129 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ÓRGÃO ESPECIAL CONFLITO DE COMPETÊNCIA

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1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ÓRGÃO ESPECIAL CONFLITO DE COMPETÊNCIA nº (5) Suscitante: EGRÉGIA 14ª CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Suscitado: EGRÉGIA 23ª CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Interessado: BANCO CACIQUE S/A Interessado: EDSON FONTES DO NASCIMENTO Relator: Des. RICARDO RODRIGUES CARDOZO Ementa CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CÂMARA CÍVEL. CÂMARA ESPECIALIZADA DO CONSUMIDOR. Execução de título extrajudicial decorrente do suposto inadimplemento no pagamento das parcelas de um empréstimo bancário consignado. Procedência dos embargos à execução. Existência de um consumidor, que é o destinatário final do empréstimo contratado, de um fornecedor, que é o banco, e de um serviço, que é o empréstimo consignado fornecido pelo banco. Nítida presença de todos os elementos que constituem uma relação de consumo. Os recursos nas demandas que envolvam operações bancárias entre instuição financeira e cliente na qualidade de destinatário final, são da competência das câmaras especializadas em matéria de consumo. Hipótese que não se confunde com a do empréstimo contratado por pessoa jurídica para ser utilizado como capital de giro ou aquisição de insumos para a atividade empresarial. Demanda que configura mero desdobramento de uma originária relação de consumo. No Sistema de Gestão das Tabelas Processuais Unificadas do Conselho Nacional de Justiça, o contrato bancário de empréstimo consignado está expressamente listado entre os Contratos de Consumo, constituindo matéria afeta ao Direito do Consumidor. Conflito procedente, fixada a competência da 23ª Câmara Cível, Juízo suscitado. Aprovação de enunciado. ACÓRDÃO

2 VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS estes autos, ACORDAM os desembargadores que compõem o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em julgar procedente o Conflito de Competência, para fixar a competência da 23ª Câmara Cível, Juízo suscitado, para conhecer e julgar o recurso objeto do Conflito, com aprovação de enunciado sumular, nos termos do voto do desembargador relator. VOTO DO RELATOR Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pela 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, nos autos da Apelação Cível nº , figurando como suscitada a 23ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, que declinou da competência, ao argumento de que não se trata de ação consumerista e sim de título de crédito. Entende a Câmara suscitante que a demanda atualmente travada entre as partes é mero desdobramento de uma originária relação de consumo, pois o apelado pactuou com o banco apelante um contrato de empréstimo consignado em folha de pagamento, verificando-se a presença de consumidor, fornecedor e produto, razão pela qual a matéria discutida nos autos atrairia a competência das Câmaras Cíveis especializadas. Informações da Câmara suscitada à fl Parecer do Ministério Público às fls. 115/123, opinando pela improcedência do conflito. É o relatório. A competência das Câmaras Cíveis especializadas em direito do consumidor está prevista no art. 20, 1º, do CODJERJ, in verbis: 1º - As Câmaras Cíveis de numeração 23ª a 27ª terão competência especializada nas matérias cujo processo originário verse sobre direito do consumidor. Trata-se de competência ratione materiae e, portanto, absoluta. Por sua vez, o 1º do art. 6º-A do Regimento Interno deste Tribunal assim dispõe:

3 1º. Consideram-se matéria de direito do consumidor as indicadas no Sistema de Gestão das Tabelas Processuais Unificadas do Conselho Nacional de Justiça. Cumpre, pois, aferir se a causa discutida nos autos envolve direito do consumidor. Para que a relação jurídica seja qualificada como de consumo, é necessário que as partes envolvidas possam enquadrar-se nos conceitos de consumidor e fornecedor, fixados nos artigos 2º e 3º do CODECOM. No caso concreto, as partes celebraram um contrato de empréstimo com desconto consignado em folha de pagamento, o qual, uma vez supostamente inadimplido, deu ensejo ao ajuizamento de ação de execução pelo banco. O mutuário, por sua vez, opôs embargos à execução, cuja pretensão é a de declaração de nulidade da execução, por violar o contrato avençado entre as partes. Não há dúvidas de que existe um consumidor, o mutuário apelado, que é o destinatário final do empréstimo contratado. Também existe um fornecedor, que é o banco apelante, e existe, por fim, um serviço, que é o empréstimo consignado fornecido pelo banco. Estão presentes, portanto, todos os elementos que constituem uma relação de consumo. O apelante ajuizou ação de execução com base em suposto inadimplemento do contrato mediante o qual o apelado contratara o serviço. O apelado, por sua vez, opôs embargos à execução, objetivando provar que não deu causa ao inadimplemento, vez que o desconto era feito por seu empregador e sempre havia margem consignável para o desconto das parcelas do contrato. Nessa conjuntura, assiste razão à suscitante quando afirma que a demanda atualmente travada entre as partes (embargos à execução) é mero desdobramento de uma originária relação de consumo. Data venia do entendimento contrário do Ministério Público, o simples fato de a execução embargada estar fundada em cédula de crédito bancário não faz com que a relação existente entre as partes se afaste do Direito do Consumidor e passe a vincular-se diretamente ao Direito Empresarial, notadamente, ao Direito Cambiário, com reflexos no Direito Civil. (Fl. 119).

4 A prevalecer tal entendimento, chegar-se-ia ao seguinte contrassenso: nas ações judiciais em que fosse discutido um inadimplemento contratual decorrente de uma relação de consumo, a competência para julgar os respectivos recursos seria das Câmaras Especializadas apenas quando o consumidor figurasse no polo ativo, ao passo que, se o fornecedor fosse o autor da ação, a competência seria a residual das Câmaras Cíveis. Em outras palavras, numa relação de consumo, quando o suposto inadimplente fosse o fornecedor do serviço, a competência seria da Câmara Especializada do Consumidor, ao passo que, se o suposto inadimplente fosse o consumidor, a competência seria da Câmara Cível Comum. Por conseguinte, a competência deixaria de ser aferida em razão da matéria e passaria a ser aferida em razão da pessoa. Por óbvio, tal entendimento não pode prevalecer. Mormente no caso concreto, onde o consumidor figura no polo passivo da execução, mas figura no polo ativo dos embargos. No mesmo sentido, o fato de o Sistema de Gestão das Tabelas Processuais Unificadas do Conselho Nacional de Justiça, a que alude o artigo 6º-A, 1º, do Regimento Interno deste Tribunal, não contemplar a Execução de Título Extrajudicial não afasta, por si só, a competência das Câmaras Especializadas. Bem ao contrário, o contrato bancário de empréstimo consignado está expressamente listado entre os Contratos de Consumo, constituindo matéria afeta ao Direito do Consumidor. Confirase: 1156 DIREITO DO CONSUMIDOR Combustíveis e derivados 7771 Contratos de Consumo 7752 Bancários Empréstimo consignado (Destaquei.) Observo, ainda, que a jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça, citada pelo MP, não se adequa ao caso concreto, vez que trata de contrato de promessa de compra e venda e cessão dos direitos de lavra (fl. 120). Na hipótese destes autos, o posicionamento do STJ é este: PROCESSUAL CIVIL E CONTRATO BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ABERTURA DE

5 CRÉDITO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. DESTINATÁRIO FINAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. INCIDÊNCIA DO CDC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. 1. Tratando-se de operação bancária feita a cliente na qualidade de destinatário final, incide, no caso, o teor da Súmula 297 desta Corte: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". (...) 4. Agravo regimental a que se dá parcial provimento. (AgRg no REsp /RS, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 16/11/2010, DJe 06/12/2010. Grifei). Destaco que, no caso concreto, não se trata de empréstimo contratado por pessoa jurídica para ser utilizado como capital de giro ou aquisição de insumos para a atividade empresarial, hipótese em que não restaria caracterizada a relação de consumo entre as partes. Bem ao contrário, trata-se de empréstimo contratado por pessoa física, policial militar, com desconto consignado em folha de pagamento. Vale dizer, o mutuário é o destinatário final do serviço prestado pela instituição financeira. Segundo o e. Superior Tribunal de Justiça, Para que o consumidor seja considerado destinatário econômico final, o produto ou serviço adquirido ou utilizado não pode guardar qualquer conexão, direta ou indireta, com a atividade econômica por ele desenvolvida; o produto ou serviço deve ser utilizado para o atendimento de uma necessidade própria, pessoal do consumidor. (CC 92519/SP, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Segunda Seção, julgado em 16/02/2009, DJe 04/03/2009). É exatamente esta a hipótese tratada no presente conflito de competência. Ante todo o exposto, verifica-se que a relação jurídica existente entre as partes qualifica-se como de consumo, o que atrai a competência das Câmaras Cíveis especializadas em matéria consumerista. No sentido de uniformizar o entendimento sobre a matéria, indico enunciado sumular nos seguintes termos: OS RECURSOS NAS DEMANDAS QUE ENVOLVAM OPERAÇÕES BANCÁRIAS ENTRE INSTUIÇÃO FINANCEIRA E CLIENTE NA QUALIDADE DE DESTINATÁRIO FINAL SÃO DA COMPETÊNCIA DAS CÂMARAS ESPECIALIZADAS EM MATÉRIA DE CONSUMO.

6 Assim, julgo procedente o Conflito de Competência, para declarar a competência da Egrégia 23ª Câmara Cível para conhecer e julgar o recurso objeto do Conflito, aprovando-se o enunciado sumular acima indicado. É como voto. Rio de Janeiro, 05 de maio de Desembargador RICARDO RODRIGUES CARDOZO Relator