Direito Constitucional e Constituição-Constituição: Conceito e Concepções

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1 Direito Constitucional e Constituição-Constituição: Conceito e Concepções Constituição - Sentidos e tipologia Nivaine Priscila de Souza Silva Em parceria com Nivaldo Oliveira da Silva Constituição é a lei fundamental e suprema de um Estado. É a constituição quem determina a estrutura do Estado, de sua forma de governo, sua maneira de adquirir e exercer o poder, bem como, a garantia das liberdades públicas. Buscamos a origem do termo constituição no latim constituere, donde se traduz os sentidos de organizar, delimitar, formar, constituir, estabelecer, firmar, construir, dentre tantos outros sentidos assemelhados. Obedecendo a boa gramática e acompanhando a orientação de Bulos, p. 29, devemos grifar os termos constituição e carta com inicial minúscula e, caso sejam determinados, com inicial maiúscula. 1 SENTIDOS DE CONSTITUIÇÃO 1.1 Sentido Sociológico defendido por Ferdinand Lassalle. Argumentava Lassalle, em conferência exibida na antiga Prússia, em 16 de abril de 1862, que a havia duas constituições: uma real e efetiva e outra escrita. Sustentava, o principal expoente desta teoria, que a constituição escrita era uma folha de papel que poderia ser rasgada a qualquer momento e que a verdadeira constituição seriam os fatores reais do poder, consubstanciados estes na monarquia, na aristocracia, na grande burguesia, nos banqueiros, na consciência coletiva e cultura geral da Nação, na pequena burguesia e classe operária, pois cada um desses fatores, cada um deles, era uma parte da constituição, perfazendo, toda ela, a soma de todos eles, os fatores. Sustentava que, caso a folha de papel coincidisse com os fatores reais do poder, seria duradoura, pois os problemas constitucionais não seriam de direito, mas de poder. Em suma, argumentava Lassalle que o Estado teria duas constituições, uma escrita e uma real. A escrita, também conhecida por jurídica, dependia da real para possuir plena eficácia, vale dizer, se o escrito na folha de papel correspondesse aos fatores reais do poder, seria efetiva, caso contrário, nada valia e podia ser rasgada a qualquer momento. Assegurava Lassalle que questões constitucionais não seriam jurídicas, mas políticas e que

2 a constituição de um país expressa as relações de poder nele dominantes. 1.2 Sentido Político - defendido por Carl Schimitt Constituição em sentido político é a decisão política fundamental do Estado, conceito responsável pela análise do perfil fundamental do Estado, isto é, a forma do Estado, forma e sistema de governo, direitos e garantias individuais, e demais estruturas e órgãos do Estado. Carl Schimitt, a partir deste sentido político, defende dois sentidos: 1) Constituição e 2) leis constitucionais. Constituição seria a concreta decisão sobre o perfil essencial do Estado, abrangendo forma de Estado, forma e sistema de governo, forma de aquisição e exercício do poder, estabelecimento e separação dos órgãos de poder e limites de sua atuação, além dos direitos e garantias fundamentais, enquanto lei constitucional seriam todas aquelas matérias que, apesar de estarem no corpo da constituição não seria constitucional na essência, como ocorre com a norma que diz respeito ao Colégio Pedro II, previsto no art. 242 da CF/88. Art O princípio do art. 206, IV, não se aplica às instituições educacionais oficiais criadas por lei estadual ou municipal e existentes na data da promulgação desta Constituição, que não sejam total ou preponderantemente mantidas com recursos públicos. 1º - O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro. 2º - O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal. 1.3 Sentido Jurídico acepção defendida por Hesse e, também, por Kelsen. - Força Normativa da Constituição Konrad Hesse É cediço que, na primeira metade do século XX, era predominante na Europa o sentido político de constituição, de Carl Schimitt, oportunidade em que Conrad Hesse, proferiu uma palestra na Alemanha visando contrapor-se a Lassalle, mas, na verdade, restou modificar o entendimento europeu de constituição política para constituição jurídica, com sua força normativa. Quase 100 anos depois de Lassalle, em 1959, veio Konrad Hesse e disse que a teoria de Lassalle não correspondia totalmente à verdade, pois a constituição possuía sua força normativa, que deveria ser respeitada, afirmando que as concepções sociológicas de Lassalle possuíam sua importância, mas, sempre, em consonância com a constituição escrita. Sustenta Hesse que a constituição pode sofrer pressões sociais, e, por conta de tais entendimentos, que se confundem, justamente, com os fatores reais do poder, a constituição pode ser modificada, mas, caso não se consiga efetuar referida transformação, continua vigorante a constituição. Em suma, na visão de Hesse, a constituição escrita não é, necessariamente, a parte mais fraca da relação folha de papel/fatores reais do poder. Hesse defende que a constituição real e a jurídica estão em relação de coordenação, embora não dependam uma da outra e que, para a constituição mostrar sua força ativa, mais depende da vontade de constituição que da vontade de poder, configurando não só a

3 visão do ser, mas também do dever-ser. - Teoria Pura do Direito Hans Kelsen É compreendida como a constituição que instaura o Estado, sendo sua norma fundamental e superior, portanto é ela quem confere validade a todo o seu ordenamento jurídico. Assim, funciona, também como pressuposto de elaboração e requisito de validade da legislação ordinária. Kelsen dividia seu entendimento em dois: O Jurírido-positivo e o Lógico-jurídico. O jurídico-positivo retrata a lei fundamental do Estado, traduzida na lei das leis, a quem todas as outras devem obediência. Para Kelsen, o Direito não depende de pressões sociais, políticas, filosóficas ou de qualquer elemento extrajurídico. Sentido Lógico-jurídico. Para dar sustentabilidade à constituição, Kelsen teve que elaborar um fundamento puramente formal que sustentasse sua teoria, tendo criado a norma fundamental hipotética, isto é, uma norma não expressa, mas que defendia obediência ao mandamentos constitucionais. Desta feita, vê-se que a constituição no sentido lógico-jurídico é justamente a norma fundamental hipotética, em outras palavras, o fundamento de validade da norma maior. 1.4 Outros sentidos de constituição Constituição Jusnaturalista: utiliza-se dos princípios do direito natural para a sua criação. Tendo como principal núcleo jusnaturalista os conceitos atinentes aos direitos humanos fundamentais. Constituição Positivista: retrata a obediência eminentemente à matéria constitucional, independentemente desta encontrar-se ou não em consonância com fatores sociais, morais, políticos, econômicos ou idealistas, pois, a exemplo da Força Normativa a que se refere Hesse, a constituição positivista preocupa-se primordialmente com as normas constitucionais. Constituição Compromissória: Reflete a pluralidade das forças políticas e sociais existentes em seu procedimento constituinte. Constituição em Branco: não traz em seu texto limitações explícitas ao poder constituinte reformador, permitem caráter discricionário aos órgãos revisores, quanto ao processo a ser utilizado. Constituição Plástica: oferece maleabilidade, permitindo acomodar suas normas à realidade social, política, econômica e cultural do cotidiano. Tal sentido pode ser apreciado tanto em constituições rígidas como nas flexíveis. Constituição Biomédica: visa garantir os direitos relacionados à genética humana, pautados ao processo de criação, desenvolvimento e utilização de novas tecnologias científicas. Constituição Empresarial: é espécie de constituição programática. Foram criadas no passado com o objetivo de possibilitar o surgimento de empresas que exploravam o

4 comércio em determinado território. Constituição Dirigente: defendida pelo mestre português J.J. Canotilho, visa estabelecer uma direção para o próprio Estado, coordenando programas de política que darão o norte em que deve tomar rumo o Estado. Esta constituição ocorre entre juristas de inspiração ideológico-socialista. Alternam entendimentos acerca do que pode ordenar ao Legislativo a constituição dirigente, uns entendem que o Legislativo deve cumprir regular, adequada e oportunamente as imposições constitucionais, enquanto outros entendem que o Legislativo teria um pouco mais de discricionariedade. 2 TIPOS DE CONSTITUIÇÃO Os diversos tipos do termo constituição: 2.1 Quanto ao processo de elaboração: Históricas e Dogmáticas Históricas as que se formam lentamente, através de vagarosa sedimentação de decisões na consciência popular. Normalmente elas são não escritas e populares. Dogmáticas surge do resultado da aplicação racional de determinados princípios. São escritas e podem ser tanto promulgadas, quanto outorgadas. 2.2 Quanto à origem: Outorgadas, Promulgadas, Pactuadas e Cesaristas. Outorgadas são as constituições impostas por um governante ou por um grupo, sem que tenha recebido do povo a devida legitimidade para atuar. Promulgadas ao contrário, são aquelas em que existe a participação do povo, é a verdadeira constituição, uma constituição democrática, votada ou popular. Pactuadas ou dualista é um pacto entre o soberano e a organização nacional. É um equilíbrio entre o princípio monárquico e democrático, onde a realeza e o Poder Legislativo firmam o acordo. Cesaristas seria um meio termo entre a outorgada e a promulgada, nem seria totalmente ditatorial, nem votada, seria um misto de dois mecanismos distintos de participação popular, que autenticam a presença do detentor do poder. Alguns autores entendem que o termo constituição representaria a propriamente dita e promulgada, enquanto o termo carta, teria o sentido de outorga. Assim, em nosso País, teríamos as Constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988 e as Cartas de 1824, 1937, 1967 e Quanto à essência: Normativas, Semânticas e Nominais. Normativas seriam aquelas adaptadas ao fato social, ou seja, apresentam uma concordância entre a parte social e o processo político. Nos nossos dias, diríamos entre a parte social e a jurídica (Bulos, p. 40). Semânticas diversamente das normativas, nas semânticas, prevalece o poder político

5 sobre o de fato. Os detentores do poder são beneficiados em detrimento dos governados, a partir de um documento formal (Bulos, p 40). Nominais é um misto de Normativa e Semântica. É uma prospectiva, visando um dia serem realizadas na prática (Bulos, p.40). 2.4 Quanto à sistematização: Unitárias e Variadas Unitárias, Unitextuais, reduzidas ou codificadas elas se apresentam em um único documento, sem admitir leis constitucionais, fora da constituição. Exemplo. Todas as constituições brasileiras. Variadas pluritextuais ou não codificadas admitem leis constitucionais fora da constituição. Ex. Carta da Bélgica de 1830 e da França de Quanto à ideologia: Ortodoxas e Ecléticas Ortodoxas são as de uma única ideologia, isto é, de ideologia centralizada. Ex. Constituições Soviéticas de 1923, 1936 e Ecléticas as com ideologias diversas. Ex. Portuguesa de Quanto ao conteúdo: Material e Formal Material também denominada de substancial é aquela em que se leva em conta o conteúdo da norma, consubstanciado nos ditames que cuidam dos aspectos relevantes do Estado, como a sua organização, os meios de aquisição e de exercício do poder, os direitos e garantias fundamentais, apresentando-se como irrelevante integrar ou não o texto escrito da constituição, vale dizer, nem tudo que está dentro da constituição é materialmente constitucional e pode existir algo que esteja fora do texto da constituição, mas que pela natureza da matéria, pode ser considerado constitucional. Tudo aquilo que defende a composição e o funcionamento da ordem política de um Estado é constituição. Formal é justamente o reverso da constituição material. Tudo que estiver no texto constitucional será constituição e nada que estiver fora do texto será constitucional, independentemente do conteúdo da norma. 2.7 Quanto à forma: Escritas e Não Escritas Escritas também denominada Instrumental por Canotilho. São aquelas codificadas e sistematizada em um único texto e elaboradas por um órgão com atribuição para tal fim. Não Escritas não são codificadas em texto único. É formada por leis esparsas, como ocorre com a Constituição Inglesa, em que parte de suas normas são consuetudinárias ou costumeiras. 2.8 Quanto à extensão: Sintéticas e Analíticas Sintéticas também chamadas de breves, curtas ou tópicas São as enxutas, compactas, concisas, não comportando construções prolixas. Ex. Constituição dos EUA de 1787, com apenas 7 artigos. Analíticas denominadas longas São amplas e detalhistas. Temos como exemplos a nossa,

6 de 1988 e a indiana, de Quanto ao processo de modificação: Rígidas, Flexíveis, Transitoriamente Flexíveis, Semi-Rígidas, Fixas e Imutáveis. Rígidas são aquelas mais difíceis que as leis ordinárias para serem modificadas. Seu processo de modificação é mais dificultoso, mais solene. Exige-se um quorum mais alto que uma lei comum. Flexíveis admitem mudança de forma simples como a mudança de uma lei comum. Transitoriamente Flexíveis são as que possuem um período de transição pré-determinado, em que poderão ser reformadas pelo rito das leis comuns. Passando este período, ela cruza o processo de modificação sendo rígida. Semi-Rígidas as que possuem rigidez e flexibilidade coexistindo concomitantemente, são constituições mistas. Também denominadas semiflexíveis. Fixas apenas admitem reforma pelo constituinte originário, poder de competência idêntico àquele que às criou. Imutáveis não acolhem nenhum órgão como competente e legítimo para proceder a sua reforma. 3 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 A atual Constituição Brasileira é dogmática; promulgada; nominal; reduzida do ponto de vista de sua sistematização; mas, eclética, do ponto de vista de sua ideologia; formal; escrita; analítica quanto à sua extensão; e rígida em relação à estabilidade. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, 1385 p. DEZEN JÚNIOR, Gbriel. Curso Completo de direito Constitucional, volume, 9. ed. Brasília: Vesticon, 2006 DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus Efeitos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, 178 p. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 10. ed. São Paulo: Método, 2006, 654 p. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, 1364 p. MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional.São Paulo: Campus, 2007, 1048 p. NETO, Manoel Jorge e Silva, Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, 678 p.

7 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. São Paulo: Método, 2008, 720 p. PAULO, Vicente; MAIA, Juliana. Aulas de Direito Constitucional. 8. ed. Niterói: Ímpetus, 2006, 873 p. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 10. ed. São Paulo: Malheiros 1995, 820 p. SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 2. ed. São Paulo: Malheiros 2006, 1023 p. Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Nivaine Priscila de Souza Silva e Nivaldo Oliveira da. Constituição - Sentidos e tipologia. Clubjus, Brasília-DF: 11 mar Disponível em: < Acesso em: 15 ago or aqui...