Palavras-chave: neoplasia hematopoiética, cavidade oral, tegumento, cão. Keywords: hematopoietic neoplasm, oral cavity, integument, dog.

Transcrição

1 1 DESCRIÇÃO CLÍNICA E LABORATORIAL DO LINFOMA MUCOCUTÂNEO DISSEMINADO CANINO CLINICAL AND LABORATORIAL DESCRIPTION OF CANINE DISSEMINATED MUCOCUTANEOUS LYMPHOMA Poliana Araújo XIMENES 1 ; Keylla Suellen Batalha Rocha FERNANDES 1 ; José Artur Brilhante BEZERRA 1 ; Ramon Tadeu Galvão Alves RODRIGUES 1 e Kilder Dantas FILGUEIRA 2 1 Médico Veterinário, Residente, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, polyaraujo_3@hotmail.com 2 Médico Veterinário, Me., Universidade Federal Rural do Semi-Árido Resumo: O linfoma é a neoplasia hematopoiética mais comum da espécie canina. A forma mucocutânea da doença pode ser observada em algumas situações e por vezes confere uma dificuldade na suspeição diagnóstica. O objetivo do presente trabalho foi apresentar os achados epidemiológico-clínicos e laboratoriais do linfoma mucocutâneo disseminado na espécie canina. Uma cadela, Fila Brasileiro, seis anos, possuía alterações cutâneas e respiratórias. Submeteu-se a paciente ao exame físico. Constataram-se nódulos subcutâneos, de distribuição disseminada. A inspeção da cavidade oral exibiu, em toda a mucosa dorsal lingual, a presença de múltiplos e esparsos nódulos. A semiologia do sistema respiratório constatou dispneia expiratória e crepitações pulmonares. Optou-se em solicitar exames complementares. Esses corresponderam a hemograma, bioquímica sanguínea, radiografias torácicas e citologia das neoformações em tegumento e língua. As principais alterações hematológicas corresponderam à anemia normocrômicanormocítica e leucocitose por neutrofilia. Na análise bioquímica havia hiperproteinemia. A imaginologia demonstrou padrão pulmonar intersticial difuso, sugestivo de infiltração celular. A citopatologia revelou um quadro morfológico compatível com linfoma. A cadela veio a óbito e não houve possibilidade de realizar exame necroscópico e outros testes laboratoriais. Deve-se considerar o linfoma em caninos acometidos por lesões mucocutâneas. Palavras-chave: neoplasia hematopoiética, cavidade oral, tegumento, cão. Keywords: hematopoietic neoplasm, oral cavity, integument, dog. Anais do 38º CBA, p.1243

2 2 Revisão de Literatura: O linfoma representa a neoplasia hematopoiética mais comum da espécie canina (VAIL et al., 2013). A localização anatômica dos tumores define a principal forma de classificação dos linfomas, sendo que apenas de 5 a 12,9% dos cães apresentam a forma cutânea da doença (CARDOSO et al., 2003; MORENO e BRACARENSE, 2007; VAIL et al., 2013). De etiologia pouco compreendida, não se observa predisposição por gênero, sendo os animais de meia idade a idosos e com raça definida, os mais afetados (MORENO, 2008; VAIL et al., 2013). Existe ainda a forma mucocutânea de tal enfermidade oncológica (onde há lesões orais concomitantes com as alterações tegumentares), com uma taxa de ocorrência considerável (CALAZANS et al., 2016). O diagnóstico pode ser obtido através da análise citopatológica e/ou histopatológica do tecido afetado, sendo de fundamental importância a realização de outros exames complementares, como provas hematológicas, bioquímicas e imaginológicas (VAIL et al., 2013; CALAZANS et al., 2016). Nesse sentido, o objetivo do presente trabalho foi detalhar os achados epidemiológico-clínicos e laboratoriais do linfoma mucocutâneo disseminado na espécie canina. Descrição do Caso: Uma cadela, raça Fila Brasileiro, seis anos de idade, não castrada, foi encaminhada para avaliação devido a alterações cutâneas e respiratórias. O tempo de evolução correspondia acima de um mês. Submeteu-se a paciente ao exame físico. Constataram-se nódulos subcutâneos, de distribuição disseminada, firmes, lisos, sésseis e íntegros. A inspeção da cavidade oral exibiu, em toda a mucosa dorsal lingual, a presença de múltiplos e esparsos nódulos, com macroscopia similar às proliferações cutâneas, exceto pela presença de erosão. A semiologia do sistema respiratório constatou, na inspeção, dispneia expiratória e crepitações à ausculta dos campos pulmonares. Optou-se em solicitar exames complementares. Esses corresponderam a hemograma, bioquímica sanguínea (renal e hepática), radiografias torácicas e citologia das neoformações em tegumento e língua (com uso da técnica punção não aspirativa por agulha fina e escarificação, respectivamente). As principais alterações hematológicas corresponderam à anemia normocrômicanormocítica e leucocitose por neutrofilia. Na análise bioquímica havia hiperproteinemia. A imaginologia demonstrou padrão pulmonar intersticial difuso, sugestivo de infiltração celular. Na citopatologia revelou-se que a amostra era Anais do 38º CBA, p.1244

3 3 hipercelular, com predomínio de linfoblastos atípicos, dotados de aumento da relação núcleo-citoplasma, figuras mitóticas atípicas, corpos linfoglandulares e cromatina grosseira. O quadro morfológico foi compatível com linfoma. A cadela veio a óbito e não houve possibilidade de realizar exame necroscópico e outros testes laboratoriais adicionais. Discussão: O linfoma canino afeta principalmente cães entre seis e nove anos de idade (MORENO, 2008; VAIL et al., 2013), estando assim o animal relatado dentro da faixa etária preconizada pela literatura. As principais raças apontadas como predispostas são Boxer, São Bernardo, Pastor Alemão, Rottweiler, Golden Retriever, Poodle e Pastor Alemão (MORENO e BRACARENSE, 2007; VAIL et al., 2013). Em um estudo nacional, conduzido por Moreno e Bracarense (2007), observou-se uma alta incidência de linfoma em cães da raça Fila Brasileiro, onde tal padrão racial foi condizente com o animal em discussão. Existe a possibilidade de predisposição ao linfoma em cães da referida raça, e talvez essa hipótese ainda não tenha sido confirmada devido à escassez de estudos desenvolvidos no Brasil e pelo fato dessa linhagem racial ser pouco difundida no mundo. Clinicamente as lesões cutâneas do linfoma iniciam-se com eritema, despigmentação, descamação e alopecia, evoluindo posteriormente para nódulos, placas e úlceras, que na maioria das vezes apresentam distribuição generalizada pela pele do animal (VAIL et al., 2013; CALAZANS et al., 2016). Os achados de tais autores corroboraram parcialmente com a macroscopia das proliferações tegumentares do individuo exposto e sugeriram uma progressão crônica da oncopatia constatada. O linfoma primário e solitário, com localização na língua é considerado raro, representando apenas 7% dos tumores de cavidade oral (SYRCLE et al., 2008). No entanto, lesões concomitantes de mucosa, em especial na cavidade oral, como as observadas na cadela em evidência, são relativamente comuns em casos de linfoma cutâneo, ocorrendo em aproximadamente 50% dos cães acometidos por essa enfermidade (CALAZANS et al., 2016). A anemia normocrômica-normocítica observada no presente caso, possivelmente correspondeu a uma síndrome paraneoplásica, uma vez que tal distúrbio hematológico é verificado rotineiramente no linfoma canino (VAIL et al., 2013). A leucocitose por neutrofilia, detectada na fêmea canina descrita, provavelmente também equivaleu a uma síndrome paraneoplásica, já que essa alteração leucocitária é observada em 30 a 40% dos cães portadores de linfoma Anais do 38º CBA, p.1245

4 4 (VAIL et al., 2013). Para a hiperproteinemia exibida pela cadela narrada, seria de fundamental importância à análise das proteínas séricas por eletroforese, já que gamopatias monoclonais são observadas em alguns casos de neoplasias hematopoiéticas (CALAZANS et al., 2016). Todavia, no estudo em questão, essa prova laboratorial tornou-se impossibilitada por razões técnicas e operacionais. Na maioria das situações, o diagnóstico do linfoma pode ser obtido por meio do exame citológico, conforme foi procedido no relato em evidência. Porém, para um adequado planejamento terapêutico e para uma melhor definição prognóstica, os exames histopatológicos e imunoistoquímicos são necessários para uma classificação mais acurada e completa (VAIL et al., 2013). Entretanto, no exemplar em exposição, a falta de acesso a fragmentos de amostras teciduais (no momento in vivo ou post mortem) justificou a não realização desses exames complementares. Por se tratar de uma neoplasia de origem hematopoiética, os principais locais de metástase são o baço, fígado e medula óssea (VAIL et al., 2013). Contudo, qualquer órgão poderá ser acometido, como no animal estudado, o qual desenvolveu um quadro respiratório, caracterizado por dispneia, que provavelmente foi decorrente de infiltração metastática de linfócitos neoplásicos para os pulmões. Conclusão: Deve-se considerar o linfoma em caninos acometidos por lesões mucocutâneas, essencialmente aquelas de distribuição disseminada. Referências: CALAZANS, S. G.; DALECK, D. C.; DE NARDI, A. B. Linfomas. In: DALECK, C. R.; DE NARDI, A. B. (Eds.). Oncologia em cães e gatos. 2. ed. Rio de Janeiro: Roca, p CARDOSO, M. J. L.; MACHADO, L. H. A.; ROCHA, N. S.; MOUTINHO, F. Q.; CIAMPOLINI, P. Linfoma canino: revisão de cinquenta e quatro casos. Bioscience Journal, Uberlândia, v.19, n.3, p , MORENO, K. Aspectos epidemiológicos, morfológicos e terapêuticos do linfoma cutâneo e índices de proliferação celular (PCNA e Ki-67) no linfoma multicêntrico em cães. Londrina, p. Tese (Doutorado em Ciência Animal). Programa de Pósgraduação em Ciência Animal, Universidade Estadual de Londrina. MORENO, K.; BRACARENSE, A. P. F. R. L. Estudo retrospectivo de linfoma canino no período de na região norte do Paraná. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science, São Paulo, v.44, n.7, p.46-52, Anais do 38º CBA, p.1246

5 5 SYRCLE, J. A.; BONCZYNSKI, J. J.; MONETTE, S.; BERGMAN, P. J. Retrospective evaluation of lingual tumors in 42 dogs: Journal of the American Animal Hospital Association, Lakewood, v.44, n.6, p , VAIL, D. M.; PINKERTON, M. E.; YOUNG, K. M. Hematopoietic tumors. In: WITHROW, S. J.; VAIL, D. M.; PAGE, R. L. (Eds). Small animal clinical oncology. 5. ed. St. Louis: Elsevier, p Anais do 38º CBA, p.1247