MÓDULO - AULA 30 Aula 30 Técnicas de integração Miscelânea Esta é a última aula do segundo módulo da disciplina Cálculo II. Isso significa que você está completando boa parte desta jornada. Você já enfrentou algumas dificuldades e, com certeza, já aprendeu muitas coisas novas. A partir do terceiro módulo, a paisagem do curso mudará, primeiro um pouco e, depois, radicalmente. Isso deverá lhe dar mais motivação ainda para seguir em frente. Os temas que foram abordados até agora foram tratados de maneira cuidadosa e a epectativa é que, com a bagagem de eemplos apresentados, e com a resolução dos eercícios propostos, você tenha ganho uma visão geral das técnicas de integração. No entanto, alguns aspectos tiveram de ser deiados de lado. Isso é natural. A Matemática é vasta, e o nosso tempo, limitado. O principal objetivo desta aula é apresentar, pelo menos rapidamente, alguns temas que não foram incluídos nas aulas anteriores e devem indicar como você pode completar sua formação, na medida em que for necessário ou de seu interesse. O primeiro tema é um tipo de substituição alternativa para o método da substituição trigonométrica. Substituição trigonométrica hiperbólica Antes de falarmos nessa técnica, vamos lembrar, rapidamente, as motivações e algumas propriedades das chamadas funções trigonométricas hiperbólicas. Seja A R um conjunto simétrico em relação à origem. A, então A. Isto é, se Aqui estão alguns eemplos de conjuntos simétricos: R, Z, ( a, a, R { k R k Z }. E agora, alguns eemplos de conjuntos que não são simétricos: (0,, N, [a, b], onde a b, R {3}. 53 CEDERJ
Seja f : A R uma função definida num conjunto simétrico. Dizemos que f é uma função par se, para todo A, f( f(. Eemplos de funções pares; f( n, f( cos, f( +. Em contrapartida, dizemos que a função f é ímpar se, para todo A, f( f(. f( Eemplos de funções ímpares: f( n+, f( sen, +. Geometricamente, reconhecemos uma função par por ter seu gráfico simétrico em relação ao eio Oy. y f( f( + As funções ímpares são caracterizadas por terem seus gráficos simétricos em relação à origem. Isto é, os pontos (, f( e (, f( (, f( são opostos um ao outro em relação à origem. y f( f( + f( f( Eercício. Mostre que, se f é par e ímpar, então f( 0. É claro que nem toda função definida sobre um conjunto simétrico é par ou ímpar. Veja que a condição de simetria nos gráficos é muito restritiva. Por eemplo, f( não é par nem ímpar. CEDERJ 54
MÓDULO - AULA 30 No entanto, toda função f definida sobre um conjunto simétrico pode ser escrita, de maneira única, como a soma de duas funções, uma par e a outra ímpar. Por eemplo, f( g( + h(, onde g( par e, h(, é ímpar. A prova de que f é a soma de uma função par com uma função ímpar é fácil. Basta definir f p : A R por e f i : A R por f p ( f i ( Claramente f( f p ( + f i (. f( + f( f( f(. A unicidade afirmada anteriormente é a seguinte: se f( g(+h( para duas funções, uma par, digamos g, e a outra ímpar, digamos h, então g f p e h f i. A prova dessa unicidade é fácil de ser realizada no conteto de Álgebra Linear e será vista, provavelmente, no decorrer dessa disciplina. Eercício. Mostre que f p é uma função par e f i é uma função ímpar. Agora, se aplicarmos a mesma construção à função f( e, que não é par e não é ímpar, obtemos duas funções que são conhecidas como trigonométricas hiperbólicas: é f p ( cosh e + e chamada função cosseno hiperbólico e, f i ( senh e e, chamada de seno hiperbólico. Usando as fórmulas similares, obtemos todas as outras funções trigonométricas hiperbólicas, como f( tgh, g( sech e h( arcsenh. A razão de usarmos trigonométricas no nome dessas funções se deve às muitas familiaridades com as funções trigonométricas tradicionais. No entanto, é preciso estar atento às dissimilaridades. Por eemplo, ( e + e f p( (cosh e e senh. ( e e f i ( (senh e + e cosh. 55 CEDERJ
Além disso, essas funções satisfazem à seguinte identidade fundamental: cosh senh Karl Weierstrass (85-897 foi um matemático nascido em Berlim que desempenhou um papel fundamental na Matemática. Foi Weierstrass que, junto com Augustin-Louis Cauchy (789-857, estabeleceu as bases da Análise Matemática. Essa é a disciplina que dá todo o suporte às ferramentas que tanto usamos no Cálculo: os limites, a continuidade etc. Além disso, Weierstrass foi um dos mais bem-sucedidos professores de todos os tempos. Pode-se dizer isso devido ao grande número de alunos seus que se tornaram grandes matemáticos. Entre eles podemos citar Georg Cantor, Feli Klein, Hermann Schwarz e, especialmente, Sofia Kovalevskaya. Isso porque, naquela época, mulheres não tinham permissão para freqüentar as universidades. Weierstrass foi professor particular de Sofia por quatro anos e, devido aos seus esforços com as autoridades, ela recebeu seu doutorado pela Universidade de Göttingen. Aqui temos uma fórmula similar à identidade trigonométrica fundamental, cos + sen, com um sinal de menos no lugar do sinal de mais. Essa é a razão para usarmos o termo hiperbólico adicionado ao nome dessas funções. Lembre-se de que y é a equação de uma hipérbole. Essa identidade permite uma substituição trigonométrica hiperbólica para resolver algumas integrais, de maneira similar à que fizemos com as substituições trigonométricas usuais. Eemplo 30. Calcule + d, usando a substituição trigonométrica hiperbólica. Fazemos senh t. Então d cosh t dt, + senh t cosh t. Assim, + d cosh t cosh t dt cosh t dt (e t + e t dt (e t + + e t dt 4 4 ( e t e t + t + C 4 4 senh t + t + C 4 ( senh t cosh t + t + C + + arcsenh + C. Para verificar que a função F ( + + arcsenh é uma primitiva da função f( +, você pode derivá-la usando o fato d ( arcsenh d A substituição de Weierstrass, R. + O próimo tema é um tipo de substituição muito especial que foi descoberto por Karl Weierstrass. Ela é especialmente adequada para lidar com quocientes de somas de funções trigonométricas. CEDERJ 56
MÓDULO - AULA 30 Eemplo 30. Calcule cos t + sen t dt. A equação que inicia todo o processo é u tg ( t. Assim, dt du e +u sen t u + u, cos t + u. Usando as fórmulas sen t sen t cos t e cos t cos t sen t, concluímos que e Assim, sen t u + u cos t u + u. Aqui usamos o fato cos t + sen t dt u + u + u + u du + u u + u + du (u + du ( arctgh (u + + C ( ( ( t arctgh tg + + C. Impressionante, não? d arctgh + C. Solução alternativa para calcular ( + 3 d Entre todas as fórmulas com que você lidou até agora, sem dúvida, a mais assustadora é a fórmula de recorrência para calcular potências do inverso de polinômios irredutíveis de grau dois, como ( + d. 3 57 CEDERJ
Uma maneira alternativa, que evita aquela fórmula, é fazer a substituição tg θ. Assim, + sec θ e d sec θ dθ. Portanto, ( + 3 d sec θ sec 6 θ dθ cos 4 θ dθ 3 8 θ + 3 8 cos θ sen θ + 4 cos3 θ sen θ + C 3 8 θ + 3 tg θ 8 sec θ + tg θ 4 sec 4 θ + C 3 8 arctg + 3 8 + + 4 ( + + C. Como você pode ver, evitamos a fórmula de recorrência. Como era de se esperar, a primitiva envolve arcotangente de e quocientes de potências menores de +. A parte delicada dessa maneira de abordar o problema é que, para epressar a resposta em termos da variável, é preciso fazer uso das identidades trigonométricas para que, na resposta com θ, as funções trigonométricas envolvidas sejam tangente e secante. Agora, o último tema da aula. Dois eemplos de integrais impróprias Na segunda aula sobre integrais impróprias, no eemplo 7.6, vimos que se f : [a, R é contínua e se f( d converge, então a f( d também converge. Por eemplo, como sen d converge, a então sen d também converge. e Esse fato é um teorema do tipo p q. Quando temos um tal teorema, é sempre importante saber o que ocorre com a recíproca. Se a recíproca q p for verdadeira, dizemos que o teorema é do tipo se, e somente se, como, por eemplo, o Teorema de Pitágoras. No entanto, quando a recíproca não é verdadeira, é sempre bom sabermos um eemplo que mostra isso. Chamamos tal eemplo de contra-eemplo. Aqui está um contra-eemplo. e Eemplo 30.3 sen A integral imprópria d é convergente, mas a integral imprópria sen d é divergente. CEDERJ 58
MÓDULO - AULA 30 Primeiro, veremos a convergência. Note que, devido à integração por partes, t sen d ( cos t cos t t + t t cos cos d Ao tomarmos o limite dessa igualdade, quando t, obtemos a con- cos t vergência da integral imprópria, pois lim t t d. 0, uma vez que lim e f( cos t é uma função limitada e a integral imprópria converge, pois Na verdade, d converge. sen d 0, 84075. t Agora, a divergência da integral imprópria Sabemos que sen, R. Portanto, sen sen. sen d. t t 0 cos d Isso vale, pois, como sen 0, podemos multiplicar a primeira desigualdade por sen, sem inverter o sinal. Além disso, sen sen. Agora, como > 0, temos sen sen. sen Muito bem, basta mostrar que a integral imprópria d diverge para, devido à desigualdade acima, concluir que sen d diverge. Novamente, usamos a integração por partes. Aqui fazemos dv sen d ( cos d, e u. Assim, du d e v ( t sen ( d sen 4. Portanto, sen t + 4 sen t + 4t t t d ( t sen 4 d sen 4 d. 59 CEDERJ
sen sen t Agora, a integral d converge e lim 0. Como 4 t 4t sen d diverge, concluímos que d diverge. Muito bem, chegamos ao fim da aula. Agora vamos aos eercícios. Eercícios Primeiro aqueles que foram propostos ao longo da aula. Eercício. Mostre que, se f é par e ímpar, então f( 0. Solução: Como f é par, f( f(. Agora, como f é ímpar, f( f(. Reunindo as duas informações, concluímos que f( f(. Assim, f( 0 e, portanto, para todo no domínio simétrico de f, f( 0. Eercício. Mostre que f p é uma função par e f i é uma função ímpar. Solução: Aqui, basta usar a fórmula. Por eemplo, f p ( f( + f( ( f( + f( f p (. Agora, você pode fazer o equivalente para a função f i para concluir que ela é uma função ímpar. Agora, alguns eercícios para você praticar. 3. Seja f( a n n + a n n + + a + a + a 0 uma função polinomial. Determine f p ( e f i (. CEDERJ 60
MÓDULO - AULA 30 4. Mostre que arcsenh ln ( + +, para todo R. Sugestão: mostre que ambas as funções têm a mesma derivada e que coincidem em um ponto. Eplique por que isso implica na veracidade da afirmação. 5. Calcule d usando a substituição trigonométrica hiperbó- + lica. 6. Calcule 7. Calcule d usando a substituição trigonométrica. (4 + dt usando a substituição de Weierstrass. + cos t 6 CEDERJ