TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº: 1620874-40.2011.8.19.0004 Apelante: RENATO LIMA DOS SANTOS Apelado: ESPÓLIO DE CARLOS ALBERTO DUTRA MARQUES REP/P/S/INV MAGDA IDALINA LIMA DOS SANTOS MARQUES Relatora: DES. ELISABETE FILIZZOLA ACÓRDÃO HABILITAÇÃO DE CESSIONÁRIO EM INVENTÁRIO. IMÓVEL OBJETO DE CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. O recorrente promoveu a presente ação de habilitação, com o fim de ver adjudicado em seu favor imóvel que fora objeto de cessão de direitos hereditários. A sentença indeferiu a petição inicial, ao argumento de que a partilha já foi julgada. A habilitação nos autos do inventário é o procedimento adequado para um cessionário de direitos hereditários se submeter aos efeitos da partilha, ali requerendo o seu pedido de adjudicação. A partilha foi, de fato, homologada. Todavia, seus efeitos recaíram sobre o esboço inicialmente apresentado, em que não consta o imóvel objeto da escritura pública de cessão de direitos hereditários em que figura como cessionário o ora Apelante. Isso porque a meeira/inventariante requereu a inclusão de dois imóveis que teriam sido inicialmente omitidos, dentre os quais figura um imóvel situado no mesmo condomínio em que se localiza o imóvel objeto da cessão, em relação aos quais a Fazenda Estadual requereu a avaliação para fins de pagamento do imposto incidente. Além disso, embora homologada a partilha (que deverá ser corrigida, considerando o pedido de inclusão de outros bens), o inventário sequer foi arquivado, porquanto os herdeiros ainda devem comprovar o pagamento dos impostos respectivos, tanto que a sentença homologatória condicionou a expedição do formal de partilha ao recolhimento dos tributos e juntada das certidões.
Ressalte-se, ademais, que a teor do disposto no art. 1.028 do CPC, a partilha, ainda depois de passar em julgado a sentença, pode ser emendada nos mesmos autos do inventário. Diante de todo o exposto, deverá prosseguir a presente habilitação, devendo o douto magistrado condutor do processo de inventário determinar as providências que entender cabíveis. RECURSO PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1620874-40.2011.8.19.0004, originários do Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de São Gonçalo em que figuram, como Apelante, RENATO LIMA DOS SANTOS e, como Apelado, ESPÓLIO DE CARLOS ALBERTO DUTRA MARQUES REP/P/S/INV MAGDA IDALINA LIMA DOS SANTOS MARQUES. ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em conhecer do recurso e, à unanimidade de votos, dar-lhe provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. RENATO LIMA DOS SANTOS ajuizou habilitação de crédito em face do ESPÓLIO DE CARLOS ALBERTO DUTRA MARQUES sustentando, em síntese, que: (a) aos 05/07/2010 adquiriu por Escritura Pública de Cessão de Meação e Direitos Hereditários, firmada com a inventariante do espólio e a única filha e herdeira do falecido, o imóvel descrito na inicial; (b) nos autos do inventário a inventariante descreve como bem do espolio um imóvel com endereço no mesmo condomínio do imóvel adquirido pelo ora habilitante, que observou tratar-se, em verdade, do mesmo imóvel adquirido; (c) o habilitante já está na posse do imóvel e vem pagando regularmente o IPTU e taxas condominiais, tendo quitado o preço pela cessão de direito do referido imóvel; (d) não há dúvidas quanto ao direito do requerente 2
à obtenção da escritura pública definitiva, uma vez que pagou integralmente o preço. Requereu fossem apensados os autos da presente habilitação no inventário, com a conseqüente citação do espólio e habilitação do crédito, com a expedição do formal de partilha para adjudicar o imóvel a seu favor. Sentença a fls. 43, indeferindo a petição inicial e julgando extinto o feito, na forma do art. 267, I, do CPC, uma vez que o inventário em cuja habilitação se pretende foi encerrado em junho de 2010, com sentença de homologação de partilha amigável a fls. 103 daqueles autos. Apelo tempestivo e regularmente preparado, pelo autor, a fls. 48/49, esperando a reforma da sentença, ou caso não seja esse o entendimento de V. Excelências, requer seja anulada a r. Sentença de fls. 43, para o regular prosseguimento do feito, a fim de que o r. Juízo a quo tome as devidas providências para retificar o grave erro que acomete o processo de inventário em questão, para que conste no formal de partilha a correta descrição do bem adquirido pelo Apelante em Escritura Pública de Cessão de Direito Hereditário e este possa adjudicar o bem a seu favor. É o relatório. VOTO O recorrente promoveu a presente ação da habilitação, com o fim de ver adjudicado em seu favor imóvel que fora objeto de cessão de direitos hereditários. A sentença indeferiu a petição inicial, ao argumento de que a partilha já foi julgada. Com efeito, o Apelante comprovou haver firmado escritura de cessão de meação e direitos hereditários, por instrumento público, relativamente a imóvel pertencente a pessoa falecida (fls. 11/13). Conforme consta na cláusula E) do referido 3
documento, in verbis: (...) fica o outorgado cessionário subrogado em todos os direitos da meeira e da herdeira cedente para, nessa qualidade, comparecer e habilitar-se no inventário, como se elas próprias o fizessem, praticando todos os atos necessários para complementação dos direitos que ora adquire. A teor do disposto no art.1.793, o direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o coherdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública. A respeito, colhe-se as lições de Eduardo de Oliveira Leite (In Comentários ao Novo Código Civil, volume XXI: Do Direito das Sucessões, 4ª edição, pág. 77/82): Se, como vimos, a sucessão transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.784), a partir da abertura da sucessão (art. 1.785) o monte hereditário é devolvido de forma unitária e indivisível (art. 1.791) aos herdeiros até o partilhamento final da herança. Instaura-se o condomínio sucessório, com vistas à manutenção da unidade (no momento da abertura da sucessão) até a concretização das cotas ideais, via processo de partilha. É a regra geral e, diríamos nós, a tendência desejada pelo legislador. A cessão, ao contrário, quer a divisão desde a abertura da sucessão, independente da posterior partilha. É situação excepcional que, por isso mesmo, exige regramento próprio. Com efeito, se não foi feita nenhuma restrição pelo de cujus (por exemplo, cláusula de inalienabilidade) desde a abertura da sucessão, já existe para o herdeiro a possibilidade de promover a transferência de seus direitos ou quinhão, através da cessão de direitos hereditários. (...). O Objeto da cessão da herança é a universalidade que foi transferida ao herdeiro, desde o momento da abertura da sucessão, de modo que o mesmo não pode individualizar bens dentro da universalidade. 4
Dessa forma, a habilitação nos autos do inventário é o procedimento adequado para um cessionário de direitos hereditários se submeter aos efeitos da partilha, ali requerendo o seu pedido de adjudicação. Assim, a sentença recorrida merece correção, porquanto o argumento de que a partilha já foi homologada (fls. 103 dos autos em apenso) não acarreta o indeferimento da presente habilitação, conforme se passa expor. Com efeito, a partilha foi, de fato, homologada. Todavia, seus efeitos recaíram sobre o esboço apresentado a fls. 18/20, em que não consta o imóvel objeto da escritura pública de cessão de direitos hereditários em figura como cessionário o ora Apelante. Isso porque a meeira/inventariante requereu a fls. 58/59 a inclusão de dois imóveis que teriam sido inicialmente omitidos, dentre os quais figura um imóvel situado no mesmo condomínio em que se situa o imóvel objeto da cessão, em relação aos quais a Fazenda Estadual requereu a avaliação para fins de pagamento do imposto incidente (fls. 70). Insta salientar que a descrição ali contida refere-se à unidade 549 da Quadra M, quando o imóvel cedido ao ora Apelante consiste na unidade 617 da Quadra Q. Todavia, conforme afirma o recorrente, as guias de IPTU anexadas ao inventário referem-se ao imóvel objeto da cessão, o que poderá ser esclarecido e sanado em eventual retificação da partilha. Além disso, embora homologada a partilha (que deverá ser corrigida, considerando o pedido de inclusão de outros bens), o inventário sequer foi arquivado, porquanto os herdeiros ainda devem comprovar o pagamento dos impostos respectivos, tanto que a sentença homologatória condicionou a expedição do formal de partilha ao recolhimento dos tributos e juntada das certidões. Ressalte-se, ademais, que a teor do disposto no art. 1.028 do CPC, in verbis: A partilha, ainda depois de passar em julgado a sentença (art. 1.026), pode ser emendada nos mesmos autos do 5
inventário, convindo todas as partes, quando tenha havido erro de fato na descrição dos bens; o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, poderá, a qualquer tempo, corrigir-lhe as inexatidões materiais. Diante de todo o exposto, deverá prosseguir a presente habilitação, devendo o douto magistrado condutor do processo de inventário determinar as providências que entender cabíveis. Sobre o assunto, traz-se à colação os seguintes julgados, colhidos da jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. MANUTENÇÃO. RECURSO COM SEGUIMENTO NEGADO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 557 CAPUT DO CPC. 1. O procedimento escolhido para o processamento do pedido da adjudicação compulsória não é compatível com o pleito almejado. 2. Demais, não pode o herdeiro individualizar bens dentro da universalidade do monte hereditário objetivando sua cessão a terceiros. Inteligência do artigo 1.793 do NCC. 3. A validade da transmissão se dará com a habilitação do cessionário no lugar do cedente no processo de inventário, atribuindose ao mesmo o imóvel objeto da cessão, se for o caso. (APELAÇÃO 0000581-11.2007.8.19.0084 DES. ZELIA MARIA MACHADO - Julgamento: 27/07/2011 - QUINTA CAMARA CIVEL). AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS POR ESCRITURA PÚBLICA. BEM INDIVIDUALMENTE CONSIDERADO. PEDIDO DE ADJUDICAÇÃO. DECISÃO QUE INDEFERIU A HABILITAÇÃO PRETENDIDA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1793 DO CÓDIGO CIVIL. CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO QUE DÁ CONTA DA CONCORDÂNCIA ENTRE OS HERDEIROS NO SENTIDO DA ADJUDICAÇÃO DO IMÓVEL, OBJETO DA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. DESSA FORMA, JUSTA É A PRETENSÃO DO RECORRENTE. TODAVIA, ESBARRA NO FATO DE QUE NÃO HÁ FALAR EM CESSÃO DO QUE AINDA NÃO INTEGRA O PATRIMÔNIO DOS HERDEIROS, PORQUANTO 6
SOMENTE HAVERÁ A TRANSFERÊNCIA A ESTES QUANDO DA PARTILHA, EM QUE, FINDO O CUMPRIMENTO DO TESTAMENTO E DO INVENTÁRIO, ULTIMAR-SE-Á A ADJUDICAÇÃO DO IMÓVEL PELO CESSIONÁRIO. DE TAL FORMA, É DE SER DEFERIDA A HABILITAÇÃO DO AGRAVANTE, PARA COM A HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA TER O DIREITO À ADJUDICAÇÃO DO BEM. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO 0006355-41.2011.8.19.0000 DES. LUIZ FELIPE FRANCISCO - Julgamento: 26/04/2011 - OITAVA CAMARA CIVEL). DIREITO SUCESSÓRIO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. Apelante cessionário de direitos hereditários que pretendendo tutela jurisdicional que lhe transfira a propriedade do imóvel cedido ajuíza ação de adjudicação compulsória dirigida em face dos primeiros cessionários. Peça recursal inepta. Ausência de regularidade formal. Falta de pedido de reforma. Inteligência do art. 514, III CPC. Cessionário de direitos hereditários de imóvel componente de monte indiviso pertencente ao espólio que apenas através de habilitação no respectivo inventário pode operar a aquisição da propriedade. Precedentes. Inadequação procedimental insanável. Inaplicabilidade do art. 284 CPC. Recurso a que se nega seguimento, nos termos do art. 557 CPC. (APELAÇÃO 0041417-84.2008.8.19.0021 (2009.001.02967) DES. CRISTINA TEREZA GAULIA - Julgamento: 30/01/2009 - QUINTA CAMARA CIVEL). Por tais fundamentos, conheço do recurso e dou-lhe provimento para anular a sentença, determinando o prosseguimento da habilitação nos autos do inventário. Rio de Janeiro, 25 de janeiro de 2012. Des. ELISABETE FILIZZOLA Relatora 7 Certificado por DES. ELISABETE FILIZZOLA A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br. Data: 25/01/2012 18:54:42Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 1620874-40.2011.8.19.0004 - Tot. Pag.: 7