PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO - 34ª CÂMARA

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO 34 a Câmara Seção de Direito Privado Julgamento sem segredo de justiça: 05 de abril de 2006, v.u. APELAÇÃO COM REVISÃO N o /3 - SÃO PAULO Apelante: Regina Aguiar de Freitas Amalfi Apelada: Banerj Seguros S. A. SEGURO DE VIDA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. AGRAVO RETIDO. PRESCRIÇÃO ANUAL. OCORRÊNCIA. A prescrição anual prevista pelo inciso II, do 6 º, do artigo 178 do Código Civil de 1916, refere-se ao segurado e ao segurador e, por isso, o pedido da parte deve ser acolhido em razão do principio de ordem pública. Voto n o Visto, REGINA AGUIAR DE FREITAS AMALFI ingressou com Ação Ordinária de Indenização contra BANERJ SEGUROS S. A., qualificação e caracteres das partes nos autos, objetivando o recebimento da indenização originária do contrato de seguro de vida, porque, em razão de... acidente pessoal e do trabalho... (folha 3) e do desempenho de sua função, tornou-se portadora de lesões por esforços repetitivos, tendo sido comprovada a sua incapacidade para o trabalho no Processo sob o n o 613/97, que promoveu contra o INSS, perante a 3ª Vara de Acidentes do Trabalho desta Capital. Recebeu os benefícios da assistência judiciária. Formalizada a angularidade, a Requerida habilitou-se e apresentou contestação, que foi impugnada. As partes exibiram documentos. O processo foi saneado, sendo deferida a produção das provas, ficando a pericial a cargo do IMESC. A Requerida opôs embargos de declaração pugnando pelo reconhecimento da prescrição. Não teve êxito. Interpôs recurso de agravo retido. As partes indicaram assistentes técnicos. Houve encarte de laudo pericial e de pareceres pelos assistentes, cumprindo-se as normas do contraditório. Foi proferido despacho para afastar a realização da prova oral e, declarada encerrada a instrução, a Requerente interpôs recurso de agravo retido, ficando ciente a parte contrária. Seguiu-se a entrega da prestação jurisdicional e, improcedente a pretensão, foi a Requerente condenada ao pagamento das custas processuais corrigidas desde o desembolso, e dos honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa. REGINA AGUIAR DE FREITAS AMALFI interpôs recurso. Requereu: 1. a apreciação do agravo retido nos termos do art. 523 do Código de Processo Civil; 2. a realização da prova oral, na impossibilidade da vistoria no local de trabalho; 3. remessa de ofícios à empregadora e ao INSS para esclarecimentos sobre o acidente do trabalho; 4. realização de perícia médica... com a avaliação de sua perda patrimonial física funcional... (folha 214). No mérito acenou que, tendo sido vítima de acidente do trabalho, deve receber a indenização correspondente a 52,5% do capital segurado, corrigido e acrescido de juros de mora e dos honorários advocatícios

2 BANERJ SEGUROS S. A., em contra-razões, requereu a apreciação do agravo retido, aduzindo que o acidente ocorreu em 11 de junho de 1996, e que a ação foi proposta em março de Contrariou a assertiva de cerceamento de defesa, pela faculdade de julgamento nos termos do inciso I, do artigo 330 do Código de Processo Civil. No mérito sustentou que a Apelante: 1. sofreu doença profissional,... caracterizada apenas e tão somente para efeitos previdenciários, como acidente de trabalho... (folha 230); 2. não é portadora de incapacidade para o trabalho, conforme exame de eletroneuromiografia de folha 136; 3. o contrato, na letra a, da cláusula 4 a, afasta a cobertura da doença identificada; 4. o capital segurado é de R$ ,00, porque o prêmio pago em junho de 1996 foi de R$ 50,59; 5. os honorários advocatícios devem ser de 15%. Relatado o processo, decide-se. São apreciados em primeiro plano os dois recursos de agravo retido, o primeiro interposto pela Requerida e relacionado à prescrição anual e, o segundo, pela Requerente, argüindo nulidade por cerceamento de defesa pela não-produção das provas pretendidas. No pedido, a Requerente diz que... foi vítima de acidente pessoal... (folha 2), mas não descreveu o evento e nem indicou a data em que ele ocorreu. Supriu, em termos, a deficiência, ao esclarecer que em 11 de junho de 1996, a empregadora firmou a CAT comunicação de acidente do trabalho, ao INSS, que resultou no benefício sob o n o , dando ênfase sobre o tratamento médico até 14 de julho de 1997 (folha 3). Comprovou esses fatos pela cópia do laudo pericial, prova emprestada da ação de prestações por acidente do trabalho que promoveu contra a entidade autárquica, de 18 de março de 1998 (folhas 11 a 19). A inicial tem carimbo do Serviço de Protocolo de 05 de março de 2001 (folha 2). Não se pode negar que, a partir do laudo pericial, a Requerente tinha plena consciência de sua incapacidade e, que, entre essas datas houve decurso de tempo superior a um ano. Prescrição, prejudicial de mérito, no sentido jurídico consiste na forma pela qual o direito se extingue, tendo em conta o não exercício dele por certo lapso de tempo. Pode-se dizer, então, que corresponde à extinção de um direito em razão do curso do prazo imposto por lei, onde houve negligência da parte interessada. A matéria é de ordem pública e, por isso, expressamente regulada em lei com condições e formas de aplicação. Para que seja afastada, ou acolhida, a matéria, esse império legal exige que a decisão seja fundamentada. A lei consagra a prescrição para que as ações atinjam a um fim e, assim, seja concedido aos homens ambiente de tranqüilidade e de segurança, fatores sem os quais a vida seria inevitavelmente insuportável e, que, somente são encontrados no direito e na justiça pelo rigor das leis. Trata-se de Ação de Indenização" de Seguro de Vida em Grupo, cujo prazo prescricional encontra expressa disposição no Código Civil: Art Prescreve: - 2 -

3 (...) 6º. Em 1 (um) ano: (...) II a ação do segurado contra o segurador e vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar no país; contado o prazo do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato (art. 178, 7º, V) O momento em que a segurada tomou consciência inequívoca da moléstia que a acometeu, deve ser considerado como início do prazo prescricional. A prescrição ânua prevista no artigo 178, 6º, II do Código Civil tem início na data do laudo pericial que comprovar a ciência inequívoca do segurado de sua doença. 1 Conta-se o prazo prescricional a partir do momento em que o segurado tomou consciência inequívoca da moléstia que o acomete. 2 O termo 'a quo' do prazo prescricional, em matéria de contrato de seguro de vida em grupo e acidentes pessoais, é da data da ciência inequívoca do fato (artigo 178, parágrafo 6º, II do Código Civil/1916), o que ocorre quando se submete o interessado à perícia e se comprova a incapacidade permanente. 3 O entendimento de que prescreve em um ano a ação do segurado contra o segurador e vice-versa 4 é pacífico na jurisprudência, e ficou consagrado pela Súmula nº 101 do Superior Tribunal de Justiça: A ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano. No caso, cuida-se de segurada e seguradora e, por isso, incide a prescrição anual. A jurisprudência é uníssona: Sendo favorecida pelo direito à indenização por seguro em grupo, a empregada é segurada e não beneficiária, motivo pelo qual a ação dela contra o segurador prescreve em um ano (Código Civil de 1916, artigo 178, 6º, II; súmula 101, do Superior Tribunal de Justiça). 5 Prescreve em um, não em cinco anos, a ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora. 6 Em seguro de vida em grupo aplica-se o prazo ânuo do artigo 178, 6º, II, do Código Civil de 1916, reprodução no artigo 206, 1º, letra "b", do Código de 2002 e a Súmula nº 101 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 7 Na ação de indenização de seguro de vida em grupo, o prazo prescricional é de um ano a partir do conhecimento inequívoco da 1 - ext. 2º TACivSP - Ap. c/ Rev /2-3ª Câm. - Rel. Juiz CAMBREA FILHO - J TJSP - Ap. c/ Rev /6-35ª Câm. - Rel. Des. JOSÉ MALERBI - J TJSP - Ap. c/ Rev /1-26ª Câm. - Rel. Des. RENATO SARTORELLI - J Cód. Civil, art. 178, 6º, inc. II. 5 - TJSP - AI /3-28ª Câm. - Rel. Des. RODRIGUES DA SILVA - J TJSP - Ap. c/ Rev /7-28ª Câm. - Rel. Des. CELSO PIMENTEL - J No mesmo sentido: Ap. c/ Rev /6-28ª Câm. - Rel. Des. CELSO PIMENTEL - J TJSP - AI /6-26ª Câm. - Rel. Des. NORIVAL OLIVA - J

4 invalidez definitiva. 8 Seguro de vida e acidentes pessoais. Indenização. Ação prescrita porque o autor teve ciência de sua parcial incapacidade em 1997 e não postulou administrativamente o recebimento do benefício, só vindo a ajuizar a ação em Figura de segurado que não se confunde com beneficiário. Prescrição ânua. Recurso improvido, com observações. 9 Em decisão que pode ser considerada como análoga, o Ilustre Desembargador WILLIAN CAMPOS assim proferiu seu voto: Havia relutância dos nossos Tribunais quanto ao reconhecimento da prescrição da ação promovida pelo segurado em grupo, porque se fazia uma distinção pelo fato do seu seguro não ser realizado diretamente com a seguradora e sim através do estipulante empregador. Entretanto, reconhece-se majoritariamente que inexistem duas situações contratuais estabelecedoras do prazo prescricional. O Egrégio Superior Tribunal de Justiça já entendeu que: No seguro de vida em grupo não se confunde a figurado estipulante com a figura do segurado. Se facultativo o seguro, o estipulante apresenta-se como mandatário do segurado (Dec-Lei n 73/66, art. 21, 2 ). Ao segurado ou ao beneficiário do segurado, ocorrido o sinistro, socorre pretensão contra a entidade seguradora, com base no contrato de seguro. A pretensão do segurado está sujeita ao prazo prescricional ânuo, inclusive nos casos de seguro em grupo, a teor do art. 178, 6, II, do Código Civil (REsp , Relator Ministro Athos Carneiro). Prescrição - Seguro em Grupo - Empregador como estipulante. Também nessa hipótese é ânua a prescrição. Incidência do disposto no artigo 178, 6, inciso II, do Código Civil (REsp SP, Relator Ministro Eduardo Ribeiro). Prevalente, portanto, a tese de que em seguro em grupo, mesmo quando o empregador é o estipulante, a prescrição é ânua. Não poderia ser outro o entendimento, porque embora o trabalhador participe da relação contratual por adesão, forçoso reconhecer que o seguro é feito em seu benefício direto, sendo a empregadora somente a intermediária, corretora ou procurador, sem nenhum benefício com tal seguro, pois o empregado é o único e exclusivo segurado. À propósito, o Decreto-Lei 73, de 21/11/66, que trata do Sistema Nacional de Seguro Privado, expressamente define que nos seguros facultativos o estipulante é mandatário do segurado. Por outro lado, não obstante alguns entendimentos em contrário, reputo não se aplicar na espécie o artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor, que prevê prescrição de cinco anos, pois a hipótese não é de reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço 8 - TJSP - Ap. c/ Rev /5-35ª Câm. - Rel. Des. EGIDIO GIACOIA - J TJSP - Ap. c/ Rev /1-34ª Câm. - Rel. Desª. ROSA MARIA DE ANDRADE NERY - J

5 prestado ao consumidor, E o eventual inadimplemento contratual por parte da seguradora não pode ser equiparado à hipótese prevista no referido dispositivo. 10 A preliminar sobre a nulidade do processo em face do cerceamento de defesa pela não-produção das provas, não fosse o reconhecimento da prescrição, poderia até ter êxito, uma vez que houve despacho para manifestação e pedidos de designação de audiência e de esclarecimentos ao perito, sobre a perda patrimonial (folhas 180 e 181). Em face ao exposto, acolhida a prejudicial de mérito (prescrição anual), nega-se provimento ao recurso com a alteração do dispositivo, ficando mantidos os benefícios da Assistência Judiciária à Requerente, observada a ressalva do artigo 12 da Lei n o 1.060, de 5 de fevereiro de IRINEU PEDROTTI Desembargador Relator. 10 -TJSP - Ap. c/ Rev /8-31ª Câm. - Rel. Des. WILLIAN CAMPOS - J