Tribunal de Justiça do Estado do Paraná

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1 Certificado digitalmente por: SIGURD ROBERTO BENGTSSON APELAÇÃO CÍVEL Nº , DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA VARA DE REGISTROS PÚBLICOS E CORREGEDORIA DO FORO EXTRAJUDICIAL. RELATOR : DES. SIGURD ROBERTO BENGTSSON APELANTE : ARNALDO ANDRADE DE OLIVEIRA LANA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RETIFICAÇÃO EM PACTO ANTENUPCIAL. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. PEDIDO DO APELANTE QUE NÃO ENCONTRA VEDAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. POSSIBILIDADE JURÍDICA RECONHECIDA. SENTENÇA REFORMADA. QUESTÃO EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO QUE ESTÁ MADURA PARA JULGAMENTO. NOME DO RECORRENTE QUE JÁ FOI ALTERADO EM TODOS SEUS DOCUMENTOS, COM EXCEÇÃO DA ESCRITURA PÚBLICA DE PACTO ANTENUPCIAL. ALTERAÇÃO QUE DEVE SER REALIZADA. CONSEQUÊNCIA LÓGICA DA RETIFICAÇÃO DE SEU REGISTRO CIVIL, ORIUNDA DE SENTENÇA JÁ TRANSITADA EM JULGADO. VONTADE EXPRIMIDA PELAS PARTES QUE NÃO SERÁ ALTERADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA E JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº , do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Vara de Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial, em que é apelante Arnaldo Andrade de Oliveira Lana. I. RELATÓRIO. Página 1 de 10 1

2 Trata-se de recurso de apelação da sentença proferida na Ação de Retificação em Pacto Antenupcial nº , cuja decisão (mov. 23.1) julgou extinto o processo sem resolução do mérito, por entender que o pedido é juridicamente impossível, condenando o autor ao pagamento das custas processuais. Inconformado, insurge-se Arnaldo Andrade de Oliveira Lana (mov. 31.1) argumentando, em suma, que: i) a retificação da escritura pública é possível de ser realizada através do meio judicial, devendo ser declarada nula a sentença fundamentada na impossibilidade jurídica do pedido; e, ii) o mérito da ação merece ser analisado, e consequentemente provido, já que a retificação trata apenas da inclusão de um sobrenome, inexistindo prejuízo a terceiros. O recurso foi recebido em seu duplo efeito (mov. 35.1). O Ministério Público do Estado do Paraná (mov. 44.1), se manifestou pelo conhecimento e provimento do recurso. Parecer da D. Procuradoria de Justiça opinando no mesmo sentido (fls. 12/14-TJ). É a síntese do relatório. II. VOTO E FUNDAMENTAÇÃO. Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), conheço do recurso e passo à análise do mérito. Página 2 de 10 2

3 II.I. No presente caso, o ora apelante afirmou em sua petição inicial que em 2001 ajuizou a Ação de Retificação de Registro Civil nº 366/2001, na Vara de Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, a qual foi julgada procedente para que seu nome constasse como Arnaldo Andrade de Oliveira Lana (mov. 1.11). Posteriormente, em 2004, ajuizou a Ação de Retificação de Certidão de Casamento nº 515/2004 perante a mesma vara, para que seu nome também fosse alterado em tal documento, o que foi deferido (mov. 1.10). Aduz que todos os seus documentos estavam com o nome incompleto, faltando o sobrenome Lana, porém as devidas alterações foram providenciadas, com a exceção do pacto antenupcial, o qual deve ser alterado por uma exigência do Cartório de Registro de Imóveis de Balneário Camboriú/SC. A Magistrada extinguiu o processo sem resolução do mérito pela impossibilidade jurídica do pedido, por entender que não é de competência do Poder Judiciário retificar uma escritura pública que traduz a vontade de partes maiores capazes, devendo as partes interessadas lavrarem novo ato. Segundo os ensinamentos de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO 1 a demanda é juridicamente impossível quando é contrária ao ordenamento jurídico: 1 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, v. 2: Processo em geral conceitos e regime legal. São Paulo: Editora Malheiros, 2004, p Página 3 de 10 3

4 A demanda é juridicamente impossível quando de algum modo colide com regras superiores do direito nacional e, por isso, sequer comporta apreciação mediante exame de seus elementos concretos. Já a priori ela se mostra inadmissível e o autor carece de ação por impossibilidade jurídica da demanda. A possibilidade jurídica é a admissibilidade desta em tese e, sem ela, sequer se indagará se o demandante é parte legítima, se o provimento que pede é adequado, se é apto a lhe trazer proveito ou se ele tem razão ou não, pelo mérito (se venho cobrar um crédito decorrente do jogo, de nada importa saber se ganhei honestamente, se realmente ganhei ou quanto ganhei CC, art ). Para que a demanda seja juridicamente possível, é necessária a compatibilidade de cada um de seus elementos com a ordem jurídica. O petitum é juridicamente impossível quando se choca com preceitos de direitos material, de modo que jamais poderá ser atendido, independentemente dos fatos e das circunstâncias do caso concreto (pedir o desligamento de um Estado da Federação). A causa petendi gera a impossibilidade da demanda quando a ordem jurídica nega que fatos como os alegados pelo autor possam gerar direitos (pedir a condenação com fundamento em dívida de jogo). Como bem ressaltado pelo ilustre Procurador de Justiça em seu parecer, a ausência de vedação ao pedido da parte acarreta no reconhecimento da sua possibilidade: A impossibilidade jurídica do pedido, pois, revela-se na existência de vedação legal sobre determinada pretensão, o que significa dizer em raciocínio contrário, que estará configurada a sua possibilidade se não houver no ordenamento jurídico norma que o proíba. Página 4 de 10 4

5 No presente caso, não há qualquer vedação legal ao pedido de retificação de escritura pública, sendo inviável concluir pela impossibilidade jurídica do pedido, de modo que a sentença deve ser anulada para que o mérito da questão seja analisado. II.II. Como o pedido do autor, de retificação de seu sobrenome na escritura pública de pacto antenupcial, versa apenas sobre questões de direito, plenamente possível a análise do mérito por esta instância julgadora, já que a instrução probatória não é necessária. Segundo o artigo 212 da Lei 6.015/73 a retificação pode ser ajuizada pela parte interessada através da via judicial: Art Se o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, a retificação será feita pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, por meio do procedimento administrativo previsto no art. 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial. Ainda, conforme o artigo 213, inciso I, alínea g, do mesmo dispositivo legal, cabe ao oficial retificar a qualificação pessoal das partes, caso seja comprovada que está redigida erroneamente: Art O oficial retificará o registro ou a averbação: I - de ofício ou a requerimento do interessado nos casos de: (...) g) inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas; Página 5 de 10 5

6 No presente caso, a escritura pública de pacto antenupcial cuja retificação é pretendida foi firmada em 24/08/2001 (mov. 1.9), e a ação de Retificação no Registro Civil nº 366/2001 teve sua sentença proferida em 13/12/2001, para adicionar o patronímico Lana ao final do nome do ora apelante. É inconteste que a escritura pública foi celebrada antes da mudança no nome do autor, a qual decorreu de uma sentença judicial já transitada em julgado, e no presente caso o pleito do apelante visa apenas a retificação de seu nome, inexistindo alteração na vontade das partes que formalizaram a escritura, como bem ressaltou o ilustre Procurador de Justiça: Não se desconhece que o deferimento do pedido de retificação de pacto antenupcial pode, sim, refletir na manifestação de vontade alheia, como bem disse a d. Juíza. Há que se atentar, contudo, que apenas analisando o caso concreto é que se poderá concluir se o atendimento do requerimento vai desaguar, mesmo, nesta situação. E faz-se esta ressalva porque, no caso em tela, ainda que o pedido seja direcionado à retificação de escritura pública de pacto antenupcial, a pretensão do apelante é de simples retificação de seu nome, não havendo interferência nenhuma na vontade outrora manifestada. Calha destacar, aliás, que a pretendida retificação decorre de sentença judicial, já transitada em julgado, em cujo processo já foram analisadas as questões pertinentes à viabilidade ou não de se acrescer o patronímico Lana, não havendo que, aqui, se perquirir quanto a isso. Página 6 de 10 6

7 Além disso, como o nome do ora apelante já foi corrigido em todos os seus documentos, como em sua certidão de casamento (mov. 1.16), passaporte (mov. 1.17), carteira de motorista (mov. 1.18) e certidão de casamento (mov. 1.19), a correção de seu nome na escritura pública de pacto antenupcial é apenas a conclusão lógica, já que a vontade das partes não será alterada. Nesse sentido, inclusive, já decidiu este Tribunal: RETIFICAÇÃO DE NOME. INDEFERIMENTO DA INICIAL.INSURGÊNCIA DOS AUTORES. ERRO DE GRAFIA DOS NOMES DOS AVÓS PATERNOS DA SEGUNDA APELANTE NO PACTO ANTENUPCIAL LAVRADO COM BASE EM REGISTRO CIVIL ORIGINÁRIO. INEXISTÊNCIA DE DÚVIDA QUANTO AO ERRO DO ASSENTO DE NASCIMENTO DA AUTORA, EIS QUE JÁ RECONHECIDO JUDICIALMENTE QUANDO NO JULGAMENTO DE PEDIDO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. PLEITO DOS APELANTES QUE NÃO ENCONTRA VEDAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. APLICAÇÃO DO ART.109 DA LEI 6.015/73. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. APLICAÇÃO DA REGRA DO 3º DOA RT. 515 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ALTERAÇÃO NA ESCRITURA PÚBLICA QUE SE APRESENTA COMO CONSEQUÊNCIA LÓGICA E EFEITO PRÁTICO DA RETIFICAÇÃO DO REGISTRO CIVIL.INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO DA VONTADE EXPRIMIDA PELAS PARTES, TAMPOUCO DANO A QUAISQUER DELAS. RECURSO PROVIDO PARA AFASTAR A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO DOS AUTORES. (TJPR - 12ª C.Cível - AC Região Metropolitana de Maringá - Foro Central de Maringá - Rel.: Luiz Cezar Nicolau - Unânime - - J ) Como bem destacado no acórdão desse julgado: 7 Página 7 de 10

8 Assim, corrigidos os nomes dos avós paternos da segunda apelante, com a retificação de assentamento em seu registro civil, a alteração dos demais registros e escrituras públicas, lavrados sob a égide do superado erro, se apresenta como consequência lógica e efeito concreto daquela. Ainda que possível a correção na via administrativa, e mesmo não tendo os apelantes comprovado a negativa do Tabelião em corrigir as inexatidões, ante o princípio da inafastabilidade da jurisdição, bem como do art. 109, cabeça, da Lei 6.015/73, não se pode arredar o legítima interesse e o direito da parte em deduzir sua pretensão em juízo, até porque, a retificação do pacto antenupcial celebrado entre os autores antes da alteração do nome dos avós paternos da segunda apelante, é medida que se impõe. Nesse sentido recentemente se posicionou este Tribunal: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL - ERRO NA GRAFIA DO NOME DE SUA GENITORA NO ASSENTO DE CASAMENTO DO REQUERENTE - INDEFERIMENTO DA INICIAL, POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL - PRETENSÃO QUE PODERIA SER SATISFEITA DIRETAMENTE COM O AGENTE DELEGADO DO REGISTRO CIVIL COMPETENTE (ART. 110 DA LEI 6.015/73) - DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA EM QUESTÃO - REQUERIMENTO PELA VIA JUDICIAL - FACULDADE DO INTERESSADO - ACESSO À JUSTIÇA - PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO - OBSERVÂNCIA DO ART. 109 DA REFERIDA LEI - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - SENTENÇA CASSADA, COM JULGAMENTO DO MÉRITO, DESDE LOGO, PELO TRIBUNAL (ART.515, 3º, DO CPC) - RECURSO PROVIDO. (TJPR - 11ª C.Cível - AC Marechal Cândido Página 8 de 10 8

9 Rondon - Rel.: Antonio Domingos Ramina Junior - Unânime - - J ) Entendimento diverso, conforme lucidamente ressaltado pela eminente Procuradora de Justiça Sonia Maria de Oliveira Hartmann, implicaria na imutabilidade do documento, visto que a pretensão de retificação lhe seria negada tanto administrativa, como judicialmente, com o que não se pode concordar (fl. 17-TJ). Enfatiza, também, a representante do Ministério Público, com razão, que o pacto antenupcial que se almeja retificar detém natureza de registro público de ato pessoal, inexistindo, pois, óbice para aplicação do art. 109 da Lei de Registros Públicos. Por fim, impõe-se esclarecer, ainda, que os autores almejam, tão somente, corrigir erro material constante na escrituração do pacto, não havendo que se falar, portanto, em alteração pelo juízo da manifestação da vontade das partes exprimida na escritura pública, que permanecerá hígida e incólume, inexistindo dano a qualquer destas. Erro este que não só foi reconhecido pelo Judiciário através da procedência do pedido de retificação de registro civil -, como já foi, inclusive, corrigido nos registros civis da segunda apelante e seus ascendentes, a exemplo das averbações nas certidões de nascimento daquela (mov. 1.7, Projudi) e de seu pai (mov. 1.9, Projudi), bem como na certidão de casamento de seus avós (mov. 1.8, Projudi). Dessa maneira, o presente recurso merece ser conhecido e provido, para reformar a sentença que reconheceu a impossibilidade jurídica do pedido e julgar procedentes os pedidos iniciais, Página 9 de 10 9

10 determinando ao Oficial do Cartório Distrital da Barreirinha de Curitiba/PR a retificação do nome do autor, para que passe a constar ARNALDO ANDRADE DE OLIVEIRA LANA na Escritura público de Pacto Antenupcial que está na fl. 168 do livro nº 125. Conclusão: Diante do exposto, voto pelo conhecimento e provimento do recurso interposto por Arnaldo Andrade de Oliveira Lana, para: i) cassar a sentença que reconheceu a impossibilidade jurídica do pedido; e, ii) julgar procedentes os pedidos iniciais, determinando ao Oficial do Cartório Distrital da Barreirinha de Curitiba/PR a retificação do nome do autor, para que passe a constar ARNALDO ANDRADE DE OLIVEIRA LANA na Escritura público de Pacto Antenupcial que consta na fl. 168 do livro nº 125. III. DISPOSITIVO ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da 11ª Câmara Cível, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso de apelação cível, nos exatos termos do voto do Relator. Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator os Desembargadores Ruy Muggiati e Mario Nini Azzolini. Curitiba, 02 de dezembro de SIGURD ROBERTO BENGTSSON Desembargador Página 10 de 10 10