EMENTA CIVIL - DANOS MORAIS - NEGATIVA NA CONCESSÃO DE PASSE LIVRE EM VIAGEM INTERESTADUAL - INDENIZAÇÃO DEVIDA.

Transcrição

1 Órgão : 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Classe : ACJ Apelação Cível no Juizado Especial N. Processo : Apelante : CLEUZA GONÇALVES DA SILVA Apelado : REAL EXPRESSO LTDA Relatora Juíza: FÁTIMA RAFAEL EMENTA CIVIL - DANOS MORAIS - NEGATIVA NA CONCESSÃO DE PASSE LIVRE EM VIAGEM INTERESTADUAL - INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1. Ao portador de deficiência é assegurado o passe livre previsto na Lei n 8.899/ Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiros os fatos não impugnados. 3. A negativa de concessão do bilhete livre ao portador de deficiência caracteriza o dano moral, pois tal ato enseja constrangimentos e contratempos, ocasionando, por conseqüência, a obrigação de indenizar os danos por ele suportados. 4. Apelação provida. Unânime. A C Ó R D Ã O Acordam os Senhores Juízes da 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, FÁTIMA RAFAEL Relatora, FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA Vogal, LUÍS EDUARDO YATSUDA ARIMA Vogal, sob a presidência do Juiz FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, em CONHECER. PROVER O RECURSO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas. Brasília (DF), 23 de junho de FÁTIMA RAFAEL Relatora ACJ

2 RELATÓRIO Trata-se de ação proposta por Cleuza Gonçalves da Silva contra Real Expresso Ltda., visando à reparação por danos morais sofridos em decorrência de negativa de concessão de passe livre em viagem interestadual realizada em ônibus da ré, pois foi compelida a comprar uma passagem e ficou sem dinheiro para arcar com as despesas de alimentação. Alega que ela e filha são portadoras de deficiência e beneficiárias de passe livre. Ressalta que pretendia viajar de Posse-GO até Brasília, juntamente com duas filhas, uma delas deficiente, mas não obteve os dois passes livres a que tinham direito, pois a empresa de transporte alegou que apenas um assento para deficiente estava disponível. Alegou que a empresa demandada lhe negou novamente a concessão de passe livre em 21 de março de 2008 e arcou com o pagamento da passagem. Pede a condenação da Ré ao pagamento de R$66,00 (sessenta e seis reais), a título de ressarcimento das passagens, e R$8.234,00 (oito mil duzentos e trinta e quatro reais) pelos danos morais. Na contestação, a Ré comentou e transcreveu a legislação de regência e alegou que a autora não apresentou o passe livre de sua filha deficiente, para que pudesse obter autorização de viagem. A sentença de fls. 46/49 julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais e materiais. Inconformada com a decisão, a Autora apresenta recurso inominado, às fls. 51/56, alegando ser hipossuficiente na relação de consumo, razão pela qual deve ser invertido o ônus da prova. A recorrida apresentou contrarazões, às fls. 64/67, oportunidade em que refutou as argumentações apresentadas pela Recorrente e postulou a confirmação da sentença. É o relatório. ACJ

3 VOTOS A Senhora Juíza FÁTIMA RAFAEL Relatora conheço do recurso. Presentes os pressupostos de admissibilidade, Cuida-se de ação indenizatória por danos morais ajuizada por Cleuza Gonçalves da Silva contra Real Expresso Ltda., visando a reparação por danos materiais e morais sofridos em decorrência da negativa de concessão de passes livres em viagem interestadual, trecho Posse Brasília, nos dias 3 de janeiro e 21 de março de Em abono de sua pretensão, alega que foi compelida a comprar as passagens naquelas datas, ao custo total de R$66,00 (sessenta e seis reais), e ficou sem dinheiro para arcar com as despesas de alimentação. Não se põe em dúvida que a relação entre as partes é claramente de consumo, devendo ser analisada sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor e da Lei n 8.899/94. É fato incontroverso que o passe livre deve ser concedido aos portadores de deficiência física no sistema de transporte coletivo interestadual. A Autora e filha são portadoras de deficiência e beneficiárias do passe livre previsto na Lei n 8.899/94, conforme comprovam os documentos de fls. 41/42. As alegações da Autora são verossímeis, pois os documentos de fls. 43 e 45 comprovam a aquisição de duas passagens na data informada na petição inicial - 8 de janeiro de O documento de fl. 44 comprova a compra de uma passagem para viajem no dia 21 de março de Sendo duas as pessoas deficientes e três as passageiras, conclui-se que apenas uma delas obteve o passe livre. Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiros os fatos não impugnados. ACJ

4 Na contestação, a Ré se limitou a comentar e transcrever a legislação de regência e alegar que a Autora não apresentou o passe livre de sua filha deficiente, para que pudesse obter autorização de viagem. Ao assim proceder, deixou de impugnar especificadamente os fatos que embasam a pretensão deduzida na petição inicial, conforme exige o art. 302 do Código de Processo Civil. Quanto à afirmação de que a autora não apresentou o passe livre de sua filha deficiente, para que pudesse obter autorização de viagem, não se desincumbiu a Ré da prova do fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito da Autora, consoante a regra do artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil. Consequentemente tem-se por verdadeira a afirmação de que foi descumprida pela empresa demandada a obrigação legal de conceder o passe livre à Autora. A reserva de vagas aos passageiros idosos decorre da obrigação imposta pela Lei n /2003 e não se confunde com a reserva assegurada ao portador de deficiência pela Lei n 8.899/94. Aplica-se ao presente caso o disposto no 6, do art. 37, da Constituição Federal, já que a Recorrida é concessionária de serviço de transporte público. A negativa de concessão do bilhete livre à Autora gera danos morais, pois tal ato enseja constrangimentos e dissabores que não se confundem com os contratempos cotidianos. Com efeito, é pacífico o entendimento em nossos tribunais que o dano moral se corporifica ante o simples fato de sua demonstração, sendo mesmo desnecessário provar a sua exteriorização. Assim, diante da presença e comprovação dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil, ato ilícito, dano e nexo de causalidade, a procedência do pedido indenizatório é medida que se impõe. Arbitro, a título de indenização por danos morais em R$1.000,00 (mil reais), valor que entendo suficiente para reparar o dano, sem causar enriquecimento ilícito da ofendida. Também é bastante para advertir o ofensor para que não venha a agir novamente de forma tão reprovável em relação a outros usuários que utilizam o transporte que oferece. ACJ

5 Deverá a Ré ressarcir a quantia que a autora gastou com duas passagens, no total de R$66,00 (sessenta e seis reais). Assim, voto pelo provimento do recurso para condenar a ré a pagar indenização por danos materiais, no valor de R$66,00 (sessenta e seis reais), devidamente corrigidos, desde a data dos desembolsos, com juros de mora a contar da citação. Condeno a Ré, ainda, a pagar indenização por danos morais, no valor de R$1.000,00 (mil reais), com acréscimo de correção monetária, desde a presente data, com juros de mora desde a citação. É como voto. O Senhor Juiz FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA - Vogal Com a Relatora. O Senhor Juiz LUÍS EDUARDO YATSUDA ARIMA - Vogal Com a Turma. DECISÃO Conhecido. Provido. Unânime. ACJ