Apelação Cível n , de São José Relator: Des. Lédio Rosa de Andrade

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1 Apelação Cível n , de São José Relator: Des. Lédio Rosa de Andrade APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. VEICULAÇÃO DE OFERTA EM COMPRA DE AUTOMÓVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO CONFIGURADA. ÔNUS DA PROVA INVERTIDO. EXEGESE DO ARTS. 6º, VII E 38 CDC. ERRO NO PEDIDO. DEFEITO DO SERVIÇO CARACTERIZADO. RESPONSABILIDADE VERIFICADA DAQUELA QUE OFERTOU O PRODUTO. RECURSO PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n , da Comarca de São José (2ª Vara Cível), em que é apelante Mariá Caroline Back, e apelado Dimas Comércio de Automóveis Ltda e outro: ACORDAM, em Quarta Câmara de Direito Comercial, por votação unânime, dar provimento ao recurso. Custas legais. RELATÓRIO Mariá Caroline Back interpôs recurso de apelação cível contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de São José (2ª Vara Cível), nos autos da ação de obrigação de fazer, ajuizada em desfavor de Dimas Comércio de Automóveis Ltda e outro. Sobreveio sentença, na qual o magistrado julgou totalmente improcedentes os pedidos formulados na inicial, ao argumento de que a autora realizou apenas uma má compra, o que afasta qualquer responsabilidade das rés. No mais, exclui do pólo passivo a demandada Ford Motor Company Brasil Ltda. por entender não ser parte legítima para responder o feito, já que o contrato de compra com ela formalizado foi cancelado. Condenou a autora ao pagamento integral das despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20%

2 (vinte por cento) sobre o valor da causa, a ser rateado pelas requeridas. Irresignada com a pretensão jurisdicional ofertada, a autora invocou a proteção da legislação consumerista e a boa-fé objetiva, reiterando o pedido inicial de ter comprado veículo com modelo e ano diferentes daquele entregue a ela na concessionária. Sucessivamente, postulou a devolução do valor pago, corrigido monetariamente. Por fim, pugnou pela reforma da sentença para compelir a demandada a entrega do carro pretendido. Contrarrazões pelas partes. VOTO Repousa a controvérsia em ação de obrigação de fazer, segundo a qual busca apelante compelir a apelada a entrega de um automóvel Ford Fiesta 1.0 Supercharger, ano/modelo 2003, cor preta, modelo 1030, com ar condicionado, direção hidráulica, vidros e travas elétricas, referente ao pedido n , perfectibilizado por arras confirmatórios de R$ 1.000,00 (um mil reais) feito por ela na Internet (no site da Ford), cuja entrega e o restante do pagamento dar-se-ia na apelada e concessionária Dimas Comércio de Automóveis e Ltda., em Narrou a apelante ter efetuado a compra do veículo pela internet no dia (fl. 14) a apartir de oferta veiculada em jornal de grande circulação em (fl. 13) de um Fiesta ano e modelo Pago o sinal de R$ 1.000,00 (um mil reais), a aquisição dar-se-ia na apelada junto com o restante do pagamento. Pelo carro divulgado a apelante efetuou no total o pagamento de R$ ,00 (vinte e cinco mil reais e quatrocentos e noventa reais) conforme comprovam os documentos às fls , nas datas respectivas de , e , sendo a nota fiscal da compra emitida em (fl. 15). Inquestionável ter havido a divulgação de uma promoção do Novo

3 Ford Fiesta 2003, com ar-condicionado grátis, direção hidráulica, vidros e travas elétricos e frete incluso (fl. 13); isto é, um carro nos mesmos atributos pretendidos pela autora. Também é verdade que no mesmo material, em letras bem miúdas, quase imperceptíveis ao consumidor - como de praxe, a prática abusiva das grandes empresas! - há a seguinte menção: a partir de R$ ,00 (vinte e cinco mil e quatrocentos e noventa reais). Logo, tal preço reflete o lance mínimo. Não há como negar, igualmente, no resumo do pedido n da Internet o preço total do carro está expresso no importe de R$ ,00 (vinte e sete mil e setecentos e cinquenta reais). A entrega do automóvel foi antecipada, sendo, portanto, a apelante comunicada pelo vendedor de que poderia retirar o veículo no dia , data não impugnada pela parte adversa, o que de fato aconteceu, estando o carro aparentemente de acordo com o pedido de compra solicitado. A surpresa aconteceu quando da análise da documentação do veículo para o registro no Detran-SC, aonde a apelante descobriu ser o veiculo ano 2002 e modelo 2003 (fl. 15), diverso do veículo por ela escolhido à fl. 14, cujo valor de mercado é inferior. O que não está bem explicado nos autos, e daí a controvérsia, é o documento de restituição de pagamento (fl. 17), no qual a apelante de forma inequívoca registra ter solicitado a restituição de R$ 1.000,00 (um mil reais), pago em , como sinal da compra e pedido da web n , em virtude de erro no pedido. Sobre isso, a apelante diz ter sido cientificada pelo vendedor Luiz Fernando de que tinha acontecido um problema no pedido, porquanto não fora processado nos cadastros da Ford, oportunidade em que o vendedor se comprometeu a resolver o infortúnio, já que na concessionária havia o mesmo carro. Argumenta que na data em que foi buscar o veículo no Dimas, o

4 vendedor pediu que ela assinasse referido termo de restituição para que o sinal então pago fosse creditado ao Dimas, pelo motivo de que, como houve erro no pedido, e o Dimas estava entregando o carro, este valor seria agregado ao depositado (fl. 16). Em contrapartida, a apelada contesta a narrativa e menciona que a compra na web n foi cancelada pela apelante, no documento de restituição de pagamento, assinado e com firma reconhecida, sendo o motivo do cancelamento o erro no pedido. E mais, acrescenta que a apelante sabia o motivo do cancelamento, em vista de que, o veículo por ela solicitado custaria conforme consta do pedido a quantia de R$ ,00 (vinte e sete mil e setecentos e cinquenta reais). Finalizou afirmando que o dinheiro restituído foi utilizado para a compra de uma carro semelhante, com a diferença de ser ano 2002 e modelo 2003 por R$ 25,490,00, por entender ser mais vantajoso. O processo não foi instruído com a produção de provas, apesar do pedido genérico de dilação probatória, e tampouco, foi deferido o pedido de inversão do ônus da prova pelo magistrado. Extemporaneamente, a apelante juntou outra nota fiscal à fl. 135, do mesmo produto, agora à monta de R$ ,00 (trinta mil e trezentos e oitenta e cinco reais), com data de emissão em , pelo vendedor Luiz Fernando Farias. Em relação à nota fiscal de fl. 135, a recorrente esclareceu ter sido emitida a seu pedido para pudesse transitar com o veículo sem emplacamento, momento em que a recorrida só informou que poderia ser no dia seguinte, mas que não haveria problema, pois seria emitida uma nota fiscal demonstração. E tal como alegou a apelante, a nota é de demonstração e foi emitida um dia antes daquela de fl. 15, embora desconsiderado pelo juízo singular. Pois bem, a relação é de consumo, existe a verossimilhança das alegações da apelante e está caracterizada sua hipossuficiência, razão pela qual é de ser feita a inversão do ônus da prova neste juízo recursal. E o

5 reconhecimento deste instituto não acarreta prejuízo à apelada, uma vez tendo pugnado pelo julgamento antecipado da lide por ela no decorrer da ação. Além disso, importante ressaltar, o ônus da prova na comunicação publicitária, como na hipótese, é de quem os patrocina, a teor do art. 38 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina. Assim, o reclamo exige a comprovação pela apelada de que não ocorreu qualquer equívoco na divulgação do produto. Nos termos do art. 30 do Código de Defesa do Consumidor: Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado. Outro artigo do CDC plenamente aplicável é o 35, o qual oferece as opções para o consumidor diante da recusa do fornecedor em cumprir a oferta publicitária; e o art. 37, 1º, que dispõe sobre a publicidade enganosa. Ora, cabe ao fornecedor oferecer informações claras e acessíveis sobre as características do produto ou serviço. E mais, a informação enganosa, leia-se, não clara, tem responsabilidade aferida objetivamente, sendo irrelevante comprovar a exitência ou não de dolo do fornecedor. Diante dessa realidade, inequívoca a responsabilidade (somente) da apelada Dimas Comércio de Automóveis Ltda., responsável pela divulgação do automóvel, de modo que a diferença apurada entre os veículos Fiesta ano e modelo 2002/2003 e ano e modelo 2003, isto é, da diferença entre R$ ,00 (vinte e sete mil e setecentos e cinquenta reais) e R$ ,00 (vinte e cinco mil e quatrocentos e noventa reais) o valor encontrado de R$ 2.260,00 (dois mil e duzentos e sessenta reais) deverá ser ressarcido à apelante, acrescido de correção monetária da data do desembolso e juros de mora a partir da citação. Os ônus sucumbenciais, bem como os honorários advocatícios devem ser alterados, em razão de atual existência de condenação. Logo, condena-se a recorrida Dimas Comércio de Automóveis Ltda. ao pagamento

6 integral das despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, 3º, do Código de Processo Civil. Por tais razões, é de se dar provimento integral ao recurso. DECISÃO Nos termos do voto do Relator, a Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, dar provimento ao recurso, para condenar a apelada Dimas Comércio de Automóveis Ltda., responsável pela oferta do produto, ao pagamento da quantia de R$ 2.260,00 (dois mil e duzentos e sessenta reais) para a apelante, a titulo de ressarcimento, valor este a ser acrescido de correção monetária da data do desembolso e juros de mora a partir da citação. Condena-se, ainda, a recorrida Dimas Comércio de Automóveis Ltda. ao pagamento integral das despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, 3º, do Código de Processo Civil. Participaram do julgamento, realizado no dia 20 de outubro de 2009, os Exmos. Srs. Des. José Carlos Carstens Köhler e João Henrique Blasi. Florianópolis, 23 de outubro de Lédio Rosa de Andrade PRESIDENTE E RELATOR