(IN)DISCIPLINA ESCOLAR: uma abordagem epistemo-filosófica
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- Catarina Sequeira Lobo
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1 44 (IN)DISCIPLINA ESCOLAR: uma abordagem epistemo-filosófica TÓPICOS DE FILOSOFIA Este trabalho tem como temática a (In)disciplina Escolar. Optou-se por empregar uma abordagem epistemo-filosófica para melhor compreensão desse fenômeno, que abrangeu tanto seu estudo sob a ótica institucional, quanto sob a ótica moral. O interesse pelo tema surgiu, primeiramente, em função da experiência profissional anterior do graduando, que em sua terra natal, Indonésia, exerceu o magistério, fato que lhe proporcionou várias experiências, tanto agradáveis e felizes, quanto desagradáveis e difíceis. Tal fato deveu-se, sobretudo, a questões ligadas à indisciplina em sala de aula. Acresce, ainda, que, nos últimos cincos anos, o formando está trabalhando em uma escola particular, em Belo Horizonte, na qual se deparou com a mesma problemática de seu país de origem. Percebeuse, assim, a necessidade de refletir e aprofundar seus estudos sobre essa temática, visando melhorar seu desempenho profissional, aliando teoria e prática. A relevância do estudo que ora se apresenta foi corroborada pela recente divulgação de uma pesquisa internacional sobre ensino e aprendizagem, conhecida pela sigla Talis. A pesquisa realizada pela Organização Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) afirmou que o Brasil está em primeiro lugar no ranking no que se
2 (IN) DISCIPLINA ESCOLAR: uma abordagem epistemo - filsófico 45 refere ao mau comportamento dos alunos em sala de aula. A pesquisa apontou, ainda, para o fato de que a indisciplina é generalizada no Brasil, pois, ocorre praticamente na mesma proporção, tanto nas escolas públicas, quanto nas escolas privadas, o que interfere, negativamente, no processo de ensino e aprendizagem. Para a realização deste trabalho, empreendeu-se uma pesquisa bibliográfica, que abrangeu a análise de livros, de revistas especializadas e de artigos acadêmico-científicos específicos da área. Estruturou-se a monografia em dois capítulos. No primeiro, buscou-se compreender o significado do termo Disciplina Escolar. Nesse sentido, concluiu-se que, etimologicamente, a palavra disciplina está relacionada à ideia de instrução, de ensino, de educação e de aprendizado. No seu sentido mais comum e usual, o termo tende a designar um conjunto de regras e procedimentos que regulam a vida dos indivíduos, no âmbito de uma determinada instituição ou formação social. A Indisciplina, por sua vez, pode ser definida como sendo a negação, ou o não cumprimento das regras previamente estabelecidas. Algumas vezes, o termo denota a própria perturbação ou desordem causada pelo não cumprimento das regras estabelecidas. Constata-se, ainda, que embora inerente ao processo pedagógico, o conjunto específico de regras e procedimentos disciplinares adotados nas escolas está intrinsecamente relacionado aos contextos histórico, político e cultural das sociedades em que essa escolarização acontece. Isso significa dizer que o conceito de disciplina utilizado pelas escolas, além de bastante diversificado, evolui ao longo da história, acompanhando as transformações ocorridas no mundo político, na vida econômica, no campo cultural e no pensamento pedagógico, entre outras esferas. No segundo capítulo, investigou-se o fenômeno da (In) disciplina Escolar, sob as óticas institucional e moral. No que tange à perspectiva institucional, Coimbra (1989) afirma que a escola surge para fortalecer e garantir o poder de uma classe que é dominante,
3 46 na formação social em que se insere o indivíduo. Nesse sentido, a instituição escolar é criada para servir a esses objetivos e tem por finalidade ensinar, aos indivíduos, os valores, hábitos e costumes que interessam a essa camada social hegemônica. Foram investigadas, ainda, em conformidade com a tradição filosófica, as possíveis origens e causas da indisciplina escolar. Estudos realizados na área apontam que a origem do que aqui se denomina indisciplina encontra-se, sobretudo, no interior da família na qual o indivíduo foi criado. A esse respeito, Nogueira e Nogueira (2002), fundamentadas pela Sociologia da Educação de Bourdieu, explicam que: As referências culturais, os conhecimentos considerados legítimos (cultos, apropriados) e o domínio maior ou menor da língua culta, trazidos de casa por certas crianças, facilitariam o aprendizado escolar na medida em que funcionariam como uma ponte entre o mundo familiar e a cultura escolar. A educação escolar, no caso das crianças oriundas de meios culturalmente favorecidos, seria uma espécie de continuação da educação familiar, enquanto para as outras crianças significaria algo estranho, distante, ou mesmo ameaçador. A posse de capital cultural favoreceria o êxito escolar, em segundo lugar, porque propiciaria um melhor desempenho nos processos formais e informais de avaliação. Bourdieu observa que a avaliação escolar vai muito além de uma simples verificação de aprendizagem, incluindo um verdadeiro julgamento cultural e até mesmo moral dos alunos. Cobra-se que os alunos tenham um estilo elegante de falar, de escrever e até mesmo de se comportar; que sejam intelectualmente curiosos, interessados e disciplinados; que saibam cumprir adequadamente as regras da boa educação. Essas exigências só podem ser plenamente atendidas por quem foi previamente (na família) socializado nesses mesmos valores. (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002). No segundo capítulo refletiu-se, ainda, sobre a indisciplina escolar no que tange a sua perspectiva moral, pois segundo La
4 (IN)DISCIPLINA ESCOLAR: uma abordagem epistemo - filsófico 47 Taille (1996), especialista na área, existe uma estreita relação entre indisciplina e moral. La Taille (1996) defende, nesse contexto, que a escola deve estabelecer o fator moral como preponderante ao analisar e buscar soluções para os problemas disciplinares. Para o autor, o ideal é que a disciplina seja vista como consequência do desenvolvimento de uma moral autônoma, com base na cooperação entre os sujeitos e não apenas na punição do aluno, pois é ele que, em geral, é responsabilizado pelo comportamento considerado indisciplinado, fato pelo qual é punido, podendo sentir-se injustiçado ou humilhado nesse processo. Nesse sentido, o autor defende que a solução é exatamente contrária: reforçar no aluno, o sentimento de sua dignidade como ser moral. (LA TAILLE, 1996, p. 23). Em síntese, verifica-se que o conceito de Indisciplina, a ser investigado, é aquele que leva em consideração que esse fenômeno consiste, acima de tudo, em comportamentos de desrespeito aos outros e às regras, construídas com base em princípios de justiça e moral. Face ao exposto, buscaram-se no estudo da Epistemologia Genética, de Piaget, os fundamentos teóricos para compreender o desenvolvimento da moralidade na criança, com base, sobretudo, em sua obra intitulada O juízo moral na criança (1994), o que permitiu melhor compreender como a consciência humana comporta-se face às regras impostas na esfera social. Além de sua contribuição para a compreensão da cognição humana, expressa na sua Epistemologia genética, Piaget desenvolveu, ainda, estudos sobre a moralidade. Neles, o autor argumenta que o desenvolvimento da moral na criança abrange três fases ou estágios, denominadas: Anomia, Heteronomia e Autonomia. Por Anomia, Piaget entende aquele período no qual as crianças não têm consciência da regra. As normas de conduta são, em geral, determinadas pelas necessidades básicas. Porém, quando as regras são obedecidas, são seguidas pelo hábito e não por uma consciência
5 48 do que é certo ou errado. Quando a criança começa a entender a existência da regra, ela passa ao estágio da moral heterônoma, na qual compreende e cumpre as regras morais. Esse período também é denominado de Realismo Moral. Ressalta-se, entretanto, que a obediência às regras deve-se mais à coerção dos adultos do que pela consciência moral da criança. Finalmente, tem-se a Autonomia, fase na qual o sujeito sabe que existem regras para se (con)viver em sociedade, mas a fonte que o impele a obedecer a essas normas está nele próprio. Neste momento, a criança tem outra relação com a regra, pois, quando o indivíduo pensa de forma autônoma, o sentimento de obrigatoriedade não se deve mais à coação adulta, nem à busca do respeito do outro, na medida em que este sentimento é subjetivo, não dependendo de orientação externa. Nas considerações finais, apresentam-se algumas das constatações resultantes desse trabalho. Ao ser analisada sob a ótica institucional, evidencia-se que a (In)disciplina está relacionada com as relações de poder existentes no interior da instituição escolar, ressaltando-se que o poder de dominação nela existente é ambíguo, pois ao mesmo tempo em que controla os indivíduos por meio da repressão, incita-os a práticas que se quer eliminar ou combater. O poder apresenta, assim, uma dimensão negativa, pois, ao não tolerar as diferenças, a escola desperta a força da resistência daqueles que não aceitam imposições. A análise da (In)disciplina, sob o ponto de vista, moral, evidenciou a necessidade de se estabelecerem normas, visando à boa convivência e à construção de um ambiente escolar mais cooperativo, em que haja respeito mútuo. Para tal, segundo os especialistas na área, é preciso que o trabalho seja desenvolvido por intermédio de atividades que favoreçam a interação respeitosa entre alunos, professores e funcionários. Deve-se recorrer ao uso de sanções somente quando realmente necessário e desde que haja justiça e moderação.
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