E: Entrevistador AA: Sr. André Achitti RA: Sra. Rita Achitti

Transcrição

1 André e Maria Anchitti Brodowski, 22 de dezembro de E: Entrevistador AA: Sr. André Achitti RA: Sra. Rita Achitti E: Brodowski, 29 de setembro de Mais dois entrevistados do Projeto de História Oral do Museu Casa de Portinari. Em primeiro lugar, nome dos dois, por gentileza. AA: Meu nome, André Eduardo Achitti, nascido em Brodowski, na Vila Cristal... eu fui Lavrador até dezenove anos. Aí eu me casei com a Maria Rita e aí eu passei a ser comerciante, junto com meu sogro, vim trabalhar junto com ele aonde estou até hoje, que está fazendo cinquenta e nove anos de casório, de casamento. RA: Casamento. AA: E depois disso, a gente viveu na lavoura e e a gente vinha pouco na cidade, porque naquela época cinquenta, sessenta anos atrás, a gente vinha pouco, não tinha nem calçado pra vestir, né? Então vinha pouco. E a gente tinha pouco conhecimento a respeito de Portinari. Pouca, pouca coisa. Quando eu mudei, que eu casei, mudei pra cá, aí, a gente ficou mais entrosou mais com a família, que é a Santina Padan [emocionado] e o Zé Pedro Felipe. É a Dona Santina, ela se dava muito com a família de Portinari. É e então a gente ficou mais por dentro das coisas, né? E aqui eu fiquei como comerciante, já quase sessenta anos de comércio; essa casa aqui é uma casa uma das mais antigas de Brodowski, quando as ruas eram só três ruas, né, que é a Floriano, General e Vereador e tinha essa aí debaixo que é a André Rebouças, mas não sou eu André, não, viu? Já nessa época, já né? Então a gente se casou, em 56, né? Faz aí quase sessenta anos de casado, né, cinquenta e nove e também, eu queria comentar com você a respeito das ruas, que as ruas eram não tinha asfalto! Não tinha asfalto nas ruas. Era só barro. Muitas vezes, a gente encrava ônibus na frente da loja e então tinha muito barro, e chovia muito, hoje chove menos. Não é isso? Que nem, essa loja aí, essa loja aí, ela desde 1902 que existe uma loja. Passou por vários sírios. E: 1902? AA: Sírio, passou por O primeiro, pode falar isso? O primeiro, que fundou essa loja aí, chamava João Elias Sada. O primeiro. Aí veio vindo, né? Ele ficou até 1929, depois veio Irmãos Sabinos, né? Que também era Sírio e a gente começou por aí... é, Miguel Sabino e depois do Miguel Sabino, então veio José Pedro Felipe, Zé Pedro Felipe é o meu sogro aí ele ficou então isso daqui tem já mais de cem anos. Essa, essa, esse grupo que a gente mora aí. A loja e mais a casa.

2 E: E sempre trabalhando com esse segmento assim, de tapetes, cortinas? AA: Sempre. Já houve uma mudança, depois, antigamente é trabalhava-se com mais coisas nessa loja, porque, antigamente, tinham poucas lojas, né? Duas, três lojas só. E era o Brisotti, era o Machetti e essa daqui. Hoje só resta essa loja de antiguidade. As outras virou outros comércios. E: Verdade. AA: E essa loja ainda continuou, e eu foi o único que ainda continuei, já passei por várias circunstâncias, né? [emocionado] É mas, tamo aí, firme. Eu tenho quase oitenta anos, né que tudo indica. E tô firme aí, trabalhando, aposentado, mas continuo trabalhando ainda. E agora, a gente entrosou mais com Portinari, né? Ele nasceu aqui em Santa Rosa, né, na Fazenda. Isso a gente sabe que nasceu aí, né? Depois ele ele brincava muito com as crianças, soltava pipa e brincava com essas crianças antigas que eu não sei quem são. Só conheço um da época, que é o Arduíno Morando. Ele que pegou um pouco dessa época dele. A gente morava na roça, não e trabalhava na lavoura, quer dizer que não tinha... não vinha pra cidade. Entendeu? Aí ele, o o Candinho a minha sogra se dava muito com a mãe e o pai, né? O pai chamava? O pai, pai dele? RA: Francisco. AA: Francisco, né? RA: E a mãe? E: É o Seu Batista o pai, né? RA: Ah é. AA: Seu Batista, né? RA: Batista. AA: Batista, né? E ela era a? E: Domingas. AA/RA: Domingas! RA: Esqueci. AA: Domingas. RA: Domingas AA: Domingas. E eles vinham aqui em casa...

3 E: Ah é? AA: Não na minha época, né? Mas eles vinham até hoje, os filhos, as filhas, da, da Dona Domingas, né? RA: A vó, delas, né? AA: Ah, vó delas, né? RA: É. AA: A Dona Domingas era vó. E elas veem a gente, e abraça e beija. E a gente se conhece a muitos anos, né? RA: É. E: Faz tempo, né? AA: A gente se conhece a muitos anos, isso daí e aí ele, como pintor, né? Ele mudou para o Rio de Janeiro, né? Ele vinha sempre pra cá. Tinha aqui uma banda de música, né? Sempre esperava ele com banda, né? E e a gente acompanhou um pouco dessa parte, mas muito pouco. Entendeu? Agora que eu me entrosei um pouco com a família e né? Eu conheci o Portinari. Eu lembro dele. Eu lembro dele, mas eu não convivi nada com ele, não. E: Senhor era menino na época, era jovem? AA: Era criança, jovem, e a gente não vinha na cidade. Não tinha, né, como vir nas E: Com muita frequência? AA: É, não vinha. Não, não vinha. Vinha muito pouco. Não tinha calçado né, naquela época, né? Trabalhava na roça capinava café, né? E e ele nasceu numa fazenda aqui, Santa Rosa, que era rodeada de café. Ele nasceu. E então a gente acompanha aí, a gente tem essa, esse pessoal que trabalha no Portinari, inclusive você, né? O Matheus. E essa e essas pessoas que levantou, até nós tudo, né? Entrosando junto com elas que é a Angelica, né? Uma grande, grande mulher, né? [emocionado] a Cristiane também e os outros enfim, né? Tem muitos né, que então, entrosou com eles aí e eles me convidam pra isso e pra aquilo e a gente não deixa de não fazer presença, né? E eu fui casado naquela igrejinha lá, Santo Antônio E: Que ano que vocês se casaram? AA: Nos se casamos em , está fazendo quase sessenta anos. E: Já comemoraram bodas de ouro. RA: Já!

4 AA: Já comemoramos ouro, já comemoramos esmeralda e vamos esperar os sessenta, que é brilhante? E: É brilhante? Confesso que não sei. AA: Esqueci de ver isso. Acho que é mais ou menos isso. E vamos comemorar também até lá, se Deus quiser, né? Vamos tocar até lá. E: Com certeza, com certeza. AA: E aí meu como eu tava dizendo, na loja, eu fiquei ali, meu sogro me ensinou trabalhar, que eu tinha só quarto ano de grupo, nem sei como é que se fala hoje, só fiz quarto ano de grupo e aí, entrei aí, me acostumei, daí dez anos, ele faleceu, eu continuei, quer dizer que faz, que eu tô aí dentro, faz cinquenta sozinho e mais dez dele, quase sessenta anos que eu tenho, que eu tô ali dentro, né? E tô bem, graças a Deus. E tenho só que agradecer esse pessoal que vêm ajudando a gente muito à muito à como é que ela chama? RA: Quem? AA: Que eu falei agora mesmo. E: A Angelica? A Cris? RA: A Angelica. AA: A Angelica, né? Tenho que agradecer ela, pela ajuda que ela tem dado pra nós [emocionado], né? É isso daí que é a minha história, é essa daí. Agora, tem também essas casas de Brodowski, costumam até desmanchar, né? Fazer casas novas, modernas, né? Eu sou meio contra isso daí. O bom é que o museu fez um círculo aí, né? Acho que duzentos, trezentos metros aí que não pode desmanchar, não pode né? Então, isso daí eu gosto de coisa antiga. Eu gosto, eu adoro coisa antiga. Eu tenho foto do Bar Central que hoje não é mais Bar Central, né? E tem muitas casas aí que não pode derrubar, não é isso? Pelo, por conta do museu, né? Isso daí é muito bom, viu? Muito bom. Mas já foram desmanchadas várias casas aí que eram história os meninos meus me disseram que pra fazer uma fachada nova nessa casa que a gente mora. E eu disse pra eles isso não é agora. Não, não é agora. Enquanto eu estiver vivo, não. Agora depois, podem até desmanchar e fazer prédios, né?. Não é isso? [Risos] E: Espero que não. AA: Não, eu não aceito, né? Então a minha história é por aí, sim. Viu? Agora o quê que você achou? E: Excelente! Eu queria saber o nome completo

5 RA: Ah, o meu? O meu é Maria Rita Barchetti Achitti. E: Excelente. E a idade da senhora? RA: Vou fazer oitenta e um, né? AA: É, oitenta e um. RA: Oitenta e um. Se Deus quiser. E: E o endereço que vocês residem, qual é aqui? RA: Rua Floriano Peixoto, 831. AA: A loja é 847. RA: É, a loja. AA: A gente mora ali. E: Muito bom. O quê que sente, vocês sentem saudades, da Brodowski antiga? Muita coisa melhorou, muita coisa mudou, algumas coisas deixam saudades. O que? AA: É, isso daí, isso daí foi é mesmo isso daí, porque a gente hoje é tudo moderno, né? RA: É. AA: E eu, eu não alcanço esse modernismo. Eu ainda continuo na minha, na minha antiguidade. Eu. Até na até nas refeições. A comida. Também. A minha tem que ser como coisa antiga. Não gosto nada de coisas novas. E: À moda antiga? AA: À moda antiga, é. A gente conviveu, né, na roça. Nós tínhamos um sítio, né? E nesse sítio a gente criava, né, galinha e então porcos, né? Então, comia muita carne de porco, né? Na época, hoje não se pode nem comer mais, né? E então, sei lá, é isso aí. E: Essa vida dá saudade, a vida lá atrás do campo? RA: Ah dá, dá sim. AA: Eu, eu, vou falar pra você, eu. Eu não me arrependo da minha vida de hoje [emocionado]. Não me arrependo. Me emociona. E: Tá certo.

6 AA: É, a vida de hoje a gente trabalha muito, né? Mas mas, tamo aí vivo, com saúde. Graças a Deus. E: E por que Brodowski? Por que ficaram em Brodowski, por que se fixaram aqui? AA: Os meus avós, descendentes de italianos, vieram da Itália, a gente é descendente, eles são E: Naturais. AA: Naturais. A minha avó, meu avô chegou aqui em Chegou em Santos. Aí mudaram pra Itobi, perto de Casa Branca e aí vieram pra cá, tiveram seus filhos, aí, nove, dez filhos, e aí, mudou pra Vila Cristal e eu nasci na Vila Cristal. Aí, meus pais, né, cresceram por aí tudo. E, aí se casaram, né, e a gente acabou ficando aí, e não mudou daqui. Não foi pra lá, nem veio pra cá, não. Ficamos aqui. Até, até hoje. Então a gente é nascido aqui e crescido aqui. Minha vó veio de lá, né, minha passou mal na chegada aqui e vieram de navio, gastaram sessenta dias de navio, né? Chegaram aqui em Eu tenho até a história deles, tudo. Eles casaram lá, aí a crise piorou, eles vieram embora, e nessa vinda, a minha sogra ainda a minha vó ainda perdeu um filho, na, nessa vinda E: Na viagem? AA: Perdeu um filho na viagem, né? Aí jogaram no mar, né? Com certeza, né? Não tinha outro jeito. Aí vieram pra cá e continuaram aqui. Hoje, hoje tem vários aqui, né, ainda. Muitos já morreram, né? Hoje, resta só um filho da minha vó. Resta só um. Ele mora no Paraná. Mora no Paraná. E, então é isso daí. Então a gente lembra muito dessas [emocionado] dessas coisas antigas, né? A gente lembra muito. E: Pra encerrar: 102 anos, Brodowski celebrou nesse ano. AA: É, é é por aí, né? E: O quê que vocês acham que deveria permanecer para os próximos cem anos de Brodowski, não pode ser perdido? D. Rita? AA: Ah, eu acho é o quê que a gente pode falar que pode? E: O senhor já mencionou a questão com o cuidado com as edificações AA: É, que isso daí precisava precisava continuar, né? Isso daí precisava continuar, essas praças, né? Principalmente a praça, que antigamente ela chamava Humaitá, né? Aquela praça e aí virou Candido Portinari, né? Isso pra nós é um orgulho, né, de e depois, muita, a gente tem muita visita né, de outros países, do mundo inteiro aqui, né? É muito bom pra nós, pra nós que mora aqui, né? Então, a gente as ruas hoje mudaram muito. A cidade cresceu demais, né? Modificou muito, né, a cidade Então é isso daí mesmo, acho que não tenho mais, assim, mais pra comentar.

7 E: A senhora quer acrescentar alguma coisa? RA: Ah, eu quero dizer assim: a minha mãe e eu, quando eu era criança, nós frequentava muito lá a mãe do do AA: Candinho. RA: Candinho. Nós ia muito lá. Lá no Seu Batista, né? Na mãe dele. Nós não saía de lá. Eu e minha mãe. Então a gente sabia a vida inteira deles, naquela época, né? Então, ele vinha, de lá, vinha, parava aqui e ia pra casa dele. E a gente, de vez em quando, a gente ele estava lá e a gente via ele, porque a gente não saía de lá. Eu e minha mãe, naquela época, né? A gente saía muito, eu e minha mãe. Nós tinha muita amizade com eles. Com a mãe dele, com o pai, né? Muita amizade. Demais. Deles. E: Como era o Portinari? Ele era mais fechado, ou conversava? RA: Não, conversava. Vixe. Nossa, ele era bacana, o pai dele. Muito bacana. É, o Portinari também conversava, quando chegava, né? Que ele chegava, ia cumprimentar a gente, tudo, né? Naquela época era ótima aquela, eu gostava, viu, daquela época. Muito boa. AA: É, muito boa. RA: Eu fiquei eu lecionei muitos anos. Quase uns quarenta anos. Eu lecionei, né? No grupo. Hoje é Tiradentes. E depois eu nasci aqui em Brodowski também. Numa casinha perto do AA: Do Clube 22 de Agosto. RA: Do Clube 22 de Agosto. Nasci lá. Eu e minha irmã. Nós duas. Minha mãe morou ali, meu pai e tudo nós nascemos lá. Bem, é só, né, Bem? AA: É, se se for pra encerrar, eu quero só agradecer a sua presença, com a ideia do pessoal lá que me, que me apontaram pra falar alguma coisa, não sou de muito, de muito historiador, né? Mas, contei aquilo que eu sei, que passou por mim, né? Por tudo isso. E eu quero agradecer a todos vocês, lá, primeiramente, viu [emocionado]? E: A gente que agradece. Ficamos muito felizes de poder contar com, não só o depoimento, mas também com a ajuda, né, com o auxílio, tanto na festa na Piazza della Nonna, nos demais projetos AA: É, essa festa aí, a gente toca ela a muitos, a muitos anos. É décimo décimo segundo ano? Décimo, décimo primeiro ano. E a gente tá sempre lá, ajudando a o pessoal lá sempre ajudando. E vamos continuar, né? E: Se Deus quiser. AA: Vamos, continuar

8 RA: Se Deus quiser! [Risos]