Anais do 38º CBA, p.1223

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1 1 MESOTELIOMA PLEURO-PERICÁRDICO EM CANINO DOMÉSTICO PLEURAL AND PERICARDIAL MESOTHELIOMA IN DOMESTIC CANINE Mirlla Baracho FERREIRA 1 ; Keylla Suellen Batalha Rocha FERNANDES 1 ; Ramon Tadeu Galvão Alves RODRIGUES 1 ; Romeika Hermínia de Macedo Assunção PEREIRA 2 e Kilder Dantas FILGUEIRA 3 1 Médico Veterinário, Residente, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, mirlla.baracho@gmail.com 2 Médica Veterinária Autônoma, Natal, RN 3 Médico Veterinário, Me., Universidade Federal Rural do Semi-Árido Resumo: O mesotelioma é uma neoplasia maligna derivada de células mesodérmicas, sendo geralmente da membrana serosa da pleura, peritônio e pericárdio. São tumores de rara ocorrência em espécies animais. Em virtude do mesotelioma, equivaler a uma neoplasia insólita na espécie canina, o presente trabalho objetivou a descrição de tal oncopatia. Uma cadela, Cocker Spaniel Inglês, 12 anos de idade, apresentava dificuldade respiratória. Submeteu-se a paciente ao exame físico. A auscultação torácica indicou hipofonese das bulhas cardíacas e inspiração interrompida. Optou em realizar toracocentese, drenando-se efusão hemorrágica. O material foi remetido para análise citológica, verificando-se grupos de células mesoteliais. O animal veio a óbito e foi encaminhado para necropsia. Essa última elucidou múltiplos e esparsos nódulos, por toda superfície das pleuras parietal/visceral e também do pericárdio. Executou-se colheita para análise histopatológica. O quadro microscópico foi compatível com mesotelioma epitelioide. O mesotelioma envolvendo o pericárdio e a pleura deve ser considerado dentre as enfermidades neoplásicas efusivas do tórax de cães idosos. Palavras-chave: neoplasia, mesotélio, cavidade torácica, cão. Keywords: neoplasia, mesothelium, thoracic cavity, dog. Revisão de Literatura: O mesotelioma é uma neoplasia derivada de células mesodérmicas da membrana serosa da pleura, do peritônio, do pericárdio e da túnica vaginal do testículo (FARAON et al., 2010). São tumores de rara ocorrência na espécie humana assim como em espécies animais, mas tem sido descrito em bovinos, equinos, suínos, ratos, gatos e cães (AMAYA e AREVALO, 2008; DA COSTA et al., 2011). Nos caninos, tal proliferação perfazer menos de 0,2% de todas as neoplasias desses Anais do 38º CBA, p.1223

2 2 animais (SEMOLIN et al., 2016). Os mesoteliomas são considerados malignos devido à habilidade inata em exfoliar e implantar células mesoteliais localmente, resultando em crescimento de múltiplos tumores. O acúmulo de fluidos cavitários também promove o desprendimento e invasão das células mesoteliais neoplásicas nos tecidos órgãos adjacentes (GARRETT et al., 2013). Classicamente os mesoteliomas apresentam-se como localizados, massas nodulares difusas ou multifocais, nas superfícies de cavidades celomáticas (AMAYA e AREVALO, 2008; DA COSTA et al., 2011; GARRETT et al., 2013). Todavia, o mesotelioma pode dissemina-se por toda a cavidade e apresenta-se sob a forma de nódulos de variados tamanhos, completamente difusos sobre toda a membrana serosa acometida (FARAON et al., 2010). O estabelecimento do diagnóstico definitivo pode ser laborioso, especialmente na fase inicial da doença neoplásica (GARRETT et al., 2013). No cão, o mesotelioma ocorre com maior frequência na pleura e pericárdio, embora alguns autores afirmem ser extremamente incomum no pericárdio (AMAYA e AREVALO, 2008; DA COSTA et al., 2011). Raramente a neoplasia é constatada no peritônio (DA COSTA et al., 2011). Em virtude do mesotelioma, oriundo de membranas serosas de estruturas torácicas equivaler a uma neoplasia insólita, de um modo geral, na espécie canina (e por vezes de difícil reconhecimento), o presente trabalho objetivou a descrição de tal oncopatia. Descrição do Caso: Uma cadela, raça Cocker Spaniel Inglês, 12 anos de idade, castrada, foi encaminhada para avaliação devido ao histórico de dificuldade respiratória, tosse, síncope, astenia, perda de peso e hiporexia. O quadro possuía evolução de um mês. Submeteu-se a paciente ao exame físico. A principal alteração foi limitada ao tórax, onde a percussão dígito-digital revelou modificação de som claro para maciço, em direção horizontal. A auscultação indicou hipofonese das bulhas cardíacas e inspiração interrompida. Havia ainda taquipneia e dispneia mista. Optou em realizar o procedimento de toracocentese, drenando-se 700mL de efusão hemorrágica, com aspecto viscoso. O material foi remetido para análise citológica, verificando-se inúmeros grupos de células mesoteliais, dotadas de critérios de malignidade. Foi solicitado hemograma, bioquímica sérica (hepática e renal, além de glicose sanguínea) e exame radiográfico do tórax. A hematologia exibiu leucocitose por neutrofilia e monocitose. A avaliação bioquímica não constatou anormalidades significativas. A imaginologia torácica detectou radiopacidade difusa da cavidade e Anais do 38º CBA, p.1224

3 3 perda da visualização da silhueta cardíaca. O animal veio a óbito e foi encaminhado para necropsia. Essa última elucidou múltiplos e esparsos nódulos (firmes, sésseis, friáveis, irregulares e amarronzados), por toda superfície das pleuras parietal/visceral e também do pericárdio. Existia ainda hemotórax e hemopericárdio. A disseminação intratorácica das proliferações ocasionava distorção na arquitetura e topografia padrão dos órgãos locais. Não ocorriam alterações nas demais cavidades corpóreas ou em outras áreas anatômicas. Executou-se colheita de alguns nódulos pleurais e pericárdicos, sendo os mesmos encaminhados para análise histopatológica. O quadro microscópico foi compatível com mesotelioma, do tipo epitelioide. Discussão: A etiologia do mesotelioma em medicina veterinária ainda não é comprovada. Em humanos estudos apontam sua relação com o óxido de alumínio e a inalação crônica de partículas de amianto. Especula-se que cães de proprietários que trabalham com as fibras amianto tenham maior predisposição ao desenvolvimento do tumor (FARAON et al., 2010). Dessa forma, cães cujos proprietários apresentam alguma forma de exposição a tal produto, utilizado na indústria automobilística, de refrigeração, entre outras, são mais predispostos a essa neoplasia (SEMOLIN et al., 2016). A exposição a pesticidas é um cofator que aparentemente incrementa o risco para o mesotelioma. Caninos oriundos de ambientes urbanos têm um risco aumentado para a ocorrência da neoplasia (OGILVIE e MOORE, 2008). Todavia, apesar das inúmeras possibilidades para a gênese tumoral, não foi possível determinar a causa relacionada ao desenvolvimento da neoplasia da paciente em discussão. Não parece haver predileção racial, sendo os animais idosos mais susceptíveis (OGILVIE e MOORE, 2008; SEMOLIN et al., 2016). Os dados epidemiológicos tumorais previamente definidos corroboraram com o animal em questão. A sintomatologia encontrada está relacionada com a formação de massa na cavidade torácica, dos órgãos afetados e do acúmulo de líquido hemorrágico ou leitoso decorrente da exsudação da própria neoplasia ou da compressão linfática ocasionada pela mesma. Dessa forma, pacientes com mesotelioma pleural em geral apresentam-se com quadros respiratórios inespecíficos como letargia, dispneia, taquipneia, intolerância ao exercício, tosse, perda de peso, anorexia, náuseas e vômitos intermitentes, diarreia, desidratação, dor e febre. No mesotelioma pericárdico, observa-se ainda sinal de tamponamento cardíaco (DA COSTA et al., Anais do 38º CBA, p.1225

4 4 2011; OGILVIE, 2015; SEMOLIN et al., 2016). Algumas das alterações clinicas previamente descritas pela literatura foram condizentes com o registro em evidência. Deve-se suspeitar de mesotelioma em cães adultos que demonstrem histórico de doença crônica, não específica e com acumulo de fluido em alguma cavidade do corpo (GARRETT et al., 2013). Em casos de mesotelioma em cavidade torácica, a auscultação detecta dificuldade na detecção da sonoridade cardíaca e decréscimo dos ruídos respiratórios (OGILVIE e MOORE, 2008). Tais achados foram similares com o presente relato. Os exames de imagem de rotina (ecocardiograma e/ou as radiografias) não são usualmente uteis para a detecção da formação neoplásica gerada pelo mesotelioma, uma vez que as células se distribuem pela superfície da cavidade e assim dificultando a obtenção de uma nítida visão de uma lesão tumoral. Pode ser preferível uma tomografia computadorizada ou ressonância magnética da região acometida pelo mesotelioma (GARRETT et al., 2013; OGILVIE, 2015). Todavia no estudo em questão não ocorreu a possiblidade de executar técnicas de diagnostico por imagem dotadas de maior acuidade. A citologia do fluido é o primeiro estudo diagnóstico a ser realizado. Nesse exame são detectadas numerosas agrupações de células neoplásicas mesoteliais com evidentes critérios de malignidade. No entanto, a diferenciação entre hiperplasia de células mesoteliais, mesotelioma e carcinomatose pode ser difícil ou mesmo impossível. Células mesoteliais reativas em efusões não neoplásicas podem ser extremamente similares com as neoplásicas (SEMOLIN et al., 2016). A avaliação citológica do fluido torácico pode ser conclusiva para outros processos, como infecções ou linfomas, mas não para os casos de mesotelioma (GARRETT et al., 2013). Conforme as afirmações literárias, para o caso descrito, a citopatologia realmente apenas contribuiu como um exame de triagem para a afecção neoplásica. Os achados hematológicos de leucocitose neutrofílica, linfopenia, eosinopenia e monocitose absolutas são verificados em virtude da reação inflamatória induzida pelo tumor. Algumas dessas alterações sanguíneas foram encontradas de modo análogo com o animal discutido. O prognóstico é grave devido à inexistência de um tratamento efetivo e por vezes, o diagnóstico definitivo é obtido somente por meio de necropsia (posterior à eutanásia dos animais), com o auxílio da análise histopatológica (FARAON et al., 2010; DA COSTA et al., 2011). Tal situação ocorreu no registro em evidência. Macroscopicamente, o mesotelioma se caracteriza por múltiplos nódulos amarronzados a róseos, de superfície lisa, firmes, esbranquiçados, de 0,1 a 3cm de Anais do 38º CBA, p.1226

5 5 diâmetro, distribuídos difusamente pelas serosas parietal e/ou visceral. Também se apresentam como placas cianóticas e ulceradas ou massas esbranquiçadas e de aspecto umbilicado (e com formações de aderências), de consistência firme (AMAYA e AREVALO, 2008; DA COSTA et al., 2011). Histologicamente, os mesoteliomas mais comuns são os epiteliais. Existe também a forma mesenquimal (ou esclerosante) e ainda a combinação de ambos, sendo denominado de bifásico ou misto. Para o animal em discussão, as características necroscópicas, no âmbito macroscópico e microscópico, foram compatíveis com os achados corriqueiramente expressos para os mesoteleiomas. Conclusão: Embora incomum, o mesotelioma envolvendo o pericárdio e a pleura deve ser considerado dentre as enfermidades neoplásicas efusivas do tórax de cães idosos. Referências: AMAYA, J. O.; AREVALO, G. H. Mesotelioma invasivo de un canino: citología, clínica y hallazgos patológicos. International Journal of Morphology, Temuco, v.26, n.1, p , DA COSTA, F. V. A.; DORIGON, O.; SILVA, C. A.; SOUZA, H. J. M.; ALMEIDA, E. C. P.; DAMICO, C. B. Mesotelioma peritoneal em um gato relato de caso. Clínica Veterinária, São Paulo, v.16, n.94, p , FARAON, A.; TOURRUCÔO, A.C.; FERREIRA, K. C. R. S.; OLIVEIRA, L. O.; OLIVEIRA, R. T. Mesotelioma pleural em um cão da raça Rottweiler. Acta Scientiae Veterinariae, Porto Alegre, v.38, n.1, p.77-80, GARRETT, L. D. Mesothelioma. In: WITHROW, S. J.; VAIL, D. M.; PAGE, R. L. (Eds.). Withrow & MacEwen s Small animal clinical oncology. 5. ed. St. Louis: Elsevier, p OGILVIE, G. K. Fundamentos para la atención compasiva del paciente con cáncer. Buenos Aires: Inter-Médica, 2015, 432p. OGILVIE, G. K.; MOORE, A. S. Manejo del paciente canino oncológico guía práctica para la atención compasiva. Buenos Aires: Inter-Médica, 2008, 936p. SEMOLIN, L. M. S.; HERNÁNDEZ-VARGAS, G.; DE NARDI, A. B. Mesotelioma. In: DALECK, C. R.; DE NARDI, A. B. (Eds.). Oncologia em cães e gatos. 2. ed. Rio de Janeiro: Roca, p Anais do 38º CBA, p.1227