ESTUDO RETROSPECTIVO DE ALTERAÇÕES ESPLÊNICAS EM CANINOS RETROSPECTIVE STUDY OF CANINE SPLENIC DISORDERS

Transcrição

1 ESTUDO RETROSPECTIVO DE ALTERAÇÕES ESPLÊNICAS EM CANINOS RETROSPECTIVE STUDY OF CANINE SPLENIC DISORDERS Simone Neves de Campos 1, Roberta Salim Menezes 1, Ana Maria Reis Ferreira 2, Elan Cardozo Paes de Almeida 3 1. Médica Veterinária, Laboratório Diagnovet, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. diagnovet@diagnovetrj.com.br 2. Professora, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil. 3. Professora, Faculdade de Odontologia, Universidade Federal Fluminense, Nova Friburgo, RJ, Brasil. PALAVRAS-CHAVE: baço, cão, hemangiossarcoma, hiperplasia, histopatologia. ABSTRACT The canine spleen is important for a range of haematopoietic and immunological functions. The aim of this work was to conduct a retrospective study using the database of a private anatomopathological laboratory in Rio de Janeiro where canine splenic disorders was reviewed. The 175/7451 cases (2,3%) were reviewed during five years where female, old, mixed breeds canine were overrepresented. The most common diagnosis was of splenic neoplasia and the most frequently canine neoplasm was haemangiosarcoma (62/111-55,9%), following to lymphoma (32/111-28,8%). Benign splenic enlargement most common was nodular hyperplasia (17/62 26,6%), following for vascular disorders congestion and hemorrhage (13/62-20,3%). KEYWORDS: dog, haemangiosarcoma, histopathology, hyperplasia, spleen. INTRODUÇÃO O baço é um órgão hematopoiético cuja principal função é a filtração do sangue através do seu sistema sinusoidal (VALLI, 2007), sendo responsável pela estocagem de plaquetas e eritrócitos maduros, pela maturação de reticulócitos, fagocitose e destruição de eritrócitos, plaquetas e leucócitos e hematopoiese extramedular (FRY & MCGAVIN, 2009), além de atuar no metabolismo do ferro (CHRISTOPHER, 2003). A natureza destas funções faz com que o baço tenha sua aparência macro e microscópica afetadas por uma grande variedade de doenças sistêmicas inflamatórias e doenças hematológicas (VALLI, 2007). Diferentes alterações podem comprometer o baço. Dentre elas, os distúrbios de crescimento, anormalidades circulatórias (hematoma, congestão, trombose, infarto e inflamação) e as neoplasias, primárias ou metastáticas, são os principais exemplos (VALLI,

2 2007). Todos estes processos, sozinhos ou combinados, podem resultar em aumento esplênico uniforme ou nodular (FRY & MCGAVIN, 2009). Estudos revelam que os processos neoplásicos são as principais causas de esplenomegalia em caninos e desses, o hemangiossarcoma é a neoplasia com maior incidência nessa espécie (DAY et al., 1995; SPANGLER & KASS, 1997; THAMM, 2007), sendo mais frequente em animais entre oito e treze anos (PRYMAK et al., 1988). O objetivo desse trabalho foi realizar um estudo retrospectivo das principais alterações esplênicas encontradas em caninos, tendo sido utilizado o arquivo de um laboratório particular de anatomia patológica veterinária durante o período de janeiro de 2005 a dezembro de MATERIAL E MÉTODOS O arquivo anatomopatológico de um laboratório veterinário particular, no Rio de Janeiro foi revisado compreendendo um período de cinco anos (2005 a 2010). Os casos considerados para este trabalho corresponderam àqueles de peças cirúrgicas ou biópsias de baço de cães, que apresentaram os dados epidemiológicos da população (espécie, raça, idade, sexo) e o diagnóstico histopatológico das lesões do órgão. As idades foram divididas em filhote, animais até 1 ano; adulto, animais entre 1 e 9 anos e idoso, animais acima de 10 anos. As lesões encontradas foram classificadas de acordo com patologia apresentada em: alterações neoplásicas, distúrbios do crescimento, anormalidades circulatórias e outros comprometimentos. RESULTADOS Dos 7451 casos do arquivo deste laboratório, compreendendo peças cirúrgicas, biópsias, necropsias e citologias, 175 casos (2,3%) corresponderam a peças cirúrgicas e/ou biópsias apresentando alterações esplênicas caninas. Nestes, foram encontradas 39 raças diferentes, incluindo cães de raça indeterminada (SRD) que corresponderam a maioria dos animais comprometidos com lesões esplênicas (34/175-19,4%), seguidos dos cães das raças Poodle (23/175-13,1%), Cocker Spaniel (19/175-10,9%) e Labrador (16/175-9,1%). As raças que apresentaram até três animais cada, foram agrupadas e corresponderam a 23,4% (41/175). Oito (4,6%) animais não tiveram sua raça informada nos arquivos. A idade variou entre 1 e 18 anos, onde os animais idosos apresentaram maior incidência de lesões esplênicas (89/175-50,9%). Trinta e três cães não apresentaram idade descriminada nos arquivos,

3 correspondendo a 18,9% dos casos. Havia 55,4% de fêmeas e 44.6% de machos. Em relação às alterações esplênicas encontradas nos caninos deste estudo, as alterações neoplásicas foram significativamente maiores do que as demais, correspondendo a 63,4% (111/175), onde somente 6/111 casos, eram de neoplasias benignas, sendo o hemangioma o que mostrou maior incidência (5/111-4,5%) e um caso de lipoma (1/111-0,9%). Das neoplasias malignas encontradas, o hemangiossarcoma foi o que mais acometeu os animais (62/111-55,9%), seguido pelo linfoma (28,8%) e pelo fibrossarcoma (2,7%). Oito casos (7,2%) correspondiam à metástases de outras neoplasias, onde 5,4% (6/111) eram metástases de adenocarcinoma e 1,8% (2/111), de sarcomas indiferenciados. As outras desordens encontradas no baço foram às alterações de crescimento (29/175-16,6%), sendo a hiperplasia nodular a mais incidente (17/29; 58,6%), seguida pela hiperplasia difusa (8/29-27,6%), hiperplasia de folículos linfóides associada à congestão e hemorragia (3/29-10,3%) e hipoplasia de polpa branca com congestão (1/29-3,4%) e os distúrbios circulatórios (29/175-16,6%), onde a congestão e hemorragia foram os distúrbios mais encontrados (13/29-44,8%), seguido do hematoma esplênico (11/29-379%) e da congestão associada a hemorragia e necrose (5/29-17,2%). Outras lesões no baço também foram avaliadas, totalizando 6 casos (6/175-3,4%) e apresentando um caso cada (1/6-16,7%), sendo elas o abscesso esplênico, autólise, espessamento de cápsula associada a hiperplasia e necrose, lesão associada a trauma, nódulo com infiltração adiposa e nódulo com necrose e esplenite. DISCUSSÃO O baço é um importante órgão com funções tanto hematopoiéticas como imunológicas. As alterações patológicas geralmente aparecem como uma esplenomegalia generalizada ou nodular do órgão e podem ser neoplásicas ou não-neoplásicas (VALLI, 2007). Neste estudo os animais sem raça definida apresentaram mais alterações esplênicas que as outras raças, concordando com achados da literatura (CHRISTENSEN et al., 2009). A literatura descreve não haver predileção por sexo para lesões esplênicas, no entanto animais idosos são apontados com maior prevalência ao desenvolvimento destas alterações (JACOBS et al., 2002; VALLI 2007). Dentre as principais alterações observadas, as neoplasias apresentaram incidência significativamente maior do que os outros processos patológicos. Dentre eles, o hemangiossarcoma foi a neoplasia mais predominante. Este dado corrobora com estudos anteriores (PRYMAK et al., 1988; DAY et al., 1995; CHRISTENSEN et al., 2009) que

4 apontam a neoplasia maligna de vasos sanguíneos como responsável por 51% das neoplasias malignas esplênicas em cães (THAMM, 2007). Macroscopicamente, os hemangiossarcomas podem ser indistinguíveis, em muitos casos, dos hematomas e hemangiomas (SPANGLER & CULBERTSON, 1992), sendo necessária a análise histopatológica para diagnóstico diferencial. No entanto, esses estudos apontam as raças German Shepherd Dogs como predisposta ao desenvolvimento desta neoplasia, enquanto que no presente trabalho os animais sem raça definida foram os mais acometidos. Em relação as alterações nãoneoplásicas, as de crescimento, em especial as hiperplasias nodulares tem grande importância diferencial para as neoplasias, principalmente para os linfomas, já que estes podem se apresentar de forma nodular (JARRET & MACKEY, 1974; VALLI, 2007). No presente trabalho, as hiperplasias nodulares corresponderam a 17/64 (26,6%) de todos os distúrbios não neoplásicos encontrados nos baços dos cães. Corroborando com achados anteriores (DAY et al., 1995; CHRISTENSEN, et al., 2009), que apontam as hiperplasias como principal alteração não neoplásica em caninos. CONCLUSÕES Neste trabalho pode-se concluir que os animais idosos, sem raça definida e do sexo masculino possuem maior incidência de alterações esplênicas. Dentre os principais processos observados, as neoplasias são os de maior ocorrência, sendo o hemangiossarcoma a principal neoplasia maligna encontrada. As alterações de crescimento e circulatório são os principais achados não neoplásicos no baço. A análise histopatológica é indispensável para distinção entre os processos neoplásicos e não neoplásico, devendo ser realizado, preferencialmente em toda peça cirúrgica. REFERÊNCIAS CHRISTENSEN, N., CANFIELD, P., MARTIN, P., KROCKENBERGER, M., SPIELMAN, D., BOSWARD, K. Cytopathological and histopathological diagnosis of canine splenic disorders. Aust Vet J. n. 87, v. 5, p , CHRISTOPHER, M. M. Cytology of the spleen. The Veterinary Clinics Small Animal Practice. Davis. v. 33, p , DAY, M. J., LUCKE, V. M., PEARSON, H. A review of pathological diagnoses made from 87 canine splenic biopsies. Journal of Small Animal Practice, v. 36, n. 10, p , FRY, M. M., MCGAVIN, M. D. Medula óssea, células sanguíneas e sistema linfático In: MCGAVIN, M.D., ZACHARY, J.F. Bases da Patologia em Veterinária. 4ed. Rio de Janeiro: Elsevier, p , JACOBS, R. M., MESSICK, J. B., VALLI, V. E. Tumors of the haemolymphatic system. In: MEUTEN, D.J. Tumors in domestic animals. 4. ed., Iowa State Press, p , JARRET, W. F. H.; MACKEY, L. J. Neoplasic diseases of the haematopoietic and lymphoid tissues. In: Bulletin of the World Health Organization, v. 50, n. 1-2, p , 1974

5 PRYMAK, C., MCKEE, L.J., GOLDSCHMIDT, M.H., CLICKMAN, L.T. Epidemiologic, clinical, pathologic and prognostic characteristic of splenic hemangiosarcoma and splenic hematoma in dogs: 217 cases (1985). Journal of Veterinary International Medice, v. 193, n. 6, p , SPANGLER, W.L., CULBERTSON, M.R. Prevalence, type, and importance of splenic diseases in dogs: 1,480 cases ( ). Journal of American Veterinary Medical Association, v. 200, p , SPANGLER, W.L., KASS, P.H. Pathologic factors affecting postsplenectomy survival in dogs. Journal of Veterinary International Medice, v. 11, n. 3, p , THAMM, D.H. Miscellaneous Tumors. In: WITHROW S. J.; MACEWEN E.G. Small animal clinical oncology. Philadelphia: WB Saunders, p. 785, VALLI, V.E.O. Hematopoietic system. In: JUBB, K.V.F.; KENNEDY, P.C.; PALMER, N.C. Pathology of domestic animals. 5 ed. Elsevier, v.3, p. 284, 2007.