Sessão do dia 26 de agosto de 2003.

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Rita Rios Amado
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1 1 QUARTA CÂMARA CÍVEL Sessão do dia 26 de agosto de APELAÇÃO CÍVEL N.º 4.946/2002 São Luís. APELANTE: Advogados: APELADO: Advogados: COMARCA: VARA: JUÍZA: RELATOR: EVISORA: AUVEMAQ FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. Dra. Thyenes de Oliveira Chagas e outros. TRIÂNGULO COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. Dr. Luís Fernando Dominice Castelo Branco e outros. São Luís-Ma. 3ª Vara Cível Dra. Ilva Salazar Eliseu Cerqueira Torres. Des. MILSON DE SOUZA COUTINHO Desa. MARIA DULCE SOARES CLEMENTINO ACÓRDÃO N.º /2003. EMENTA AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO CONTRATO DE FACTORING JUROS E REMUNERAÇÃO DISTINÇÃO ENTRE O PRIMEIRO INSTITUTO E O SEGUNDO. APELAÇÃO PROVIDA. I O contrato de Factoring se assemelha a uma cessão onerosa de créditos, em que, além dos juros, é devida também pelo faturizado uma remuneração (preço) ao faturizador. II Não tendo a perícia discriminado um instituto do outro, não tem cabimento a conclusão do expert de que os juros cobrados excederam 1% ao mês. III Apelação provida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação Cível n.º 4.946/2002, da Comarca de São Luís (3ª Vara Cível), em que são partes, as acima indicadas:

2 2 ACORDAM, em Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, à unanimidade, dar provimento ao recurso para reformar a sentença recorrida, nos termos do voto do Desembargador Relator. Custas como de direito. Participaram da sessão os Senhores Desembargadores: Militão Vasconcelos Gomes Presidente, Milson de Souza Coutinho Relator e Maria Dulce Soares Clementino Revisora. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça, Dr(a) Suvamy Vivekananda Meireles. São Luís, 26 de agosto de Des. MILITÃO VASCONCELOS GOMES Presidente Des. MILSON DE SOUZA COUTINHO Relator RELATÓRIO Trata-se de Apelação interposta por AUVEMAQ FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. contra decisão da juíza de Direito da 3ª Vara Cível desta Comarca, que julgou procedente o pedido formulado na Ação de Revisão de Contrato c/c Repetição de Indébito intentada por TRIÂNGULO COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. A referida ação foi proposta pela ora apelada, sob o argumento de que nas operações de emissão e transferência de créditos realizadas entre ela e a empresa de Factoring no período de fevereiro de 1997 a junho de 1998, teriam incidido juros acima do permitido por lei, além de ter havido a capitalização desses juros. Por essa razão,

3 3 na inicial aduziu que esses fatos geraram crescimento desproporcional das obrigações pactuadas e efetivamente pagas, havendo, assim, um crédito a seu favor para ser devolvido pela empresa/apelante. A sentença a quo, acolheu os argumentos da autora e julgou procedente a ação, afirmando que a prova pericial havia demonstrado que os juros realmente haviam sido cobrados acima de 1% ao mês. Inconformada, a apelante alega, inicialmente, que desenvolve a atividade de factoring, traduzida em operações de compra e venda de títulos de crédito representativos de efeitos comerciais (faturamento), não sendo, todavia, instituição financeira. Nesse passo, aduz que a sua atividade cessão onerosa de direito de crédito guarda estrita relação com o contrato de compra e venda, tendo, portanto, o preço como um de seus elementos essenciais, o que, a toda evidência, não se confunde com juros. Ressalta, ainda, que nesse preço deverá estar incluída a remuneração decorrente das despesas efetuadas com os serviços de cadastramento dos clientes do cedente do título e com a análise da capacidade de pagamento desses mesmos clientes. Em seguida, diz que a apelada não pode ser considerada consumidora final do serviço de factoring, vez que o utiliza tão-somente para o exercício de sua atividade econômica ou profissional. Ao final, pede seja provida a presente apelação, a fim de que se reforme totalmente a sentença atacada, julgando-se improcedente o pedido formulado pela autora. Em contra-razões de fls. 337/647, a apelada alega, em suma, que nos autos restou comprovada a prática de juros acima do legal, bem como a captação desses juros, e que quanto a isso não houve qualquer impugnação da parte contrária, que se limitou a citar conceitos doutrinários sobre o contrato de factoring.

4 4 Nesse passo, aduz que a cobrança de juros acima de 1% ao mês é expressamente vedada por lei, motivo pelo qual deve ser mantida a sentença que condenou a ré à devolução do que foi pago a maior pela autora. Instada a se manifestar, a douta Procuradoria Geral de Justiça deixou de opinar, a mingua de interesse público na lide a ser tutelado. É o Relatório. VOTO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço deste recurso. No mérito, vejo que a pretensão da recorrente merece prosperar. Dos autos, extrai-se que a avença realizada entre apelante e apelada refere-se à atividade de factoring, e que quanto a isso não existe qualquer controvérsia, posto que ambas as partes não divergem nesse particular. Pois bem, diante dessa constatação, vale então fazer breves considerações a respeito do que venha a ser esse contrato, a fim de que se extraia quais são os elementos que o compõem. Factoring na dicção de Maria Helena Diniz: Consiste numa técnica de mobilização do preço, oriundo de vendas comerciais. Trata-se, geralmente, de financiamento de créditos a curto prazo (seis meses no máximo). O cessionário assumirá o risco de não recebê-los contra o pagamentos de determinada comissão, a que o cedente se obriga, não tendo a ação de in rem verso contra o faturizado. O faturizador, pelo fato de prestar serviço de cobrança, será remunerado não só pela comissão, mas também por ágio correspondente aos adiantamentos feitos por ele ao vendedor. Esse contrato liga-se à necessidade de reposição do capital de giro, principalmente nas

5 5 pequenas e médias empresas, que por sua vez, correm o risco de serem manipuladas por grandes bancos. 1 Percebe-se, então, que o contrato de factoring traduz-se basicamente em uma cessão onerosa de créditos, assemelhando-se ao instituto da compra e venda, possuindo, portanto, como um de seus elementos principais o preço (ou remuneração). E não poderia ser diferente, visto que a empresa que pratica essa atividade assume o risco de receber a menor os valores constantes na face do título, ou de sequer recebê-los. A grosso modo, o cessionário (faturizador) recebe títulos dos credores do cedente (faturizado) e repassa a este um valor em dinheiro, descontado da remuneração que lhe é devida. Nesse particular, diferencia-se substancialmente das operações de crédito realizadas pelas instituições financeiras, vez que o risco assumido impede que o faturizador ingresse com ação de regresso contra o faturizado, se acaso os credores deste não tiverem meios de arcar com o débito oriundo dos títulos cedidos. Em contrapartida, o faturizador, repita-se, recebe a já mencionada remuneração, que, por óbvio, não se confunde com os juros bancários ou juros de qualquer outra espécie que estariam sujeitos à limitação de 1% ao mês. Todavia, o que se vê nas provas colacionadas aos autos, principalmente na perícia em que se baseou a sentença atacada, é a ausência de distinção entre o que seja os valores oriundos dos serviços creditícios prestados pela apelante à apelada, e os que representavam o ágio correspondente aos adiantamentos realizados pelo faturizador ao faturizado. Com efeito, o expert não fez qualquer menção ao que seja uma coisa e outra, reunido tudo no que denominou de juros, chegando, 1 Tratado Teórico e Prático dos Contratos, 2ª Ed., Saraiva, 1996

6 6 portanto, à conclusão de que houve uma cobrança excessiva destes últimos, ultrapassando o percentual de 1% ao mês. Vale frisar, que a essência do negócio jurídico aqui discutido não revela apenas o financiamento do valor do crédito vendido e o respectivo seguro, mas também os serviços de administração do crédito, como por exemplo, controle dos vencimentos, eventuais avisos de protesto e notificações com o fim de assegurar o direito creditício, entre outros. A magistrada sentenciante ao entender que deveriam ser devolvidos os valores cobrados a título de juros, não se ateve que seria necessário fazer-se primeiramente a individualização do valor da comissão acertada entre apelante e apelada, subtraindo-se do saldo remanescente o total dos descontos, para só depois chegar-se às taxas de juros cobradas, reduzindo-os para 1% se fosse o caso. Não se discute o acerto da magistrada ao dizer que as empresas de factoring estão obrigadas a atender ao limite de 1% ao mês na cobrança de juros, todavia, ao se basear em perícia que não demonstrou quantum satis que os valores cobrados seria exclusivamente juros, deu ensejo a que as razões de reforma de sua decisão fossem acolhidas por este Relator. Ademais, trata-se de Ação de Revisão de Contrato c/c Repetição de Indébito, em que se pugna pela declaração de nulidade das cláusulas abusivas e onerosas, o que não foi feito pela juíza a quo, que silenciou quanto às possíveis cláusulas ensejadoras da nulidade contratual, reescrevendo-as como determina a lei. Ante o exposto, dou provimento ao presente recurso, para reformar a sentença atacada e julgar improcedente o pedido formulado pela autora, ora apelada. É como voto. Sala das Sessões da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 26 de agosto de 2003.

7 7 Des. MILSON DE SOUZA COUTINHO Relator

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