambiente doméstico é sempre exercida mediante ação pública incondicionada, ainda que a lesão seja leve. Nesse sentido a Súmula 542 do STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. Art Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: ( ) 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. ( ) 11. Na hipótese do 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. O art. 45 altera o art. 152 da Lei de Execução Penal, prevendo que na execução de pena restritiva de direitos de limitação de final de semana à condenado pelo prática de crime que envolva violência contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação. O conceito legal de violência doméstica e contra a mulher é definido no art. 5º. Ademais, o único frisa que nas relações pessoais de que trata independe a orientação sexual, ou seja, podem ser relações hétero ou homossexuais. Ademais, a violência doméstica exige que a conduta do ofensor tenha por fundamento o gênero e que cause morte, lesão ou sofrimento físico, sexual, psicológico ou patrimonial. Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; 206

207 II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. O art. 7º complementa o art. 5º, caracterizando as formas de violência doméstica. Deve-se atentar que o rol é meramente exemplificativo, como fica explícito pelo uso da expressão entre outras. Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. O art. 16 prevê que, nos crimes tratados na lei e que sejam de ação penal pública condicionada à representação, só será admitida renúncia (leia-se: retratação) à representação em audiência especialmente designada essa finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. O art. 17 veda a possibilidade de aplicação aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa. Nos arts. 18 a 24 a lei dispõe sobre a possibilidade de concessão de medidas protetivas de urgência à mulher vítima de violência doméstica. Os arts. 25 e 26 dispões sobre a atuação do Ministério Público em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher: 207

208 Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher. Art. 26. Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário: I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, entre outros; II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas; III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. O art. 41 determina que aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se aplicam, independentemente da pena prevista, as disposições da Lei 9.099/1995. Dessa forma, aos acusados de prática de crime que envolve violência contra a mulher não são julgados pelo Juizado Especial Criminal e a eles não aplica a suspensão condicional do processo, a transação penal e a composição civil dos danos. O STF julgou constitucional este artigo no julgamento do HC /MG, em Atenção: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha (Súmula 536 do STJ). A Lei nº 9.455/1997 define o crime de tortura. A criminalização da tortura tem fundamento constitucional no art. 5º da Constituição, que determina no inciso III que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante e no inciso XLIII que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. O art. 1º define os tipos penais de tortura. Todos os tipos, tanto os previstos nos incisos I e II, assim como nos 1º e 2º, apenas podem ser cometidos na modalidade dolosa e são de ação pública incondicionada. Art. 1º Constitui crime de tortura: I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: 208 a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

209 b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa; II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos. O tipo previsto no inciso I exige elemento subjetivo específico, que são as intenções previstas nas alíneas a, b e c. O tipo previsto no inciso II também exige elemento subjetivo específico, que é a intenção de aplicar castigo ou medida de caráter privativo. Em ambos os casos é necessário que a execução da conduta ocorra por meio de violência ou grave ameaça, causando sofrimento físico ou mental. No inciso II, ainda exige-se que o sujeito passivo esteja sob guarda, pode ou autoridade do sujeito ativo. O 1º prevê modalidade equiparada, devendo-se aplicar a mesma pena para quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal. Trata-se, portanto, de tipo que envolve um ato que comumente é praticado por autoridade e que não tem suporte legal. Não exige elemento subjetivo específico. O 2º prevê modalidade omissiva, cominando pena menos grave: detenção, de um a quatro anos. Comete crime aquele que se omite em face das condutas previstas no art. 1º, I, II e 1º, desde que tenha o dever de evitá-las ou apurá-las. Para apurar o dever de agir, pode-se utilizar as disposições do art. 13, 2º, do CP. O 3º prevê qualificação do crime pelo resultado, que se aplica apenas aos tipos dos incisos I e II e 1º, não se aplicando à modalidade omissiva do 2º. Se do crime resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos. Importante que o resultado não pode ter sido querido pelo agente, ou seja, não pode haver dolo de que haja morte ou lesão corporal, pois nesses casos estaria configurado outro crime, como, por exemplo, homicídio qualificado pelo emprego de tortura. Portanto, o dolo deve se de torturar e o resultado deve acontecer por culpa (crime preterdoloso). O 4º prevê causas de aumento da pena (majorantes), que aumentam a pena de um sexto até um terço: I - se o crime é cometido por agente público; II - se o crime é cometido contra criança, gestante, deficiente e adolescente; II se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos; III - se o crime é cometido mediante sequestro. A condenação terá efeitos específicos, acarretando a a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada ( 5º). Para o STJ, Atenção: A perda do cargo, função ou emprego público é efeito automático da condenação pela prática do crime de tortura, não sendo necessária fundamentação concreta para a sua aplicação (STJ, 5ª T., HC , j. 19/11/

210 A tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia ( 6º), além de que condenado iniciará o cumprimento da pena em regime fechado, ressalvada a modalidade omissiva do 2º. O STF julgou constitucional o início do cumprimento da pena em regime fechado (HC , 1ª T., j. 9/6/2015). O art. 2º prevê que à tortura aplica-se a lei brasileira ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira. Trata-se de caso de extraterritorialidade, punindo-se quem pratica o crime de tortura contra vítima brasileira (princípio da personalidade passiva) ou sob jurisdição brasileira (exemplo seria sede diplomática em outro país). A Lei nº 4.737/1965 (Código Eleitoral), que a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado, institui uma série de crimes vinculados ao processo eleitoral. Todos os crimes previstos são de ação pública incondicionada e exigem dolo DISPOSIÇÕES GERAIS Art Para os efeitos penais são considerados membros e funcionários da Justiça Eleitoral: I - os magistrados que, mesmo não exercendo funções eleitorais, estejam presidindo Juntas Apuradoras ou se encontrem no exercício de outra função por designação de Tribunal Eleitoral; II - Os cidadãos que temporariamente integram órgãos da Justiça Eleitoral; III - Os cidadãos que hajam sido nomeados para as mesas receptoras ou Juntas Apuradoras; IV - Os funcionários requisitados pela Justiça Eleitoral. 1º Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, além dos indicados no presente artigo, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. 2º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal ou em sociedade de economia mista. Art Sempre que êste Código não indicar o grau mínimo, entende-se que será ele de quinze dias para a pena de detenção e de um ano para a de reclusão. 210 Art Quando a lei determina a agravação ou atenuação da pena sem mencionar o "quantum", deve o juiz fixá-lo entre um quinto e um terço, guardados os limites da pena cominada ao crime.

211 Art A pena de multa consiste no pagamento ao Tesouro Nacional, de uma soma de dinheiro, que é fixada em dias-multa. Seu montante é, no mínimo, 1 (um) dia-multa e, no máximo, 300 (trezentos) dias-multa. 1º O montante do dia-multa é fixado segundo o prudente arbítrio do juiz, devendo êste ter em conta as condições pessoais e econômicas do condenado, mas não pode ser inferior ao salário-mínimo diário da região, nem superior ao valor de um salário-mínimo mensal. 2º A multa pode ser aumentada até o triplo, embora não possa exceder o máximo genérico caput, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do condenado, é ineficaz a cominada, ainda que no máximo, ao crime de que se trate CRIMES ELEITORAIS Art Inscrever-se fraudulentamente eleitor: Pena - Reclusão até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa. Art. 290 Induzir alguém a se inscrever eleitor com infração de qualquer dispositivo deste Código. Pena - Reclusão até 2 anos e pagamento de 15 a 30 dias-multa. Art Efetuar o juiz, fraudulentamente, a inscrição de alistando. Pena - Reclusão até 5 anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa. Art Negar ou retardar a autoridade judiciária, sem fundamento legal, a inscrição requerida: Pena - Pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Perturbar ou impedir de qualquer forma o alistamento: Pena - Detenção de 15 dias a seis meses ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Reter título eleitoral contra a vontade do eleitor: Pena - Detenção até dois meses ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Promover desordem que prejudique os trabalhos eleitorais; Pena - Detenção até dois meses e pagamento de 60 a 90 dias-multa. Art Impedir ou embaraçar o exercício do sufrágio: Pena - Detenção até seis meses e pagamento de 60 a 100 dias-multa. Art Prender ou deter eleitor, membro de mesa receptora, fiscal, delegado de partido ou candidato, com violação do disposto no Art. 236: Pena - Reclusão até quatro anos. Art Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita: Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa. Art Valer-se o servidor público da sua autoridade para coagir alguém a votar ou não votar em determinado candidato ou partido: Pena - detenção até seis meses e pagamento de 60 a 100 dias-multa. Parágrafo único. Se o agente é membro ou funcionário da Justiça Eleitoral e comete o crime prevalecendo-se do cargo a pena é agravada. Art Usar de violência ou grave ameaça para coagir alguém a votar, ou não votar, em determinado candidato ou partido, ainda que os fins visados não sejam conseguidos: 211

212 Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa. Art Promover, no dia da eleição, com o fim de impedir, embaraçar ou fraudar o exercício do voto a concentração de eleitores, sob qualquer forma, inclusive o fornecimento gratuito de alimento e transporte coletivo: Pena - reclusão de quatro (4) a seis (6) anos e pagamento de 200 a 300 dias-multa. Art Majorar os preços de utilidades e serviços necessários à realização de eleições, tais como transporte e alimentação de eleitores, impressão, publicidade e divulgação de matéria eleitoral. Pena - pagamento de 250 a 300 dias-multa. Art Ocultar, sonegar açambarcar ou recusar no dia da eleição o fornecimento, normalmente a todos, de utilidades, alimentação e meios de transporte, ou conceder exclusividade dos mesmos a determinado partido ou candidato: Pena - pagamento de 250 a 300 dias-multa. Art Intervir autoridade estranha à mesa receptora, salvo o juiz eleitoral, no seu funcionamento sob qualquer pretexto: Pena - detenção até seis meses e pagamento de 60 a 90 dias-multa. Art Não observar a ordem em que os eleitores devem ser chamados a votar: Pena - pagamento de 15 a 30 dias-multa. Art Fornecer ao eleitor cédula oficial já assinalada ou por qualquer forma marcada: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa. Art Rubricar e fornecer a cédula oficial em outra oportunidade que não a de entrega da mesma ao eleitor. Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 60 a 90 dias-multa. Art Votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem: Pena - reclusão até três anos. Art Praticar, ou permitir membro da mesa receptora que seja praticada, qualquer irregularidade que determine a anulação de votação, salvo no caso do Art. 311: Pena - detenção até seis meses ou pagamento de 90 a 120 dias-multa. Art Votar em seção eleitoral em que não está inscrito, salvo nos casos expressamente previstos, e permitir, o presidente da mesa receptora, que o voto seja admitido: Pena - detenção até um mês ou pagamento de 5 a 15 dias-multa para o eleitor e de 20 a 30 dias-multa para o presidente da mesa. Art Violar ou tentar violar o sigilo do voto: Pena - detenção até dois anos. Art Deixar o juiz e os membros da Junta de expedir o boletim de apuração imediatamente após a apuração de cada urna e antes de passar à subseqüente, sob qualquer pretexto e ainda que dispensada a expedição pelos fiscais, delegados ou candidatos presentes: Pena - pagamento de 90 a 120 dias-multa. Parágrafo único. Nas seções eleitorais em que a contagem fôr procedida pela mesa receptora incorrerão na mesma pena o presidente e os mesários que não expedirem imediatamente o respectivo boletim. Art Deixar o juiz e os membros da Junta de recolher as cédulas apuradas na respectiva urna, fechá-la e lacrá-la, assim que terminar a apuração de cada seção e antes de passar à subsequente, sob qualquer pretexto e ainda que dispensada a providencia pelos fiscais, delegados ou candidatos presentes: Pena - detenção até dois meses ou pagamento de 90 a 120 dias-multa. 212

213 Parágrafo único. Nas seções eleitorais em que a contagem dos votos for procedida pela mesa receptora incorrerão na mesma pena o presidente e os mesários que não fecharem e lacrarem a urna após a contagem. Art Alterar nos mapas ou nos boletins de apuração a votação obtida por qualquer candidato ou lançar nesses documentos votação que não corresponda às cédulas apuradas: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa. Art Não receber ou não mencionar nas atas da eleição ou da apuração os protestos devidamente formulados ou deixar de remetê-los à instância superior: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa. Art Violar ou tentar violar o sigilo da urna ou dos invólucros. Pena - reclusão de três a cinco anos. Art Efetuar a mesa receptora a contagem dos votos da urna quando qualquer eleitor houver votado sob impugnação (art. 190): Pena - detenção até um mês ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Subscrever o eleitor mais de uma ficha de registro de um ou mais partidos: Pena - detenção até 1 mês ou pagamento de 10 a 30 dias-multa. Art Inscrever-se o eleitor, simultaneamente, em dois ou mais partidos: Pena - pagamento de 10 a 20 dias-multa. Art Colher a assinatura do eleitor em mais de uma ficha de registro de partido: Pena - detenção até dois meses ou pagamento de 20 a 40 dias-multa. Art Divulgar, na propaganda, fatos que sabe inverídicos, em relação a partidos ou candidatos e capazes de exercerem influência perante o eleitorado: Pena - detenção de dois meses a um ano, ou pagamento de 120 a 150 dias-multa. Parágrafo único. A pena é agravada se o crime é cometido pela imprensa, rádio ou televisão. Art Caluniar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando fins de propaganda, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção de seis meses a dois anos, e pagamento de 10 a 40 dias-multa. 1 Nas mesmas penas incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. 2º A prova da verdade do fato imputado exclui o crime, mas não é admitida: I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido, não foi condenado por sentença irrecorrível; II - se o fato é imputado ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro; III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. Art Difamar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação: pena - detenção de três meses a um ano, e pagamento de 5 a 30 dias-multa. Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Art Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena: I - se o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. 213

214 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou meio empregado, se considerem aviltantes: Pena - detenção de três meses a um ano e pagamento de 5 a 20 dias-multa, além das penas correspondentes à violência prevista no Código Penal. Art As penas cominadas nos artigos. 324, 325 e 326, aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I - contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro; II - contra funcionário público, em razão de suas funções; III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da ofensa. Art Inutilizar, alterar ou perturbar meio de propaganda devidamente empregado: Pena - detenção até seis meses ou pagamento de 90 a 120 dias-multa. Art Impedir o exercício de propaganda: Pena - detenção até seis meses e pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Utilizar organização comercial de vendas, distribuição de mercadorias, prêmios e sorteios para propaganda ou aliciamento de eleitores: Pena - detenção de seis meses a um ano e cassação do registro se o responsável fôr candidato. Art Fazer propaganda, qualquer que seja a sua forma, em língua estrangeira: Pena - detenção de três a seis meses e pagamento de 30 a 60 dias-multa. Parágrafo único. Além da pena cominada, a infração ao presente artigo importa na apreensão e perda do material utilizado na propaganda. Art Na sentença que julgar ação penal pela infração de qualquer dos artigos. 322, 323, 324, 325, 326,328, 329, 331, 332, 333, 334 e 335, deve o juiz verificar, de acôrdo com o seu livre convencionamento, se diretório local do partido, por qualquer dos seus membros, concorreu para a prática de delito, ou dela se beneficiou conscientemente. Parágrafo único. Nesse caso, imporá o juiz ao diretório responsável pena de suspensão de sua atividade eleitoral por prazo de 6 a 12 meses, agravada até o dôbro nas reincidências. Art Participar, o estrangeiro ou brasileiro que não estiver no gôzo dos seus direitos políticos, de atividades partidárias inclusive comícios e atos de propaganda em recintos fechados ou abertos: Pena - detenção até seis meses e pagamento de 90 a 120 dias-multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorrerá o responsável pelas emissoras de rádio ou televisão que autorizar transmissões de que participem os mencionados neste artigo, bem como o diretor de jornal que lhes divulgar os pronunciamentos. Art Não assegurar o funcionário postal a prioridade prevista no Art. 239: Pena - Pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Destruir, suprimir ou ocultar urna contendo votos, ou documentos relativos à eleição: Pena - reclusão de dois a seis anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa. Parágrafo único. Se o agente é membro ou funcionário da Justiça Eleitoral e comete o crime prevalecendo-se do cargo, a pena é agravada. Art Fabricar, mandar fabricar, adquirir, fornecer, ainda que gratuitamente, subtrair ou guardar urnas, objetos, mapas, cédulas ou papéis de uso exclusivo da Justiça Eleitoral: Pena - reclusão até três anos e pagamento de 3 a 15 dias-multa. Parágrafo único. Se o agente é membro ou funcionário da Justiça Eleitoral e comete o crime prevalecendo-se do cargo, a pena é agravada. Art Retardar a publicação ou não publicar, o diretor ou qualquer outro funcionário de órgão oficial federal, estadual, ou municipal, as decisões, citações ou intimações da Justiça Eleitoral: Pena - detenção até um mês ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. 214

215 Art Não apresentar o órgão do Ministério Público, no prazo legal, denúncia ou deixar de promover a execução de sentença condenatória: Pena - detenção até dois meses ou pagamento de 60 a 90 dias-multa. Art Não cumprir o juiz o disposto no 3º do Art. 357: Pena - detenção até dois meses ou pagamento de 60 a 90 dias-multa. Art Recusar ou abandonar o serviço eleitoral sem justa causa: Pena - detenção até dois meses ou pagamento de 90 a 120 dias-multa. Art Não cumprir qualquer funcionário dos órgãos da Justiça Eleitoral, nos prazos legais, os deveres impostos por êste Código: Pena - pagamento de 30 a 60 dias-multa. Art Não cumprir a autoridade judiciária, ou qualquer funcionário dos órgãos da Justiça Eleitoral, nos prazos legais, os deveres impostos por êste Código, se a infração não estiver sujeita a outra penalidade: Pena - pagamento de trinta a noventa dias-multa. Art Violar o disposto no Art. 377: Pena - detenção até seis meses e pagamento de 30 a 60 dias-multa. Parágrafo único. Incorrerão na pena, além da autoridade responsável, os servidores que prestarem serviços e os candidatos, membros ou diretores de partido que derem causa à infração. Art Recusar alguém cumprimento ou obediência a diligências, ordens ou instruções da Justiça Eleitoral ou opor embaraços à sua execução: Pena - detenção de três meses a um ano e pagamento de 10 a 20 dias-multa. Art Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro, para fins eleitorais: Pena - reclusão de dois a seis anos e pagamento de 15 a 30 dias-multa. 1º Se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo, a pena é agravada. 2º Para os efeitos penais, equipara-se a documento público o emanado de entidade paraestatal inclusive Fundação do Estado. Art Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro, para fins eleitorais: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa. Art Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular. Parágrafo único. Se o agente da falsidade documental é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo ou se a falsificação ou alteração é de assentamentos de registro civil, a pena é agravada. Art Equipara-se a documento (348,349 e 350) para os efeitos penais, a fotografia, o filme cinematográfico, o disco fonográfico ou fita de ditafone a que se incorpore declaração ou imagem destinada à prova de fato juridicamente relevante. Art Reconhecer, como verdadeira, no exercício da função pública, firma ou letra que o não seja, para fins eleitorais: Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular. 215

216 Art Fazer uso de qualquer dos documentos falsificados ou alterados, a que se referem os artigos. 348 a 352: Pena - a cominada à falsificação ou à alteração. Art Obter, para uso próprio ou de outrem, documento público ou particular, material ou ideologicamente falso para fins eleitorais: Pena - a cominada à falsificação ou à alteração. Ademais, crimes relacionados com o processo eleitoral também são previstos na Lei nº 6.091/1974, que dispõe sobre o fornecimento gratuito de transporte, em dias de eleição, a eleitores residentes nas zonas rurais. Os crimes são previstos no art. 11, sendo todos eles de ação pública incondicionada e exigindo dolo. Art. 11. Constitui crime eleitoral: I - descumprir, o responsável por órgão, repartição ou unidade do serviço público, o dever imposto no art. 3º, ou prestar, informação inexata que vise a elidir, total ou parcialmente, a contribuição de que ele trata: Pena - detenção de quinze dias a seis meses e pagamento de 60 a 100 dias multa; O dever do art. 3º a que se refere o inciso I é o dos responsáveis por todas as repartições, órgãos e unidades do serviço público federal, estadual e municipal de, até cinquenta dias antes do pleito, informarem a Justiça Eleitoral sobre o número, a espécie e lotação dos veículos e embarcações de sua propriedade, a fim de que fiquem disponíveis, em dias de eleições, para o transporte gratuito de eleitores em zonas rurais (art. 1º), ou justificarem a indispensabilidade dos veículos e embarcações ao funcionamento de serviço público insusceptível de interrupção ( 1º do art. 1º). II - desatender à requisição de que trata o art. 2º: Pena - pagamento de 200 a 300 dias-multa, além da apreensão do veículo para o fim previsto; O art. 2º prevê que se a utilização de veículos pertencentes às repartições, órgãos e unidades do serviço público federal, estadual e municipal não for suficiente, a Justiça Eleitoral requisitará veículos e embarcações a particulares, de preferência os de aluguel. Se o particular desatender a requisição, cometerá crime. III - descumprir a proibição dos artigos 5º, 8º e 10º; Pena - reclusão de quatro a seis anos e pagamento de 200 a 300 dias-multa (art. 302 do Código Eleitoral); O art. 5º proíbe transporte por meio de veículos e embarcações de eleitores desde o dia anterior até o posterior à eleição, salvo: a serviço da Justiça Eleitoral; coletivos de linhas regulares e não fretados; de uso individual do proprietário, para o exercício do próprio voto e dos membros da sua família; o serviço normal, sem finalidade eleitoral, de veículos de aluguel. O art. 8º proíbe o fornecimento de refeições a eleitores da zona rural. O art. 10. veda aos candidatos ou órgãos partidários, ou a qualquer pessoa, o fornecimento de transporte ou refeições aos eleitores da zona urbana. 216

217 IV - obstar, por qualquer forma, a prestação dos serviços previstos nos arts. 4º e 8º desta Lei, atribuídos à Justiça Eleitoral: Pena - reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos; O art. 4º prevê que a Justiça Eleitoral divulgará, quinze dias antes das eleições, o quadro geral de percursos e horários programados para o transporte de eleitores. O art. 8º prevê que a Justiça Eleitoral poderá, quando imprescindível, em face da absoluta carência de recursos de eleitores da zona rural, fornecer-lhes refeições. V - utilizar em campanha eleitoral, no decurso dos 90 (noventa) dias que antecedem o pleito, veículos e embarcações pertencentes à União, Estados, Territórios, Municípios e respectivas autarquias e sociedades de economia mista: Pena - cancelamento do registro do candidato ou de seu diploma, se já houver sido proclamado eleito. Parágrafo único. O responsável, pela guarda do veículo ou da embarcação, será punido com a pena de detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e pagamento de 60 (sessenta) a 100 (cem) dias-multa. A Lei n 9.613/1998 dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores. A lavagem de dinheiro atinge a ordem econômica nacional e internacional, pois a livre concorrência depende de condições igualitárias de obtenção de capital. O dinheiro obtido com a lavagem de dinheiro não tem o custo do dinheiro obtido licitamente (juros, impostos, contratações de funcionários com direitos trabalhistas e previdenciários etc.), o que torna a concorrência desleal. O crime de lavagem de dinheiro se verifica nas operações destinadas a ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal (art. 1º), a fim de integrá-los no sistema econômico e financeiro como se tivessem sido obtidos de maneira lícita. Com a intenção de coibir tal comportamento, a Lei tipifica os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. O pressuposto do crime de lavagem de dinheiro é a existência de uma infração penal antecedente. Originalmente havia um rol taxativo de crimes antecedentes que poderiam dar ensejo à caracterização do crime de lavagem de dinheiro, mas a Lei nº /2012 alterou o art. 1º e substitui a lista de crimes pelo termo infração penal, ampliando o âmbito de aplicação da norma. O art. 2º dispõe que o julgamento pelo crime de lavagem de dinheiro independe de julgamento anterior pelos crimes antecedentes, ainda que praticados em outro país.. O crime de lavagem de dinheiro possui três fases: ocultação, mascaramento e integração. A primeira se dá quando os agentes procuram se desfazer materialmente das importâncias em dinheiro que obtiveram com suas atividades ilícitas, saindo do país com o dinheiro, depositando-o em entidades financeiras de modo fracionado, misturando fundos lícitos com ilícitos, por exemplo. 217

218 Na segunda fase ocorre o desaparecimento da origem dos bens lavados. O agente pretende fazer desaparecer o vínculo existente entre o crime praticado anteriormente e o bem procedente do ilícito. E na terceira fase, o capital ilicitamente adquirido já conta com aparência de legalidade e pode ser utilizado no sistema econômico financeiro como se fosse lícito. A competência será da Justiça Federal quando o crime for praticado contra o sistema financeiro ou contra a ordem econômico-financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas ou, ainda, quando o crime antecedente for de competência da Justiça Federal. Nas demais hipóteses, a competência será da Justiça Estadual. 66 A Lei nº /2006 instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD, passou a prescrever medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas, estabeleceu normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e definiu os crimes atinentes à matéria. Importante ressaltar que é por meio de Portaria da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde que há a inclusão da substância como ilícita. Assim, acaso a substância não se encontre elencada, não há crime de drogas. Da mesma forma, se a substância em questão for retirada da lista, deixa de se lhe aplicar as previsões da Lei de Drogas, mesmo que nos dias subsequentes ela volte a configurar o rol proibitivo, havendo abolitio criminis pois apenas constando daquele rol a lei será aplicável. O critério para a substância conste na Portaria do Ministério da Saúde é o da potencialidade de dependência da substância. Os crimes, na Lei nº /06, encontram-se no Capítulo III, do Título III, e no Capítulo II, do Título IV: Posse para Consumo Pessoal (art. 28) A conduta, que consiste em adquirir, guardar, ter em depósito, transportar e trazer consigo, pode ter como sujeito ativo qualquer pessoa. Já o sujeito passivo é o Estado. A prática de mais de uma das condutas previstas no tipo não enseja concurso de crimes, visto se tratar de crime de ação múltipla. Ainda, é necessário que se verifique que a droga se destina a consumo pessoal, o que se constata pela natureza e quantidade da droga apreendida, bem como pelo local e condições em que a ação ocorreu. Não se admite a tentativa. Este tipo penal não prevê como sanção a pena privativa de liberdade, mas apenas a pena de advertência e duas penas restritivas de direito. Contudo, não pode-se falar em descriminalização da conduta, visto que temos apenas um abrandamento na punição. O bem jurídico tutelado é a saúde pública e, secundariamente, pode-se falar que também busca-se tutelar a vida e a saúde de cada 66 ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação penal especial. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, p. 1 a

219 cidadão. A competência para julgamento da posse de drogas é dos Juizados Especiais Criminais. A conduta de fumar a droga não é punível, de modo que não é possível punir o uso pretérito da droga. Igualmente, a posse de sementes não configura o delito em análise. No entanto, a plantação para consumo pessoal é conduta punível ( 1º). Tráfico de Drogas (art. 33) A conduta é representada por dezoito verbos (importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, fornecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar e entregar). Igualmente ao crime anterior, este tipo visa proteger a saúde pública e a vida e a saúde de cada cidadão. Os sujeitos ativo e passivo também são os mesmos do delito supracitado. A tentativa é admitida apenas nas condutas instantâneas, embora haja posição no sentido de não ser possível o reconhecimento da tentativa em face da multiplicidade de condutas incriminadas. O 1º prevê modalidade equiparada, punível com a mesma pena, de quem realiza as condutas do caput também com matéria-prima destinada a preparação de drogas e com semeio e cultivo de plantas que constituam matéria-prima de drogas. Os 2º e 3º preveem modalidades qualificadas. Pune-se aquele que induzir, auxiliar ou instigar alguém ao uso de droga e aquele que oferece droga para consumo conjunto. Em relação aos verbos induzir e instigar, o STF decidiu, no julgamento da ADI 4.274, em 2011, que não abarca manifestações populares em prol da descriminalização de substâncias entorpecentes. O 4º prevê redução de 1/6 a 2/3 de pena aos delitos previstos no caput e no 1º se o agente for primário, de bons antecedentes, não se dedicar às atividades criminosas e não integrar organização criminosa. De acordo com o art. 1º da Resolução 05/2012 do Senado Federal, É suspensa a execução da expressão vedada a conversão em penas restritivas de direitos do 4º do art. 33 da Lei nº , de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº /RS. Atenção: o STF decidiu recentemente que o tráfico ao qual se aplica o previsto neste dispositivo não é crime hediondo, não estando submetido, por isso, às regras especiais destinadas a tais crimes (HC , j. 23/06/2016). Aparelhagem para a Produção de Substância Entorpecente (art. 34) A conduta é representada por onze verbos (fabricar, adquirir, utilizar, transportar, oferecer, vender, distribuir, entregar, possuir, guardar e fornecer) e diz respeito a maquinário, aparelho, instrumento ou objeto destinado à fabricação, produção ou transformação de drogas. O bem jurídico tutelado é o mesmo dos dois artigos anteriores. Os sujeitos ativo e passivo também são os mesmos. A tentativa é admitida apenas nas condutas de fabricar, adquirir, vender, fornecer, transportar e distribuir. Associação para o Tráfico (art. 35) A conduta é a de associar-se para o fim de, reiteradamente ou não, praticar os delitos previstos nos arts. 33 e 34. O bem jurídico tutelado é o mesmo dos artigos anteriores. Os sujeitos ativo e passivo também são os mesmos. Não se admite a tentativa. O parágrafo único prevê o crime de associação para o financiamento ou custeio do tráfico, no qual é exigida a prática reiterada do crime previsto no art. 36. O crime previsto neste artigo pode ocorrer em concurso material com o de tráfico (art. 33). Por fim, a associação para o tráfico não é assemelhado a hediondo. 219

220 Financiamento ou Custeio do Tráfico de Drogas (art. 36) Consiste em financiar e custear a prática dos delitos previstos nos arts. 33 e 34. Para a configuração deste delito, é necessário que o financiador não participe do tráfico de drogas (se participar, incorrerá nas sanções do art. 33, c/c com o art. 40, inc. VII). O bem jurídico tutelado é o mesmo dos artigos anteriores. Os sujeitos ativo e passivo também são os mesmos. Aqui, admite-se a tentativa. Colaboração ao Tráfico (art. 37) Comete este delito o agente que colaborar, como informante, com grupo que se destine à prática dos crimes previstos nos arts. 33 e 34. O autor do fato deve atuar somente como informantes, não participando do tráfico. Se o informante for funcionário público, aumenta-se a pena (art. 40, inc. II). Se a colaboração se der com traficante individual, não constitui crime. O bem jurídico tutelado é o mesmo dos artigos anteriores. Os sujeitos ativo e passivo também são os mesmos. Admite-se a tentativa. 220 Prescrição Culposa (art. 38) Trata-se de crime próprio, em que o sujeito ativo deve ser médico, dentista, farmacêutico ou enfermeiro. O bem jurídico tutelado é a saúde pública e a vida e a saúde do cidadão. A conduta consiste em prescrever ou ministrar droga que o paciente não necessite ou em doses excessivas ou, ainda, em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Não se admite a tentativa (crime culposo). Condução de Embarcação ou Aeronave após o Consumo de Drogas (art. 39) Diferentemente dos casos anteriores, o bem jurídico aqui tutelado é a incolumidade pública. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, ao passo que o passivo é a coletividade. A conduta consiste em conduzir após ter consumido drogas, não se exigindo que ele esteja drogado. Também é necessário que o agente exponha a dano potencial a incolumidade de outrem. Não se admite tentativa. O art. 40 prevê causas de aumento de pena (majorantes): Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito; II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância; III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos; IV - o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva; V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal; VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação; VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.

221 A Lei nº /2003 (chamada de Estatuto do Desarmamento) regulamenta o registro, a posse e a comercialização de armas de fogo e munição. Em seus arts. 12 a 21 prevê crimes relacionados ao uso, porte e comércio de armas fogo e munição. O bem jurídico tutelado é a incolumidade pública. Todos eles são de ação pública incondicionada e exigem dolo. Diversos dos tipos utilizam-se da construção em desacordo com determinação legal ou regulamentar e armas de fogo de uso permitido, restrito ou proibido, tratando-se de leis penais em branco, pois exigem complementação de lei ou ato administrativo para que se verifique a realização do tipo penal. A lei é regulamentada pela Decreto nº 5.123/2004. A definição do que são armas de fogo e munições de uso permitido, restrito e proibido são dadas pelo Decreto nº 3.665/2000. Posse irregular de arma de fogo de uso permitido Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa: Pena detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. O tipo de posse de arma de fogo utiliza os verbos possuir e manter e faz referência a um elemento espacial, pois ocorre no interior da residência ou nas dependências desta ou ainda no local de trabalho, se for responsável legal do estabelecimento ou empresa. Súmula 513 do STJ: A 'abolitio criminis' temporária prevista na Lei n /2003 aplicase ao crime de posse de arma de fogo de uso permitido com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado, praticado somente até 23/10/2005. Omissão de cautela Art. 13. Deixar de observar as cautelas necessárias para impedir que menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua posse ou que seja de sua propriedade: Pena detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrem o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e transporte de valores que deixarem de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda, furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessório ou munição que estejam sob sua guarda, nas primeiras 24 (vinte quatro) horas depois de ocorrido o fato. 221

222 O art. 13 é crime omissivo próprio, consumando-se com a inobservância das cautelas a que faz referência. O dever de agir deriva da posse ou propriedade da arma de fogo. 222 Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. O crime de porte ilegal de arma de fogo é absorvido por outro crime, quando mais grave, no qual o autor utilize a arma como meio. Entretanto, se o crime e o porte ilegal ocorrem em contextos fáticos distintos, não há absorção (nesse sentido STF, HC , j. 24/02/15). Disparo de arma de fogo Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Nos arts. 14 e 15 consta único dispondo que tratam-se de crimes inafiançáveis. Entretanto essas disposições foram declaradas inconstitucionais pelo STF (ADIn , dj. 2007). Na mesma decisão, também o art. 21, que dispunha que os arts. 16, 17 e 18 seriam insuscetíveis de liberdade provisória, foi declarado inconstitucional. Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou o- cultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato; II modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou juiz; III possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar; IV portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado; V vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança ou adolescente; e VI produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.

223 Comércio ilegal de arma de fogo Art. 17. Adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, arma de fogo, a- cessório ou munição, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. Parágrafo único. Equipara-se à atividade comercial ou industrial, para efeito deste artigo, qualquer forma de prestação de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência. Tráfico internacional de arma de fogo Art. 18. Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente: Pena reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. O tráfico internacional de drogas é de competência da Justiça Federal. Nos crimes de comércio ilegal e tráfico internacional de armas de fogo, a pena é aumentada da metade se a arma de fogo, acessório ou munição forem de uso proibido ou restrito (art. 19). Nos crimes previstos nos arts. 14, 15, 16, 17 e 18, a pena é aumentada da metade se forem praticados por integrante dos órgãos e empresas referidas nos arts. 6º, 7º e 8º da do Estatuto, o que inclui, entre outros, empresas de segurança privada e de transporte de valores, entidades desportivas, polícias, guardas municipais e agentes prisionais (art. 20). A Lei 4.898/1965 dispõe sobre condutas lesivas às garantias fundamentais da pessoa humana, protegendo-as dos excessos cometidos pelos agentes do Estado. O fundamento da tipificação do abuso de autoridade está no art. 5º, XXXIV, da CF: são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; (...). Direito de Representação Art. 2º O direito de representação será exercido por meio de petição: 223

224 a) dirigida à autoridade superior que tiver competência legal para aplicar, à autoridade civil ou militar culpada, a respectiva sanção; b) dirigida ao órgão do Ministério Público que tiver competência para iniciar processo-crime contra a autoridade culpada. Parágrafo único. A representação será feita em duas vias e conterá a exposição do fato constitutivo do abuso de autoridade, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e o rol de testemunhas, no máximo de três, se as houver. A ação penal é pública incondicionada, de forma que representação, nesta lei, deve ser lido como notitia criminis. De acordo com o art. 1º da Lei 5.249/67, A falta de representação do ofendido, nos casos de abusos previstos na Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, não obsta a iniciativa ou o curso de ação pública. Crimes de abuso de autoridade Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: a) à liberdade de locomoção; b) à inviolabilidade do domicílio; c) ao sigilo da correspondência; d) à liberdade de consciência e de crença; e) ao livre exercício do culto religioso; f) à liberdade de associação; g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto; h) ao direito de reunião; i) à incolumidade física do indivíduo; j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. Crime próprio, tendo como sujeito ativo a autoridade pública. Elemento subjetivo: dolo, vontade de atentar contra algum dos direitos elencados. Crime formal, não dependendo de resultado lesivo para a vítima. Os bens jurídicos tutelados são os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana e, especialmente, a dignidade humana. Não admite forma tentada, pois a tentativa é equiparada à consumação pelo tipo. Importante: no caso de invasão de domicílio por autoridade pública sem que esta tenha permissão para tal, estará caracterizado o crime de abuso de autoridade, não o de invasão de domicílio previsto no Código Penal, por aplicação do princípio da especialidade no conflito aparente de normas penais. O princípio da especialidade também deve ser utilizado no referente à alínea g, mas em sentido contrário ao citado no parágrafo anterior. Há inúmeros crimes passíveis de serem cometidos por autoridades da Justiça Eleitoral que estão previstos na legislação eleitoral. Aplicar-se-á, portanto, a legislação eleitoral, quando ocorrer conflito aparente. 224

225 Art. 4º Constitui também abuso de autoridade: a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder; b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei; c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa; d) deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada; e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei; f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie quer quanto ao seu valor; g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa; h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal; i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade. Nas condutas descritas neste artigo, diferentemente daquelas do 3º, admite-se a forma tentada. Quanto à possibilidade de concurso entre o abuso de autoridade e lesão corporal, a posição majoritária na doutrina (e endossada pelo STF) é de admissibilidade, desde que as condutas se deem em momentos distintos. Note-se, por fim, que, caso o prazo citado supra não seja respeitado em prejuízo de adolescente ou criança, não configurar-se-á abuso de autoridade, mas sim crime contra a criança e o adolescente, nos termos previstos pelo ECA. Autoridade pública para os fins desta lei Art. 5º Considera-se autoridade, para os efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração. Este artigo 5º não abrange pessoas que exercem cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, ou mesmo empresa que executa atividade típica da administração pública. A incidência do parágrafo único do art. 327 do Código Penal ( Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública ) resta, portanto, afastada. Após divergência acerca da competência para julgar militar que comete crime de abuso de autoridade, foi promulgada a Súmula 172 do STJ: compete à Justiça Federal processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço. 225

226 Art. 6º O abuso de autoridade sujeitará o seu autor à sanção administrativa civil e penal. 1º A sanção administrativa será aplicada de acordo com a gravidade do abuso cometido e consistirá em: a) advertência; b) repreensão; c) suspensão do cargo, função ou posto por prazo de cinco a cento e oitenta dias, com perda de vencimentos e vantagens; d) destituição de função; e) demissão; f) demissão, a bem do serviço público. 2º A sanção civil, caso não seja possível fixar o valor do dano, consistirá no pagamento de uma indenização de quinhentos a dez mil cruzeiros. 3º A sanção penal será aplicada de acordo com as regras dos artigos 42 a 56 do Código Penal e consistirá em: a) multa de cem a cinco mil cruzeiros; b) detenção por dez dias a seis meses; c) perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos. 4º As penas previstas no parágrafo anterior poderão ser aplicadas autônoma ou cumulativamente. 5º Quando o abuso for cometido por agente de autoridade policial, civil ou militar, de qualquer categoria, poderá ser cominada a pena autônoma ou acessória, de não poder o acusado exercer funções de natureza policial ou militar no município da culpa, por prazo de um a cinco anos. O Estatuto do Idoso EI (Lei nº /2003) busca dar especial tratamento ao idoso, assegurando medidas em âmbito civil, administrativo e também penal. As disposições em matéria penal são feitas do art. 95 ao 113, criando-se 14 novos tipos penais. As disposições foram criadas visando a proporcionar maior celeridade à apuração, processo e julgamento das infrações penais praticadas contra o idoso, dando maior tutela a sua dignidade. 226

227 O art. 94 dispõe que aos crimes previstos no EI, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto na Lei no 9.099/1995. Sobre esse artigo isso decidiu o STF que se trata apenas do procedimento e não dos benefícios previstos na Lei 9.099, sendo seu escopo dar celeridade ao julgamento dos crimes contra idosos (Vide ADI , dj. 03/09/2010). O art. 95 dispõe que nos crimes previstos no Estatuto a ação será pública incondicionada e não serão aplicáveis as previsões dos arts. 181 e 182 do Código Penal, que tratam das escusas absolutórias e do processamento mediante representação de crimes contra o patrimônio. A disposição do art. 95, em verdade, alcança apenas o art. 102 do Estatuto, único que se trata de crime contra o patrimônio. Mas sua finalidade está repetida no art. 110 que prevê não aplicação do art. 181 e 182 do Código Penal também aos crimes patrimoniais dos arts. 155 a 180, também do mesmo diploma. Quanto aos diversos delitos tipificados pelo EI, conforme acima delineado, há os realmente novos (como os previstos nos arts. 96, 100, 103, 104, 105, 106 e 108) e outros que em verdade são meras variações de delitos já existentes, aos quais se acrescentou a condição de ser a vítima pessoa idosa (como os delitos dos arts. 97, 98, 99, 101 e 102). A previsão do art. 100 é totalmente sui generis, tratando-se de tipo penal que contém uma série de ações que diferenciam ou discriminam os idosos. Discriminação em bancos, em meios de transportes, ao direito de contratar ou ao direito de exercício da cidadania. Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade: Pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. 1oNa mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo. 2o A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os cuidados ou responsabilidade do agente. Omissão de socorro Art. 97. Deixar de prestar assistência ao idoso, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte. Abandono de idoso Art. 98. Abandonar o idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado: Pena detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa. Maus tratos Art. 99. Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado: Pena detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa. 1o Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 2o Se resulta a morte: Pena reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. 227

228 Traz várias condutas ligadas ao respeito ao idoso Art Constitui crime punível com reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa: I obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público por motivo de idade; II negar a alguém, por motivo de idade, emprego ou trabalho; III recusar, retardar ou dificultar atendimento ou deixar de prestar assistência à saúde, sem justa causa, a pessoa idosa; IV deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida na ação civil a que alude esta Lei; V recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil objeto desta Lei, quando requisitados pelo Ministério Público. Desobediência Art Deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida nas ações em que for parte ou interveniente o idoso: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. Apropriação indébita Art Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade: Pena reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa. Negativa de acolhimento ou permanência Art Negar o acolhimento ou a permanência do idoso, como abrigado, por recusa deste em outorgar procuração à entidade de atendimento: Pena detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. Retenção de documento Art Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida: Pena detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. Exibição ou veiculação injuriosa Art Exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação, informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do idoso: Pena detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e multa. Induzimento à outorga de mandato Art Induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente: Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Constrangimento ilegal Art Coagir, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração: Pena reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. Lavratura irregular de ato notarial Art Lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal: Pena reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Impedimento ou embaraçamento a ato do Ministério Público ou de outro agente fiscalizador Art Impedir ou embaraçar ato do representante do Ministério Público ou de qualquer outro agente fiscalizador: Pena reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa. 228

229 Além disso, também no âmbito penal, o EI ainda acrescentou agravantes genéricas, (art. 61), e agravantes específicas (121 4º, 133 3º, 140 3º, 141, 148 1º, 159 1º e 244), todos ao Código Penal. No que tange à legislação extravagante, criou causa de aumento de pena à contravenção penal de vias de fato (art. 21 do Decreto-lei nº 3.688/41), ao crime de tortura (art. 1º da Lei nº 9.455/97) e aos crimes previstos na Lei de Entorpecentes (art. 18 da Lei nº 6.368/76). A Lei 7.716/1989 trata do repúdio à discriminação racial, de cor, étnica, de nacionalidade e religiosa. Esta Lei não incluiu outras formas de discriminação (sexual, idade, política, etc.), de modo que a discriminação por tais motivos é fato atípico sob a luz desta lei. O bem jurídico que a Lei busca tutelar é a dignidade da pessoa humana. Conforme previsto na Constituição Federal, tais crimes são imprescritíveis e inafiançáveis. Os crimes previstos no art. 3º, o art. 4º, 1º, inc. II e III e 2º, e os arts. 5º a 14 possuem características em comum. São crimes próprios (exceto o previsto no art. 14, que é comum). São crimes formais, instantâneos e comissivos, que admitem apenas a modalidade dolosa, sendo possível a tentativa. Já o delito previsto no art. 4º, 1º, inc. I, é omissivo próprio, não cabendo tentativa (é de mera conduta). O art. 20 prevê a incitação de discriminação por raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. É crime comum, formal e só admite a forma dolosa. É também instantâneo e admite a tentativa. Art. 3º Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional. Pena: reclusão de dois a cinco anos. Art. 4º Negar ou obstar emprego em empresa privada. 1º Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça ou de cor ou práticas resultantes do preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica: I - deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os demais trabalhadores; II - impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional; III - proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário. 2º Ficará sujeito às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas atividades não justifiquem essas exigências. Pena: reclusão de dois a cinco anos. 229

230 Art. 5º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador. Pena: reclusão de um a três anos. Art. 6º Recusar, negar ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau. Pena: reclusão de três a cinco anos. Parágrafo único. Se o crime for praticado contra menor de dezoito anos a pena é agravada de 1/3 (um terço). Art. 7º Impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou qualquer estabelecimento similar. Pena: reclusão de três a cinco anos. Art. 8º Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares, confeitarias, ou locais semelhantes abertos ao público. Pena: reclusão de um a três anos. Art. 9º Impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos, casas de diversões, ou clubes sociais abertos ao público. Pena: reclusão de um a três anos. Art. 10. Impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabeleireiros, barbearias, termas ou casas de massagem ou estabelecimento com as mesmas finalidades. Pena: reclusão de um a três anos. Art. 11. Impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de acesso aos mesmos: Pena: reclusão de um a três anos. Art. 12. Impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navios barcas, barcos, ônibus, trens, metrô ou qualquer outro meio de transporte concedido. Pena: reclusão de um a três anos. Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas. Pena: reclusão de dois a quatro anos. Art. 14. Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou convivência familiar e social. Pena: reclusão de dois a quatro anos. Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa. 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo; II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas ou televisivas. II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por qualquer meio; III - a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores. 4º Na hipótese do 2º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do material apreendido. 230

231 O art. 16 prevê como efeito da condenação, para os crimes previstos na lei, a perda do cargo ou função pública, para o servidor público, e a suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a três meses. O efeito não é automático devendo ser fundamentado na sentença (art.18). O Estatuto da Criança e do Adolescente ECA (Lei nº 8.069/90) regulamenta os crimes contra a criança e o adolescente e dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. A regulamentação se dá, no âmbito penal, por meio da previsão de crimes, o que se dá no Título VII, em conjunto com as infrações administrativas. No capítulo I se especifica os crimes, primeiro tratando sobre suas disposições gerais (arts. 225 a 227) e posteriormente sobre os crimes em espécie (arts. 228 a 244). O conceito legal de criança e adolescente, que deve ser utilizado para a interpretação dos tipos penais, consta no art. 2º: criança é a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Os crimes previstos no ECA são de ação pública incondicionada (art. 227). Sobre a competência, ela em regra será da Justiça Estadual, podendo ser da Justiça Federal (nos casos do art. 109 da CF). Os crimes regulados pelo ECA visam à proteção dos direitos da criança e do adolescente de modo geral, bem como de sua integridade física e psíquica. Especificamente, podese classificar tais condutas como ligadas à saúde da criança e do adolescente (arts. 228 e 229), aos atos infracionais cometidos (arts ), à atuação da autoridade judiciária, do membro do Ministério Público ou do Conselho Tutelar (art. 236), ao lar substituto (arts. 237 a 239) e à pornografia, sexo explícito ou exploração sexual e corrupção (artigos 240, 241, 241-A, 241-8, 241-C, 241-0, 241-E, 244-A e 244-8). Condutas ligadas ao prejuízo à saúde da criança, mesmo que enquanto nascituro, e do adolescente Art Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de manter registro das atividades desenvolvidas, na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a seu responsável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. Se o crime é culposo: Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa. 231

232 Art Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10 desta Lei: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. Se o crime é culposo: Pena - detenção de dois a seis meses, ou multa. Importante frisar que os crimes previstos nos arts. 228 e 229 preveem modalidade culposa. Todos os demais crimes do ECA só admitem dolo. Condutas ligadas aos atos infracionais Art Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem observância das formalidades legais. Art Deixar a autoridade policial responsável pela apreensão de criança ou adolescente de fazer imediata comunicação à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Art Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Art Deixar a autoridade competente, sem justa causa, de ordenar a imediata liberação de criança ou adolescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade da apreensão: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Art Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei em benefício de adolescente privado de liberdade: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Atuação da autoridade judiciária, do membro do Ministério Público ou do Conselho Tutelar Art Impedir ou embaraçar a ação de autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público no exercício de função prevista nesta Lei: Pena - detenção de seis meses a dois anos. Condutas ligadas à colocação da criança ou adolescente em lar substituto. Art Subtrair criança ou adolescente ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar substituto: Pena - reclusão de dois a seis anos, e multa. Art Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante paga ou recompensa: Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa. 232 Art Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa. Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.

233 Condutas ligadas a pornografia, sexo explícito ou exploração sexual e corrupção de criança ou adolescente Art Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente: Pena reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. 1º Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena. 2º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime: I no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la; II prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; ou III prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento. Art Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. 1º Nas mesmas penas incorre quem: I assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo; II assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo. 2º As condutas tipificadas nos incisos I e II do 1º deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo. Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. 1º A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o material a que se refere o caput deste artigo. 2º Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241- C desta Lei, quando a comunicação for feita por: I agente público no exercício de suas funções; II membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes referidos neste parágrafo; III representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário. 3º As pessoas referidas no 2º deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito referido. Justiça Federal: Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241- A e 241-B da Lei nº 8.069/1990) quando praticados por meio da rede mundial de computadores (tese fixada pelo Pleno do STF no julgamento do RE , em 29/10/2015). 233

234 Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual: Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo. Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso: Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso; II pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se e- xibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão cena de sexo explícito ou pornográfica compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em a- tividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. Art Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente arma, munição ou explosivo: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos. Art Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida: Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave. Art Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente fogos de estampido ou de artifício, exceto aqueles que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer dano físico em caso de utilização indevida: Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa. Art. 244-A. Submeter criança ou adolescente, como tais definidos no caput do art. 2º desta Lei, à prostituição ou à exploração sexual: Pena reclusão de quatro a dez anos, e multa. 1º Incorrem nas mesmas penas o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão de criança ou adolescente às práticas referidas no caput deste artigo. 2º Constitui efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de funcionamento do estabelecimento. Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 1º Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet. 2º As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de Crime formal: A configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal. 234

235 A Lei nº 8.666/1993 estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Nos arts. 89 a 98 prevê crimes relacionados ao processo licitatório e aos contratos com os entes da Federação. Todos os crimes são de ação pública incondicionada e só admitem modalidade dolosa (alguns deles exigem elemento subjetivo específico). Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade. Pena detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público. No art. 89 há dois crimes diversos. No caput se trata de crime exclusivo do agente que tem o poder de dispensar ou de inexigir licitação: crime próprio, comissivo (dispensar ou inexigir) ou omissivo próprio (deixar de observar). Atente-se ao fato de que deve haver dolo, não se punindo o mero erro ou equívoco. No caso da segunda parte, pune-se aquele que se beneficiou do primeiro ato em qualquer momento. Para o STJ, O crime do artigo 89 da Lei n /93, possui natureza material, exigindo para sua tipificação, a demonstração de dolo específico e prejuízo ao erário público (STJ, 5ª T., HC , j. 24/05/2016). Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, como intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Pena detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Trata-se de fraude do caráter competitivo da licitação. O sujeito ativo será tanto o licitante quanto o servidor público, devendo haver elemento subjetivo específico: intenção de obter vantagem. Art. 91. Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a Administração, dando causa à instauração de licitação ou à celebração de contrato, cuja invalidação vier a ser decretada pelo Poder Judiciário. Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. 235

236 O sujeito ativo é o servidor público, tratando-se de crime próprio. A invalidação da licitação ou contrato é condição objetiva de punibilidade. Art. 92. Admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta Lei. Pena detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. Parágrafo único. Incide na mesma pena o contratado que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, obtém vantagem indevida ou se beneficia, injustamente, das modificações ou prorrogações contratuais. Há fracionamento da conduta em duas partes. No caput, o sujeito ativo da conduta é o servidor público (crime próprio), no único a punição ocorre em relação ao particular que compactue com a conduta de obter vantagem indevida. O contratado, por óbvio, apenas será punido se participar para tal resultado. Art. 93. Impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório. Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, mesmo o servidor público. Art. 94. Devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo. Pena detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos, e multa. Apenas pode cometer tal crime o servidor público responsável pela proposta, que tem o dever de guarda. Art. 95. Afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo. Pena detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único Incorre na mesma pena quem se abstém ou desiste de licitar, em razão da vantagem oferecida. Pode ser cometido por qualquer pessoa, sendo crime comum, inclusive por servidor público, ocorrendo quando se afastar um licitante pelos meios prescritos. Deve haver dolo. No parágrafo único faz-se menção à ação do particular que recebe vantagem de terceiro para afastar-se do certame. Art. 96. Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: I - elevando arbitrariamente os preços; 236

237 II - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada; III - entregando uma mercadoria por outra; IV - alterando substância, qualidade ou quantidade da mercadoria fornecida; V - tornando, por qualquer modo, injustamente, mais onerosa a proposta ou a execução do contrato. Pena detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. O sujeito ativo pode ser qualquer um que participar do certame, fraudando a licitação em qualquer das hipóteses previstas (crime comum). Art. 97. Admitir à licitação ou celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo. Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que, declarado inidôneo, venha a licitar ou contratar com a administração. Há dois crimes diferentes no mesmo artigo. O do caput é considerado próprio, praticado por servidor público competente que permita a participação de empresa ou profissional inidôneo. O do parágrafo primeiro é comum e pode ser realizado por qualquer pessoa. Seu momento de consumação é a fase de habilitação. Sendo extinta a licitação, o crime não subsiste. Art. 98. Obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento de registro do inscrito. Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Crime próprio, praticado somente pelo servidor público que possui acesso aos registros. O Código de Trânsito Brasileiro CTB (Lei 9.503/97) prevê, como parte regramento de trânsito em vias públicas, um capítulo que aborda os crimes no âmbito do trânsito. O Capítulo XIX determina as situações caracterizadoras de crimes de trânsito com as respectivas penas e situações que as agravam. O art. 291 determina que aos crimes cometidos na direção de veículos automotores lá previstos, aplicam-se, em regra, as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal. Aplicável também, sempre que cabível, as disposições da Lei 9.099/

238 Ademais, aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa, o previsto nos arts. 74 (composição civil), 76 (possibilidade de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a pedido do MP) e 88 (designação imediata da audiência de instrução e julgamento) da Lei nº 9.099/95, exceto nos casos previstos nos incisos do 1º, quais sejam: influência de álcool ou substância psicoativa que determine dependência, participação de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada por autoridade competente e trânsito em velocidade superior à máxima permitida pela via em 50 Km/h. As penalidades aplicáveis como punição são variadas e incluem a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação como penalidade principal, isolada ou cumulativamente com outras penalidades (art. 293), cuja duração é de duração de dois meses a cinco anos (art. 293). No caso de reincidência, o juiz deve necessariamente aplicar a penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor (art. 296). O CTB prevê ainda possibilidade de multa reparatória em favor da vítima ou seus sucessores (art. 297). As circunstâncias que agravam as penalidades dos crimes de trânsito estão previstas no art. 298 do mesmo diploma legal: Art São circunstâncias que sempre agravam as penalidades dos crimes de trânsito ter o condutor do veículo cometido a infração: I - com dano potencial para duas ou mais pessoas ou com grande risco de grave dano patrimonial a terceiros; II - utilizando o veículo sem placas, com placas falsas ou adulteradas; III - sem possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação; IV - com Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação de categoria diferente da do veículo; V - quando a sua profissão ou atividade exigir cuidados especiais com o transporte de passageiros ou de carga; VI - utilizando veículo em que tenham sido adulterados equipamentos ou características que afetem a sua segurança ou o seu funcionamento de acordo com os limites de velocidade prescritos nas especificações do fabricante; VII - sobre faixa de trânsito temporária ou permanentemente destinada a pedestres. Os crimes em espécie previstos no Código Brasileiro de Trânsito são todos de ação penal pública incondicionada. Importante atentar que vários deles são crimes previstos no Código Penal (homicídio culposo, lesão corporal culposa, omissão de socorro), mas aos quais se prevê pena diferenciada em razão de ser cometido na direção de veículo automotor. Nesses casos, o agente, por aplicação do princípio da especialidade, responderá pelo crime na forma prevista no CTB e não no CP. Homicídio culposo na direção de veículo automotor 238 Art Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. 1º No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) à metade, se o agente:

239 I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação; II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada; III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente; IV - no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros. 2º Se o agente conduz veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência ou participa, em via, de corrida, disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente: Penas - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Lesão corporal culposa na direção de veículo automotor. Art Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Parágrafo único. Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) à metade, se ocorrer qualquer das hipóteses do 1º do art Deixar de prestar imediato socorro à vítima Art Deixar o condutor do veículo, na ocasião do acidente, de prestar imediato socorro à vítima, ou, não podendo fazê-lo diretamente, por justa causa, deixar de solicitar auxílio da autoridade pública: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa, se o fato não constituir elemento de crime mais grave. Parágrafo único. Incide nas penas previstas neste artigo o condutor do veículo, ainda que a sua omissão seja suprida por terceiros ou que se trate de vítima com morte instantânea ou com ferimentos leves. Afastar-se do local do acidente, com objetivo de fuga Art Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa. Conduzir veículo sob a influência de droga psicoativa Art Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. 1 o As condutas previstas no caput serão constatadas por: I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora. 2 o A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova. 3 o O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para e- feito de caracterização do crime tipificado neste artigo. 239

240 Violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir Art Violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor imposta com fundamento neste Código: Penas - detenção, de seis meses a um ano e multa, com nova imposição adicional de idêntico prazo de suspensão ou de proibição. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre o condenado que deixa de entregar, no prazo estabelecido no 1º do art. 293, a Permissão para Dirigir ou a Carteira de Habilitação. Participar, em via pública, de corrida, disputa ou competição não autorizada por autoridade competente Art Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente, gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada: Penas - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. 1º Se da prática do crime previsto no caput resultar lesão corporal de natureza grave, e as circunstâncias demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena privativa de liberdade é de reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, sem prejuízo das outras penas previstas neste artigo. 2º Se da prática do crime previsto no caput resultar morte, e as circunstâncias demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena privativa de liberdade é de reclusão de 5 (cinco) a 10 (dez) anos, sem prejuízo das outras penas previstas neste artigo. Dirigir veículo sem a devida permissão gerando perigo Art Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa. Entregar a direção de veículo a pessoa não habilitada Art Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa. Atenção: Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo (Súmula 575 do STJ, DJe 27/06/2016). Trafegar em velocidade incompatível com a segurança em locais específicos em que haja muitas pessoas ou risco de acidentes. Art Trafegar em velocidade incompatível com a segurança nas proximidades de escolas, hospitais, estações de embarque e desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande movimentação ou concentração de pessoas, gerando perigo de dano: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa. Modificar o local do delito de trânsito com o intuito de se livrar da responsabilidade antes que a autoridade competente possa averiguar os fatos. Art Inovar artificiosamente, em caso de acidente automobilístico com vítima, na pendência do respectivo procedimento policial preparatório, inquérito policial ou processo penal, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, a fim de induzir a erro o agente policial, o perito, ou juiz: Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa. Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo, ainda que não iniciados, quando da inovação, o procedimento preparatório, o inquérito ou o processo aos quais se refere. 240

241 A economia popular, o sistema financeiro, o sistema tributário, o sistema previdenciário, as relações de consumo são temas atinentes ao Direito Econômico, e este tem por objeto a proteção, a segurança e a regularidade da econômica do Estado. Em razão de sua importância, a necessidade de regulação se demonstra inclusive no âmbito penal, de modo que os delitos correlatos encontram-se esparsos na legislação respectiva (Lei 8.137/90, Lei 8.176/91, Lei 8.078/90 e Lei 7.492/8 no Código Penal Brasileiro) LEI 8.137/90 A Lei 8.137/90 define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, estando os delitos nesta mesma ordem previstos. Os arts. 1º a 3º tratam dos crimes contra a ordem tributária, que têm em vista a proteção ao erário, enquanto fonte essencial para a manutenção do Estado e de toda a comunidade, e, assim, a proteção da política socioeconômica do Estado. Crimes praticados por particulares Art. 1 Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecêla em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V. 241

242 Atenção: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo (Súmula Vinculante 24 do STF). Art. 2 Constitui crime da mesma natureza: I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Crimes praticados por funcionários públicos Art. 3 Constitui crime funcional contra a ordem tributária, além dos previstos no Decreto- Lei n 2.848, de 7 de dezembro de Código Penal (Título XI, Capítulo I): I - extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento, de que tenha a guarda em razão da função; sonegá-lo, ou inutilizá-lo, total ou parcialmente, acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social; II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente. Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. III - patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração fazendária, valendo-se da qualidade de funcionário público. Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. O art. 4º prevê crimes contra a ordem econômica, que visam à proteção da livre concorrência e da livre iniciativa. Configura-se crime a formação de acordos que prejudiquem a concorrência, nas formas dos incisos I e II do art. 4º: 242 Art. 4 Constitui crime contra a ordem econômica: I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas; II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre ofertantes, visando: a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas ou produzidas; b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas; c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de distribuição ou de fornecedores. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa. O art. 7º prevê crimes contra as relações de consumo, que visam a proteção dos interesses econômicos ou sociais do consumidor, seu patrimônio e da coletividade. Art. 7 Constitui crime contra as relações de consumo: I - favorecer ou preferir, sem justa causa, comprador ou freguês, ressalvados os sistemas de entrega ao consumo por intermédio de distribuidores ou revendedores;

243 II - vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial; III - misturar gêneros e mercadorias de espécies diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço estabelecido para os demais mais alto custo; IV - fraudar preços por meio de: a) alteração, sem modificação essencial ou de qualidade, de elementos tais como denominação, sinal externo, marca, embalagem, especificação técnica, descrição, volume, peso, pintura ou acabamento de bem ou serviço; b) divisão em partes de bem ou serviço, habitualmente oferecido à venda em conjunto; c) junção de bens ou serviços, comumente oferecidos à venda em separado; d) aviso de inclusão de insumo não empregado na produção do bem ou na prestação dos serviços; V - elevar o valor cobrado nas vendas a prazo de bens ou serviços, mediante a exigência de comissão ou de taxa de juros ilegais; VI - sonegar insumos ou bens, recusando-se a vendê-los a quem pretenda comprá-los nas condições publicamente ofertadas, ou retê-los para o fim de especulação; VII - induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária; VIII - destruir, inutilizar ou danificar matéria-prima ou mercadoria, com o fim de provocar alta de preço, em proveito próprio ou de terceiros; IX - vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo; Pena - detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II, III e IX pune-se a modalidade culposa, reduzindo-se a pena e a detenção de 1/3 (um terço) ou a de multa à quinta parte LEI 8.176/1991 A Lei 8176/91 trata dos crimes contra a ordem econômica e cria o Sistema de Estoques de Combustíveis. No que tange aos tipos penais criados, visa à proteção econômica das fontes energéticas. Art. 1 Constitui crime contra a ordem econômica: I - adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico, hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei; II - usar gás liquefeito de petróleo em motores de qualquer espécie, saunas, caldeiras e a- quecimento de piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei. Pena: detenção de um a cinco anos. Art. 2 Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo. Pena: detenção, de um a cinco anos e multa. 1 Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo. 2 No crime definido neste artigo, a pena de multa será fixada entre dez e trezentos e sessenta dias-multa, conforme seja necessário e suficiente para a reprovação e a prevenção do crime. 3 O dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior a quatorze nem superior a duzentos Bônus do Tesouro Nacional (BTN). 243

244 50.3. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social. O Código dedicou o Título II (arts. 61 a 80) à fixação de infrações penais e suas sanções. Crimes em espécie Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa. 1 Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado. 2 Se o crime é culposo: Pena - Detenção de um a seis meses ou multa. Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa. Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo. Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa. Parágrafo único. As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à lesão corporal e à morte. Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta. 2º Se o crime é culposo; Pena - Detenção de um a seis meses ou multa. Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança: Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa: Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à publicidade: Pena - Detenção de um a seis meses ou multa. Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou componentes de reposição usados, sem autorização do consumidor: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. 244 Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.

245 Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros: Pena - Detenção de seis meses a um ano ou multa. Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata: Pena - Detenção de um a seis meses ou multa. Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara de seu conteúdo; Pena - Detenção de um a seis meses ou multa. Concurso de pessoas Art. 75. Quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes referidos neste código, incide as penas a esses cominadas na medida de sua culpabilidade, bem como o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou por qualquer modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta e prestação de serviços nas condições por ele proibidas. Agravantes Art. 76. São circunstâncias agravantes dos crimes tipificados neste código: I - serem cometidos em época de grave crise econômica ou por ocasião de calamidade; II - ocasionarem grave dano individual ou coletivo; III - dissimular-se a natureza ilícita do procedimento; IV - quando cometidos: a) por servidor público, ou por pessoa cuja condição econômico-social seja manifestamente superior à da vítima; b) em detrimento de operário ou rurícola; de menor de dezoito ou maior de sessenta anos ou de pessoas portadoras de deficiência mental interditadas ou não; V - serem praticados em operações que envolvam alimentos, medicamentos ou quaisquer outros produtos ou serviços essenciais. Fixação da multa Art. 77. A pena pecuniária prevista nesta Seção será fixada em dias-multa, correspondente ao mínimo e ao máximo de dias de duração da pena privativa da liberdade cominada ao crime. Na individualização desta multa, o juiz observará o disposto no art. 60, 1 do Código Penal. Penas restritivas de direito Art. 78. Além das penas privativas de liberdade e de multa, podem ser impostas, cumulativa ou alternadamente, observado o disposto nos arts. 44 a 47, do Código Penal: I - a interdição temporária de direitos; II - a publicação em órgãos de comunicação de grande circulação ou audiência, às expensas do condenado, de notícia sobre os fatos e a condenação; III - a prestação de serviços à comunidade. 245

246 A Lei nº 9.605/1998 dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente DISPOSIÇÕES GERAIS SOBRE OS CRIMES PREVISTOS NA LEI Conforme o art. 26, todos os crimes previstos na lei são ação pena pública incondicionada. O art. 2º prevê dever de agir para o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que portanto responde pelos crimes previstos na lei na modalidade omissiva imprópria quando, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixa de impedir a sua prática, se podia agir para evitá-la. O art. 3º prevê possibilidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica, que não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato ( único). Destaca-se aqui a atual posição do STF de que a responsabilização da pessoa jurídica independe da condenação da pessoa física responsável. O art. 225, 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação (RE , Primeira Turma, DJe 29/10/2014). O STJ também tem seguido essa posição DISPOSIÇÕES SOBRE A APLICAÇÃO DA PENA Os arts. 6ª a 24 dispõe sobre a aplicação da pena para os crimes previstos na lei: adiciona critérios para a imposição e gradação da penalidade (art. 6º); fixa regras específicas para a aplicação das penas restritivas de direito (arts. 7º a 13º); prevê atenuantes (art. 14) e agravantes específicas (art. 15); dispõe sobre a reparação do dano ambiental (arts. 17, 19 e 20). Destaca-se aqui que o art. 16 prevê possibilidade de suspensão condicional da pena aos crimes previstos na lei quando aplicada pena privativa de liberdade não superior a 3 anos (a regra geral, prevista no art. 77 do CP, permite suspensão da pena apenas quando a pena privativa de liberdade não é superior a 2 anos). O art. 7º prevê que para substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, o crime deve ser culposo ou a pena aplicada deve ser inferior a 4 anos (a regra geral do art. 44, I, do CP prevê que a pena pode ser menor ou igual a 4 anos). Conforme o art. 18, a multa será calculada segundo os critérios do Código Pena, mas poderá ser aumentada até três vezes se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida. Art. 6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará: I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente; II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; III - a situação econômica do infrator, no caso de multa.

247 Art. 7º As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando: I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime. Parágrafo único. As penas restritivas de direitos a que se refere este artigo terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída. Art. 8º As penas restritivas de direito são: I - prestação de serviços à comunidade; II - interdição temporária de direitos; III - suspensão parcial ou total de atividades; IV - prestação pecuniária; V - recolhimento domiciliar. Art. 9º A prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação, e, no caso de dano da coisa particular, pública ou tombada, na restauração desta, se possível. Art. 10. As penas de interdição temporária de direito são a proibição de o condenado contratar com o Poder Público, de receber incentivos fiscais ou quaisquer outros benefícios, bem como de participar de licitações, pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos, e de três anos, no de crimes culposos. Art. 11. A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às prescrições legais. Art. 12. A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator. Art. 13. O recolhimento domiciliar baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado, que deverá, sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer atividade autorizada, permanecendo recolhido nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual, conforme estabelecido na sentença condenatória. Art. 14. São circunstâncias que atenuam a pena: I - baixo grau de instrução ou escolaridade do agente; II - arrependimento do infrator, manifestado pela espontânea reparação do dano, ou limitação significativa da degradação ambiental causada; III - comunicação prévia pelo agente do perigo iminente de degradação ambiental; IV - colaboração com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental. Art. 15. São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - reincidência nos crimes de natureza ambiental; II - ter o agente cometido a infração: a) para obter vantagem pecuniária; b) coagindo outrem para a execução material da infração; c) afetando ou expondo a perigo, de maneira grave, a saúde pública ou o meio ambiente; d) concorrendo para danos à propriedade alheia; e) atingindo áreas de unidades de conservação ou áreas sujeitas, por ato do Poder Público, a regime especial de uso; f) atingindo áreas urbanas ou quaisquer assentamentos humanos; 247

248 g) em período de defeso à fauna; h) em domingos ou feriados; i) à noite; j) em épocas de seca ou inundações; l) no interior do espaço territorial especialmente protegido; m) com o emprego de métodos cruéis para abate ou captura de animais; n) mediante fraude ou abuso de confiança; o) mediante abuso do direito de licença, permissão ou autorização ambiental; p) no interesse de pessoa jurídica mantida, total ou parcialmente, por verbas públicas ou beneficiada por incentivos fiscais; q) atingindo espécies ameaçadas, listadas em relatórios oficiais das autoridades competentes; r) facilitada por funcionário público no exercício de suas funções. Art. 16. Nos crimes previstos nesta Lei, a suspensão condicional da pena pode ser aplicada nos casos de condenação a pena privativa de liberdade não superior a três anos. Art. 17. A verificação da reparação a que se refere o 2º do art. 78 do Código Penal será feita mediante laudo de reparação do dano ambiental, e as condições a serem impostas pelo juiz deverão relacionar-se com a proteção ao meio ambiente. Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida. Art. 19. A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa. Parágrafo único. A perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório. Art. 20. A sentença penal condenatória, sempre que possível, fixará o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo o- fendido ou pelo meio ambiente. Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá efetuar-se pelo valor fixado nos termos do caput, sem prejuízo da liquidação para apuração do dano efetivamente sofrido DISPOSIÇÕES SOBRE A APLICAÇÃO DA PENA À PESSOA JURÍDICA Os arts. 21 a 24 preveem regras específicas para a aplicação da pena às pessoas jurídicas, dispondo ainda sobre as modalidades de penas aplicáveis: Art. 21. As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas, de acordo com o disposto no art. 3º, são: I - multa; II - restritivas de direitos; III - prestação de serviços à comunidade. Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são: I - suspensão parcial ou total de atividades; II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade; III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. 1º A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente. 248

249 2º A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar. 3º A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos. Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em: I - custeio de programas e de projetos ambientais; II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III - manutenção de espaços públicos; IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas. Art. 24. A pessoa jurídica constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta Lei terá decretada sua liquidação forçada, seu patrimônio será considerado instrumento do crime e como tal perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional CRIMES EM ESPÉCIE Crimes contra a fauna (arts. 29 a 37) Fauna é o conjunto de animais de qualquer espécie que viva naturalmente fora do cativeiro. Atualmente, os crimes contra a fauna são afiançáveis. Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa. 1º Incorre nas mesmas penas: I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida; II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural; III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. 3 São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras. 4º A pena é aumentada de metade, se o crime é praticado: I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; II - em período proibido à caça; III - durante a noite; IV - com abuso de licença; V - em unidade de conservação; VI - com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa. 5º A pena é aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício de caça profissional. 6º As disposições deste artigo não se aplicam aos atos de pesca. Art. 30. Exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a autorização da autoridade ambiental competente: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. 249

250 Art. 31. Introduzir espécime animal no País, sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida por autoridade competente: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal. Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras: Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas: I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aqüicultura de domínio público; II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou autorização da autoridade competente; III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica. Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente: Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem: I - pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos; II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos; III - transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas. Art. 35. Pescar mediante a utilização de: I - explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante; II - substâncias tóxicas, ou outro meio proibido pela autoridade competente: Pena - reclusão de um ano a cinco anos. Art. 36. Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora. Art. 37. Não é crime o abate de animal, quando realizado: I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família; II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente; IV - por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente. Crimes contra a flora (arts. 38 a 53) Flora é o conjunto de plantas de determinado lugar. Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade. 250

251 Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade. Art. 39. Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão da autoridade competente: Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Decreto nº , de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização: Pena - reclusão, de um a cinco anos. 1º Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral as Estações Ecológicas, as Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios de Vida Silvestre. 2º A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de Proteção Integral será considerada circunstância agravante para a fixação da pena. 3º Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade. 1Entende-se por Unidades de Conservação de Uso Sustentável as Áreas de Proteção Ambiental, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico, as Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural. 2º A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de Uso Sustentável será considerada circunstância agravante para a fixação da pena. 3º Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade. Art. 41. Provocar incêndio em mata ou floresta: Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de detenção de seis meses a um ano, e multa. Art. 42. Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano: Pena - detenção de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Art. 44. Extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente, sem prévia autorização, pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Art. 45. Cortar ou transformar em carvão madeira de lei, assim classificada por ato do Poder Público, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo com as determinações legais: Pena - reclusão, de um a dois anos, e multa. Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade competente. 251

252 Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Art. 49. Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. No crime culposo, a pena é de um a seis meses, ou multa. Art. 50. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 50-A. Desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio público ou devolutas, sem autorização do órgão competente: Pena - reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa. 1º Não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do agente ou de sua família. 2º Se a área explorada for superior a ha (mil hectares), a pena será aumentada de 1 (um) ano por milhar de hectare. Art. 51. Comercializar motosserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de vegetação, sem licença ou registro da autoridade competente: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Art. 52. Penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais, sem licença da autoridade competente: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Art. 53. Nos crimes previstos nesta Seção, a pena é aumentada de um sexto a um terço se: I - do fato resulta a diminuição de águas naturais, a erosão do solo ou a modificação do regime climático; II - o crime é cometido: a) no período de queda das sementes; b) no período de formação de vegetações; c) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da infração; d) em época de seca ou inundação; e) durante a noite, em domingo ou feriado. Crimes de poluição e outros crimes ambientais (arts. 54 a 61) Poluição é a degradação da qualidade ambiental resultantes de atividades que: prejudiquem a saúde, a segurança e o bemestar; criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente o biossistema e as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e lancem matérias ou energia em desacordo com padrões ambientais. O bem jurídico tutelado por esses crimes é a pureza e limpeza da água, do ar e do solo. 252 Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 1º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. 2º Se o crime: I - tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana; II - causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;

253 III - causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade; IV - dificultar ou impedir o uso público das praias; V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos: Pena - reclusão, de um a cinco anos. 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível. Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar a área pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão, licença, concessão ou determinação do órgão competente. Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 1º Nas mesmas penas incorre quem: I - abandona os produtos ou substâncias referidos no caput ou os utiliza em desacordo com as normas ambientais ou de segurança; II - manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá destinação final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou regulamento. 2º Se o produto ou a substância for nuclear ou radioativa, a pena é aumentada de um sexto a um terço. 3º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Art. 58. Nos crimes dolosos previstos nesta Seção, as penas serão aumentadas: I - de um sexto a um terço, se resulta dano irreversível à flora ou ao meio ambiente em geral; II - de um terço até a metade, se resulta lesão corporal de natureza grave em outrem; III - até o dobro, se resultar a morte de outrem. Parágrafo único. As penalidades previstas neste artigo somente serão aplicadas se do fato não resultar crime mais grave. Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Art. 61. Disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. 253

254 Crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (arts. 62 a 65) O bem jurídico tutelado por estes artigos é o meio ambiente urbano e o patrimônio cultural. 254 Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar: I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial; II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa. Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. Art. 64. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. 1º Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou histórico, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa. 2º Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente e a observância das posturas municipais e das normas editadas pelos órgãos governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio histórico e artístico nacional. Crimes contra a administração ambiental (arts. 66 a 69-A) Tutela-se aqui o meio ambiente de forma indireta. Art. 66. Fazer o funcionário público afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar informações ou dados técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. Art. 67. Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público: Pena - detenção, de um a três anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa. Art. 68. Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental: Pena - detenção, de um a três anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa. Art. 69. Obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais: Pena - detenção, de um a três anos, e multa.

255 Art. 69-A. Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. 1º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. 2º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se há dano significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou enganosa. 67 A Lei nº /2005 estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente. Todos os crimes previstos na lei são de ação pública incondicionada e só podem ser praticados na modalidade dolosa. Crimes relativos à genética humana Bens jurídicos: a vida humana embrionária e a dignidade reprodutiva humana e a identidade genética do ser humano. Sujeitos ativos: qualquer pessoa (física), independentemente de qualquer qualidade ou condição pessoal. São crimes comuns. Sujeito passivo: a coletividade; a humanidade. Art. 24: Trata-se de crime de mera conduta (que inadmite tentativa). "Embrião humano" é elemento normativo extrajurídico e significa o estágio de vida humana iniciado ao momento da fecundação do óvulo, até o terceiro mês de desenvolvimento, quando passa a ser denominado "feto". Art. 24. Utilizar embrião humano em desacordo com o que dispõe o art. 5º desta Lei: Pena detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Art. 25: "Engenharia genética", "célula germinal humana", "zigoto humano" ou "embrião humano" são os elementos normativos jurídicos do tipo. As definições dos dois primeiros estão no art. 3º da Lei /2005, enquanto que "zigoto humano" ou "embrião humano" seriam o primeiro estágio de desenvolvimento imediatamente após a fecundação, até 40 horas após esta. 67 FONTE: 255

256 Art. 25. Praticar engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano ou embrião humano. Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Art. 26: "Clonagem humana" é elemento previsto no art. 3º, VIII, IX e X, da Lei /2005. Art.26. Realizar clonagem humana: Pena reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Crimes relativos à genética não humana Bens jurídicos: o equilíbrio ecológico e a biodiversidade; a vida, a integridade física, a saúde pública e o patrimônio. Sujeitos ativos: qualquer pessoa, independentemente de qualquer qualidade ou condição pessoal. São crimes comuns. Sujeitos passivos: a coletividade e o meio ambiente (natural). Subsidiariamente, a pessoa (física ou jurídica). Art. 27: Trata-se de crime de mera conduta que permite a tentativa. Há aumento de pena se tiver resultado danoso, conforme incisos do 2º. "Organismo geneticamente modificado" é elemento normativo jurídico do tipo previsto no art. 3º, V, da Lei /2005. Art. 27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização. Pena reclusão, de 1(um) a 4 (anos), e multa. Pena: detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. 2º Agrava-se a pena: I de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se resultar dano à propriedade alheia; II de 1/3 (um terço) até a metade, se resultar dano ao meio ambiente; III da metade até 2/3 (dois terços), se resultar lesão corporal de natureza grave em outrem; IV de 2/3 (dois terços) até o dobro, se resultar a morte de outrem. Art. 28: Trata-se de crime de mera conduta no que tange à conduta utilizar. Para as demais condutas, exige a ocorrência de resultado, sendo admissível a tentativa. As "tecnologias genéticas de restrição do uso" são previstas no art. 6º, VII, parágrafo único, da Lei /2005. Art. 28. Utilizar, comercializar, registrar, patentear ou licenciar tecnologias genéticas de restrição do uso: Pena reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Art. 29: Os termos"organismo geneticamente modificado" e "seus derivados" são definidos no no art. 3º, V e IV, da Lei /2005 Art.29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar OGM ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização. 256 Pena reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.

257 A Lei /2013 define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado. A lei vem na esteira da Convenção de Palermo (2003), da qual o Brasil é signatário, que impõe a criminalização da organização criminosa. A Convenção foi internalizada por meio do Decreto nº 5.015/ DEFINIÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA O 1º do art. 1º define organização criminosa: associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. O 2º estende a aplicação da lei a outros casos: I - às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; II - às organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em território nacional. II - às organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo legalmente definidos TIPIFICAÇÃO Trata-se de crime de mera conduta, bastando a realização do verbo do tipo para consumação. É crime permanente, estendendo-se sua consumação no tempo. Não admite, portanto, tentativa. Só admite modalidade dolosa. Os bens jurídicos tutelados são a paz ou a tranquilidade pública e também intangibilidade e preservação material das instituições. Importante frisar que a organização criminosa exige no mínimo 4 pessoas, de forma que se houver 3 pessoas haverá crime de associação criminosa (art. 288 do CP). É crime comum, podendo ter como sujeito ativo qualquer pessoa. 257

258 Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas. 1º Nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa. 2º As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo. 3º A pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução. 4º A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços): I - se há participação de criança ou adolescente; II - se há concurso de funcionário público, valendo-se a organização criminosa dessa condição para a prática de infração penal; III - se o produto ou proveito da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior; IV - se a organização criminosa mantém conexão com outras organizações criminosas independentes; V - se as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade da organização DISPOSIÇÕES RELATIVAS A FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS 5º Se houver indícios suficientes de que o funcionário público integra organização criminosa, poderá o juiz determinar seu afastamento cautelar do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à investigação ou instrução processual. 6º A condenação com trânsito em julgado acarretará ao funcionário público a perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo e a interdição para o exercício de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao cumprimento da pena. 7º Se houver indícios de participação de policial nos crimes de que trata esta Lei, a Corregedoria de Polícia instaurará inquérito policial e comunicará ao Ministério Público, que designará membro para acompanhar o feito até a sua conclusão DEFINIÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NA CONVENÇÃO DE PALERMO A Convenção de Palermo também traz, no art. 2º, definição de organização criminosa, expondo de forma analítica os elementos que a compõem. Portanto, trata-se de importante instrumento para interpretação do conceito utilizado no art. 1º e da tipificação do art. 2º. Destacase: 258

259 a) "Grupo criminoso organizado" - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material; b) "Infração grave" - ato que constitua infração punível com uma pena de privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena superior; c) "Grupo estruturado" - grupo formado de maneira não fortuita para a prática imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não disponha de uma estrutura elaborada; MEIOS DE PROVA E CRIMES A ELES RELACIONADOS O art. 3º prevê uma série de meios de provas admitidos especialmente na persecução do crime previsto no art. 2º, tais como: colaboração premiada; captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos; ação controlada; acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, a dados cadastrais constantes de bancos de dados públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais; interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, nos termos da legislação específica; afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação específica; infiltração, por policiais, em atividade de investigação; cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais na busca de provas e informações de interesse da investigação ou da instrução criminal. Regramentos específicos sobre a utilização desses meios de prova são feitos nos arts. 4º a 17. Alguns crimes são previstos para crimes que podem ocorrer durante a investigação e na obtenção de prova: Art. 18. Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Art. 19. Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Art. 20. Descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a ação controlada e a infiltração de agentes: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Art. 21. Recusar ou omitir dados cadastrais, registros, documentos e informações requisitadas pelo juiz, Ministério Público ou delegado de polícia, no curso de investigação ou do processo: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem, de forma indevida, se apossa, propala, divulga ou faz uso dos dados cadastrais de que trata esta Lei. 259

260 O Estatuto do índio (Lei 6.001/73) prevê, no art. 58, uma série de condutas que configuram crimes contra os índios e a cultura indígena. O objetivo das tipificações é de proteger a cultura indígena, evitar a mercantilização de suas culturas e tradições e proteger os índios não integrados da distribuição de substâncias entorpecentes. O aumento da pena se dá no caso de cometimento por funcionário ou empregado de órgão de assistência de índio. Art. 58. Constituem crimes contra os índios e a cultura indígena: I - escarnecer de cerimônia, rito, uso, costume ou tradição culturais indígenas, vilipendiá-los ou perturbar, de qualquer modo, a sua prática. Pena - detenção de um a três meses; II - utilizar o índio ou comunidade indígena como objeto de propaganda turística ou de exibição para fins lucrativos. Pena - detenção de dois a seis meses; III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. As penas estatuídas neste artigo são agravadas de um terço, quando o crime for praticado por funcionário ou empregado do órgão de assistência ao índio. Art. 59. No caso de crime contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não integrado ou comunidade indígena, a pena será agravada de um terço. A Lei nº 8.072/1990 dispõe sobre os crimes hediondos, regulamentando o art. 5º, XLIII, da Constituição. Crimes hediondos são aquele que, pela especial gravidade e reprovabilidade, recebem um tratamento mais gravoso do que os demais crimes. Assim, a lei em questão traz uma lista de crimes previstos no Código Penal que são considerados hediondos (art. 1º) e na sequência estabelece medidas especiais para tais crimes (art. 2º). O caput do artigo primeiro é expresso em afirmar que os crimes arrolados em seus incisos serão hediondos se praticados tanto na forma consumada como na tentada. São hediondos, portanto, o homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e o homicídio qualificado (art. 121, 2º, incisos I a VII). O 260

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