PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO

Transcrição

1 A C Ó R D Ã O 3ª Turma VÍNCULO DE EMPREGO. Admitida a prestação de serviços, a reclamada atraiu para si o ônus da prova de que a relação jurídica havida entre as partes não era de emprego. Entretanto, deste ônus não se desincumbiu. Recurso a que se dá parcial provimento. Visto, relatado e discutido o recurso ordinário em que são partes LUIZ FERNANDO SANTOS, recorrente, e MOLTEC INDÚSTRIA DE MÁRMORES E GRANITOS LTDA., recorrida. Trata-se de recurso ordinário interposto pelo reclamante da respeitável sentença da MM. 32ª Vara do Trabalho de Duque de Caxias, de lavra da eminente Juíza Marta Verônica Borges Vieira, que julgou improcedente o pedido (fls. 92/93). Salienta que faz jus ao reconhecimento do vínculo de emprego entre as partes. (fls.97/103). Preparo à fl. 96. Contrarrazões às fls.106/111, sem preliminares. Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho por não se configurar hipótese de sua intervenção. É o relatório. V O T O CONHECIMENTO Conheço do recurso, por preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade

2 MÉRITO VÍNCULO DE EMPREGO E CONSECTÁRIOS A respeitável sentença julgou improcedente o pedido de reconhecimento do vínculo e consectários, sob o fundamento de que não há nos autos qualquer elemento de convencimento capaz de dar a certeza ao Juízo de que o autor foi empregado do réu, mormente nas condições declinadas na inicial; que os documentos juntados revelam a prestação de serviços no moldes alegados na defesa. (fls. 92/93) Assevera o recorrente que os documentos de fls.15/17, 63/67 e 85/88 demonstram que o recorrente não exerceu a prestação de serviços de forma intercalada, configurando a existência de pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação jurídica; que o recorrente comprovou ter laborado para a ré no período de a ; que os recibos juntados demonstram a prestação de serviços por vários meses ininterruptos e sempre com o mesmo salário; que prestava serviços de vendedor, recebendo da reclamada mensalmente; que a recorrida não juntou contrato de prestação de serviços entre as partes. (fls. 97/103). Com parcial razão. Em sua defesa, a reclamada aduziu, em síntese, que o serviço prestado pelo reclamante era caracterizado pela eventualidade, em situações de contingência e de acidentalidade. Ressaltou, ainda, que inexistia subordinação do reclamante à reclamada. (fls.78/80) Conforme se depreende dos autos, a prestação de serviços do reclamante em favor da reclamada é incontroversa, havendo divergência das partes quanto à sua natureza. Sustenta o reclamante se tratar de relação de emprego, ao passo que a reclamada afirma a tese de trabalho sem vínculo. Todavia, cabia à ré provar os fatos alegados em defesa como óbices ao reconhecimento do vínculo de emprego. É o que se depreende do artigo 818 da CLT e inciso II do artigo 333 do CPC, subsidiariamente aplicável ao Processo do

3 Trabalho. Nesse sentido, é a doutrina de Francisco Antônio de Oliveira: (...)Ora, se o réu (reclamado) defende-se afirmando que o autor nunca lhe prestou serviços, o ônus de provar a prestação de serviços e a consequente existência de vínculo empregatício é desenganadamente do autor. Outra seria a óptica, se a empresa confirmasse a prestação de serviços, mas os classificasse como eventuais. Neste caso, estaria alegando um fato impeditivo de vínculo empregatício, e seu seria o ônus da prova. O princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado, quando indiscutível a presença de vínculo empregatício, por isso que é empregado. (...) (in Comentários às Súmulas do TST, 7ª edição - São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, p ). Para que se declare a existência da relação de emprego é necessário que estejam presentes os requisitos dos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, sendo empregador aquele que assume os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços, e empregado a pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário. Registro que o autor exercia a função de vendedor, atividade essencial aos fins da reclamada, empresa do ramo de comercialização de granitos, mármores e similares, conforme a cláusula I do contrato social de fls. 68/70. As partes não produziram prova oral. Todavia, à vista dos documentos carreados pelo reclamante e pela reclamada, não há dúvidas sobre a existência de todos os requisitos inerentes ao

4 contrato de trabalho, constantes dos artigos 2º e 3º da CLT, ou seja, prestação de serviços de natureza contínua, realizados com pessoalidade, mediante remuneração e sob subordinação à empresa reclamada. Da análise dos documentos juntados pelo reclamante às fls.63/67, não impugnados pela reclamada, observo que houve prestação de serviços no período de março de 2009 a junho de Além disso, o primeiro recibo de fl.66, datado de 20 de novembro de 2009, aponta pagamento referente à 1ª parcela de 13º, e os dois primeiros recibos de fl.65 expressam o pagamento de quantias referentes à reajuste salarial, o que, por si só, evidencia a existência de quitação de verbas pertinentes à relação empregatícia. Por outro lado, não apresentou a reclamada elementos que evidenciassem que o reclamante desenvolvia atividades por conta própria, com total desvinculação da reclamada. Prevalece hoje, na doutrina e na jurisprudência, o conceito de subordinação jurídica ou hierárquica, definida pela prestação de serviços essenciais e necessários à finalidade do empreendimento. É a teoria da integração objetiva que descreve o empregado como aquele que trabalha para uma fonte econômica ou a ela equiparada, no regime de colaboração social e integração nos seus objetivos ou na sua organização. Surge quando o trabalhador passa a integrar o serviço geral da empresa, inserindo-se na sua engrenagem, nas suas atividades, de maneira a se tornar indispensável, permanente e, pela integração, convola-se em empregado. É a integração dos fatores trabalho e capital que traduzem a empresa como ente econômico social. Ademais, houve pagamento mensal pelo serviços prestados, o que não é compatível com o serviço autônomo, vez que o autor tinha obrigação de retornar em outra oportunidade. Ora, o autor prestou serviços para a ré por pelo menos 16 (dezesseis) meses, o que comprova a não eventualidade. Destarte, impõe-se declarar a existência da relação de emprego entre

5 as partes, limitada ao período comprovado nos autos através dos recibos de pagamento juntados, qual seja, de 01 de março de 2009 a 31 de julho de 2010 (projeção do aviso prévio), na função de vendedor. Fica caracterizada a dispensa por iniciativa do empregador, em razão do princípio da continuidade da relação de emprego e diante da ausência de prova em contrário. Na impossibilidade da anotação do contrato pelo representante da reclamada, a Secretaria deverá proceder as devidas anotações na CTPS do reclamante. Tomando por base a prova documental, reconheço como salário o valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) por mês. Havendo sido declarado o vínculo, devido o pagamento da multa prevista no 8º do artigo 477 da CLT, já que as verbas obviamente não foram quitadas no prazo legal. Ora, se aquele empregador que registra o contrato de trabalho é penalizado com a multa do artigo 477 da CLT, ante a mora no pagamento das verbas rescisórias, com muito mais razão deverá ser penalizado aquele que sequer cumpre a mais elementar obrigação contratual, qual seja, a devida anotação na CTPS do trabalhador. Ante a existência de controvérsia seria, legítima e razoável, improcede o pedido da multa do artigo 467 da CLT. Considerado o período do vínculo e os limites do pedido, defiro o pagamento das seguintes verbas: aviso prévio indenizado; natalinas proporcionais 2009 (10/12) e proporcionais 2010 (07/12), férias integrais de 2009/2010 e proporcionais (05/12), todas acrescidas com 1/3; indenização de 40% (quarenta por cento) sobre o FGTS. Como decorrência do reconhecimento do contrato de trabalho em Juízo, o que obstou o recebimento do FGTS e do seguro-desemprego, responde o empregador pela indenização correspondente. Recolhimentos fiscais e previdenciários na forma da lei, observando o

6 disposto na Súmula nº 368 do TST. Juros de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, a partir do ajuizamento da ação, nos termos do 1º do artigo 39 da Lei nº 8.177/91. A incidência de correção monetária sobre os débitos trabalhistas de qualquer natureza é regulada pelo artigo 39 da Lei nº 8.177/91, que dispõe que a época própria é a data do vencimento da obrigação, esta definida em lei, norma coletiva ou cláusula contratual. E com base no artigo 459 da CLT, no que diz respeito ao salário e demais verbas pagas juntamente com este, reconhecidas por condenação desta Justiça Especial, a jurisprudência do C. TST consagrou o entendimento de que o índice de correção monetária incide a partir do primeiro dia do mês subseqüente ao da prestação de serviço. Todavia, para outros títulos prevalece o índice de correção a partir da data de vencimento de cada uma das obrigações reconhecidas nos termos da Súmula nº 381 do C. TST. Desse modo, em relação ao salário e demais verbas pagas juntamente com este deve ser observado o disposto na Súmula nº 381 do Colendo TST e para outros títulos deve ser aplicado o índice de correção a partir da data de vencimento de cada uma das obrigações. Os pleitos de pagamento de vale-transporte, ticket-refeição, salário família e expedição de ofícios não foram devolvidos de forma específica à instância revisora, não se tratando de consectários do reconhecimento do vínculo de emprego. Portanto, por preenchidos os pressupostos do artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, dou parcial provimento para declarar a relação de emprego entre as partes, determinando que a reclamada proceda a anotação das Carteiras de Trabalho, na função de vendedor, com data de admissão em e dispensa em , sob pena da Secretaria da Vara fazê-lo, fixando como salário o valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) por mês, declarando-se que a dispensa ocorreu de forma imotivada, bem como para condenar a ré ao

7 pagamento do aviso prévio indenizado (30 dias), natalinas proporcionais 2009 (10/12) e proporcionais 2010 (07/12), férias integrais de 2009/2010 e proporcionais (05/12), todas acrescidas com 1/3, dos depósitos de FGTS de todo o período contratual, da indenização compensatória de 40%, da multa do artigo 477 da CLT, e da indenização compensatória do seguro-desemprego, tudo conforme se apurar em liquidação, autorizando-se desde já a dedução dos valores comprovadamente pagos a mesmo título. CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do recurso e dou-lhe parcial provimento para declarar a relação de emprego entre as partes, determinando que a reclamada proceda a anotação das Carteiras de Trabalho, na função de vendedor, com data de admissão em e dispensa em , bem como para condenar a ré ao pagamento do aviso prévio indenizado (30 dias), dos décimos terceiros proporcionais, das férias integrais e proporcionais com 1/3 constitucional, dos depósitos de FGTS, da indenização compensatória de 40%, da multa do artigo 477 da CLT, da indenização compensatória do seguro-desemprego, nos termos traçados na fundamentação, tudo conforme se apurar em liquidação. Invertido o ônus da sucumbência. Recolhimentos fiscais e previdenciários na forma da lei, observada a Súmula nº 368 do TST. Juros de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, a partir do ajuizamento da ação, nos termos do 1º do artigo 39 da Lei nº 8.177/91, e correção monetária nos moldes da Súmula nº 381 do C. TST. Diante da condenação, arbitro seu valor em R$ ,00 (dez mil reais) e custas de R$ 200,00 (duzentos reais), pela reclamada, nos termos das Instruções Normativas nº 3/93 e 09/96 do C. TST. A C O R D A M os Desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para declarar a relação de emprego entre as partes, determinando que a reclamada proceda a anotação das Carteiras de Trabalho, na

8 função de vendedor, com data de admissão em e dispensa em , bem como para condenar a ré ao pagamento do aviso prévio indenizado (30 dias), dos décimos terceiros proporcionais, das férias integrais e proporcionais com 1/3 constitucional, dos depósitos de FGTS, da indenização compensatória de 40%, da multa do artigo 477 da CLT, da indenização compensatória do segurodesemprego, nos termos traçados na fundamentação, tudo conforme se apurar em liquidação. Invertido o ônus da sucumbência. Recolhimentos fiscais e previdenciários na forma da lei, observada a Súmula nº 368 do TST. Juros de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, a partir do ajuizamento da ação, nos termos do 1º do artigo 39 da Lei nº 8.177/91, e correção monetária nos moldes da Súmula nº 381 do C. TST. Diante da condenação, arbitrar seu valor em R$ ,00 (dez mil reais) e custas de R$ 200,00 (duzentos reais), pela reclamada, nos termos das Instruções Normativas nº 3/93 e 09/96 do C. TST. O Exmo Des. Rildo Brito, embora presente na sessão, não manifestou seu voto por estar realizando vista em mesa de outro processo. Rio de Janeiro, 27 de Agosto de DESEMBARGADOR MARCOS PALACIO Relator alvp/ver