Hipertireoidismo da doença de graves: um relado de caso
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1 Hipertireoidismo da doença de graves: um relado de caso Lara Dias Gardoni 1 Karla Thayse Mendes Soares 2 Letticia Selles Nacife dos Reis 3 Manoel Vinícius Vasconcelos Miranda Guzella 4 Cecília Lopes Nobre 5 Gustavo Gomes Soares de Sá 6 Raquel Xavier Ligeiro Dias 7 Leonardo Soares Prates 8 RESUMO O hipertireoidismo é a condição clínica na qual a glândula tireoide apresenta um funcionamento inadequado, expresso pelo aumento da síntese e liberação dos hormônios tireoidianos. Tem como principal causa a Doença de Graves; doença autoimune caracterizada pela produção de autoanticorpos que agem contra a glândula tireoide, desencadeando uma hiperatividade permanente da mesma. Predomina em mulheres na faixa etária entre 20 a 40 anos, cuja apresentação clínica envolve bócio, oftalmopatia e tireotoxicose. Existem três abordagens terapêuticas para tratamento da Doença de Graves: drogas antitireoidianas (DAT), cirurgia e iodo radioativo (131I) e o diagnóstico correto é fundamental antes da terapia ser instituída. O presente trabalho traz o relato da evolução clínica de uma paciente atendida no Centro de Assistência à Saúde da UNEC (CASU), diagnosticada com Hipertireoidismo da Doença de Graves. O tipo de pesquisa é 1 Acadêmica do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 2 Acadêmica do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga Graduada em Enfermagem pela Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC. 3 Acadêmica do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 4 Acadêmico do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 5 Acadêmica do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 6 Acadêmico do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 7 Bióloga. Doutoranda em Bioquímica Aplicada pela UFV. Docente do Centro Universitário de Caratinga 8 Médico Reumatologista. Docente do curso de Bacharelado em Medicina do Centro Universitário de Caratinga 67
2 descritiva, através de um relato de caso e, para este fim, foi utilizado o prontuário médico do sujeito da pesquisa, pertencente ao CASU. Paciente do sexo feminino, 31 anos, apresentou um quadro clínico caracterizado por cefaleia, artralgia, mialgia intensa e limitante, prurido generalizado, fadiga ao menor esforço e sudorese. Diante da evolução do quadro clínico e a potencial correlação entre o Hipertireoidismo da Doença de Graves e a Síndrome de Sjogren, o reumatologista suspeitou desta, havendo confirmação do diagnóstico por meio de exames. A incidência da doença, sua natureza autoimune e suas consequências potencialmente graves justificam a importância deste relato como contribuição científica para compreensão dos mecanismos patogênicos e terapêuticos. Espera-se que este trabalho venha auxiliar a qualidade do atendimento a pacientes portadores da doença na prática clínica. Palavras-chave: doença de graves, hipertireoidismo, doença autoimune. ABSTRACT: Hyperthyroidism is a condition in which the thyroid gland is overactive. In such condition, the gland produces excessive amounts of thyroid hormones. It is mainly caused by Graves Disease, an autoimmune disorder responsible for an overproduction of antibodies, which act against the thyroid gland, resulting in a permanent hyperactivity of the thyroid gland. Graves disease is diagnosed predominantly in women, between the ages of 20 and 40 years old, whose clinical symptoms are ophthalmopathy, goiter, and thyrotoxicosis. There are three therapeutic treatments for Graves disease: antithyroid drugs, surgery, and radioactive iodine (131I). The correct diagnosis is crucial prior choosing the method. The current work presents a case study of a patient assisted at UNEC health care center (CASU, in Portuguese), diagnosed with Hyperthyroidism as a result of Graves disease. This is a descriptive research, based on information provided by the patient s medical records, which belongs to CASU. The patient is female, 31 years old, showing symptoms such as arthralgia, headache, intense and limiting myalgia, generalized pruritus, fatigue, and excessive sweating. In view of the evolution of the clinical picture and a potential correlation between Graves Disease Hyperthyroidism and Sjogren s Syndrome, the rheumatologist suspected this, and the diagnosis was confirmed by means of exams. The occurrence of the disease, its 68
3 autoimmune nature, and its potentially severe consequences support the importance of the present study, as a scientific contribution for a better comprehension of the pathologic and therapeutic mechanisms. It is expected that this work contributes to improving the quality of the service for patients diagnosed with this disease during clinical practice. Keywords: graves disease, hyperthyroidism, autoimmune disease. INTRODUÇÃO O hipertireoidismo é uma doença que afeta significativamente a qualidade de vida do indivíduo. Oliveira e Maldonado (2014) ressaltam que é uma condição na qual a glândula tireoide fica hiperativa, ou seja, há uma excessiva síntese e liberação de hormônios tireoidianos, o que acarreta em alterações de diversas funções do organismo. Se não tratada a doença pode provocar problemas de saúde mais graves envolvendo o coração e os ossos. De acordo com Viana, Grodzki, Oliveira e Magalhães (2015), essa condição tem como principal causa a Doença de Graves (60%- 80%) que é uma alteração descrita primeiramente por Caleb Parry ( ), mas o crédito foi concedido ao médico Robert Graves que o publicou 10 anos depois. Compreende-se que a interação, de forma não completamente conhecida, de fatores ambientais, genéticos e constitucionais pode desencadear a doença autoimune. Segundo Davies (citado por Zanardo, 2015) a doença é de 5 a 10 vezes mais frequente no sexo feminino, sendo comum em idades entre 20 e 40 anos. O predomínio é equivalente entre caucasianos e asiáticos adultos e é menor na raça negra. O Hipertireoidismo da Doença de Graves evidencia uma tríade clássica que são o bócio difuso, tireotoxicose e exoftalmia. Trata-se de uma doença autoimune caracterizada pela infiltração linfocitária da glândula tireoide, ativando o sistema imune e provocando um consequente aparecimento de autoanticorpos que agem contra o receptor de TSH, estimulando assim o crescimento e função glandular. O tratamen- 69
4 to atualmente empregado possui três abordagens, que são as drogas antitireoidianas (DAT), cirurgia e o iodo radioativo. A escolha dessas terapêuticas varia de acordo com fatores como, idade, gravidade do hipertireoidismo, presença de comorbidades, entre outros. (Chassot & Costa, 2012). A escolha do tema justifica-se pela razão do desencadeamento desse processo autoimune não estar totalmente compreendida e por provocar consequências potencialmente graves, caso não tratada. Desta forma, o Hipertireoidismo da Doença Graves é uma patologia de profunda investigação, com o intuito de melhorar a percepção dos mecanismos patogênicos e a exploração de métodos terapêuticos mais eficazes. RELATO DE CASO NGR, sexo feminino, 31 anos, viúva, residente do município de Caratinga (zona urbana) portadora do Hipertireoidismo de Basedow Graves, compareceu ao CASU, acompanhada pela mãe, para consulta com Reumatologista no dia 23 de fevereiro de 2015, queixando-se de dor por todo o corpo, fraqueza e sudorese. Relata que há cerca de um ano sente dores em membros inferiores e dificuldades para realizar mínimos esforços. No momento da consulta refere dor por todo o corpo, principalmente nas articulações. Passa a maior parte do dia em repouso. Descreve a dor atual como 09 na escala de 0 a 10, constante e intensa. Refere que não há melhora da dor sem analgesia e que não há hora do dia em que se intensifique ou melhore. Tem obesidade grau II (IMC=36,14). Alérgica à tapazol, penicilina, dipirona e atropina. Foi diagnosticada com Hipertireoidismo de Basedow Graves há 11 anos. Em 2006 desenvolveu um quadro de toxoplasmose adquirida com calcificações, na época fez o tratamento. 70
5 Em 2009 houve reativação da toxaplasmose, tratou novamente, mas permaneceu com sequelas: perda parcial da visão bilateral, nistagmo por lesão de mácula e cefaleias periódicas intensas. Tinha depressão leve há alguns anos e relata piora desta após a toxoplasmose. Desenvolve crises de ansiedade em situações de tensão. Em 2015 apresentou abcesso em face por infecção de Helicobacter pylori. O que desencadeou um quadro de nefrite no rim direito. O medicamento utilizado para o tratamento desta, na época, gerou complicações no rim esquerdo. A paciente ficou internada por 7 dias com edema generalizado e dores abdominais intensas. Faz uso de: propranolol 40 mg, propiltiuracil 100 mg, prestic 50 mg, alprazolam 2 mg. Pai com histórico de Hipertenção Arterial Sistêmica, Diabete Mellitus, Infarto Agudo do Miocárdio, câncer de faringe e depressão. Mãe hipertensa. Irmão depressivo. Possui uma tia com hipertireoidismo. O quadro depressivo foi deflagrado em 2006, na ocasião do diagnóstico de câncer de faringe do seu pai. Interrompeu os estudos na faculdade em 2009, devido ao comprometimento visual. No mesmo ano, seu marido cometeu suicídio, isso agravou o quadro depressivo. Não trabalha, é pensionista do INSS. As dores constantes limitam suas atividades diárias, passa a maior parte do dia deitada. Não pratica exercícios físicos. Nega etilismo e tabagismo. Tem uma filha de 7 anos, com a qual reside na casa da sua mãe. Refere normalidade nas eliminações vesicais e intestinais. Relata apetite normal e prejuízo do sono em decorrência das dores constantes. G1, P1, A0. Ciclo menstrual regular. Diante do quadro, o reumatologista suspeitou de: Síndrome de Sjogren, artrite reumatoide ou lúpus. Foram solicitados exames específicos para determinar o diagnóstico: Latex, Waaler-Rose, anti-ccp, anti-ro, anti-la e FAN (HEP2). Em 24/05/2016 retornou ao CASU para consulta com reumatologista, com o resultado dos exames. Houve alteração no exame Waaler-Rose que apresentou resultado de 8 UI/mL (valor de referência: inferior a 8UI/mL) e FAN (HEP2) que teve como resultado reagente para núcleo e placa metafásica cromossômica. Na ocasião, a suspeita de Síndrome de Sjögren foi confirmada. 71
6 DISCUSSÃO O hipertireoidismo caracteriza-se por um estado de hiperativação do metabolismo produzido por uma ampliação na função tireoidiana e, por conseguinte, aumento dos níveis séricos dos hormônios triiodotironina (T3) e tiroxina (T4). Os fatores mais comuns que desencadeiam essa condição são hiperplasia difusa da tireoide associada à doença de Graves, bócio multinodular hiperfuncionante e adenoma hiperfuncionante da tireoide. (Barroso et. al, 2012). A Doença de Graves é a principal causa do Hipertireoidismo e evidencia como tríade clássica o bócio difuso, tireotoxicose e exoftalmia (Chassot & Costa, 2012). Segundo Davies (citado por Zanardo, 2015), é frequente no sexo feminino em idade entre 20 e 40 anos e tem predomínio entre caucasianos e asiáticos. A paciente citada no relato de caso tem 31 anos, portanto, se enquadra na faixa etária de maior prevalência. Os achados clínicos encontrados com maior frequência são: nervosismo, aumento da sudorese, intolerância ao calor, palpitações, cansaço, perda de peso, diarreia, tremores, exoftalmia, dificuldade de dormir, aumento dos batimentos cardíacos, agitação, aumento da energia apesar de muito cansaço, queda de cabelos, ciclo menstrual irregular, fraqueza muscular, mudanças na espessura da pele e bócio (Vainboim, 2005). Como descrito no relato, a paciente apresentava fraqueza muscular e sudorese, sintomas equivalentes aos apresentados por pacientes com hipertireoidismo. Em relação ao tratamento, todas as tentativas de intervenção dirigidas à produção autoimune de anticorpos estimuladores da tireóide tem se mostrado ineficazes. Nesse contexto, as modalidades terapêuticas atuam na tireóide ou nas manifestações da síntese exacerbada de hormônios tireoidianos (Viana et. Al., 2015). Hoje em dia são utilizados três métodos terapêuticos no tratamento do hipertireodismo de Graves, são eles: drogas antitireoidianas, cirurgia e o iodo radioativo (Chassot & Costa, 2012). A paciente em questão utiliza como terapia o fármaco propiltiuracil, uma droga antitireoidiana. 72
7 Irregularidades na função tireoidiana e a existência de autoanticorpos da tireoide têm sido descritas com frequência em pacientes com doenças reumatológicas. A associação mais descrita é entre doenças autoimunes tireoidianas (DAIT) e Síndrome de Sjögren (SS) dada pela semelhança histológica e funcional das glândulas salivares e tireoide (Robazzi & Adan, 2012). A Síndrome de Sjögren secundária ao Hipertireodismo da Doença de Graves foi confirmada através dos testes FAN (HEP2) e Waaler Rose positivos. A SS é uma doença autoimune inflamatória de curso crônico. Seu quadro clínico impacta consideravelmente na qualidade de vida de seus portadores. Existem dois tipos reconhecidos: A doença primária das glândulas exócrinas (SS primária) e associada a outras doenças auto-imunes, dentre estas, a Doença de Graves (SS secundária). (Lima, Sena & Ferreira, 2009), De acordo com Aragona, et. al., citado por Felberg & Dantas (2006), infecções virais prévias (vírus Epstein-Barr, citomegalovírus, herpes vírus humano, vírus da hepatite C) ou bacterianas (Helicobacter pylori) já foram relacionadas como potenciais desencadeadores da resposta imune ao tecido glandular, devido à frequente concomitância em portadores da SS. A paciente deste relato desenvolveu uma infecção por Helicobacter pylori em 2015, é provável que tal fator possa ter desencadeado a doença. Ferberg & Dantas (2006), ressaltam que manifestações psiquiátricas como ansiedade, depressão e distúrbios da personalidade, podem ocorrer em maior frequência entre os as pessoas com a SS do que na população geral. A paciente tem histórico de depressão. Manifestações musculoesqueléticas, como dores ósteoarticulares, fadiga e deformidades articulares, também são frequentes entre os portadores da SS. Da mesma forma, a paciente traz mialgia, astenia, fadiga e artralgia como suas queixas principais. É de suma importância o acompanhamento constante de portadores de doenças autoimunes, a fim de estabelecer mecanismos de controle e monitorar o possível surgimento de outras doenças associadas. O diagnóstico precoce diminui o desenvolvimento de complicações e um tratamento adequado providencia um bom controle da doença na maioria das situações. 73
8 O desenvolvimento do hipertireoidismo da Doença de Graves não está inteiramente compreendido e por ocasionar consequências significativas é necessária profunda investigação de mecanismos patogênicos e exploração de terapias eficazes. CONSIDERAÇÕES FINAIS Espera-se que este trabalho venha auxiliar na qualidade do atendimento a pacientes portadores da Doença de Graves na prática clínica. A incidência da doença, sua natureza autoimune e as consequências potencialmente graves justificam a importância deste relato como contribuição científica para compreensão dos mecanismos patogênicos e terapêuticos. Referências Barroso, C. F., Santos, A. F., Pessoa, P. P., Santos, L. B., Pires, L. V., Castro, L. M., et al. (2012). Estado nutricional relativo ao zinco em pacientes com hipertireoidismo. Nutrire, São Paulo. Chassot, F. e Costa, G. M. (2012). Tratamento do Hipertireoidismo da Doença de Graves com o Radioisótopo Iodo 131. Revista de Saúde e Biologia. Campo Mourão PR.,7(3). Felberg, S. e Dantas, P. E. C. (2006) Diagnóstico e tratamento da síndrome de Sjögren. Arq. Bras. Oftalmol. [online].,69(6), ISSN Lima J. F.; Sena M. F.; Ferreira M. A. (2005). Condição oral dos pacientes com síndrome de Sjögren: uma revisão sistemática. Revista Odonto Ciência. 20(49), Oliveira, V. e Maldonado, R. R. (2014). Hipotireoidismo e Hipertireoidismo Uma breve revisão sobre as disfunções tireoidianas. Interciência & Sociedade, Mogi Guaçu SP,3(2). Robazzi, T. C. M. V. e Adan, F. F. (2012, junho). Ocorrência de doenças autoimunes tireoidianas em pacientes com doenças reumáticas. São Paulo: Revista Brasileira de Reumatologia. 52(3), Vainboim, T. B. (2005, julho). Representação da doença e internação e níveis de ansiedade e depressão em pacientes com hipertireoidismo internados comparados a pacientes ambulatoriais. São Paulo: Psicol. hosp., 3(1), Viana, V.; Grodzki, M. J. R.; Oliveira, R. H. L.; Magalhães, S. R. (2015). Relato de caso: Doença de Graves. Belo Horizonte: Revista de Iniciação Científica da Universidade Vale do Rio Verde, 5(1), Zanardo, J. G.; Barros, V. F.; Brandão, C. D. G. (2012). Doença de Graves na Infância. Vila Velha: Grupo Editorial Moreira Jr. 74
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