Futsal na escola: propostas para uma prática alternativa

Transcrição

1 Futsal na escola: propostas para uma prática alternativa Claudiney André Leite Pereira. ou

2 Sempre no primeiro dia de aula de educação física, quando o professor passa a programação do ano letivo, surgem às famosas perguntas: professor porque não é futsal o ano todo?futsal só uma unidade é pouco! Faz só futsal! Enfim são vários pedidos em relação ao futsal. O futebol no Brasil exerce um fascínio muito grande nos brasileiros e essa paixão é facilmente percebida nas escolas. Neste momento o professor se pergunta, vou dar só futsal por que é o desejo deles ou eu não posso reforçar essa monocultura do esporte no Brasil e tenho que passar outras modalidades? Que o futebol é o esporte nº1 no Brasil já sabemos, mas de onde vem essa paixão? Tudo começou quando Charles Miller chegou ao Brasil, após concluir seus estudos na Inglaterra. Ele era um apaixonado pelo futebol e colocou-se como um missionário a difundir o esporte no Brasil. Mas no início ele só era praticado pela burguesia, como: estudantes das melhores escolas ou engenheiros, representantes da classe mais nobre da sociedade. O acesso do pobre aos gramados era muito discreto, mas evoluindo com o passar do tempo. Eram muitas as barreiras a enfrentar, o preconceito social, a aceitação da burguesia em ter um jogador oriundo do povo em seu meio, a dificuldade financeira em acompanhar o ritmo de consumo de outros jogadores etc. Mais aos pouquinhos o negro foi mostrando seu valor futebolístico e conquistando seu espaço nas principais equipes da cidade e claro que concomitantemente a isto cresceu também o numero de admiradores do futebol. A população urbana crescia bastante e o futebol era a forma de lazer mais barata, não só para praticá-lo como também assistir. Dentro desse contexto a classe baixa via no futebol uma forma de ascensão e também o único momento em que podiam se igualar à burguesia dividindo as mesmas paixões. Encontramos hoje na nossa sociedade um cenário muito parecido com este onde um menino de infância pobre vira personalidade no mundo todo. E milhões de brasileiros encontram no futebol uma válvula de

3 escape para suas frustrações, depositando no seu escrete um sonho de se sentir importante no mundo. Voltando às nossas aulas e utilizando esse pequeno resumo para ajudar-nos a responder nossas indagações, observemos também outros detalhes. Quando se constrói um espaço para as atividades esportivas nas nossas escolas, a primeira coisa que é feita é uma quadra de futsal, quando se pensa em se fazer algum torneio, o futsal não pode faltar, o futsal também é a atividade mais barata para a escola, já que o vôlei precisa de mastro e rede, o basquete uma boa tabela para não quebrar toda hora e o handebol de bolas diferenciadas para meninos e meninas.aliado a tudo isso há o apelo da mídia em relação ao mundo do futebol e o pequeno espaço para outras modalidades esportivas. Na prática do futebol é interessante o professor perceber o fascínio que este esporte exerce sobre os alunos, o jogo é uma representação teatral da vida de cada um e traduz de forma simbólica as suas relações com o eu, o outro e o mundo. Antes do jogo começar os mais tímidos e que não tem tanta habilidade ficam na periferia da quadra à espera de serem chamados, os ditos craques não se interessam em dividir os times, pois sabem que vão ser escolhidos querem mais é exibir suas qualidades chutando a bola para o gol, aqueles que sabem que podem não ser escolhidos se oferecem para ser goleiros e os que não são tão habilidosos mas tem poder de decisão no grupo tomam a iniciativa de dividir as equipes para não ficarem de fora. No momento em que a bola rola a grande mágica do jogo acontece, ou seja, há uma transcendência do mundo real para o imaginário, todos os problemas desaparecem, a cada drible é uma dificuldade vencida, um bom ataque é a certeza de estar no caminho vitorioso, a corrida atrás da bola é o túnel da vida que viaja passado ao presente a todo o momento nos fazendo perspectivar um futuro de felicidade coletiva. Para o artilheiro se deve todas as glorias de um vencedor que se enaltece na sua vaidade de naquele momento ser o responsável pela felicidade contagiante de todo o grupo.

4 São estes momentos que devem ser aproveitados pelo professor. Para não só conhecer os alunos como ampliar suas discussões em relação ao futebol como esporte nº 1 em popularidade, e também fazê-los entender a fascinação que eles e a grande maioria dos brasileiros tem esse jogo nos pés e como este na sua prática as transformam de coadjuvante para artistas principal na simulação teatral de um jogo de futebol. O jogo segundo Huizinga, (2004) o jogo é uma atividade voluntária. Sujeito a ordens, deixa de ser jogo, podendo no Maximo ser uma imitação forçada. Basta essa característica de liberdade para afastá-lo definitivamente do curso da evolução natural. Propostas pedagógicas para prática no futsal na escola. Um dos grandes dilemas do professor ao trabalhar o futsal na escola é fazer sua aula com meninos juntos com as meninas, sabemos que a maioria dos meninos contam com um repertorio motor mais afinado com o futebol em relação às meninas, por conta de um processo educacional e cultural que os favorecem. Outro ponto que devemos observar é que nenhuma disciplina faz a sua aula com separação de sexos, porque só a educação física teria que ser diferente? Diante destes problemas é que apresento então algumas propostas de trabalho que podem servir de referencia para o professor de educação física na sua prática. 1º Atividade Jogo: Meninos x Meninas. Objetivo: Trabalhar a organização no jogo e o companheirismo. Metodologia: Dividem-se duas equipes por sexo

5 meninos. A equipe feminina com 3 a 5 alunas a mais que os A equipe masculina só pode fazer gol de cabeça. Atividade: pode-se jogar com todas as regras do futsal apenas adaptando a regra do gol para os meninos. Cada partida pode ter duração de cinco minutos, já que haverá outros alunos querendo jogar. Discussão: Avaliar junto com os alunos, porque os meninos têm mais habilidade no futebol. Respeito ao companheiro diante de suas limitações. Importância do trabalho em equipe diante de uma situação favorável ou adversa. 2º Atividade. Jogo: Futebol misto. Objetivo: aprender a trabalhar em grupo diante de novas situações. Metodologia: dividem-se duas equipes de futsal, sendo que cada uma delas será formada por metade meninos e metade meninas. Atividade: jogar o futsal respeitando a companheira e ensinando-a sem descriminação. Na dificuldade das meninas pegarem na bola pode-se criar regras alternativas como: só vale gol se a bola passar por todo mundo, gol de menina vale dois, as cobranças de qualquer falta será das meninas etc. Discussão: Neste jogo é bom observar os alunos em seu momento de conflito, como: uma menina que perde uma bola fácil e gera polemica

6 por parte dos meninos, o boicote dos meninos em não passar a bola para as meninas, são algumas situações que podem ser levantadas pelo professor para discutir com os alunos procurando sempre fazer com eles percebam que a sociedade é formada por homens e mulheres e é importante o respeito e ajuda mútua para cada um vencer as suas dificuldades. 3º Atividade Jogo: Futsal x Handebol adaptado. Objetivo: analisar as dificuldades e facilidades motoras impostas pelas duas modalidades aos praticantes. Metodologia: os meninos jogam futebol e as meninas jogam handebol, mas podendo também chutar a bola. Atividade: Neste jogo os meninos jogam o futsal dentro das suas regras e as meninas o handebol, mas elas também podem usar os pés, já que na tentativa de pegar a bola dos meninos este contato só poderia ser feito com os pés para evitar acidentes. Discussão: porque boa parte das meninas tem mais habilidades com as mãos? Porque as meninas jogam mais handebol do que o futsal nas escolas? Qual a relação que há entre a cultura educacional e valores de cada país e seu reflexo no esporte. Conclusão. O principal objetivo destas atividades é dar ao professor de educação física sugestões em relação a sua prática pedagógica com o futsal, para que ele não reproduza valores machistas de que menina não joga futebol nem limitar esta prática aos meninos, podendo assim enriquecer sua aula e levantar varias discussões sobre a mulher no esporte, sua participação na sociedade e outras questões ligadas ao esporte, Pois muitas vezes escolhemos por nossos alunos o que eles querem fazer

7 transformando assim a aula no espaço acrítico e de reprodução de movimentos e valores. Referências bibliográficas. HUIZINGA, Johan. Homo ludens, São Paulo:estudos perspectiva, FILHO, Mario. O negro no futebol brasileiro 4ºediçãoRio de Janeiro: FAPERJ, 2003.